O Verão irlandês
Discorrendo por aí, dou com um folheto turístico irlandês, perdido nos papeis do meu colega que calculou os diagramas de marcha para uma nova linha do metropolitano de Dublin.
Não vou repetir o lugar comum de que a Irlanda preferiu investir na educação e no desenvolvimento da industria com mão de obra altamente qualificada, em detrimento das suas infra-estruturas (tem poucas auto-estradas, não tem caminho de ferro de alta velocidade, Dublin não tem metropolitano que se veja).
Não vou porque a Irlanda, para além de ter tido uma quebra acentuada nos principais indicadores das suas estatísticas, está agora a desenvolver um programa intensivo para as suas infra-estruturas.
Além de que também em Portugal temos empresas de mão de obra altamente qualificada como a empresa do Prof.António Câmara (embora a fazer jogos e toques para telemóveis ou iPods) ou as nano tecnologias bio ou não - moleculares.
É bonito ver, em termos de planeamento integrado, que a Irlanda assume claramente que a região da capital tem de ser o motor do desenvolvimento de todo o país, e para isso precisa de infra-estruturas.
Mas o que me chamou a atenção e para o que vos peço também a vossa, se chegaram pacientemente até aqui, foram os termos do folheto: “Aproveite os maravilhosos dias de Verão na Irlanda, em Maio”.
Para nós Maio é o mês das flores, das giestas e da Primavera, mas as agências turísticas irlandesas querem lá os turistas e o Verão no primeiro dia de Maio.
A ser assim, o Verão irlandês será Maio-Junho-Julho. Agosto já é Outono, juntamente com Setembro e Outubro. E sim, o Inverno começa implacável em Novembro, quando a legião dos parentes mortos, ou de Todos os Santos, se abate sobre o mundo dos vivos na noite de Halloween.
E depois de, no último fim de semana de Outubro, Greenwich impor a sua vontade e repor a hora de Inverno, sincronizando-a com a hora TMG (é meio-dia quando o sol culmina por sobre o meridiano de Greenwich), para que as madrugadas de Inverno não sejam tão escuras (a hora atrasa, eliminando o convite da hora de Verão ao lazer de mais uma hora de luz solar ao fim do dia).
Novembro-Dezembro-Janeiro é o Inverno, para que a Primavera seja Fevereiro-Março-Abril.
De facto, os prunus florescem em Fevereiro (até antes, as nossas amendoeiras, em Janeiro, mas eu preferiria a variedade de florescer em Fevereiro, para proteger os frutos das geadas tardias).
Isto é, vejo consistência na proposta do Verão começar no dia dos trabalhadores.
A lei de Philips
E por falar em trabalhadores, graças aos aumentos da produtividade, serão os trabalhadores cada vez menos, até porque a lei de Philips convida ao desemprego.
Recordam-se? a lei de Philips traduz aquela correlação entre o aumento do desemprego e a diminuição do custo de vida (por outras palavras: a inflação combate-se aumentando o desemprego). Ou ainda, por outras palavras, os políticos que asseguram que vão combater o desemprego vão aumentar o custo de vida, o que é mau para todos, mas melhor para quem não tem emprego do que para quem tem emprego.
O que é óptimo para dividir de um lado os que têm emprego e vêem o seu poder de compra aumentar se houver níveis elevados de desemprego, e do outro quem não tem mas gostava de ter, só que não vai conseguir o poder de compra de quem já tem emprego.
Não há assim uma luta de classes no sentido simplista do termo, mas há um conflito de interesses.
Claro que não apenas um conflito de interesses, mas muitos conflitos, consoante o lugar ocupado por cada um na estrutura produtiva da comunidade e na sua estrutura social e cultural.
Donde, havendo muitos conflitos de interesse e diversas formas de estar nas estruturas (e ia a escrever super-estruturas, mas soaria a marxista), é natural que os eleitores estejam divididos.
E eleitores divididos é bom porque contribuem para que não haja maiorias absolutas que ignorem as preferências das minorias (temos de aprender alguma coisa com o fracasso da organização soviética, não acham? Um partido só a decidir o rumo da coisa pública não dá, pois não é verdade?).
A razão de Marx
Mas talvez eu esteja enganado e o número de trabalhadores não esteja a diminuir e então tenho de reflectir sobre isto.
Achei muita graça a um livrinho de dois senhores que se auto definem como dois académicos suecos que circula por aí : Funky Business, capitalism for ever.
“Funky” significa bem cheiroso, se bem que bem cheiroso aqui entronca na concepção antropológica dos cheiros de atracção sexual, digamos de maneira mais fina, cheiro a feromonas, e será aqui aplicado no sentido de inovador, balanceado e provocador como a musica “funk” (mistura de jazz, soul e blues ritmados), divertido, de olhos bem abertos para a realidade para progredir (não quero aborrecer ninguém, mas este é um dos princípios básicos de qualquer disciplina científica, adoptado também por Karl Marx na economia: observar a realidade, pôr hipóteses , testar a teoria, aplicar a teoria para melhorar o mundo ou dar felicidade às pessoas).
Perguntar-se-á, como na anedota do marido quando a mulher lhe disse que tinha ido ao salão de beleza; então porque não dão felicidade às pessoas?
E é aqui que entra o tal livrinho “Funky business”.
Dá, afinal dá; a teoria dá felicidade às pessoas. Porque foi a teoria da informação mais o teorema de Shannon da amostragem ,mais a teoria quântica da física electrónica que permitiram os toques de telemóvel e os televisores de LCD e de plasma que alegram o pessoal.
A tecnologia pode dar felicidade às pessoas. Gandhi também dizia isso, se bem que referindo-se à roca de fiar. Mas o investimento em software da nova Índia está de acordo com o pensamento de Gandhi.
Assim como a explosão tecnológica actual está de acordo com o pensamento de Marx.
Porquê?, porque Marx, tal como todos os seguidores do método científico, considerou o desenvolvimento tecnológico indissociável do desenvolvimento do processo histórico.
Apenas foi ingénuo, quando quis que os benefícios do progresso tecnológico permitissem uma vida mais feliz para as pessoas.
E na realidade permitiu, permitiu subir o nível de vida.
Apesar do triunfo das ideias neo-liberais, dos leitores precipitados de Adam Smith, terem cavado e alargado o fosso entre ricos e pobres (não vale a pena citar estatísticas, mil milhões de seres humanos a passar fome é o melhor atestado de incompetência dos economistas e políticos que nos conduziram ao ponto onde estamos, apesar das potencialidades da tecnologia e de já não haver a desculpa do bloco comunista para justificar a fome).
A acumulação de fortunas para além de um certo limite é um mau sinal do funcionamento da economia.
As listas das fortunas da Forbes e da Fortune, por mais felicidade que tragam aos seus leitores (não posso comprar o BMW de 550 CV, mas se a revista de automóveis não publicar um artigo circunstanciado sobre ele, deixo de comprar a revista), são um indicador da falência dos circuitos distributivo e dinamizador da economia. Se a fortuna se acumulou aqui, neste ponto, foi porque foi incapaz de gerar moeda a circular (possivelmente porque, de forma deliberada, a retiveram, em vez de a deixarem ir à sua vida). Se fossem o resultado das análises de um paciente num laboratório, seriam indicadores de que o sistema digestivo estava com prisão de ventre, em estado, diriam os médicos pré-Pasteur, hidrópico, a inchar o estômago e a deslassar os músculos do peritoneu.
Ingenuamente, podemos sugerir aos acumuladores que cortem ligeiramente nas suas margens de lucro, que façam isso porque os seus negócios ficarão pela certa mais competitivos.
E contudo, como dizem os dois académicos suecos citados, alguém, para produzir a riqueza acumulada, teve de trabalhar, i.é, sujeitar-se a actividades penosas, conscientes e úteis (definição do sociólogo Gurvitch).
Mesmo que esse alguém incluísse o principal accionista, ou que essas actividades fossem ilegais, como transportar armas clandestinamente, ou droga, ou diamantes (sendo um negócio de morte, o negócio das armas alimenta muitos outros seres humanos).
E embora os níveis de remuneração de toda a cadeia necessária para haver acumulação de fortunas sejam desiguais, e de uma forma gritantemente desigual, o facto é que muitos dos intervenientes nessas cadeias foram senhores do seu trabalho, não foram servos da gleba. E se o senhor russo quer ser dono duma grande equipa de futebol, os seus adeptos optam livremente por o financiar (ao dono).
Dominaram os seus processos de trabalho (quanto mais não seja convencendo a direcção de uma fábrica de que ao sábado, de momento, não pode ser; ou então fazendo o que era preciso, criar uma frase publicitária para ajudar à imagem do produto e da empresa, e depois calar-se até à próxima frase-sucesso).
É, os académicos suecos são capazes de ter razão quando explicam (logo ao princípio do livro, acrescentando que não deixem de comprar o livro por causa disso, se estiverem a apreciar as primeiras páginas, na dúvida compro, não compro) que, afinal Karl Marx tinha razão, porque muitos dos trabalhadores da actualidade (cujo conceito não coincide com o da classe operária; lembram-se de Lenine a escrever um opúsculo: A classe operária irá desaparecer? e por isso não dão o seu voto aos partidos chamados comunistas ou ex-comunistas) dominam os seus meios de produção, de uma forma ou outra.
Cinjamo-nos, para definir “trabalhador”, à relação biunívoca : trabalhador<>mais valia gerada (já imaginaram aonde pode levar este raciocínio: a opção em bolsa pelo desejo de comprar uma acção de uma empresa valorizou-a, a empresa ganhou uma encomenda por causa disso e então o pequeno investidor gerou mais valia? Isso é capitalismo popular ou é, como os suecos dizem, Marx a funcionar?).
E se generalizarmos a boutade de Lenine (bem, ele não disse bem o que eu vou dizer agora, mas estou a citar de cor e a ver se ajeito os factos à teoria, para ver depois se a teoria ficou bem sem deformar muito os factos) subimos do nível da produção de mais valias (direito ao emprego, direito ao trabalho, consignado no art.23º da Declaração Universal dos Direitos do Homem) aos níveis do lazer e da cultura (artos 24º e 27º da mesmissima Declaração) quando definirmos que a primeira tarefa depois dos trabalhadores subirem ao poder é absorver a cultura burguesa. I.é, o requinte de bem viver.
Pena que Malthus ainda esteja bem vivo, e que Adam Smith, com o seu interesse individual tão mal compreendido (não vou cansar-me de repetir que a mão invisível de que falava Adam Smith não era a mão invisível que remunera os audaciosos, era a mão invisível que castigava Macbeth e a sua mulher demasiado audaciosa, que certamente teriam aplicações tóxicas do Lehman Bros e dos “off-shores” se já houvesse Lehman Bros no tempo deles, porque “off-shores” sempre os houve, salvo melhor opinião) não deixe repartir fraternalmente o pouco que há para tantos.
Daí dependermos do avanço da tecnologia para fazer um bolo com fatias suficientes para todos, com a ameaça de a maioria do pessoal não querer estudar as maravilhas da tecnologia nem reduzir o consumo dos combustíveis fósseis... Não têm paciência, e agora com o IC16 e o IC30 inaugurados...
Admirável mundo novo.
Fascinante, como dizia o senhor Spock do Star trek.
A idiossincracia dos portugueses
Tudo isto a propósito de uma data para começar o Verão.
Afinal, talvez valha mais concordar que o Verão começa mesmo em Maio e que Agosto é mês para voltar ao trabalho, em lugar de debandar da cidade.
Apesar do calor.
Já repararam que, quanto mais importante é o cargo que um português exerce, ou que pensa que é, mais tarde em Agosto ele marca as suas férias, mas tem de ser em Agosto, porque a importância mede-se pelo grau de insubstituibilidade (a intensidade deste barbarismo é proporcional ao grau de auto-estima) do cidadão, pela vontade de adiar o mais possivel a separação do local de trabalho (vêem, por mais importante que a pessoa seja, tem um local de trabalho, logo é trabalhador, como dizia Marx, e o partido em que vota é marxista, quod eramus demonstrandum).
A menos que seja um grande proprietário de terras acima do centro do País. E aí pode ser Setembro por causa das vindimas.
Mas Portugal está a sincronizar-se com a Europa e as vindimas são cada vez mais cedo. (Ou será o aquecimento global? Ou a escolha das castas? Ou o recurso a estufas?).
E as azeitonas portuguesas não querem ficar atrás e já pedem o varejo em Novembro.
Insistamos no vinho e no azeite. Não liguem ao desabafo infeliz do presidente do instituto do apoio à exportação (“Portugal não pode continuar a ser o país do bacalhau e do azeite”). Portugal não deverá nunca deixar de ser um país de vinho e de azeite (Drucker dixit, lembram-se, chamando-lhes clusters ou grupos tradicionais).
Aproveitem a azeitona para tudo, até para lubrificante e óleo de iluminação; não a deixem estragar-se ingloriamente.
Talvez a questão seja simples e não passe de mais uma influência determinista do clima na idiossincracia de um povo. Gostamos que seja Verão para o tarde, e que ele se prolongue por Setembro.
Somos periféricos e por isso gostamos de fazer as coisas de maneira diferente.
Infelizmente vamos ter de nos adaptar a trabalhar com o calor, em Agosto e Setembro também.
Saudemos a chegada do Verão no dia dos trabalhadores.
Aproveitemos as férias em Maio, Junho ou Julho.
Como disse, é um direito, consignado na Declaração dos Direitos do Homem, artigo 24º.
Acham muito radical, o primeiro de Maio?
Pronto, adiemos por um mês, podem ir de férias a 1 de Junho, dia de início do Verão (e da época balnear…), e mais próximo do dia do solstício, quando a noite é mais curta.
Mas então o Verão acaba a 31 de Agosto, quando a transumância regressa, auto-estrada acima, do Algarve para o Norte, e se desmontam as discotecas de praia.
Eu sabia que íamos chegar a um acordo.
Discorrendo por aí, dou com um folheto turístico irlandês, perdido nos papeis do meu colega que calculou os diagramas de marcha para uma nova linha do metropolitano de Dublin.
Não vou repetir o lugar comum de que a Irlanda preferiu investir na educação e no desenvolvimento da industria com mão de obra altamente qualificada, em detrimento das suas infra-estruturas (tem poucas auto-estradas, não tem caminho de ferro de alta velocidade, Dublin não tem metropolitano que se veja).
Não vou porque a Irlanda, para além de ter tido uma quebra acentuada nos principais indicadores das suas estatísticas, está agora a desenvolver um programa intensivo para as suas infra-estruturas.
Além de que também em Portugal temos empresas de mão de obra altamente qualificada como a empresa do Prof.António Câmara (embora a fazer jogos e toques para telemóveis ou iPods) ou as nano tecnologias bio ou não - moleculares.
É bonito ver, em termos de planeamento integrado, que a Irlanda assume claramente que a região da capital tem de ser o motor do desenvolvimento de todo o país, e para isso precisa de infra-estruturas.
Mas o que me chamou a atenção e para o que vos peço também a vossa, se chegaram pacientemente até aqui, foram os termos do folheto: “Aproveite os maravilhosos dias de Verão na Irlanda, em Maio”.
Para nós Maio é o mês das flores, das giestas e da Primavera, mas as agências turísticas irlandesas querem lá os turistas e o Verão no primeiro dia de Maio.
A ser assim, o Verão irlandês será Maio-Junho-Julho. Agosto já é Outono, juntamente com Setembro e Outubro. E sim, o Inverno começa implacável em Novembro, quando a legião dos parentes mortos, ou de Todos os Santos, se abate sobre o mundo dos vivos na noite de Halloween.
E depois de, no último fim de semana de Outubro, Greenwich impor a sua vontade e repor a hora de Inverno, sincronizando-a com a hora TMG (é meio-dia quando o sol culmina por sobre o meridiano de Greenwich), para que as madrugadas de Inverno não sejam tão escuras (a hora atrasa, eliminando o convite da hora de Verão ao lazer de mais uma hora de luz solar ao fim do dia).
Novembro-Dezembro-Janeiro é o Inverno, para que a Primavera seja Fevereiro-Março-Abril.
De facto, os prunus florescem em Fevereiro (até antes, as nossas amendoeiras, em Janeiro, mas eu preferiria a variedade de florescer em Fevereiro, para proteger os frutos das geadas tardias).
Isto é, vejo consistência na proposta do Verão começar no dia dos trabalhadores.
A lei de Philips
E por falar em trabalhadores, graças aos aumentos da produtividade, serão os trabalhadores cada vez menos, até porque a lei de Philips convida ao desemprego.
Recordam-se? a lei de Philips traduz aquela correlação entre o aumento do desemprego e a diminuição do custo de vida (por outras palavras: a inflação combate-se aumentando o desemprego). Ou ainda, por outras palavras, os políticos que asseguram que vão combater o desemprego vão aumentar o custo de vida, o que é mau para todos, mas melhor para quem não tem emprego do que para quem tem emprego.
O que é óptimo para dividir de um lado os que têm emprego e vêem o seu poder de compra aumentar se houver níveis elevados de desemprego, e do outro quem não tem mas gostava de ter, só que não vai conseguir o poder de compra de quem já tem emprego.
Não há assim uma luta de classes no sentido simplista do termo, mas há um conflito de interesses.
Claro que não apenas um conflito de interesses, mas muitos conflitos, consoante o lugar ocupado por cada um na estrutura produtiva da comunidade e na sua estrutura social e cultural.
Donde, havendo muitos conflitos de interesse e diversas formas de estar nas estruturas (e ia a escrever super-estruturas, mas soaria a marxista), é natural que os eleitores estejam divididos.
E eleitores divididos é bom porque contribuem para que não haja maiorias absolutas que ignorem as preferências das minorias (temos de aprender alguma coisa com o fracasso da organização soviética, não acham? Um partido só a decidir o rumo da coisa pública não dá, pois não é verdade?).
A razão de Marx
Mas talvez eu esteja enganado e o número de trabalhadores não esteja a diminuir e então tenho de reflectir sobre isto.
Achei muita graça a um livrinho de dois senhores que se auto definem como dois académicos suecos que circula por aí : Funky Business, capitalism for ever.
“Funky” significa bem cheiroso, se bem que bem cheiroso aqui entronca na concepção antropológica dos cheiros de atracção sexual, digamos de maneira mais fina, cheiro a feromonas, e será aqui aplicado no sentido de inovador, balanceado e provocador como a musica “funk” (mistura de jazz, soul e blues ritmados), divertido, de olhos bem abertos para a realidade para progredir (não quero aborrecer ninguém, mas este é um dos princípios básicos de qualquer disciplina científica, adoptado também por Karl Marx na economia: observar a realidade, pôr hipóteses , testar a teoria, aplicar a teoria para melhorar o mundo ou dar felicidade às pessoas).
Perguntar-se-á, como na anedota do marido quando a mulher lhe disse que tinha ido ao salão de beleza; então porque não dão felicidade às pessoas?
E é aqui que entra o tal livrinho “Funky business”.
Dá, afinal dá; a teoria dá felicidade às pessoas. Porque foi a teoria da informação mais o teorema de Shannon da amostragem ,mais a teoria quântica da física electrónica que permitiram os toques de telemóvel e os televisores de LCD e de plasma que alegram o pessoal.
A tecnologia pode dar felicidade às pessoas. Gandhi também dizia isso, se bem que referindo-se à roca de fiar. Mas o investimento em software da nova Índia está de acordo com o pensamento de Gandhi.
Assim como a explosão tecnológica actual está de acordo com o pensamento de Marx.
Porquê?, porque Marx, tal como todos os seguidores do método científico, considerou o desenvolvimento tecnológico indissociável do desenvolvimento do processo histórico.
Apenas foi ingénuo, quando quis que os benefícios do progresso tecnológico permitissem uma vida mais feliz para as pessoas.
E na realidade permitiu, permitiu subir o nível de vida.
Apesar do triunfo das ideias neo-liberais, dos leitores precipitados de Adam Smith, terem cavado e alargado o fosso entre ricos e pobres (não vale a pena citar estatísticas, mil milhões de seres humanos a passar fome é o melhor atestado de incompetência dos economistas e políticos que nos conduziram ao ponto onde estamos, apesar das potencialidades da tecnologia e de já não haver a desculpa do bloco comunista para justificar a fome).
A acumulação de fortunas para além de um certo limite é um mau sinal do funcionamento da economia.
As listas das fortunas da Forbes e da Fortune, por mais felicidade que tragam aos seus leitores (não posso comprar o BMW de 550 CV, mas se a revista de automóveis não publicar um artigo circunstanciado sobre ele, deixo de comprar a revista), são um indicador da falência dos circuitos distributivo e dinamizador da economia. Se a fortuna se acumulou aqui, neste ponto, foi porque foi incapaz de gerar moeda a circular (possivelmente porque, de forma deliberada, a retiveram, em vez de a deixarem ir à sua vida). Se fossem o resultado das análises de um paciente num laboratório, seriam indicadores de que o sistema digestivo estava com prisão de ventre, em estado, diriam os médicos pré-Pasteur, hidrópico, a inchar o estômago e a deslassar os músculos do peritoneu.
Ingenuamente, podemos sugerir aos acumuladores que cortem ligeiramente nas suas margens de lucro, que façam isso porque os seus negócios ficarão pela certa mais competitivos.
E contudo, como dizem os dois académicos suecos citados, alguém, para produzir a riqueza acumulada, teve de trabalhar, i.é, sujeitar-se a actividades penosas, conscientes e úteis (definição do sociólogo Gurvitch).
Mesmo que esse alguém incluísse o principal accionista, ou que essas actividades fossem ilegais, como transportar armas clandestinamente, ou droga, ou diamantes (sendo um negócio de morte, o negócio das armas alimenta muitos outros seres humanos).
E embora os níveis de remuneração de toda a cadeia necessária para haver acumulação de fortunas sejam desiguais, e de uma forma gritantemente desigual, o facto é que muitos dos intervenientes nessas cadeias foram senhores do seu trabalho, não foram servos da gleba. E se o senhor russo quer ser dono duma grande equipa de futebol, os seus adeptos optam livremente por o financiar (ao dono).
Dominaram os seus processos de trabalho (quanto mais não seja convencendo a direcção de uma fábrica de que ao sábado, de momento, não pode ser; ou então fazendo o que era preciso, criar uma frase publicitária para ajudar à imagem do produto e da empresa, e depois calar-se até à próxima frase-sucesso).
É, os académicos suecos são capazes de ter razão quando explicam (logo ao princípio do livro, acrescentando que não deixem de comprar o livro por causa disso, se estiverem a apreciar as primeiras páginas, na dúvida compro, não compro) que, afinal Karl Marx tinha razão, porque muitos dos trabalhadores da actualidade (cujo conceito não coincide com o da classe operária; lembram-se de Lenine a escrever um opúsculo: A classe operária irá desaparecer? e por isso não dão o seu voto aos partidos chamados comunistas ou ex-comunistas) dominam os seus meios de produção, de uma forma ou outra.
Cinjamo-nos, para definir “trabalhador”, à relação biunívoca : trabalhador<>mais valia gerada (já imaginaram aonde pode levar este raciocínio: a opção em bolsa pelo desejo de comprar uma acção de uma empresa valorizou-a, a empresa ganhou uma encomenda por causa disso e então o pequeno investidor gerou mais valia? Isso é capitalismo popular ou é, como os suecos dizem, Marx a funcionar?).
E se generalizarmos a boutade de Lenine (bem, ele não disse bem o que eu vou dizer agora, mas estou a citar de cor e a ver se ajeito os factos à teoria, para ver depois se a teoria ficou bem sem deformar muito os factos) subimos do nível da produção de mais valias (direito ao emprego, direito ao trabalho, consignado no art.23º da Declaração Universal dos Direitos do Homem) aos níveis do lazer e da cultura (artos 24º e 27º da mesmissima Declaração) quando definirmos que a primeira tarefa depois dos trabalhadores subirem ao poder é absorver a cultura burguesa. I.é, o requinte de bem viver.
Pena que Malthus ainda esteja bem vivo, e que Adam Smith, com o seu interesse individual tão mal compreendido (não vou cansar-me de repetir que a mão invisível de que falava Adam Smith não era a mão invisível que remunera os audaciosos, era a mão invisível que castigava Macbeth e a sua mulher demasiado audaciosa, que certamente teriam aplicações tóxicas do Lehman Bros e dos “off-shores” se já houvesse Lehman Bros no tempo deles, porque “off-shores” sempre os houve, salvo melhor opinião) não deixe repartir fraternalmente o pouco que há para tantos.
Daí dependermos do avanço da tecnologia para fazer um bolo com fatias suficientes para todos, com a ameaça de a maioria do pessoal não querer estudar as maravilhas da tecnologia nem reduzir o consumo dos combustíveis fósseis... Não têm paciência, e agora com o IC16 e o IC30 inaugurados...
Admirável mundo novo.
Fascinante, como dizia o senhor Spock do Star trek.
A idiossincracia dos portugueses
Tudo isto a propósito de uma data para começar o Verão.
Afinal, talvez valha mais concordar que o Verão começa mesmo em Maio e que Agosto é mês para voltar ao trabalho, em lugar de debandar da cidade.
Apesar do calor.
Já repararam que, quanto mais importante é o cargo que um português exerce, ou que pensa que é, mais tarde em Agosto ele marca as suas férias, mas tem de ser em Agosto, porque a importância mede-se pelo grau de insubstituibilidade (a intensidade deste barbarismo é proporcional ao grau de auto-estima) do cidadão, pela vontade de adiar o mais possivel a separação do local de trabalho (vêem, por mais importante que a pessoa seja, tem um local de trabalho, logo é trabalhador, como dizia Marx, e o partido em que vota é marxista, quod eramus demonstrandum).
A menos que seja um grande proprietário de terras acima do centro do País. E aí pode ser Setembro por causa das vindimas.
Mas Portugal está a sincronizar-se com a Europa e as vindimas são cada vez mais cedo. (Ou será o aquecimento global? Ou a escolha das castas? Ou o recurso a estufas?).
E as azeitonas portuguesas não querem ficar atrás e já pedem o varejo em Novembro.
Insistamos no vinho e no azeite. Não liguem ao desabafo infeliz do presidente do instituto do apoio à exportação (“Portugal não pode continuar a ser o país do bacalhau e do azeite”). Portugal não deverá nunca deixar de ser um país de vinho e de azeite (Drucker dixit, lembram-se, chamando-lhes clusters ou grupos tradicionais).
Aproveitem a azeitona para tudo, até para lubrificante e óleo de iluminação; não a deixem estragar-se ingloriamente.
Talvez a questão seja simples e não passe de mais uma influência determinista do clima na idiossincracia de um povo. Gostamos que seja Verão para o tarde, e que ele se prolongue por Setembro.
Somos periféricos e por isso gostamos de fazer as coisas de maneira diferente.
Infelizmente vamos ter de nos adaptar a trabalhar com o calor, em Agosto e Setembro também.
Saudemos a chegada do Verão no dia dos trabalhadores.
Aproveitemos as férias em Maio, Junho ou Julho.
Como disse, é um direito, consignado na Declaração dos Direitos do Homem, artigo 24º.
Acham muito radical, o primeiro de Maio?
Pronto, adiemos por um mês, podem ir de férias a 1 de Junho, dia de início do Verão (e da época balnear…), e mais próximo do dia do solstício, quando a noite é mais curta.
Mas então o Verão acaba a 31 de Agosto, quando a transumância regressa, auto-estrada acima, do Algarve para o Norte, e se desmontam as discotecas de praia.
Eu sabia que íamos chegar a um acordo.
A curva de Philips
ResponderEliminarrevelava uma, aparente, evidência empírica sobre a correlação inversa entre as variações do desemprego e as variações dos salários. No entanto, esta lei foi fortemente criticada. Em vários momentos da história, nomeadamente anos 70 do séc. XX, a economia mundial assistiu a um aumento da inflação a par de um aumento do desemprego. Ou seja, revelou que a curva de Philips não era uma verdade absoluta a relação inversa entre salários, sublinhe-se nominais, e inflação. Era um dos períodos de estagflação. O que é curioso é que o maior dos críticos era nem mais nem menos que... Milton Friedman!!!
Pois foi...e veja no que deu ter dado ouvidos a Milton Friedman...deu no que deu. Também não devemos esquecer-nos que nos anos 70 houve aqueles choques petrolíferos. Andava toda a gente com medo do petróleo acabar e o preço da gasolina subia, subia, com a malta dos investimentos a cortar-se e o desemprego a aaumentar...
ResponderEliminarAfinal havia petróleo, mas a exploração do petróleo saudita que então estava na primeira década agora está a declinar. Cá esperamos o próximo choque, porque a nova GM já anda entusiasmadissima a projectar carros grandes.
Mas concorda que os governos de agora são um bocadinho hipócritas quando dizem que vão combater o desemprego e afinal não para conter os preços, não acha? Eu por mim, deviam combater o desemprego a sério, pagando o preço de aumento do custo de vida e das taxas.