terça-feira, 1 de outubro de 2013

Dois discursos de vitória e um discurso de derrota


 

Fala de António Costa, depois dos cumprimentos e agradecimentos

A extensão da minha vitória é difícil de entender. Talvez que eu seja um fenómeno, de atração da simpatia das pessoas.
Tenho dificuldade em apreender as razões técnicas das coisas, mesmo quando rodeado de assessores técnicos que se esforçaram por mas explicarem. Recordo por exemplo, ter batalhado e imposto aos operadores de contentores da Liscont um máximo de 5 contentores empilhados, para que a altura não prejudicasse a vista dos moradores das Janelas Verdes. Ora, a prática comum dos operadores era empilharem apenas 4.
Também não andei muito bem quando, ministro, validei o castigo do jovem tenente da GNR que detetou o desvio de verbas do seu coronel de aprovisionamentos, ou quando baralhei as áreas de intervenção da PSP e da GNR e deixei extensas áreas sem proteção policial, ou quando fiz uma lei de condicionamento de financiamento das autarquias que me impediu depois de contrair um empréstimo.
Tambem tenho duvidas de ter sido bem aconselhado no loteamento do campo de Santana, que tantas duvidas suscita nalguns cidadãos.
Mas tive uma boa ideia quando pus o burro a ganhar ao maserati na Calçada de Carriche. Eu até sou um defensor do transporte público.
No fundo, serei como o Mr Magoo, atravesso todas as tormentas e todos os cataclismos sem os perceber mas chego ao outro lado do percurso de teste e as pessoas aplaudem. Mas confesso que no fundo, a maioria absoluta é um perigo, vou ter de ter muito cuidado com os conselhos de quem me rodeia. É um perigo quando as pessoas acham que deteem a verdade suprema e a verdade só delas.
Quanto à grande vitória,  não há vitórias quando a abstenção atinge quase 50%, quando tantos marginalizados ou desistentes da participação cívica não expressam a sua opinião, mas como todos sabem mas não podemos dizer, estas eleições são mais um passo rumo à vitória final, rumo ao palácio de Belem.





Fala de Bernardino Soares, depois dos cumprimentos e agradecimentos

Posso finalmente abrir o coração e comprometer o meu partido a, a partir de agora,  aplicar a diretiva leninista de trabalhar com todos os que não escravizam nem matam o povo por mais retrógrada que possa ser a sua orientação. Peço desculpa em nome do partido, por partilharmos os ideias de origem, pelo desvio que os partidos que se reclamavam dos ideais marxistas e leninistas cometeram quando no poder. Aprendemos com o estalinismo e com a ciência moderna de gestão, que não deve haver partidos únicos nem maiorias absolutas, mesmo referendadas, nem círculos uninominais, e que ninguém é senhor da verdade. Essa é a grande conquista do método científico, abrir-nos os olhos para as sucessivas conquistas da ciência, desde as tecnologias que permitem aumentar a produtividade e, para o mesmo salário, obter maior produção revertendo as mais valias para a segurança social, educação e saúde, até às referidas descobertas da ciência de gestão das comunidades, em que deixou de ser necessário uma vanguarda de elites porque a inteligência, o conhecimento e a análise da experiencia estão descentralizados e partilhados, permitindo a utilização das capacidades de todos. Mais uma vez aqui, seremos cumpridores dos princípios leninistas, de cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo as suas necessidades, tendo em conta o rendimento disponível e tudo fazendo para que esse rendimento cresça. Por isso estenderemos a mão e assinaremos protocolos definindo limites de autonomia de atuação com todas as forças politicas (que não escravizem nem matem o povo) e com os cidadãos que queiram colaborar, ao mesmo tempo que reativaremos, no âmbito partidário, o setor intelectual.
A nossa prática autárquica será que as soluções virão sempre de baixo para cima e da periferia para o centro, cabendo ás estruturas partidárias a integração a nível central e a obtenção de informações e meios a nível nacional e internacional. As correias de transmissão serão substituídas pelas redes sociais inteligentes e distribuídas. As grandes decisões nacionais começarão a ser definidas nas juntas de freguesia e não na Gomes Teixeira (presidência do conselho de ministros) e acabarão por ser tomadas de acordo com a recolha das posições das juntas.


Fala de Passos Coelho numa sala fria e sepulcral

Se os eleitores não votaram em nós foi porque não fomos eleitoralistas, porque desta vez não prometemos proteger os seus salários e pensões como nas últimas eleições.
Por isso continuarei contra tudo e contra todos a minha politica.
Havemos de baixar tanto o nosso PIB que ele não terá outro remédio senão começar a subir.
Nunca explicarei aos enviados da troika, também porque não entendo bem certos pormenores, as especificidades próprias do nosso país, como a desfasagem entre as estatísticas e a realidade ou a forma atabalhoada como desenvolvemos um projeto.
Serei como o general Crassus, irei pelo desfiladeiro fora até ao desastre total, não ligarei aos efeitos recessivos dos cortes e ignorarei os investimentos que gerariam crescimento, quer seja o investimento privado , que não estudaremos em conjunto com os eventuais interessados, quer seja o investimento com fundos QREN, que desviaremos para fins não reprodutivos.
Não contrariarei os grandes grupos com mais impostos, nem mexerei uma palha para que haja equidade na repartição dos sacrifícios, e continuarei a castigar os trabalhadores por conta de outrem e os pensionistas. Continuará o fator trabalho, que detem quase 50% de rendimento, a pagar 75% dos impostos, em beneficio do setor capital.
Eu é que tenho razão.
Ficarei à espera que  os meus ministros se vão demitindo aos poucos, como avisadamente fez o senhor da fala tarda.
Muito obrigado.

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