domingo, 16 de fevereiro de 2014

Sinédoques, sintomas de doença grave

sinédoque - substantivo feminino; figura de retórica que toma a parte pelo todo ou vice versa, utilização de um termo num sentido mais abrangente do que o que lhe é próprio; do grego sunekdokhés (reunião de significados)  pelo latim synecdoche
ver
http://pt.wikipedia.org/wiki/Sin%C3%A9doque

Serve a introdução para pôr uma hipótese, já falada neste blogue, a propósito das especificidades da linguagem dos portugueses e da relação estreita entre a linguagem e os mecanismos cerebrais.
A hipótese é a de que as sinédoques são uma das principais causas do insucesso do país.
As sinédoques são sistematicamente utilizadas em qualquer argumentação entre portugueses. E isso é só por si um indício porque revela o não cumprimento das regras básicas da discussão: recolher e apresentar dados e factos, argumentar e ouvir os contra-argumentos. Mas os portugueses preferem as sinédoques.
Com a agravante de, sendo um sintoma de uma doença grave, ser sistematicamente ignorado. E ignorar os sintomas e o diagnóstico é um grande obstáculo à cura.

Quando se diz que o português viveu acima das suas possibilidades, é uma sinédoque. Pode ter havido alguns que o tenham feito, mas todos não. Está-se a tomar a parte pelo todo.
Quando se diz que os indicadores do PIB revelam melhoria, está-se a tomar o pequeno crescimento nalguns setores e por comparação com o período homólogo do ano anterior,  por um todo prometedor.
Quando se diz que os autarcas são corruptos, está-se numa sinédoque injusta para aqueles que não o são.
Quando se diz que se gastou  mal o dinheiro dos fundos comunitários em infraestruturas, está-se a cair numa sinédoque enganadora, porque apenas 12% dos fundos comunitários foram aplicados em infraestruturas. Enganadora porque agora se justifica com essa sinédoque o "desvio" de fundos comunitários para ações diferentes da construção de infraestruturas. A construção de infraestruturas que contribuam para a autonomização do país na produção de energia e de alimentos, para a reabilitação habitacional, para a reorganização dos territórios e para a reindustrialização é indispensável, mas as sinédoques utilizadas para conduzir a opinião pública tomam os 12% pelos 100% e assim a opinião pública aceita pacificamente que o dinheiro vá parar a empresários sem visão abrangente e integrada.
É a estratégia das sinédoques, até o senhor secretário de estado das infraestruturas já veio dizer que não haverá problema se preterirem algumas das infraestrutras selecionadas pelo seu grupo de trabalho, que elas não são nenhumas vacas sagradas.
Será uma metáfora, mas que se subordina à tirania das sinédoques: a parte das PME a ser tomada como o todo da economia.
É pena as coisas não se discutirem com base em dados e factos, com numeros credíveis sobre a contribuição para o PIB  das coisas em termos de produto e de valor do produto (tudo o que contribui para substituir ou reduzir as importações contribui para o aumento do PIB).
E enquanto não se tomar consciencia da doença de que as sinédoques são sintoma, é dificil a cura.



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