Este
texto pretende registar alguns factos relativos às baterias dos
automóveis eletricos.
Como
sempre acontece em assuntos que interessam às pessoas, formaram-se
correntes de opinião que mais parecem de grupos religiosos ou de clubes.
Por
exemplo, a propósito dos incendios que alguns Tesla têm sofrido, os seus
adeptos têm dito que os automoveis de motor de explosão tambem se incendeiam e
a tacas superiores. É verdade, mas a comparação deverá fazer-se com os
outros eletricos, que não se incendeiam e até analisar porque os
incendios se têm dado no Tesla S e não no model 3. Mas isso tentarei mostrar depois.
Os
adeptos quase religiosos ou clubistas tambem desenvolveram a fé que os
automoveis eletricos já têm ou terão num futuro proximo o mesmo
desempenho dos automoveis de motor de explosão.
Para
que o desempenho fosse o mesmo, em termos de autonomia, velocidade e peso
total, seria necessário que a conjugação da densidade energetica e do
rendimento dos motores fosse identica. O que, do ponto de vista da Fisica, não
parece.
Admitindo
um rendimento do motor termico de 0,45 e da cadeia de transmissão de 0,9,
teremos um rendimento do deposito do automovel às rodas de cerca de 0,4.
Sendo a densidade da gasolina e do gasóleo cerca de 1 litro/10 kWh, temos que
para cada litro consumido teremos produzido uma energia mecanica util de 4 kWh.
Por
outras palavras, considerando que um automovel medio, medianamente carregado e
em condução normal requer 0,2 kWh nas rodas para percorrer 1 km, então 1 litro
dá para percorrer 4/0,2 = 20 km (ou 5 l/100 km).
Considerando
agora um automóvel eletrico, temos que o rendimento do motor vezes o
rendimento da transmissão dá aproximadamente 0,8.
Isto
é, cada kWh saido da bateria dá às rodas 0,8 kWh, o que permite percorrer 3,2
km .
Isto
é, para andar os mesmos 20 km, será preciso extrair da bateria 20/3,2 = 6,2 kWh (e não os 10 kWh equivalentes
graças ao melhor rendimento do motor elétrico) . Pode então dizer-se que 1 litro de gasolina
no depósito de um automóvel a gasolina equivale a 6,2 kWh úteis na bateria do
automóvel elétrico. Como o depósito dos primeiros tem uma capacidade da ordem
de 40 a 50 litros (autonomia da ordem de 600 a 700 km) teremos para a bateria
de um elétrico equivalente 250 a 300 kWh úteis .
Mas
há um problema, é que a capacidade da bateria não é a que vem no catálogo do
automóvel. De uma bateria de 20 kWh de capacidade nominal não se pode utilizar
senão 70% para evitar as dendrites, isto é, 14 kWh.
As
dentrites são caminhos arborescentes nos separadores dos elétrodos criados pelo
excesso de carga ou descarga por ultrapassagem dos limites de temperatura,
especialmente com cargas rápidas ou com descargas prolongadas. É que o lítio,
sendo o metal mais leve e com a estrutura da camada eletrónica mínima tem a
particularidade de fundir aos 180º. Ao fundir ao longo das dendrites vai fazer
curto circuito entre os elétrodos que por sua vez leva a incendio e explosão.
Por isso se incendiaram vários Tesla modelo S, apesar de disporem de sensores
de temperatura que controlam um sistema de ar condicionado para conter a
temperatura da bateria (como se sabe, às vezes o software tem hesitações).
Noutras marcas o automóvel imobiliza-se se a temperatura exterior ultrapassar
45º-.
Então,
para termos 250 a 300 kWh utilizáveis teremos de ter uma bateria de capacidade
nominal de 350 a 420 kWh.
Voltando
ao automóvel de combustível fóssil, o peso dos 40 a 50 litros de gasóleo é da
ordem de 40 kg . No caso do elétrico, considerando que de momento a densidade
das baterias é de cerca de 200 Wh/kg (as previsões mais otimistas para um
futuro ainda incerto chegam a 1 kWh/kg, mas são grandes as reservas por motivos
de fiabilidade e segurança) temos que a bateria equivalente aos 40 a 50 litros
de gasolina pesará à volta de 2000 kg. A este peso terá de se acrescentar a
estrutura de proteção contra explosões. Isto é, para termos um elétrico
equivalente, teremos de transportar permanentemente o peso de 28 passageiros
(mesmo que a evolução tecnológica permita atingir o valor de 1kWh/kg teríamos
300 kg e 6 “passageiros” permanentes).
Estas
as razões para considerar que a solução para o automóvel elétrico para
utilização semelhante aos de motor térmico não são as baterias mas sim o
hidrogénio e as células de combustível. O hidrogénio seria produzido por
eletrólise nos próprios postos de abastecimento a partir de energia elétrica de
origem renovável.
No
entanto, por razões de escala, podem ser muito úteis as baterias de lítio em
autocarros de 12 metros (1,5 kWh/km) e em automotoras de caminho de ferro, LRT
ou BRT (2 kWh/km).
É
óbvio que para autonomias curtas o elétrico de baterias pode ter grande
utilidade, mas considerem-se os números anteriormente apresentados, resumidos
assim para uma utilização normal/intensa
(0,7/0,2 = 3,5):
autonomia
de um elétrico em km = 3,5 x capacidade nominal da bateria em kWh
1 kWh nominal da bateria de um elétrico
equivale a 0,175 l num automóvel de
motor térmico (ou 3,5 km de
percurso)
Será
importante ter estas considerações em atenção ao analisar a hipótese de
exploração e processamento completo do lítio a extrair das minas em Portugal.
É
interessante analisar a constituição das baterias Tesla.
Elas
são constituídas pela associação série e paralelo de pequenos acumuladores cilíndricos
Panasonic com 18 mm de diâmetro e 65 mm de comprimento (baterias 18650,
utilizadas no modelo S) ou com 21 mm de
diâmetro e 70 mm de comprimento (baterias 21700, utilizadas no model 3).
Diz
a Tesla que deixou de haver incêndios desde que são utilizadas as baterias
21700. Esperemos que sim, que seja porque a construção destas evita a formação
de dendrites. Mas infelizmente temos de considerar a hipótese que, por software
possivelmente, o sistema de deteção de aumento de temperatura das baterias e de
risco de formação de dendrites funciona melhor. Infelizmente, a opacidade não é
um exclusivo das instancias dos governos, faz parte também da estrutura de
muitas privadas. Como técnico de análise de riscos, diria que, pelo menos no
caso das 18650, a Tesla foi imprudente. Falta mais grave do que a pequena
vigarice da poluição dos Volkswagen.
Olá.
ResponderEliminarDeixo alguns comentários ao seu artigo:
- Talvez se deva considerar o rendimento do automóvel eléctrico um pouco superior, pois nas travagens/descidas, alguma energia é recuperada para carregar as baterias. Numa estrada aberta plana isso é negligenciável, mas numa zona sinuosa ou em cidade pode ser importante.
- Na questão dos pesos, também é preciso descontar toda a parte mecânica que nos eléctricos é descartada (motor, caixa de velocidade), que é trocada por pequenos e mais leves motores eléctricos. Será razoável uma poupança de 150 kg?
- Será que é preciso os carros eléctricos terem uma autonomia superior a 400 km? Com as devidas excepções de determinados profissionais, na vida útil de um automóvel poucas vezes são feitas viagens de mais de 300-400 km. E antes dessa distância ser percorrida é preciso parar para descansar, ir ao WC e comer. Com sistemas de carregamento rápido nas actuais bombas de gasolina, em 15-30 minutos temos a bateria quase carregada. É como comparar os telemóveis tradicionais com os smartphones. Nos tradicionais a bateria durava uma semana, agora mal dá para um dia mas as pessoas habituaram-se a isso e não se importam.
Obrigado pelo seu comentário informado. Não quero de modo nenhum "condenar" o automóvel elétrico com baterias. Ele terá certamente uma quota importante no chamado "mix". Não penso é que seja uma panaceia. A extração de lítio e as dificuldades de reciclagem não recomendarão a alimentação de toda a frota planetária. Haverá lugar pelo menos para os de células de combustível.
ResponderEliminarQuanto ao rendimento é provável que temha razão, mas repare que o rendimento da regeneração é reduzido pelo atrito das rodas (parte da energia de travagem é absorvida nas rodas e não "vai" para o gerador. De acordo, descontamos 150 kg na comparação.
Quanto às cargas rápidas, são uma das razões das dendrites, isto é, reduzem a vida da bateria e o seu rendimento. Seria interessante comparar a autonomia de um auto movel elétrico com a de um automóvel a ar comprimido Nos postos de abastecimento a energia elétrica de origem renovável seria utilizada para alimentar copressores que carregariam garrafas (tipo botija de gás), trocando-se pela garrafa vazia do automóvel. Aliás este esquema foi pensado para as baterias mas os fabricantes não quiseram normalizar.
Sobre a autonomia das baterias dos smartphones permito-me discordar pelo menos pela minha parte, como sou distraído não gosto do consumo elevado, mas de facto não será por isso que deixo de utilizar.
Melhores cumprimentos
Eu lembro-me de ver um artigo sobre automóveis a ar comprimido na revista Turbo para aí de 1990.
ResponderEliminarFiquei sempre com a ideia que o problema será o rendimento obtido a comprimir o ar. Ou seja, 1 unidade de energia gasta no compressor, dá por exemplo apenas 0,5 unidade de energia para fazer mover o carro. Será isso verdade? Tive alguma formação sobre ar comprimido, mas nunca sobre o seu rendimento.
Mas a realidade é que é preciso reduzir muito o uso do automóvel, pois qualquer que seja a energia, é pouco eficiente e muito perigoso para os ocupantes, peões e animais.
Talvez esta nova onda de veículos partilhados seja uma inesperada solução. Umas vez de bicicleta, outras de trotinete, outras de qualquer coisa que ainda não tenha sido inventada e só em casos esporádicos um automóvel.