A capital da República Fatimida do Meridião Europeu, Fadópoles, está localizada na margem esquerda do estuário do rio Sável. O sítio é aprazível e por isso atrai muitos visitantes estrangeiros. O pobre aeroporto, de conceção antiga. mesmo ao lado do parque central da capital, e de volume de tráfego limitado ao longo de muitos anos, rebenta agora pelas costuras. É dificil aumentar o volume de tráfego porque os decisores da República Fatimida não desistem de utilizar a única pista do aeroporto também como aeródromo militar, o que inclui o serviço da Presidencia da República. Por isso, os decisores decidiram aproveitar uma base aérea instalada numa ínsua junto da margem direita do rio Sável. O problema é que a pista pretendida, como a ínsua é pequena, é também ela pequena e o projeto da ampliar esbarra na oposição dos ambientalistas que defendem à outrance a vida dos moluscos que seriam soterrados com a obra. Mas os responsáveis do turismo são dinâmicos e conseguiram fazer aprovar um estudo de impacto ambiental, apesar das multidões de flamingos que frequentam a ínsua e as suas imediações.
E foi assim que o governo da República Fatimida deu ordem ao concessionário para construir o aeroporto na ínsua.
Mas surgiu um contratempo. Quando as primeiras máquinas chegaram ao cais para desembarcarem na ínsua encontraram um pelotão de paraquedistas armados até aos dentes que ameaçaram disparar sobre quem pusesse o pé em terra. Que tinha acontecido? Acontece que a base na ínsua acolhe os helicopteros de apoio naval, de prevenção aos acidentes ao largo da costa da República Fatimida. E como esta faz parte da Federação da Europa, essa costa é também da Federação e as obrigações de proteção estão bem definidas nos acordos. Por isso o chefe do estado maior da força aérea informou o chefe supremo das forças armadas, o senhor presidente da Republica, que iria defender a base de qualquer tentativa de invasão, de acordo com o juramento de bandeira que tinha feito, e obteve o acordo de cavalheiros dos colegas do exército e da marinha que assobiariam para o lado se houvesse sarrafusca. O senhor presidente, por se aproximarem as eleições e por achar alguma graça a uma rasteira ao senhor chefe do governo, confirmou junto dos orgãos centrais da Federação os acordos de proteção costeira em que não podia mexer-se e deu igualmente a garantia de que assobiaria para o lado. No entanto, como era boa pessoa, preparou com o chefe da Força aérea e um conjunto de entidades minimamente responsáveis (que até aí tinham estado afastadas do processo) um plano B: o aeródromo militar do aeroporto antigo da margem esquerda libertaria a pista e iria para a base aérea da margem direita, na ínsua, o que permitiria aumentar o tráfego, graças a um novo taxiway para acelerar a saída da pista dos aviões que aterram e far-se-ia um concurso publico internacional para a escolha de um local para um novo aeroporto e elaboração do respetivo projeto para construção faseada sincronizada com o abandono faseado e prolongado no tempo do aeroporto antigo da margem esquerda. Os terrenos do aeroporto antigo irão para zona verde. O senhor Presidente, como pessoa muito bem vista na Federação, conseguiu até um empréstimo a taxas de juro negativas não só para o projeto e construção do novo aeroporto, mas também para o concurso internacional para a elaboração do projeto e construção da nova linha ferroviária Fadópoles-Bairro do Norte e da nova linha Porto Concavo-Fadópoles-Zarzuelópoles segundo os parâmetros técnicos da Federação.
A colónia de bivalves dos baixios do rio Sável respirou de alívio, embora não por muito tempo que os apanhadores não lhes dão tréguas.
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