Exmo Senhor Secretário de Estado
Sou um reformado do metropolitano de Lisboa e, como tal, do
seu ponto de vista, um co-responsável pela dívida da empresa superior a 4.000
milhões de euros e EBIDTAs sucessivamente negativos, que usufruiu de
privilégios comparativamente com a população que a empresa serviu.
Mereci portanto, ainda segundo os seus critérios, o corte do
complemento de reforma acumulado com uma redução da pensão da segurança social da
ordem de 20%, com outros pretextos.
Assim como eu, cerca de 1400 colegas.
Como diz o professor João Cesar das Neves, a discussão sobre
o incumprimento do contrato que vinculava a empresa ao pagamento dos
complementos de reforma será estéril, por mais que eu recorde que os
vencimentos no metropolitano quando a maioria de nós foi admitida era de cerca
de 70% do que se ganhava nas empresas privadas para igual qualificação.
Não vale portanto a pena recordar isso, nem que a dívida foi
engrossando através da assunção pela empresa do que deveria desde o início
estar inscrito nas contas do Estado, como sistematicamente rezavam os
relatórios e contas do metropolitano.
Nem vale a pena recordar que a dívida privada portuguesa,
apesar das transferências habilidosas de um ou outro governo, para a parte
pública, ultrapassa a dívida pública, nem que a dívida da PT é quase dupla da
do metropolitano, nem que a da EDP é quase quintúpla.
Muito menos vale a pena recordar os bons indicadores de
performance do metropolitano, apesar dos cortes sofridos na manutenção e nos
quadros de pessoal, quando comparados com os dos homólogos.
Nem tão pouco as experiencias negativas tidas em Londres com
as privatizações, nem destacar as fontes de financiamento dos operadores
públicos franceses.
Falei nisto apenas porque tive alguns contactos com outros
metropolitanos enquanto fazia a minha vida profissional no de Lisboa, desde um
tempo em que V.Exa era criança, acompanhando a evolução tecnológica que fomos
aplicando ao nosso metro à medida que ele crescia, não tanto como desejaríamos,
mas duma forma que está à vista de todos nos tempos que correm, apesar das
ameaças.
E é afinal por isso, por termos um metropolitano, e por
termos um secretário de Estado que não retira dele o que ele pode dar,
preferindo restringir a sua atividade até caber no conceito da concessão que
tão caro é a V.Exa, que lhe escrevo desta forma. Porque o metropolitano de Lisboa,
tal como como grande parte da população portuguesa, vive claramente abaixo das
suas potencialidades.
É que os metropolitanos servem para transportar pessoas em áreas
metropolitanas segundo critérios de eficiência energética.
O seu colega de governo, da pasta da Energia e Ambiente terá
certamente grande prazer em explicar-lhe como o país perde dinheiro todos os
dias porque 60% das deslocações diárias são feitas de automóvel, cuja eficiência
é de 250 Wh/passageiro.km, quando no metropolitano é de 140 Wh/passageiro.km, todos
os componentes incluídos, do poço de petróleo à roda num caso e do parque
eólico e do poço de gás no outro .
Claro que V.Exa, sorridente, dirá que é para isso que vai concessionar.
Para que os privados sirvam os interesses da população graças ao seu saber
como.
Já reparou, quando diz isso, que está a chamar incompetentes a mim e aos
meus colegas que permanecem no ativo? Que contas simples e a análise dos
indicadores mostram que o diferencial de uma eventual maior eficiência é
inferior ao lucro exigido pelo acionista? Que é o interesse do acionista que está
na primeira linha e não o interesse da população que paga 7.000 milhões de
euros de juros e 7.000 milhões de euros de importação de combustíveis fósseis?
E que o critério de votação nas assembleias gerais dos acionistas não respeita
o princípio básico da democracia, uma voz, um voto?
Eu , que vivi uns anos nesta problemática, lhe digo que não,
que a concessão não será boa para a população e para as contas públicas.
Que o problema está, e afinal por isso lhe escrevo, que
temos um secretário de Estado que não faz ideia da problemática dos transportes
urbanos.
Estou a citá-lo, não estranhe.
É que também o ouvi na sessão promovida pela ordem dos
engenheiros sobre a localização do terminal de contentores (como V.Exa sabe
explorar tão bem, para chegar aonde quer, a dificuldade de trabalho em equipa
dos portugueses, engenheiros ou não, a dificuldade em sintetizar as variáveis
técnicas e todos os componentes das análises de custos-benefícios de um problema
complexo, de modo à decisão resultar da comparação de pelo menos 3 hipóteses de
solução, a dificuldade de apresentação antes de fevereiro de 2015 de projetos credíveis
para ligar Portugal à Europa…)
Mas para o ouvir
esperei 45 minutos depois da hora marcada.
É verdade que V.Exa pediu desculpa, como qualquer pessoa bem
educada, mas distraidamente porque deixou escapar “não fazia ideia que ia levar
45 minutos da Horta Seca até à ordem dos engenheiros com o transito que estava”.
Se tivesse utilizado o metropolitano, em termos médios teria
gasto sem pressas 25 minutos e poupado o tal diferencial de 100 Wh vezes 3 km.
Está a ver, 20 minutos a multiplicar por 400 assistentes,
temos de contabilizar o valor da hora.homem, mais os 300 Wh do diferencial e a
poluição correspondente, da ordem de 500 gramas de CO2.
Ora este é o meu ponto, os governantes (não me refiro aos ciclistas
holandeses e aos dinamarqueses) estão habituados a andar de motorista (valha
que o seu colega da Energia e Ambiente ameaça
pô-los a andar de automóvel elétrico), não parece terem a noção do que é
um transporte ferroviário urbano.
Por isso lhe escrevi, para o ajudar a ter essa noção, que
penso deveria sobrepor-se à obsessão concessionária.
Com os melhores cumprimentos
Fernando Santos e Silva, reformado do ML R-3071
Esta é a fase em que a noite fria e silenciosa aproxima o som dos tambores, avista-se a fogueira com um caldeirão ao centro e uns primos afastados a gesticular freneticamente à volta em cânticos satânicos. O chão estremece com a cadência lúdica. Dá para entender que não é um prefácio de um "tea after eight". O estado de insanidade tribal misturado com demência em breve vai alcançar a satisfação de um acto consumado e que alguém é consumido. Os Deuses agradecem e amanhã será um novo dia. Apaga-se a consciência do passado. Sleep tight.
ResponderEliminarA sua descrição é viva e nãoandará longe da realidade. Mas como diz, haverá novos dias e a "consumição" no caldeirão poderá ter o efeito contrário ao do horizonte, isto é, nós afastar-nos-emos dele à medida que ele se aproxima de nós. Procuremos alternativas.
EliminarProcurar alternativas dá muito trabalho mesmo em sociedades com poucos vícios. A inteligência humana prefere guerras e recomeçar.
ResponderEliminarTalvez, nunca poderemos ter a certeza de nada, mas nestas coisas estou como escreveu Jorge de Sena, "que tudo recomece desde quando a luz não fora ainda separada às trevas do espaço sem matéria. Nem havia um espírito flanando ocioso sobre as águas quietas, que pudesse mentir-se olhando a Criação.(o mais seguro, porém, é não recomeçar)"
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