terça-feira, 21 de maio de 2019

Nós, os portugueses

Nós, os portugueses não somos diferentes dos outros. Não podemos, o código genético não deixa, é uma programação implacável. Mas podemos fazer umas variantes.
O primeiro ministro alemão cessou as suas funções e foi para a presidencia da Gazprom. Portas giratórias. A Siemens foi condenada por um tribunal americano em 2000 a pagar uma elevada indemnização por ter pago luvas num concurso. Mas a imprensa portuguesa, não sei se com medo de perder receitas de publicidade, não deu a notícia. Lá como cá, existem esses problemas. O aeroporto de Schonfeld naufragou em concursos mal conduzidos, o orçamento da casa da Filermoniade Paris inchou, inchou. Temos cá disso, mas os outros vão ultrapassando as questões, nós afogamo-nos nelas.
Durante séculos, os decisores foram-se aproveitando do seu poder para colher benefícios, obviamente à custa do povo.
Os senhores feudais que disputaram o poder agrário e militar com os seus homólogos galegos, os senhores feudais que se aproveitaram da demografia resultante da peste negra e do apoio da casa de Lancastre que não conseguia vingar na terra dos anglos e dos saxões, para repartir as áreas de influencia na península, os argutos armadores de navios que se entenderam com os reis da pimenta, da escravidão e da morte do povo na trágico marítima, os nobres que queriam reaver o seu poder contra a duquesa de Mantua, os limitados reis deslumbrados com o poder dos quintos do Brasil, os convencidos e impantes  deputados do liberalismo que mantiveram os índices de analfabetismo longe, muito longe dos índices europeus... Ainda hoje pagamos o preço da ileteracia, da dificuldade em compreender o que o outro quer dizer (também custa-nos a ouvi-lo, preferimos cobrir as suas palavras falando mais forte).
Talvez eu esteja mal disposto, por isso escrevo assim. Ou talvez seja porque reparei, no canal Mezzo, que os espetadores franceses, alemães, russos, quando batem palmas depois da execução da peça musical, durante breves momentos fazem-no de forma aleatória, e de repente, as palnmas estão sincronizadas. Reparem, em Portugal isso nunca acontece. As palmas são sempre aleatórias, nunca há sincronismo. Tentativa psicológica de explicação. A insegurança individual rejeita "deixar-se conduzir" pelo ritmo das palmas do vizinho, achará que seria prova de falta de personalidade. Mas a mesma insegurança individual leva as pessoas a integrarem-se em grupo para se sentirem protegidas. Seguem um lider, em torno de cujas opiniões se unem, emocionalmente, não racionalmente, desculpando-se que não percebem nada disso, por isso têm confiança em quem percebe. Normalizam-se e sentem-se em segurança em grupo. Mas se não percebem nada, como distinguem em quem devem confiar?
O porto de Roterdão estava espartilhado num estuário estreito com um banco de areia a perturbar a entrada na barra. Fizeram um acrescento, uma espécie de bolha que se projetou para fora da costa, cobrindo o banco de areia. Os navios de 20m de calado podem lá acostar, no interior desse acrescento. Em Lisboa, fizeram-se procissões de repulsa contra o porto de águas profundas . Que não se podia fazer na Trafaria. Mas na Trafaria já há um terminal de combustíveis e outro de graneis solidos alimentares. Ver http://www.silopor.pt/styled-2/index.html       e

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2015/03/ponto-de-vista-sobre-o-terminal-de.html


terminal da Silopor da Trafaria

E não era na Trafaria que se pretendia fazer o porto de águas profundas, era entre a Cova do Vapor e o Bugio.  O projeto deslocou-se para o Barreiro, onde a sonda é de 6 metros... e por não se fechar a Golada, coisa que os senhores ambientalistas consideram, o fecho, que é um crime, a barra do Tejo vai-se assoreando... nós, portugueses, somos assim, não somos holandeses. Quem quer o progresso do país e que a barra do Tejo não assoreie é criminoso.
Nós portugueses e ambientalistas, não quisemos a prospeção do gás  nem do petróleo. Prospeção, depois se resolveria. Não quisemos, as torres ficavam a 45 km da costa, e dada a curvatura da terra, a 5 km já não se veriam as torres. Mas não, não queremos prospeções. Como dizem os americanos, NIMBY, not in my back yard (por exemplo, não há fracking no rancho do presidente de uma das principais empresas de fracking). Guardadas as devidas distancias, nós, portugueses ambientalistas, metemo-nos nos nossos carros a gasóleo para regressar a Lisboa depois das triunfantes manifestações de repulsa, e não desdenhamos das viagens aéreas low cost a Londres ou mais longe, ao Caribe.
Segue-se a recusa da prospeção de lítio, que afeta a produção de carne barrosã (podiam ajudar a estudar formas de reduzir a produção pecuária de metano, mas de momento trata-se de reduzir a produção de lítio).
Ou a recusa de estudar soluções técnicas para evitar consequencias catastróficas em caso da rotura da barragem do Fridão (não há exemplos no planeta de roturas catastróficas de barragens exclusivamente hidroelétricas, mas os senhores ambientalistas não querem preocupar-se com as razões técnicas que previnem essas catástrofes, preferem dizer que os rios devem correr livremente para os oceanos -  não será uma forma de praticar a sabotagem do bem estar das comunidades? levantar obstáculos à barragem do Alvito/Ocreza, aos transvazes, às centrais de dessalinização?).
Ou simplesmente, gloriosamente capitaneados pelos sucessivos governos, como agora se diz para caraterizar bem a capacidade de liderança dos senhores governantes, adiando as soluções nas interligações energéticas com Espanha e a Europa, ferroviárias, de gestão da água...
Nós, portugueses...

"... consumir no ócio o tempo e a fortuna, ou mendigar pelas secretarias um emprego: o que não podem, sem indignidade, é trabalhar! Uma fábrica, uma oficina, uma exploração agrícola ou mineira, são coisas impróprias da nossa fidalguia. Por isso as melhores indústrias nacionais estão nas mãos dos estrangeiros, que com elas se enriquecem, e se riem das nossas pretensões."
                                                      Antero do Quental, Causas da decadencia dos povos    
                                                                               peninsulares nos últimos três séculos

porto de Roterdam     (https://en.wikipedia.org/wiki/Maasvlakte ):


o traço branco corresponde a 5 km; à esquerda o Maasvlakte, o porto artificial construido sobre bancos de areia

evolução do porto de Roterdam desde o século XIV

Sem comentários:

Enviar um comentário