sexta-feira, 19 de junho de 2015

A indignidade da entrega da exploração do metro à Avanza/ADO


Evidentemente que tenho de fazer a declaração de interesses de ter sido um ingénuo técnico ao serviço do metropolitano de Lisboa durante 36 anos em que acreditei, ingenuamente como já disse, que estava a prestar serviço público e em que, apesar de ser olhado agora pela opinião pública formatada pela comunicação social como um privilegiado,  tenho a imodéstia de ter obtido alguns resultados não por mérito meu, mas pelo mérito do coletivo em que estive integrado, do auxiliar ao diretor coordenador, passando pelos eletricistas, serralheiros, mestres e colegas de licenciatura.

A presente subconcessão da exploração do metro de Lisboa a um grupo (ADO – Avanza) que só tem experiência de exploração de redes de autocarros configura para mim uma indignidade e uma manifestação de ignorância dos requisitos de segurança de uma rede ferroviária. Parafraseando Henrique Neto, será um exemplo de impreparação dos decisores.
É verdade que o caderno de encargos definiu o preço mínimo como fator único. Qualquer técnico com um mínimo de experiência sabe que só por isso o caderno de encargos já pecava. Mas seria transparente conhecer quem elaborou o caderno de encargos e quem constituiu o júri de seleção. Incluindo as respetivas formações e experiências profissionais e quais os critérios prevalecentes na análise (recordo as discussões que tive com uma colega jurídica nas comissões de análise em que participámos: ela dizia se o concorrente diz que faz com segurança temos de acreditar e eu dizia eu acredito em função da experiência e do conhecimento que tenho do concorrente e da sua atividade).
Enfim, o governo parece ter força para levar a dele àvante.
A mim parece-me um disparate, mas posso estar enganado. E também me parece uma ofensa a quem trabalhou num metropolitano que apresentou e apresenta indicadores de desempenho aos melhores níveis, pensando que não estou enganado.
Por  exemplo, o material circulante foi escolhido com base na economia de tração é uma das melhores frotas (mérito também da Siemens, claro), sendo certo que a sua gestão está excluída da subconcessão, permitindo ao governo fazer o brilharete de dizer que deixou de pagar indemnizações compensatórias (isto é, o erário público vai continuar a pagar a manutenção do material circulante e o serviço da dívida da construção das estações e túneis).
Também não compreendo como o erário público poupa 25 milhões de euros anuais como disse o senhor secretário de Estado. Interessante que mostrasse as contas, sendo certo que os 450 milhões ganhadores para 8 anos chegam e sobram para pagar as carruagens.km com a percentagem da receita que vai para o subconcessionário ( Confesso que não li o caderno de encargos e portanto não sei se os 30% das receitas (que dariam cerca de 25 milhões de euros) estão incluidos ou não nos 56 milhões por ano, sendo que pagando 1,5 eur por carr.km já está bem pago, atendendo a que  o subconcessionário não tem de pagar a manutenção nem o leasing do material circulante nem a parte correspondente dos recursos humanos e restantes custos fixos como energia, amortizações, e juros, alem de se lhes reduzir o quadro de pessoal em cerca de 20% relativamente ao anterior. Mas o essencial é ver se os padrões de segurança vão ser alterados (por exemplo, alterar o numero de horas de condução dos maquinistas é alterar padrões de segurança) para redução de custos (a tal conversa da eficiencia do privado absorver o lucro...)).
Ver também:

PS em 29 de junho de 2015 - Já está amplamente esclarecido que os 30 % de receitas estão incluidos nos 56 milhões de euros anuais que foram anunciados como remuneração do subconcessionário (receita do subconcessionário: (1,5€/carruagem.km x 21 Mcarr.km = 31 M€) + (0,3 x receita de tráfego = 0,3 x 87 M€ = 26M€) + (publicidade/alugueres 9 M€) = 66 M€ ). Ora, estimando uma despesa com pessoal de 47 milhões (é o que vem no caderno de encargos) e de 28 milhões de fornecimentos e serviços externos incluindo 8 milhões com energia (FSE em 2014 incluindo toda a manutenção: 38 M€), verifica-se que se trata de um preço de dumping só recuperável ao longo de cortes drásticos ao longo do período de 8 anos da subconcessão (ausência de investimento na manutenção e nas instalações), eventualmente com recurso a lucros na gestão da Carris (mas então como renovar a frota, mesmo com autocarros usados?).
Veremos, receando uma politica de cortes conduzindo à degradação e ao desrespeito pelas pessoas, funcionários e passageiros, e à implementação das cláusulas gravosas para o erário público, de reequilíbrio financeiro, carinhosamente previstas no caderno de encargos. 

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