quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Juncker: "On a violé la dignité du peuple et particulièrement en Grèce...des erreurs ont été commises"

O presidente da comissão europeia já em 4 de fevereiro de 2015 tinha apelado aos 3 componentes da troika que revissem o seu funcionamento.
Mas a 18 de fevereiro foi mais claro: "Violaram a dignidade dos povos grego, português e irlandês" e foi muito crítico para o seu antecessor.
Parece uma auto-crítica porque ele era o presidente do Eurogrupo, agora presidido pelo senhor contabilista rígido Hieron Daisselblum (escrita conforme se pronuncia)

Silogismo:
                    a troika violou a dignidade do povo
                    o primeiro ministro português foi além da troika
                    logo,
                    o primeiro ministro português violou a dignidade do povo mais do que a troika

Também se pode comparar a rigidez dos ministros das finanças alemão e holandês (este o senhor Daisselblum) com a obstinação do agiota de "o mercador de Veneza" de Shakespeare.
António, mercador de Veneza, perdera o investimento que fizera nos navios que não chegaram e, pior que isso, não tinha como pagar o empréstimo senão, conforme o contrato que fizera com Shylock, sem medir as consequencias, deixando que este lhe cortasse uma libra de carne em caso de incumprimento.
António foi salvo pela advogada Porcia que invocou um artigo do código civil, por acaso ainda em vigor, que declara nulo o contrato cujas cláusulas resolutivas são indetermináveis.
Ora, salvo melhor opinião, neste caso jurídica, o memorando com a troika impôs cortes na dignidade e na integridade sanitária do povo.
Só que estas, tal como o valor dos juros a pagar, são indetermináveis.
Juridicamente, haveria justificação para dizer: "Não pagamos".
Mas como diz João Taborda Gama no DN de hoje, quem diz não pagamos são por exemplo a GALP e os grandes grupos (nunca mais se falou na taxa Tobin, a aplicar às transações da bolsa; não confundir com mais valias). Ou, como dizia a viúva Helmsley e João Cesar das Neves, os ricos não pagam impostos.
Na verdade, tanto o Syriza grego como os partidos da oposição portuguesa não dizem não pagamos, dizem que querem renegociar, corrigir normas do tratado de Lisboa definidas sem experiencia real e antes da crise de 2008.
Já está demonstrado que  essas normas estão erradas. Que pena ver os contabilistas engravatados que orbitam os ministros das finanças alemão e holandês a insistir nos dogmas de Haieck e Friedman desajustados às condições atuais...

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Excertos de "o capital no século XXI" de Thomas Piketty

Sinceramente, esperava da parte da direita um ataque mais fundamentado às teses de Thomas Piketty. Depois de umas tímidas críticas em que não se apresentaram argumentos ou dados concretos contra os gráficos de Thomas Piketty, apenas posições ideológicas, nada encontro.
Talvez porque seria muito trabalhoso rebatê-lo. Além de que são quase 900 páginas.
Ingenuidade a do autor, que escreveu o livro para demonstrar aos eleitores que as desigualdades crescem porque o rendimento do capital cresce mais do que a economia, e que se lerem o livro já sabem como devem votar se quiserem diminuir as desigualdades. Que escreveu o livro para os eleitores, porque dos políticos já não esperava nada ( impressionante a rigidez e a insensibilidade dos financeiros que dirigem as finanças da união europeia a ignorarem as causas das desigualdades, enquanto se recusam nas negociações com a Grécia a explicitar que flexibilidade podem ter).

1 - A força da divergencia fundamental (pág.47) :  r > g
sendo
    r   a taxa de rentabilidade do capital, isto é, a percentagem do seu valor que o capital gera em média num ano sob a forma de lucros, dividendos, juros, rendas, royalties, mais valias e outros rendimentos
    g  a taxa de crescimento anual da produção (PIB)
Analisadas as séries de dados, a conclusão é a de que, sempre que  r > g, existem forças de divergencia  que aumentam as desigualdades de rendimentos.
Por exemplo, os 10% norte-americanos mais ricos detinham 35% do rendimento nacional (PIB) nos anos 50 do século XX e cerca de 50%, a crescer, em 2010.



2 - Primeira lei fundamental do capitalismo (pág.87) : α  =  r x β  
sendo
    α   a parte em percentagem do capital no rendimento nacional  (PIB)
   β   a relação entre o capital existente e o rendimento 
Por exemplo, se  r = 5%  e  β = 600%  ,  então  α = 0,05 x 600% = 30% 
Isto é, se o património nacional equivale a 6 anos de PIB e se a taxa de rentabilidade do capital for 5% ao ano, então a parte do capital no rendimento nacional é de 30% (valor típico nos países ricos, sendo superior em Portugal, indiciando acumulação de capital apesar dos constantes protestos de descapitalização, subavaliação do PIB ou um PIB muito reduzido).

3 - Segunda lei fundamental do capitalismo (pág.250) :  β = s / g
sendo
    s    a taxa de poupança
Por exemplo, se   s = 12%   e   g = 2% , então  β = 12% / 0,02 = 600%
Isto é, se um país poupar todos os anos 12% do seu rendimento nacional e se a taxa de crescimento do PIB for de 2%, então o capital acumulado tenderá para um valor equivalente a seis anos de rendimento nacional. Um crescimento fraco conduz a uma acumulação de capital ou  ao aumento do seu peso no rendimento (poupanças elevadas não investidas conduzem a um defice orçamental).



4 - A desigualdade total dos rendimentos (trabalho e capital) no tempo e no espaço (pág.371)
Nas sociedades em que a desigualdade total dos rendimentos do trabalho e do capital é fraca, os 10% mais ricos detêm cerca de 20% do rendimento total e os 50% mais pobres cerca de 30% (coeficiente de Gini = 0,26). Nos países de desigualdade forte, os 10% mais ricos detêm 50% do rendimento e os 50% mais pobres 20% (coeficiente de Gini = 0,36 , valor semelhante ao de Portugal).
Esta é a informação que se pensa ser importante fornecer aos eleitores antes das eleições, na esperança de que não contribuam para o aumento das desigualdades.

















terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

As rosas de S.Valentim

- E este ano, donde vieram as rosas? - perguntei ao florista ambulante da avenida da Igreja a quem compro flores, de vez em quando.
- Do Equador, quer levar as de cor de salmão?
- Sim, se não tem vermelhas
- Mas veja como são bonitas, com as pétalas bem encaixadas umas nas outras.
- Já não cultivam as rosas, no Montijo? Têm lá estufas.
- Nesta altura do ano não. Tinham de aquecer as estufas para as rosas crescerem e a conta do gás seria incomportável. É mais barato mandar vir do Equador.
- Do Equador, como os camarões cozidos, de aquacultura, vendidos na grande superfície comercial.
Abro o jornal enquanto o florista faz o ramo de rosas. Elegantemente vestida, contrariamente ao habitual na propaganda das visitas, em que já apareceu de fato de trabalho a separa tomates ou a sacholar, a senhora ministra da Agricultura debruça-se numa gravura da página da política nacional sobre um golden retriever, numa visita a uma fábrica de rações. Pede o principal acionista que lhe baixem o IVA.
Também penso que sim. Não se poderão criar barreiras alfandegárias às rosas do Equador, mas podia baixar-se o IVA nas transações das matérias primas e dos fornecimentos e serviços externos da fábrica de rações, apesar de algum fundamentalista fanático da burocracia eurocrática poder protestar.
E também se podia baixar o IVA dos fornecimentos e serviços externos das empresas de aquacultura que já vamos tendo em Portugal, para não precisarmos de importar camarões cozidos do Equador (eu sei que o Equador precisa e merece exportar, mas não somos um país rico nem de balanças de pagamentos de bens e de alimentos equilibradas).
E ainda sugeria à senhora ministra um plano de aquecimento das estufas por energia térmica solar, ou por pilhas de combustível alimentadas por hidrogénio produzido por eletrólise a partir de geradores eólicos.
E como estão os planos de defesa da floresta de sobreiros e de pinheiros contra as doenças? E a proteção das abelhas contra a vespa asiática? e o combate aos escaravelhos das palmeiras?
Ou estamos simplesmente na armadilha da pobreza em que nem os fundos comunitários nos salvam, esperando calmamente o governo que os "empreendedores" concorram em candidaturas cheias de "competitividade"?

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

O medo

Acontece por vezes, a um idoso como quem escreve estas linhas.
Dobra-se uma esquina e voltamos atrás 30 anos.
É que já não via o meu amigo e colega de curso há 30 anos.
Está quase na mesma, com mais algumas rugas , claro, mas inconfundível com a sua voz apaixonada. Não o reconheci imediatamente, graças ao boné para proteger do frio a calva que já tinha e os óculos.
Revoltado com a situação e com a nossa geração.
Longe estão os tempos em que nos encontravamos ao almoço, ele vindo do edifício dos CTT, nas esquina da Conde de Redondo com  Luciano Cordeiro, eu vindo da subestação do Metro na Sidónio Pais.
Discutiamos a fibra ótica e a passagem das centrais eletromecânicas para as de comutação espacial (ainda não havia centrais de comutação temporal, ao tempo que isto foi...).
E agora discutimos a desgraça, a destruição das empresas estratégicas de interesse público.
Foi quando eu lhe disse que tinha escrito um livro, umas crónicas de 36 anos de vida profissional no metropolitano, e que um amigo e colega do Porto o tinha classificado como muito "farpeado", de que as pessoas com influencia podem não gostar e limitar a divulgação. Ou coisa pior ainda.
Foi o que o meu amigo de há 30 anos respondeu.
Que tinha também começado a escrever as suas crónicas dos CTT e depois da PT, mas que tinha desistido. Por medo. Assim dito, por medo, de ser processado por difamação.
Pois, medo. De facto, ninguém está livre de ser processado. Mas como pode escrever-se sobre
a vida profissional em empresas estratégicas de serviço público, sem deixar o testemunho de que os decisores abusaram do seu poder, impediram a gestão participativa e à vista do público, subordinaram as suas decisões ao interesse privado em detrimento do interesse das populações (será isto subjetivo? não está patente?)
E não sendo possível, é isso difamar?
Aguardemos as crónicas de umas telecomunicações.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Acidente no Metro-North de Nova York em 3 de fevereiro de 2015

Colisão do suburbano da linha de Harlem do Metro-North de Nova York, perto da cidade de Valhalla em 3 de fevereiro de 2015, numa passagem de nível, com um jipe SUV, seguida de incendio com 6 mortos.
Condições ambientais desfavoráveis com neve; tráfego de travessia da passagem de nível superior ao normal devido a um desvio por acidente rodoviário noutra estrada.
Não é possível fazer uma exploração segura de uma linha suburbana com passagens de nível, por mais eficazes que sejam os automatismos de proteção.
Não é fisicamente possivel.
Logo, a sua existencia revela desprezo pela vida dos 45.000 passageiros diários da linha de Harlem e dos utilizadores das estradas que a atravessam.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Poema dos bons governantes e dos bons gestores, datado dos dias de hoje

Tome-se uma empresa
com capacidade produtiva.
Se for pública,
exija-se a submissão,
ao ministério das Finanças,
do pedido de autorização de aquisições 
de matérias primas,
ou ao tribunal de contas,
sem o que 
o produto da empresa 
não poderá ser concluido 
e,
portanto, 
vendido;
deixe-se a burocracia atrasar o despacho do pedido;
ou desencante-se
uma cláusula do caderno de encargos
de um qualquer contrato,
se possível desvantajoso para a empresa,
ou das diretivas europeias que justifiquem,
aos olhos dos ignorantes,
especialmente se ministros,
dirigentes políticos de partidos da governação,
ou seus serventuários da comunicação social,
que o negócio não possa fazer-se.
Se for privada,
arranje-se uma boa ligação a uma entidade financeira,
de preferência com um quociente core tier
(é assim que eles dizem)
que possa rebentar de um dia para o outro,
sem que ninguém o preveja,
que o core tier era tão bom...
por esgotamento dos créditos.
Então,
num caso ou noutro,
ponha-se à venda,
ponha-se à venda,
a empresa,
é o melhor para todos.
Tomem-se as devidas precauções
para os procedimentos de venda.
Se for pública,
que se invoquem as excecionalidades do código da contratação pública
(não esquecer de consultar os habituais gabinetes de consultores,
sim, esses, que diligentemente se entregam à coisa pública,
no Parlamento)
Que sejam transparentes
as candidaturas das empresas interessadas
e os leilões mais rápidos do que os concursos públicos.
Se for privada,
declare-se
a insolvência,
o risco sistémico,
o impacto negativo
sobre
o saldo orçamental,
o orçamento dos contribuintes,
declare-se
o que é virtuoso,
o que é repelente,
intervenha-se,
intervenha-se.
Então,
já pode arranjar-se quem não tenha
a mais pequena intenção
de comprar a empresa à venda,
mas que apresente o preço mais alto,
sem se esquecer de,
para satisfazer as cláusulas do caderno de encargos,
garantir que as cumpre,
preto no branco,
que isso dá muito boa impressão
junto da opinião pública,
e os governantes conseguem assim apagar a impressão
de que degradaram propositadamente,
o valor da empresa.
Mas depois,
afinal,
não cumpre o primeiro classificado.
É então,
que todos vemos,
luminosa como o tungsténio,
incandescente na atmosfera
de vácuo,
a proposta ganhadora,
a do segundo classificado.
Sim, essa,
deste ou daquela,
que atabalhoadamente
competiam
com a empresa à venda,
a invejavam,
ou, até,
a geriam sem conseguir
a maioria das ações,
como agora conseguem.
Depois se vê,
se se fecha, 
ou se se aumenta 
o volume de negócios.
De momento, 
serve-se
em travessa comprida,
guarnecida
com cartas de despedimento.




segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Exemplo de cortes na educação





Há 3 anos atrás, brincavam 20 crianças no recreio desta escola, numa pequena povoação do litoral sul do país.
Hoje desponta uma urbanização de algumas moradias de férias.
As crianças têm de se deslocar para uma escola a mais de 2 km de distancia.
Com a existencia da internet não se justifica o benefício das crianças estarem numa escola centralizada melhor e com mais convivencia.
As vantagens económicas para a gestão pública devem ser encaradas considerando que as despesas com a educação são cerca de 7% do PIB, pelo que uma economia setorial de 10% corresponde a uma economia global de 0,7%.
Para respeitar a verdade das coisas, terá de dizer-se que neste caso houve uma transferencia de património, de ativos, da esfera pública para a esfera privada.
Isto é, houve (está a haver) uma apropriação por uns poucos de um bem público, mediante uma remuneração inferior ao valor do ativo (considerando os benefícios para as crianças de proximidade do local de habitação).
Coisa que tem um nome horrível e que não ilustra as elites que o decidiram.

Mortalidade em janeiro de 2015


Apresentei neste blogue, em março de 2012, uma análise sobre o excesso de mortalidade relativamente aos valores médios:

http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=insa

Três anos depois, a situação não parece ter melhorado.
A ocorrência do pico da gripe e de temperaturas baixas, a redução da capacidade de resposta das unidades de saúde e das urgencias hospitalares e a redução do poder de compra da população conduziram a um pico de mortalidade (valor espetável 2500 mortes/semana, valor observado 3100)
A comunicação social tem registado depoimentos de profissionais da saúde que confirmam a redução de recursos nos hospitais e as dificuldades burocráticas para a admissão de médicos para fazer face ao aumento de procura no inverno.
Como qualquer técnico sabe, um sistema dimensiona-se para os seus picos e não para os valores médios em períodos normais.
Considerando que as despesas de saúde são cerca de 10% das despesas públicas totais, uma economia setorial de 10% representa uma economia total de 1%, pelo que é chocante o efeito negativo que tão pequena economia provoca.

Observando o registo histórico, verificaram-se picos de mortalidade semanal em janeiro de 2009, março de 2012, julho de 2013 (excesso de calor, evidencia de insuficiencia de isolamento térmico nas casas e inexistencia de programas de reabilitação habitacional elegíveis pelo QREN) e janeiro de 2015.
A existencia destes picos deveria levar  o governo a estabelecer programas a financiar pelos fundos comunitários para atenuação das causas, que vão desde a deficiente cobertura da população por médicos de família, pela falta de hospitais principais mais perto da população, pela falta de poder de compra desta para resistir ao frio e ao calor, e pela falta de isolamento térmico das habitações.
Mas não, o governo insiste na sua versão de que os cortes não têm alternativa e desculpa-se com a mentira de que tem havido maior procura por causa da gripe.
Torna-se assim cúmplice e ator principal na agressão à população e na violação dos direitos humanos relativos á saúde e dignidade da vida humana.



PS em 2 de fevereiro de 2015 - Penso que deve ainda ficar registada a desculpa do tribunal de contas para o atraso nos vistos que permitiriam contratar mais médicos ou outros recursos para melhorar a resposta ás urgencias. É intolerável (utilizo o termo da norma 50126 para designar a não aceitação de um risco, considerado como a associação da probabilidade de ocorrencia de um acidente e da gravidade das suas consequencias) a burocracia que obriga a vistos (a entidade depende assim do ministério das finanças ou do tribunal de contas que não tem conhecimento direto
das atividades, e não da entidade especializada). Nenhuma unidade produtiva pode funcionar assim. O tribunal de contas constitui-se em obstáculo (embora sirva os objetivos do governo, que são o de redução de despesas e criação de oportunidades à iniciativa privada).