resumo:
a campanha publicitária para redução da sinistralidade rodoviária seria provavelmente mais eficaz se apresentasse comportamentos corretos a imitar, em vez de apresentar imagens chocantes que "só acontecem aos outros"
a campanha publicitária para redução da sinistralidade rodoviária seria provavelmente mais eficaz se apresentasse comportamentos corretos a imitar, em vez de apresentar imagens chocantes que "só acontecem aos outros"
Passa um anuncio na TV promovido pela autoridade da
segurança rodoviária que choca pela crueza das imagens.
A ideia é mostrar as consequências de uma condução imprudente,
nomeadamente a não adaptação da velocidade ás condições ambientais, na
esperança de levar as pessoas a evitar os comportamentos de risco.
Pessoalmente, chocou-me o que me parece uma abordagem errada.
A reação da maioria das pessoas poderá ser a de que coisas
tão horrorosas só acontecem aos outros; comover-se-ão com a desgraça dos outros
e por razões de auto-estima e auto-confiança, manterão os seus comportamentos.
Isto é, se analiso bem, o anúncio é inútil.
Penso que uma publicidade televisiva com o objetivo de promover um
comportamento mais correto só poderá funcionar pela positiva, apresentando
exemplos desse comportamento e esperando que por imitação ele seja seguido.
Recordo um exemplo da televisão espanhola focando a condução em
autoestrada á aproximação da zona de portagens. Ao ver o sinal de portagem
próxima, vê-se o condutor a levantar o pé do acelerador e a aconchegar o pedal
de travão.
Por cá, o que me acontece é, à aproximação do canal da via verde,
normalmente colocado à esquerda, ao reduzir a velocidade de acordo com a
sinalização lateral, ser ultrapassado por um condutor sem via verde que depois
se atravessa á minha frente para passar pelo canal normal.
Recordo ainda uma campanha que passou na televisão portuguesa, em
que se via a paragem do automobilista para deixar passar os peões na
passadeira. O aspeto cortês do anuncio induzia a reprodução desse comportamento
na vida real.
Reapresento o post de abril de 2013 neste blogue sobre a
sinistralidade rodoviária:
Retomo os números da operação da GNR no período de 23 a 28,
inclusivé, de dezembro de 2014, em comparação com 2013 em igual período:
nº
de mortos nºde feridos nºde acidentes nºestimado de
graves mortos a 30
dias
2013
5
20
1308
7
2014 14
18
935
19
As hipóteses que podem colocar-se não serão conclusivas porque não
se fazem inquéritos exaustivos aos acidentes (ou pelo menos não são divulgados
os resultados, com a análise das causas e circunstancias dos acidentes e com
recomendações para reduzir a probabilidade da sua ocorrencia), mas talvez
possa dizer-se que a redução do preço dos combustíveis estimulou o
tráfego, que embora tenha havido menos acidentes o número de mortos mais
elevado poderá estar ligado á velocidade excessiva, e que velocidade excessiva
existe sempre que a condução não se adequa às condições ambientais ou de clima
(chuva, nevoeiro, fumos, poeiras) e do estado do pavimento e condições de aderência.
Mas é gritante a ausência de relatórios conclusivos sobre os
acidentes que se vão verificando.
Seria muito mais eficaz do que a passagem de anúncios de imagens
chocantes. E a insistência no conceito de velocidade excessiva e na correlação
entre velocidade e sinistralidade. Segundo os dados da ANSR, autoridade nacional
de segurança rodoviária, essa correlação traduz-se por uma redução de 5% na
velocidade média de circulação corresponde a uma diminuição estatística de 30%
no número de acidentes mortais.
Considerando os dados da ANSR relativos aos mortos a 30 dias em
janeiro e fevereiro de 2014 (contabilizando as mortes no local do acidente e as
que se verificam como consequência nos 30 dias seguintes), ver em:
temos:
nº total de mortos em acidentes
em janeiro e fevereiro de 2014: 90
(em 2013: 106)
sendo:
1) 25 por atropelamento
27 por
colisão
38 por
despiste
2) 54 condutores
10 passageiros
26 peões
3) 15 em autoestradas
(em
2013: 3)
30 em estradas fora de localidades (em 2013:
49)
45 em arruamentos e estradas
dentro de
localidades (em
2013: 54)
Notar a gravidade dos acidentes
mortais nas povoações e o peso dos peões e atropelamentos
O número de despistes evidencia o
fator velocidade excessiva (45 km/h pode ser excessivo se as condições de
visibilidade ou de aderência forem más). A sinistralidade nas autoestradas,
aparentemente menor do que nas estradas, deve ser reduzida porque a gravidade
dos acidentes, quando se verificam, parece ser maior.
Conclusão: apesar das melhorias que se vêm verificando, ainda há muito
a fazer para reduzir a sinistralidade, e as campanhas publicitárias para isso
deverão insistir na redução da velocidade (o automóvel não deve servir de
compensação freudiana nem de manifestação de superioridade ou perícia de
condução), na prevalência de comportamentos corteses e na prudencia na
condução. É essencial a realização de inquéritos aos acidentes e divulgação das recomendações.