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A depressão de fim de semana começou logo na sexta feira de manhã.
Um email inesperado anunciava o fim da colaboração com uma jovem colega, da empresa subsidiária.
O seu vínculo contratual era a termo certo e não lhe renovaram o contrato.
Coordenava, e bem, o trabalho de auditoria energética a que a nossa empresa é obrigada por força das disposições comunitárias (escrevo assim propositadamente, uma vez que a legislação nacional ainda aguarda uma regulamentação duma regulamentação), por ser uma empresa de transportes consumidora intensiva de energia.
Os decisores aplicaram os critérios dos economistas que nos governam, e cortaram na despesa.
Bem pôde Keynes pregar que se se corta na despesa os outros fatores da equação diminuem e também, perigosamente, diminui o PIB.
Sem investimento não há produção.
É´ isto que os defensores da gestão escocesa (a do cavalo e da redução da despesa com a palha) não querem aceitar.
Não querem, pronto, e a nossa colega está a procurar governar a sua vida por outro lado.
Continuação da depressão de fim de semana recordando os queixumes do senhor presidente da República e a sua recomendação: que os portugueses procurem emprego nas empresas privadas.
Cito de cor, mas foi a ideia com que eu fiquei. Depois de lancinantes apelos aos senhores empresários, para que aplicassem o seu (deles) empreendedorismo para melhorar a economia, os apelos são agora aos portugueses para que encontrem emprego em empresas privadas.
A minha jovem colega encontrará emprego numa empresa privada?
Ou criará uma empresa privada?
Mais uma para a selva de Adam Smith?
Sem querer ressuscitar Keynes, não seria melhor seguir a proposta de Melo Antunes, que não era professor de economia nem de finanças, mas já sabia que o setor empresarial do estado (aquele que resolve as externalidades de interesse público) devia conviver e colaborar com o setor privado (aquele que acha que o interesse egoísta se repercute no benefício coletivo).
Como é que Melo Antunes sabia isso, como é que se consegue traçar a linha de demarcação dos dois setores? Por que razão não aceita isso o representante de todos os portugueses, criminosos ou não, com a missão específica de supervisionar o regular funcionamento das instituições? (vêem? É a depressão de fim de semana, a achar que a probabilidade das instituições publicas não estarem a funcionar regularmente sobe a taxas mais elevadas do que a das cotações das empresas de sucesso na bolsa).
Talvez Melo Antunes conhecesse o teorema de Gudel.
Que diz simplesmente que não há um teorema universal que seja válido em todos os domínios da Matemática (dispensem-me de justificar este teorema como universal; essa questão já tinha sido tratada com êxito por Bertrand Russel).
Há uns teoremas que são impecáveis num domínio. Mas noutros não.
É como as empresas públicas e as privadas.
E como os seus empregos.
É como a legislação nacional.
Não pode ser universal (no seu campo de aplicação, não no universo dos cidadãos e cidadãs, claro).
É muito louvável proibir ajustes diretos para combater a corrupção.
Mas o legislador não quis saber se o domínio concreto onde trabalhava a minha jovem colega era de aplicação universal. Não era. A empresa subsidiária não tinha que ser considerada como uma empresa independente no mercado. Os mecanismos para garantir a gestão correta da empresa subsidiária são outros, mas têm de me perguntar .
Em resumo, o cumprimento da obrigação comunita´ria de realizar a auditoria energética sempre que a empresa consome mais de 500 toneladas equivalentes de petróleo ficou mais, muito mais longe.
São responsáveis pelo não cumprimento dessa obrigação o legislador que acreditou ingenuamente que podia haver leis aplicáveis em todos os domínios, sem conhecer os meandros da vida real nem perguntar a quem os conhece, e os decisores que não renovaram o contrato à minha jovem colega.
Mas podem estar tranquilos. Isto só se passa no meu tribunal interior. Que, como se sabe, não é de aplicação aos domínios exteriores.
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