Que surpresa.
Encontrar numa banca de uma livraria
um livro de desenhos.
De desenhos de passageiros de
metropolitanos de todo o mundo.
Capa cartonada. Na frente o desenho
cursivo e rápido de uma rapariga de mangas curtas, jeans e tenis, recostada a
ler o livro aberto sobre a mala, a mão esquerda displicente acariciando a nuca.
No verso uma jovem mãe abraçada ao
filho que dorme ao colo e à eterna mala. Tem flores bordadas nas calças e o
cabelo puxado para tras, apertado uma fina trança.
São ambas passageiras do
metropolitano de São Paulo, ou o Metrô.
O autor pegou no seu caderninho de
esboços e foi por esse mundo fora.
Sentava-se num banco de uma carruagem
de metro, olhava fixamente para as pessoas em frente, e desenhava-as.
Respeitava o direito de quem não
queria ser representado no papel e isso acontecia de forma tácita.
Mas a maioria, depois da surpresa,
sorria e o desenho era mais do que um instantâneo.
Os desenhos não pretendem valorizar a
beleza das pessoas, antes acentuam o sofrimento, a pressa, a preocupação, ou
simplesmente a ausencia ou a pausa do repouso de en-quanto não chegam.
Tenho de me recordar das palavras do
colega do metro de Paris, que nós técnicos sabemos aproximar as pessoas melhor do que os politicos.
Porque são as mesmas as necessidades
e as preocupações e as reações de quem anda de metropolitano como os
representados no livro: Londres, Lisboa, Berlim, Estocolmo, Nova Iorque, São
Paulo, Tóquio, Atenas, Moscovo, Cairo.
Quisera que os metros fossem
transparentes, desde que o cidadão ou cidadã entra, até que sai, que o tempo
seja o mínimo, que seja confortável a viagem, e em segurança, que se esqueça
que nós, os que trabalhamos no metro-politano e o nosso trabalho, existimos, que
apenas o queremos devolver à superfície, aonde tem de ir.
As pessoas representadas no livro são
melhor do que o que lemos nos jornais, agressivas e votantes em decisores que
promovem guerras.
As pessoas estão aí, nos
metropolitanos, prontas para sorrir, para produzir, para criar os filhos, para
contribuir para a felicidade de todos, assim os decisores as compreendam, que
não , não as compreendem, pouco andam de metropolitano.
As pessoas são boas.
Quer seja uma menina de sandálias ao
colo do avô de bigode no metro do Cairo iguais em qualquer parte do mundo,
independentemente das crises de cada povo, quer seja uma adolescente estouvada
no metro de Lisboa, ou um executivo no London Underground.
Ou um rosto de uma beleza eslava de
olhos azuis (é o que sugere o traço apressado) que envolto na gola de peles
olha fixamente o desenhador.
Ou o técnico comercial casado e
adormecido com a pasta sobre os joelhos,
a leitora asiática, a senhora de idade, o jamaicano de cabelo apanhado
atrás, no metro deLondres.
O judeu ortodoxo no metro de Nova
Iorque, ao lado do muçulmano, do afro-americano, do casal de turistas sul
americano.
O recolhimento dos executivos
japoneses do metro de Tóquio, ou o ar decidido dos alemães e das alemãs que vão
para o seu trabalho.
Devia canalizar-se todo o fluxo dos
dinheiros do negócio das armas para o desenvolvimento das redes de metro.
Referencia:
Subway Life, Vida subterranea
de António Jorge Gonçalves,
ed. Assírio e Alvim
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