Este pequeno comentário pretende recolher as informações disponíveis sobre as prováveis causas do descarrilamento de um comboio pendular na Croácia, perto de Split.
1 – o descarrilamento deu-se por excesso de velocidade relativamente ao estado da via (chama-se a atenção para que a velocidade é excessiva sempre em relação a qualquer coisa, e, no caso das velocidades elevadas, a exploração só é segura se o projecto, a execução e a manutenção da via férrea, forem correctos e adaptados a essas velocidades)
2 – o excesso de velocidade deveu-se, provavelmente, à presença de uma substancia lubrificante entrando na composição de um liquido retardante de chama, que tinha sido aplicado havia poucas horas antes; esse líquido retardante é eficaz na protecção contra a ignição de ervas secas em tempo quente; porém, aplicada por vaporização depositou sobre os carris uma camada lubrificante que impediu a travagem
3 – não obstante o que antecede, os próprios técnicos dos caminhos de ferro já tinham informado que o estado da via existente não é compatível com os comboios pendulares; em reforço desta afirmação, temos que no ano passado tinha havido um descarrilamento no mesmo local, sem a projecção mediática deste, no qual morreram turistas; o próprio comboio de socorro ao comboio agora descarrilado, em chegando ao mesmo local, entrou em velocidade excessiva e descarrilou (é uma fatalidade dos caminhos de ferro: originalmente construidos para velocidades de 60 km/h, suportam agora velocidades duplas – isso tem que ver principalmente com a estabilidade do leito de via e com a escala ou inclinação nas curvas para compensar a força centrífuga) ;
4 – já se encontram detidos responsáveis pelos caminhos de ferro e pela firma que vendeu o produto; quem mandou prender não se interrogou por que não mandou prender ninguém no ano passado; tampouco se interrogou por que na Croácia não se segue o método usado nos países anglo-saxónicos do gabinete oficial de investigação de acidentes fazer o seu trabalho fornecendo as informações factuais que for obtendo à medida que a investigação progride. Dito de outro modo, é essencial que se faça uma investigação isenta e precisa após cada acidente. Só assim se podem evitar as suas repetições. Deixemos o pelourinho no seu sítio histórico: a Idade-Média.
5 – em resumo, o transporte ferroviário é uma resultante com muitos componentes que interferem uns com os outros, requerendo que a cada alteração num dos componentes (por ex, alteração de velocidade, aplicação de um produto novo mesmo que aparentemente nada tenha com o assunto – recordo o perigo corrido no metropolitano de Lisboa quando se adoptou o processo de soldadura por arco eléctrico dos cabos de retorno nos limites dos circuitos de via, processo esse já abandonado) se faça uma reanálise de segurança de todo o sistema; é esta a mensagem que nos chega da Croácia.
PS - Relativamente aos perigos de utilização de produtos químicos nos carris, considerar também os líquidos e as massas lubrificantes para diminuir o atrito entre a roda e o carril que por um lado reduzem o perigo de gripagem e galgamento do carril nas curvas, reduzem também o ruído nas curvas, mas por outro lado podem aumentar as distancias de travagem. É imperativo que o aplicador do líquido ou massa o faça apenas no verdugo da roda (a coroa circular saliente relativamente à periferia de apoio da roda no carril) de modo a não escorrer para a mesa de rolamento. É aliás uma boa prática calcular as distancias de travagem para condições de má aderencia, como a presença de folhas mortas e humidas sobre os carris. No caso do pendular que descarrilou na Croácia, teria sido boa ideia pôr no caderno de encargos o requisito de travagem electromagnética (binário resistente devido a campos magnéticos entre o carril e electroimans a bordo).
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