segunda-feira, 30 de abril de 2012

Falas de governantes – Vitor Gaspar e a poesia de Sofia de Melo Breyner

O senhor ministro das finanças saberá se tem ou não como objetivo a estratificação da população portuguesa em faixas mais ou menos imunes à crise, desde os 100 mil portugueses que não sofrerão com ela , isto é, cerca de 1%, até aos 20% da população que vive na pobreza, passando pelo estrangulamento da classe media d emodo a alargar a faixa da pobreza ou da dificuldade de sobrevivencia.
Se tem esse objetivo, tê-lo-á justificado dizendo que as medidas que tomou foram necessárias para haver melhorias no futuro.
Poderá ser, mas desde a forma como se exprime, invocando “circularização de créditos”, e planos de estabilidade e crescimento que não têm de “precular (!? – teria querido dizer “percolar”, no sentido de filtrar, de perpassar, à imagem do fenómeno da capilaridade?) na Assembleia da Republica, ao quase pedido de desculpas com a “hipótese de trabalho” da reposição dos subsídios de férias e de Natal ao ritmo de 25% ao ano depois de 2015 (inclusive? ano de eleições?), e à repetição de que a maioria dos portugueses o compreende, infelizmente não posso acreditar nele.

Por isso agradeço a Manuel António Pina , quando recordou o 25 de Abril de 1974 e a poesia de Sofia de Melo Breyner no magazine do DN.
Acredito mais na intuição e na poesia de Sofia de Melo Breyner do que no perito financeiro Vítor Gaspar:

“É certo que a esquerda fez erros
Caiu em desmandos confusões praticou injustiças
Mas que diremos da longa tenebrosa e perita
Degradação das coisas que a direita pratica?
Que diremos do lixo do seu luxo – de seu
Viscoso gozo da nata da vida – que diremos
De sua feroz ganância e fria possessão?
Que diremos de sua sábia e tácita injustiça
Que diremos de seus conluios e negócios
E do utilitário uso dos seus ócios?
Que diremos de suas máscaras álibis e pretextos
De suas fintas labirintos e contextos?
Nestes últimos tempos é certo a esquerda muita vez
Desfigurou as linhas do seu rosto
Mas que diremos da meticulosa eficaz expedita
Degradação da vida que a direita pratica?”
                                                       
                                                              em o Nome das coisas

Não é mesmo uma fala profética, sobre a ”sábia e tácita injustiça” das medidas que nos impõem, sendo que a poetisa escreveu o poema em julho de 1976, muito antes destas crises financeiras ?

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