Com a devida vénia, retiro a informação da Enciclopédia da Estória Universal, de Afonso Cruz, cidadão escritor, ilustrador, autor de filmes de animação, fabricante de cerveja artesanal e habitante de um monte alentejano, que oiço num programa da Antena 2.
O Bufus marinus, ou sapo dos canaviais (América do Sul, Austrália) tem umas glândulas nas costas que segregam, para além de toxinas venenosas contra os predadores, um alcalóide, a bufotonina, alucinogénea e euforizante, equiparável à heroína e à cocaina.
Termina aqui a informação científica desta entrada da enciclopédia, porque o resto, tal como nas outras entradas da enciclopédia, é uma ficção, as citações e as histórias.
O que me faz crer na humanidade.
Será talvez o lugar comum de que o que nos surpreende pode ser valioso.
Ou será o alívio de que os disparates que nos vêm à cabeça também vêm à cabeça dos outros e ainda bem que há quem seja capaz de os imaginar e de os passar a letra de forma.
E não seria mais lógica uma realidade em que aquelas citações e aquelas histórias tivessem sido reais?
Da existência da bufotonina e da experiencia dos naturalistas medievais e das suas poções se deduz uma fantasia que os irmãos Grimm desenvolveram.
Beijar as costas dum sapo é absorver uma dose alucinogénea de bufotonina, imaginada equivalente a uma pastilha de ecstasy.
E quando se entrou na ilusão da droga, vê-se aquilo que se deseja, acredita-se naquilo que se quer.
E está explicado como o sapo se transformou no príncipe encantado.
Pobre cinderela, que se lambesses as costas do bufus marinus morrias intoxicada, com o sistema nervoso paralisado, os lindos olhos muito abertos e fixos no infinito, porque é muito pequena a percentagem de bufotonina na secreção das glândulas do sapo.
Mas talvez não seja o bufus marinus a origem do mito do príncipe encantado escondido no sapo.
A psicologia humana precisa dos conceitos do bem e do mal, pelo menos desde que os mazdeistas os definiram para ajudar à formação das grandes religiões monoteístas.
E se o bem fosse a ausência do mal? Se o sapo fosse a personificação do mal? Se o sapo fosse o diabo, mas se o diabo fosse o mal apenas porque se sente só, desprezado e naturalmente diabolizado?
Então o beijo no sapo é o beijo no diabo que de repente já não se sente só ou, se estava acompanhado, achava que ninguém lhe ligava a agora, finalmente que a Cinderela o beijou, deixou de ser um sapo e é um príncipe.
Já dizia Freud (citação da Enciclopédia ou minha?) que a origem da agressividade e das guerras está na insegurança, e que se tratássemos o inimigo como um ser inseguro, cheio de certezas porque desconfiado delas, mas a acreditar nelas apenas para se agarrar a alguma esperança, porque, como dizia Karl Marx (citação minha ou da Enciclopédia?) a religião não é só ópio para o povo, é uma esperança, então, se beijássemos o inimigo vencíamos a guerra.
Interesseiras as religiões altruístas, amar o inimigo mais do que a nós mesmos, para o vencer.
Se beijarmos o sapo, ele transformar-se-á no príncipe da paz e a guerra termina.
É isso, vou comprar a Enciclopédia da estória universal para ver se aprendo mais coisas.
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