Abstive-me de comentar a metáfora de Vítor Gaspar em Londres, numa das suas incursões entre velhos conhecidos da finança internacional, em fevereiro de 2012, para fazer o seu marketing de credibilidade e confiança para ter juros baixos: que nós portugueses, com a nossa história marítima , sabíamos chegar a bom porto.
Abstive-me porque a história marítima de Portugal não foi só chegar a bom porto.
Foi também, e principalmente, a história trágico-marítima.
O rei da pimenta lucrou, alguns armadores lucraram, alguns, poucos, marinheiros também.
Mas os que morreram foram muitos.
E as viúvas nada receberam.
Claro que o patriotismo não gosta da fala do velho do Restelo, mas esta fala baseia-se na experiencia.
De modo que, quando ouvi falar novamente numa metáfora marítima, que o primeiro ministro tinha ventos favoráveis que lhe permitiam vencer a forte corrente, não gostei.
É verdade. Junto da costa podem formar-se correntes de sentido oposto ao dos ventos dominantes. Situação vulgar no canal da Mancha, por exemplo. Também sucede na costa sul-africana. Houve até o caso do Santa Maria (ou do Vera Cruz?) , que no regresso de Moçambique, para aproveitar uma corrente próxima da costa, poupando combustível, teve um sério problema com uma turbulência que provocou uma série de ondas gigantes. O caso relatado nos Lusíadas ter-se-á passado próximo de Moçambique, antes de virar ao mar alto no Índico, e terá provavelmente sido resolvido porque o piloto não afrontou diretamente a corrente , antes procurou o melhor ângulo beneficiando do tal vento favorável e afastando-se da costa. Não terá sido com um rumo cego ao exterior que conseguiu vencer a situação. E depois, no alto mar, não tem que saber, é o vento que dá o sentido da ondulação. Problema, se forem ventos fortes cruzados ou instáveis, que tem de se pôr o barco de capa (recolher a vela), lançar a ancora flutuante e deixar o barco correr com a tempestade. Senão…lá teremos mais um episódio da história trágico-marítima.
Melhor fora, quanto a mim, que num pais com tanta história trágico-marítima e em que a navegação do governo é feita à vista, sem capacidade de previsão do rumo, se utilizassem menos metáforas marítimas.
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