sábado, 22 de junho de 2024

Sobre o protesto da Medway contra a política ferroviária oficial

 

Protesto da MEDWAY em junho de 2024

https://www.tsf.pt/1928279485/medway-avisa-governo-empresa-pondera-sair-de-portugal-e-mudar-se-para-espanha/   

 

 

 

Pessoalmente, eu gostaria de ver no meu país um incumbente operador ferroviário de mercadorias. Por razões, para mim de incompreensão da dimensão do tema e de incompetência ao nível dos governos, não temos esse incumbente. Mas reconheço, sem preconceitos, que os operadores Medway e Captrain desempenham as suas funções de modo eficiente e são, como diz o diretor da Associação Portuguesa de Empresas Ferroviárias, indispensáveis para a economia do país.

Então, pondo de lado questiúnculas partidárias de um governo de um partido ser melhor ou pior do que o governo de outro partido, parece-me que seria interessante os técnicos da especialidade apoiarem os protestos da Medway e não apenas no cumprimento das medidas acordadas e não executadas. Numa altura em que finalmente é revelada a incapacidade da IP de desenvolver efetivamente a ferrovia em Portugal, sugiro o apoio à Medway nos seguintes temas:

1 – rápida satisfação das medidas referidas no protesto

2 - desenvolvimento de um plano faseado de aplicação do novo regulamento das redes TEN-T a Portugal, procurando cumprir os prazos e evitando as isenções, respeitando todos os parâmetros da interoperabilidade, incluindo a bitola 1435 mm e o ERTMS, tendo em vista a transferência de cargas rodoviárias para a ferrovia e o crescimento das exportações por modo ferroviário para a Europa além Pireneus

3 – rápida revisão da problemática da linha da Beira Alta dentro do objetivo do ponto 2, planeando a construção do corredor Aveiro-Almeida em linha nova dupla para tráfego misto com as caraterísticas de interoperabilidade plena, incluindo pendentes máximas de 1,2%

3 – a curto prazo, desenvolver o sistema de autoestradas ferroviárias (transporte por comboio, em vagões plataformas articuladas de 3 bogies e gabari P400, de camiões, semirreboques, caixas móveis) , numa primeira fase em bitola ibérica servindo as plataformas de Vitoria e de Valencia servidas por bitola europeia espera-se que em 2025

4 – simplificação do processo de certificação da plataforma de Lousado (descontaminação de solos)

5 – aceleração, para permitir a entrada das locomotivas Euro 6000 em Portugal, em cooperação com a ERA (Europeam Rail Agency), Hitachi Rail,  Siemens, Critical Software, Stadler, do processo de conclusão e certificação do STM (Specific Transmission Module para compatibilização ERTMS-CONVEL), mas com o respeito integral dos prazos determinados pelo novo regulamento (2030 para o ERTMS nos corredores principais e 2040 para o abate dos sistemas proprietários tipo CONVEL)   

 

 

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Notas

1 - registo de declarações do presidente da Medway, Carlos Vasconcelos, reconhecendo (i) que a existência de linhas em bitola europeia na península seria o ideal https://14-congresso.adfersit.pt/videos/      ver momento 1:22 ;  (ii) que 2 comboios por dia em Irun de bitola ibérica seria incomportável https://www.youtube.com/watch?v=VBhs7u2Q5XI&list=PLjW3hUKuSY4WgI4-cfKow8Y2ukE4W9O4O&index=4&t=1022s      ver momento 1.03.48 ; (iii)

https://www.railwaygazette.com/in-depth/freight-medway-takes-on-the-trucks/59909.article

ver o final da entrevista


2 - artigo no Portugal ferroviário sobre a IP








Aprovação do novo regulamento das redes transeuropeias TEN-T que substitui o 1315

 

O Conselho da União Europeia aprovou o novo regulamento

das redes TEN_T

 

 

 

Uma notícia do Conselho da União Europeia em 13 de junho de 2024 – as redes transeuropeias

Discretamente, através dum press release do Conselho da União Europeia  de 13 de junho de 2024[1] , foi noticiada a aprovação do novo regulamento das redes transeuropeias de transporte TEN-T, que substitui o 2013/1315, com as linhas de orientação para o desenvolvimento dessas redes.

O objetivo das redes transeuropeias, também na vertente ferroviária, está consagrado no art.170 do TFUE, Tratado de funcionamento da União Europeia (curiosamente conhecido como Tratado de Lisboa), exprimindo o seu compromisso desta forma: “… a ação da União terá por objetivo fomentar a interconexão e a interoperabilidade das redes nacionais, bem como o acesso a essas redes. Terá em conta, em especial, a necessidade de ligar as regiões insulares, sem litoral e periféricas às regiões centrais da União.”

Do exposto pareceria que qualquer Estado membro, especialmente se longe do centro económico da Europa, teria todo o interesse em aderir convictamente às linhas de orientação da regulamentação comunitária em tudo o que facilitasse as ligações à Europa. Por exemplo, reduzindo as emissões de gases com efeito de estufa substituindo a maior parte das ligações aéreas Lisboa-Madrid[2] por ligações ferroviárias de Alta Velocidade e substituindo a maior parte do tráfego rodoviário de mercadorias para além dos Pireneus por tráfego ferroviário.

A importância das exportações

Dizem-nos que o principal destino das nossas exportações é Espanha e como a sua rede ferroviária de mercadorias é maioritariamente de bitola ibérica não vale a pena pensar em linhas novas para a Europa de bitola europeia. E contudo, segundo o INE não será bem assim.

Em 2023 as exportações por modos terrestres para Espanha foram 10,84 Mton no valor de 16908 M€ e para o resto da EU  5,55 Mton no valor de 26275 M€. A quota modal ferroviária para a Europa além Pireneus é irrelevante devido à diferença de bitolas, cingindo-se à contabilização dos percursos intermodais e parciais em ferrovia na península. Admitindo comboios de 1400 toneladas teríamos para a transferência de todo esse tráfego para comboios cerca de 4000 por ano ou mais de 10 comboios por dia substituindo cerca de 500 camiões por dia. 

De janeiro a abril de 2024 as exportações em valor para Espanha por todos os modos  foram, para Espanha 6686 M€, para a EU 18797 M€, e para o mundo 26539 M€ (fonte INE). Basta somar o valor das exportações para França, Paises Baixos e Alemanha para ter um valor superior ao para Espanha. A quota modal marítima para a EU tem sido inferior a 15%.

Não parece assim haver suporte para manter a bitola ibérica se quisermos transferir tráfego rodoviário para a ferrovia.

As autoestradas ferroviárias

Há porém uma solução enquanto não dispusermos da ligação a França em bitola europeia, que são as autoestradas ferroviárias ou transporte de camiões, semirreboques ou caixas móveis por comboio, em vagões plataforma articulados e com 3 bogies. O facto da chamada e atrasada modernização da linha da Beira Alta não ter previsto o alargamento ou variantes dos túneis é apenas mais um sintoma da preferência por soluções baratas que adiam os investimentos necessários e eficientes como o corredor Aveiro-Salamanca com as caraterísticas de interoperabilidade das redes TEN-T.

O corredor atlântico no mapa das redes transeuropeias TEN-T

O mapa seguinte faz parte do Anexo III.14  do regulamento. A amarelo o corredor atlântico, com os acrescentos, relativamente ao anterior regulamento 1315, dos portos do sudoeste de Espanha, Galiza e Astúrias. A calendarização reparte-se pelos troços da rede “core” (2030), “extended core” (2040) e “comprehensive” (2050).




Uma  política de coesão deverá reduzir a desigualdade dos níveis do PIB por região o que exigirá investimentos e aumento de ativos de infraestruturas nessas regiões. As análises de custos benefícios referidas no regulamento terão em consideração o que se perde por não investir, as taxas expetáveis de crescimento do PIB e das exportações devido ao investimento em linhas férreas de ligação ao centro da Europa (Mannheim, Strassbourg), a economia devida às caraterísticas das linhas novas, a redução de gases com efeito de estufa devido à transferência dos modos aéreo e rodoviário[3].



O que especifica relativamente à bitola e ao ERTMS o novo regulamento aprovado  pelo Conselho da União Europeia em 13 de junho de 2024

No seu art.17, determina que “Member States shall ensure that any new railway line of the core network and the extended core network … provides for the European standard nominal track gauge of 1 435 mm   e no art.18:  Member States shall ensure that by 31 December 2030  ERTMS is equipped on the railway infrastructure of the core network.

Ora, não há em Portugal neste momento (contrariamente aos países bálticos que estão construindo o Rail Baltica em bitola europeia e não na bitola russa pré existente) planeamento para a construção de linhas de bitola europeia nem para a instalação de ERTMS (controle da circulação dos comboios). É verdade que o próprio regulamento prevê a possibilidade de isenções do cumprimento desta obrigação mas sempre sujeita a análises de custos benefícios e de avaliação do impacto na interoperabilidade e sempre de natureza temporária. Isto é, o recurso a essas isenções apenas funciona como adiamento de decisões que deverão ser urgentemente tomadas.

A argumentação contra a bitola europeia

Não parece correta a noticia do ECO que diz que em Espanha não há ligação entre a rede UIC e a rede convencional quando existem 272 km de via com 3 carris prevendo-se aumento no corredor mediterrâneo. https://24.sapo.pt/atualidade/artigos/alianca-iberica-pela-ferrovia-pede-servico-direto-lisboa-madrid-em-2025 

O presidente do principal operador ferroviário de mercadorias em Portugal, a Medway, apesar de não considerar oportuna a construção de novas linhas em bitola UIC, reconhece que isso seria muito mais fácil[4]

Sibilinamente, dizem-nos a IP e os sucessivos governos que o uso exclusivo da bitola ibérica é imposto por Espanha, cuja rede interna de mercadorias é maioritariamente em bitola ibérica. Sibilinamente porque o comissário espanhol para o corredor atlântico tem, apesar de limitado, um orçamento para investir no seu corredor, esperando-se a curto prazo a ligação em via de 3 carris entre a fronteira francesa e a plataforma logística de Vitoria. Também no corredor mediterrânico se espera a curto prazo a ligação em bitola UIC entre Barcelona e Valencia. Sibilinamente porque apesar das limitações da rede de mercadorias espanhola reconhecida pelo próprio ministério com uma quota modal de 9% [5], a natureza vinculativa da regulamentação comunitária impõe a um Estado membro a obrigatoriedade  de coordenar com o Estado vizinho as ligações transfronteiriças e nunca a possibilidade de constituir um obstáculo às exportações desse Estado vizinho.

Considerando a demora na construção das novas linhas para mercadorias em Portugal e Espanha com as caraterísticas de interoperabilidade com  o resto da Europa, os respetivos governos deveriam coordenar um plano com o faseamento de aproximação da bitola UIC dos portos atlânticos. Julga-se que isso só poderá ser feito com uma estrutura de gestão de infraestruturas corretamente dimensionada em termos de recursos humanos para gestão do desenvolvimento de uma nova rede, separada da gestão corrente da rede existente, sem prejuízo do recurso a concursos públicos internacionais para seleção de consultor com experiência internacional em projeto, manutenção e operação de redes de alta velocidade/mercadorias.





 

A posição dos sucessivos governos e da IP

Infelizmente, os sucessivos governos portugueses têm recusado seguir as linhas de orientação comunitárias que desde 2013 formalizaram uma série de especificações para garantir a interoperabilidade entre todas as redes nacionais, numa única rede europeia[6]. O atual governo aparentemente não sente que incorre no risco de um processo de infração por, por exemplo, dar prioridade à ligação Porto-Vigo (fixada pelo novo regulamento para 2040) em detrimento da ligação a Madrid (fixada para 2030), ou por insistir na exclusividade da bitola ibérica de 1668 mm, quando o especificado é a bitola europeia ou UIC de 1435 mm. Esta opção tem também o risco de inviabilizar o aproveitamento das taxas máximas de cofinanciamento, nomeadamente dos programas CEF , Connecting Europe Facility[7] .

Lamentavelmente, são-nos apresentadas soluções definitivas e indiscutíveis para o  Plano Ferroviário Nacional, o Plano de Investimentos 2030 e os planos para as linhas de Alta Velocidade, a terceira travessia do Tejo (TTT) e o serviço ferroviário do novo aeroporto. Não apenas por recusarem críticas, mas por ignorarem: (i) os princípios legais da gestão territorial numa altura em que a economia do país beneficiaria com o desenvolvimento da regionalização administrativa livre da partidarização e do caciquismo e baseada num número pequeno de NUTs II (ii) as orientações e as especificações da regulamentação comunitária (iii) a ponderação do recurso a concurso público internacional para seleção de um gabinete de engenharia de transportes para elaboração de um plano integrado.

A IP e o governo insistirão que já há muito funciona a tecnologia de eixos variáveis para passageiros e já está homologada para mercadorias e que portanto podemos conservar a bitola ibérica. Esquecem que são raros os fabricantes e os operadores que dispõem dessa tecnologia, o que contraria o princípio da concorrência. Esquecem que é uma tecnologia para a transição duma rede ibérica para uma rede europeia e que não é razoável enviar vagões de eixos variáveis para longe das oficinas de manutenção. Paradoxalmente, recusam-se a aceitar a solução de eixos variáveis para viabilizar  a construção por fases da ligação Porto-Lisboa em bitola europeia de raiz (instalando intercambiadores nos pontos de transição entre os troços novos em europeia e os troços existentes em ibérica, como na ligação de AV Madrid-Galiza com um intercambiador em Ourense).

 

CONCLUSÃO

Para sairmos da situação de impasse na ferrovia de passageiros e na de mercadorias, reduzir as emissões nas ligações Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid e aumentar a quota modal da ferrovia interna e de exportações, é essencial espanhóis e portugueses desenvolverem, em sintonia com o regulamento TEN-T substituto do 1315, e de forma coordenada, um plano de progressiva aproximação da bitola 1435mm dos portos atlânticos segundo os traçados do corredor atlântico de utilização mista, revendo simultaneamente o PFN para assumir o que está inscrito no próprio PFN, "A criação de ligações ferroviárias em bitola padrão (1435 mm) teria inegáveis vantagens no transporte de mercadorias internacional de longa distância, contribuindo para melhorar a competitividade das exportações portuguesas", revendo numa perspetiva de gestão integrada do território e da mobilidade os grandes investimentos na ferrovia.



[1] https://www.consilium.europa.eu/en/press/press-releases/2024/06/13/trans-european-transport-network-ten-t-council-gives-final-green-light-to-new-regulation-ensuring-better-and-sustainable-connectivity-in-europe/     O Conselho da União Europeia é composto pelos ministros dos Estados membros conforme a natureza dos temas, de presidência rotativa de 6 meses; é um órgão legislativo juntamente com o Parlamento Europeu vetando, corrigindo ou aprovando as iniciativas da Comissão Europeia (não confundir com o Conselho Europeu composto pelos primeiros ministros dos Estados membros e que define com a Comissão Europeia a orientação geral da política da UE)

[2] Admitindo um consumo específico de energia primária de 260 Wh/pass-km no avião, 70 Wh/pass-km no comboio AV, taxa de ocupação de 90% e 2500 passageiros/dia na ligação Lisboa-Madrid, teremos um consumo diário de 0,36 GWh e 110 tonCO2 se tráfego exclusivo por avião e 0,11 GWh e 30 tonCO2 se por comboio AV  

[3] Embora com limitações, ensaiou-se uma análise de custos benefícios favorável ao investimento no corredor atlântico na comunicação ao 10º congresso do Centro rodoferroviário Português de julho de 2022 consultável em              https://1drv.ms/w/s!Al9_rthOlbwewAPiImeJt2AleD8l?e=8een7f         

[5] Volumes de tráfego em Mton, comparativo Espanha-Portugal (2021):

                                                             rodovia      ferrovia

fonte OTLE: Espanha nacional           1541            20

             Espanha internacional             119              4,7

fonte   INE:  Portugal  nacional            120,5           6,6

             Portugal  internacional              22,9           2,7

 

[6] Alimentação 25 kVAC, 250 km/h passageiros, 100 km/h mercadorias, pendentes máximas 1,2% e tráfego misto passageiros/mercadorias, comprimento comboios 740 m, controle ERTMS, bitola europeia

[7] Regulamento 2021/1153. A preocupação com as condições de  acesso a níveis elevados de cofinanciamento levou um grupo de cidadãos a dirigir uma carta aberta à presidente do BEI a propósito do financiamento de 3000 milhões de euros para a linha de AV Porto-Soure, consultável em   https://1drv.ms/w/s!Al9_rthOlbwe0ROQecRWWYfLt0LJ?e=70VWc0   


sábado, 15 de junho de 2024

Aeroporto, junho de 2024, pela EasyJet

 Chamou-me a atenção uma entrevista do diretor da Easyjet em Portugal sobre o problema do novo aeroporto. https://www.dinheirovivo.pt/8078832790/jose-lopes-dizer-que-a-ana-paga-o-novo-aeroporto-significa-que-serao-as-companhias-e-depois-os-consumidores-a-pagar/

Não sendo especialista  de aviação, apreciei a argumentação apresentada, para mais vinda de alguém com experiência, que me pareceu mais civilizado e cooperante do que o presidente da Ryannair. Destaco a observação muito simples, que um bom meio para aumentar a capacidade aeroportuária de Lisboa é aumentar a capacidade unitária dos aviões. Não gostarão os adeptos do "ponto a ponto" exclusivista por dificultar o preenchimento do avião e exigir comprimentos maiores das pistas. Por isso é uma medida que torna indispensável o prolongamento do taxiway norte/nascente até ao fim da pista 2 (os pontos 13, 14 e 17  das obrigações específicas de desenvolvimento do anexo 9 do contrato com a ANA para saídas rápidas da pista 2 , entradas múltiplas na pista 20 e expropriações para o prolongamento do taxiway que deveriam estar executados até 2021) para evitar o cruzamento da pista.  

É também curiosa a referência à construção do novo aeroporto paga pela ANA e subsequentemente pelo aumento das taxas. Esta posição parece ser partilhada pela CTI ( e pelo XXIV governo, prometendo que os contribuintes não pagariam o novo aeroporto) , sugerindo-se renegociação do contrato. No entanto, este determina que o concessionário apresente um plano de financiamento, não que assegure o pagamento:

Transcrição do art.17 sobre as obrigações da concessionária:



          Transcrição do art 45.3 sobre o relatório inicial:

Transcrição do art.46 sobre o relatório da candidatura:  

A Concessionária deve preparar e apresentar (a expensas suas) ao Concedente, a Candidatura ao NAL, no prazo de trinta e seis (36) meses  … compreendendo relatórios:

(a)             com os comentários dos cinco (5) maiores operadores aéreos  … sobre: (i) o local que preferem para o NAL, (ii) as principais especificações para o NAL e (iii) os níveis das Taxas Aeroportuárias ...

(b)             com a justificação do local proposto e uma síntese do impacte ambiental negativo  …

(c)             com uma proposta de planeamento, da calendarização da construção, da estrutura de subcontratação e um orçamento para a construção do NAL …

(d)             com uma solução de financiamento proposta para o NAL e a confirmação da disponibilidade das instituições financiadoras para financiar a construção do NAL …



Eu concluiria que a concessionária ANA tem a obrigação contratual de desenvolver em  3,5 anos (relatórios inicial e da candidatura) um anteprojeto de um novo aeroporto com capacidade da ordem de 90 movimentos por hora (60 a 70 milhões de passageiros por ano) e angariar um plano de financiamento. Aparentemente nada obriga a ANA a pagar o NAL nem a recorrer ao aumento das taxas embora isso seja referido no art.45.3 integrando  o financiamento.


Os extratos acima do contrato são suficientes para dar razão ao presidente do CA da ANA quando atribui aos sucessivos governos a culpa dos atrasos e inconvenientes devidos à indefinição da localização do NAL. Esses governos não tinham de aceitar a solução Portela+Montijo pela simples razão de que a sua capacidade máxima, 48 + 24 movimentos por hora é inferior em eficiência, embora menos onerosa, do que a especificada no anexo 16 do contrato. Mas a culpa é claramente partilhada pela ANA porque também de forma simples se eximiu ao cumprimento do art.17 que a obrigava `execução de especificações de desenvolvimento no anexo 9 (com a agravante de serem definidas datas de execução dessas obrigações, nomeadamente início em 2018) pelo que não terá direito a nenhuma indemnização pela desistência do Montijo.

Também se estranham as declarações do presidente da ANA, Thierry Ligonnière quando afirmou aos deputados da CEOPH que a Vinci já tinha executado o taxiway requerido para o aumento da capacidade da pista. Terá sido um mal entendido. Há anos que a falta do prolongamento do taxiway U até à extremidade norte da pista 2 (ex 3) pelo lado nascente é um dos principais obstáculos ao aumento da capacidade - os aviões maiores, wide body, terminam a sua aterragem a norte do cruzamento com a antiga pista 17/35 e só podem seguir para o estacionamento pelo taxiway do lado poente para depois atravessar a pista, atrasando as outras aterragens. Esse prolongamento é o conjunto das obrigações específicas 13 (saídas rápidas da pista 3) e 14 (entradas múltiplas na pista 21). O senhor presidente terá confundido com o que foi executado, as entradas e saídas dos troços do taxiway U5 e U6  que ficam longe da extremidade norte da pista 2. Fica por executar a obrigação 17, expropriações dos armazens necessárias para o prolongamento (seria muito estranho ter-se executado o taxiway antes das expropriações).

Recordo ainda a obrigação 16, o aproveitamento da placa de estacionamento de Figo Maduro, também com a culpa pelos atrasos partilhada.

Sobre eventuais reclamações de compensação pelos prejuízos do COVID, tratar-se-á de um tema típico para os juristas, mas parece que o art.25.1.b) determina claramente que as compensações do reequilíbrio financeiro não são aplicáveis em caso de força maior (por definição de Alteração de circunstancias) 

Em resumo, apesar de existir uma comissão de negociação com a ANA para desenvolvimento das obras no AHD para aumento da sua capacidade, os cidadãos não estão suficientemente informados sobre a sua extensão e calendarização. O que, por se tratar de assunto público, é por força do art.48,  uma inconstitucionalidade, receando-se que estejam a  gerar-se atrasos substanciais e que as obras em curso ou em perspetiva possam não ser as prioritárias.  





 





Comparando as propostas da alta velocidade pela margem esquerda e direita na ligação Porto-Lisboa

Interessante a proposta recentemente divulgada de um traçado da linha de Alta Velocidade Porto-Lisboa  por Santarem e a margem esquerda do Tejo, divergindo do traçado da IP de Pombal para sul
Ligação para a proposta pela margem esquerda do Tejo desde Santarem

https://www.msn.com/pt-pt/noticias/other/grupo-de-engenheiros-desafio-governo-a-avaliar-percurso-alternativo-para-o-tgv-que-dizem-mais-r%C3%A1pido-e-mais-barato/vi-BB1o0gDg?ocid=mailsignout&pc=U591&cvid=ae5e1ab3d4e34eef909acf80e2687f10&ei=37

Admitindo que nesta proposta a distancia Soure-NAL é aproximadamente igual à distancia Soure-Gare do Oriente (cerca de 155km) pelo traçado da IP  por Carregado, teremos de contar com mais 40km (pela TTT Beato Montijo) ou 50 km (por Chelas-Barreiro) para se atingir a Gare do Oriente. 

Em resumo, Porto-Lisboa 290 km pelo Carregado e margem direita do Tejo.

Alternativa proposta por Santarém e margem direita:  Porto-Lisboa 330 km (por Beato-Montijo) ou 340 km (por Chelas-Barreiro). 

A proposta da CTI do NAL propõe também a ligação Porto-Lisboa pela margem esquerda, mas com travessia do Tejo em Carregado conduzindo aproximadamente à mesma diferença de percursos entre a margem direita e a margem esquerda, considerando que entre o Carregado e a Gare do Oriente e o Carregado e o NAL a distancia é aproximadamente a mesma (32 km). 

Analisando melhor, pela margem direita temos 32 km assim distribuídos  com indicação de km, de preços unitários e parciais:
Tunel 19 x 100 = 1900 M
Viaduto  13 x 40 = 520 M€
________________________
                             2420 M€  ~ 2500 M€


Pela margem esquerda temos entre o Carregado e o NAL os mesmos 32km, assim distribuidos:
Ponte   5 X 100 = 500 M€
Viadutos  23 x 40 = 920 M€       
(não vão criar-se barreiras na lezíria com troços ao nível da superfície, nem pensar, os viadutos são necessários considerando a classificação do território e a natureza da sua ocupação)
Túnel NAL 2 X 100 = 200 M€
Trincheira NAL 2 x 20 = 40 M€
__________________________
                                 1660 M€ ~ 1700 M€

Isto é,     diferença é ~800 M€

Agora vamos ver as externalidades:
Estimativa AV Porto-Lisboa  10 M passageiros /ano
Consumo energia primária  160 Wh/pass-km
Percurso adicional pela margem esquerda 40 km pela TTT Beato-Montijo, 50 km por Chelas-Barreiro
Estimativa em energia adicional por  Beato-Montijo:      (estou a contabilizar apenas os valores para Porto-Lisboa)
10 M x 40 X 0,16 kWh = 64 M kWh / ano     (ou 64 GWh , 2/3  do consumo anual do metro)
Custo adicional energia a 10 cents o kWh:
6,4 M€/ano

Tempo de percurso adicional (limite de velocidade nas curvas apertadas das travessias do Tejo e do NAL) : 15minutos
Valor da hora do passageiro: 10€
10 M pass x  0,25 h x 10 €/pass-h = 25 M€

Isto é, temos uma poupança  de cerca de 30 M€ por ano pela margem direita em termos de operação. Ou em menos de 30 anos diluiu-se o prejuízo.
Não esquecer ainda que a quadruplicação da linha suburbana, se se quiser fazer a coisa a sério, implica um túnel de 5 km entre Alhandra e Vila Franca, ou mais 500 M€.


Eis por que não posso subscrever o traçado pela margem esquerda.

Ver também sobre a localização do NAL e a ligação de AV:       https://fcsseratostenes.blogspot.com/2024/03/mensagem-para-um-senhor-jornalista-que.html  



terça-feira, 4 de junho de 2024

Comentário a um artigo da APAT e a um seminário da T&N lamentando a baixa quota modal da ferrovia

  




Comentário a um artigo de opinião do presidente da APAT (Associação portuguesa de transitários) e ao seminário da Transportes e Negócios sobre transporte ferroviário de mercadorias em junho de 2024[1]

  

Dividindo o problema, temos o transporte terrestre de mercadorias interno, o transporte para e de Espanha e o transporte para e de além Pirineus. Dado o peso maioritário da rodovia especialmente nos dois últimos aspetos, parecerá que o transporte ferroviário não se desenvolve precisamente por causa da importância e dos lobies do setor rodoviário. Junte-se a isso a natureza da gestão do corredor de mercadorias atlântico RFC4, pelo consórcio “AEIE agrupamento europeu de interesse económico” da IP, ADIF, SNCF e DB, naturalmente interessadas no aproveitamento máximo das infraestruturas existentes e no mínimo investimento evitando as mudanças, condicionando assim as ligações ferroviárias à Europa. Citando Daniel Gros em 2015, quando diretor do Centro de Estudos Europeus,    “Muitos projetos ferroviários e rodoviários também avançam lentamente, devido à oposição local e não à falta de financiamento.”

 

No caso do setor rodoviário parece haver um lobby influente que elimina portagens e subsidia o gasóleo, invocando que contribui muito para as exportações e para o emprego e anunciando à boa maneira portuguesa que já há soluções para camiões de baterias e de hidrogénio (embora não estejam dispostos a investir neles).

 

O seminário de 6 de junho com representantes da IP e dos principais operadores e entidades ligados à logística ferroviária e portuária em Portugal mostrou unanimidade na crítica ao favorecimento do setor rodoviário em comparação com as dificuldades sentidas pelo operadores ferroviários desde a burocracia à taxação e às limitações das infraestruturas. Mas sancionou a política de exclusividade da bitola ibérica consagrada no PFN com o pretexto de conectar as novas linhas com a rede existente (o que alternativamente poderia fazer-se no caso da linha de AV Porto-Lisboa com a tecnologia dos eixos variáveis e intercambiadores).

 

Considerando apenas as ligações ferroviárias à Europa, o fundamento para o seu desenvolvimento é a necessidade de substituir, por razões ambientais e de estímulo ao crescimento das exportações, parte significativa das exportações rodoviárias pela ferrovia.

Em 2023, as exportações por rodovia, segundo o INE, foram:

para a EU         16,287 Mton (42858 M€)

para Espanha   10,761 Mton (16856 M€)

 

 

Pela ferrovia foram (a contabilização pelo INE dos destinos das exportações não implica o transporte das mercadorias desde Portugal além  da fronteira dos Pirineus):

para a EU          0,105 Mton (325 M€)

para Espanha    0,079 Mton (  52 M€)

               ( mais informação em           https://fcsseratostenes.blogspot.com/2024/02/os-numeros-de-2023-das-exportacoes-e.html     )

 

Tamanha discrepância motivaria ações mais evidentes de promoção de uma estratégia de desenvolvimento de soluções para a referida transferência de cargas para a ferrovia. Mas isso é incompatível com a simples manutenção da gestão unicamente concentrada no aproveitamento das infraestruturas existentes, requerendo investimento elevado e uma gestão separada da gestão corrente, investindo em linhas novas com as caraterísticas de interoperabilidade plena normalizadas segundo o regulamento substituto do 1315 das redes TEN-T.

 

 

A primeira fase poderia ser o transporte de semirreboques ou caixas móveis por comboio (autopistas ferroviárias) com dois destinos dos camiões em Espanha: Vitoria e Valencia, negociando o governo português com o espanhol a ligação em bitola europeia das respetivas plataformas a França o mais cedo possível, ainda antes de 2030 . Trata-se de um investimento avultado dado que a nova regulamentação europeia obriga a especificações como o DAC (Digital automatic coupling) , o gabari P400, o comprimento dos comboios, o ERTMS, as pendentes, a bitola UIC em linhas novas,  e a progressiva incorporação dos serviços de mercadorias no corredor atlântico de alta velocidade via Aveiro-Salamanca e via Caceres-Plasencia para sua rentabilização[2].

E neste caso requer-se de Espanha uma atitude mais ativa nas mercadorias  para, numa segunda fase, progressivamente vir trazendo a bitola europeia em via dupla até à fronteira portuguesa.

 

 Será necessário um plano e a sua implementação com datas como:  2025/2027 Vitoria e Valencia; 2030/2032 Medina del Campo e Madrid; 2035/2037 Badajoz e Salamanca/ Almeida/ Mangualde; 2035/2037 Aveiro/Leixões e Poceirão/Lisboa/Sines; 2040 Leixões-Vigo.



Precisamente por ser um investimento avultado e que contribui para a coesão europeia através da rede única ferroviária, a normalização com todos os componentes da interoperabilidade deve ser respeitada também para facilitar o cofinanciamento comunitário. 

Na primeira fase já terão de ser abordados e preparada a resolução dos problemas do ERTMS (a própria regulamentação europeia determina a retirada de sistemas como o CONVEL até 2040), os traçados em via dupla, o recurso a material circulante de eixos variáveis ou de eixos intermutáveis para soluções localizadas de curta extensão ou temporárias, o desenvolvimento da rede de plataformas logísticas nomeadamente o reaproveitamento parcial do terminal rodoferroviário da Bobadela e a implementação do terminal de Castanheira do Ribatejo.

 

Especialmente no caso das autopistas ferroviárias os cadernos de encargos do material circulante deverão prever uma substituição económica de bogies ou rodados de bitola ibérica por bogies ou rodados de bitola europeia.  

O panorama das mercadorias em Espanha não é atualmente famoso, com uma quota modal em 2021 da ordem de 9% segundo o observatório de transporte e logística em Espanha OTLE que registou em 2021 os seguintes volumes em Mton de tráfego nacional e internacional para a rodovia e a ferrovia,  superiores cerca de 7% relativamente a 2019, comparando-se com os volumes em Portugal:

                                                      rodovia      ferrovia

OTLE: Espanha nacional                1541            20

            Espanha internacional           119              4,7

INE:    Portugal  nacional                 120,5            6,6

            Portugal  internacional           22,9            2,7

Nota: os dados do INE são da sua Estatística de transportes de 2022 e incluem os serviços em redes estrangeiras mas da responsabilidade de operadoras nacionais; repetidamente foi afirmado no seminário de 6 de junho que a quota do transporte ferroviário de mercadorias em Portugal será de 13%, mas provavelmente referindo-se a toneladas-km; em toneladas os números do INE conduzem a 5,2% dos modos terrestres para o tráfego nacional e 6,5% para o tráfego nacional e internacional

    

Isto é, também em Espanha o aumento da quota modal não se compadece com o exclusivo aproveitamento e melhoria da rede existente. Eletrificação do troço Badajoz-Puertollano ajuda, mas a ligação a Madrid deveria utilizar a ligação de AV e ponderar a ligação por Aranda de Duero.


Como reconhece o próprio MITMA (ministério espanhol de infraestruturas), a baixa quota modal do transporte de mercadorias em Espanha tem como causas a demografia e a desadequação da rede de bitola ibérica, com troços de via única sem cruzamentos para comboios de 740m, não eletrificados, não equipados com ERTMS, sem terminais intermodais eficientes, sem caraterísticas de atração dos operadores estrangeiros como a DB Cargo, cujo grupo integra a Transfesa, reconhece no seu site             ( ver https://network.dbcargo.com/network-en ) :  "With the expansion of the european standard gauge to Barcelona, it is no longer necessary to change axles at the spanish border. In this way, trains can travel directly to the mediterranean metropolis and easily reach the only spanish port facility in the standard gauge network"  o que implica, enquanto a bitola 1435mm não for prolongada até Valencia, a necessidade de transporte para "various spanish economic centers by means of reloading, axle relocation or truck on-carriage". Trata-se de uma postura bem diferente da que os sucessivos governos portugueses veem defendendo, apoiados na IP, no RFC4 e, como o seminário de 6 de junho mostrou, na opinião da grande maioria dos principais operadores e entidades ligadas à logística ferroviária e portuária.

 

Para sairmos desta situação e aumentar a quota modal da ferrovia, é essencial espanhois e portugueses desenvolverem, em sintonia com o regulamento TEN-T substituto do 1315, e de forma coordenada, o plano referido acima de aproximação da bitola 1435mm dos portos atlânticos, revendo simultaneamente o PFN para assumir o que está inscrito no próprio PFN: "A criação de ligações ferroviárias em bitola padrão (1435 mm) teria inegáveis vantagens no transporte de mercadorias internacional de longa distância, contribuindo para melhorar a competitividade das exportações portuguesas".

 Julga-se que isso só poderá ser feito com uma estrutura corretamente dimensionada em termos de recursos humanos para gestão do desenvolvimento de uma nova rede separada da gestão corrente da rede existente, sem prejuízo do recurso a concursos públicos internacionais para seleção de consultor com experiência internacional em projeto, manutenção e operação de redes de alta velocidade/mercadorias.




PS - ver em   https://fcsseratostenes.blogspot.com/2023/06/seminario-transportes-e-negocios-sobre.html         o relato do seminário ferroviário realizado pela T&N em junho de 2023, verificando-se, não só pelos atrasos da plano ferrovia 2020, especialmente das obras da linha da Beira Alta, que persistem as inconformidades


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[1] https://www.transportesenegocios.pt/o-mesmo-de-sempre-o-que-nao-muda-nunca/e
         e
      https://seminarios.transportesenegocios.com/ferroviario mercadorias 6jun2024

[2] A Medway e a Tramesa têm já prevista para 2024 a rota Valencia-Madrid e em 2025 Valencia-Puertollano-Badajoz-Entroncamento com vagões plataforma articulados de eixos intermutáveis https://www.transportesenegocios.pt/ae-ferroviaria-valencia-madrid-arranca-em-julho/