segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Naufrágio na Figueira da Foz, 4 mortes


Depois da cobertura noticiosa perdeu-se a oportunidade de divulgar as causas dos acidentes.
Independente de inquéritos a realizar pelas entidades oficiais (de responsabilidade algo difusa dada a indefinição resultante das concentrações supostamente economizadoras e dos conflitos de fronteiras entre os ministérios da defesa, da administração interna e da agricultura e mar : IMT? IPTM? AMN? Marinha?), enquanto a memória dos acidentes está viva, deveriam estes ser analisados por especialistas (colocando hipóteses quando os dados faltem) e por eles propostas medidas.
O objetivo de aplicação dessas medidas será o de evitar ou, pelo menos, reduzir a probabilidade de ocorrência dos acidentes.
Este blogue tem insistido que o método correto é o anglo-saxónico, em que o gabinete de investigação de acidentes mantem a população informada dos avanços dos inquéritos e está aberto à participação pública.
Não havendo ainda esta cultura no nosso país, penso que deverá ser combatido o “pudor” inibitório que manda esperar pelas conclusões dos inquéritos que, aliás nunca chegam (ver o caso dos inquéritos ao acidente de Alfarelos e aos descarrilamentos na linha de Cascais).
Esta situação só é possível porque a probabilidade de ocorrência dos acidentes graves é relativamente baixa.
No caso da morte de pescadores, porem,  o risco de morte é elevado e exigirá uma mudança de comportamento e atitude, não só das entidades oficiais como dos próprios pescadores. Neste aspeto, penso que a comunicação social poderia desempenhar um papel importante voltando ao tema com as propostas dessas medidas.
As mortes de pescadores tornam-se mais chocantes quando se sabe que não são aplicadas todas as medidas de segurança e que ocorrem em locais onde outros praticam atividades lúdicas.
Cito este facto apenas para chamar a atenção para que, em contrapartida, os surfistas praticam normas de segurança como, por exemplo, o uso de vestuário térmico .
Infelizmente, ou por hábito ou porque o equipamento de segurança é caro, os pescadores raramente usam vestuário térmico (as camisolas de lã, na água, não protegem contra a hipotermia.
Sistematicamente não usam coletes de flutuação e o uso de botas altas ou calças fechadas em baixo, que contribuem, estas, para o afundamento ou para o cansaço dos náufragos. Relativamente ao acidente na Figueira, conviria divulgar, em intenção dos próprios pescadores, as condições de menor risco na saída da barra (saída antes da preia mar, durante a enchente, para redução da rebentação – porque a corrente da vazante facilita a rebentação das ondas de oeste - velocidade reduzida para reduzir o embate na onda de rebentação, ligeiro angulo de ataque da onda para reduzir o afundamento da proa após a onda, cabina fechada, aberturas do convés fechadas para evitar que a água entre no interior da embarcação e arranjo do convés e da popa de modo a facilitar o escoamento da água "emborcada" - que desequilibra a embarcação pela inércia da água embarcada - revisão da resistencia do leme e quilhas às forças das ondas dada a sua importancia em corrigir o rumo para evitar que a embarcação vire, idem para as hélices, cuja permanencia dentro de água é importantissima para a correção desse rumo) .
Por análise das fotos publicadas, é possivel que algum componente tenha falhado, embora das fotos tambem se retire que o período das ondas de rebentação deve ter sido muito curto e que a configuração delas, num mar desencontrado e não regular, era muito perigosa (dir-se-ia que a barra deveria estar fechada).
A necessidade de esclarecer todas as condições do desastre não deverá nunca constituir desculpa para o não pagamento pelo seguro das indemnizações, mesmo que as decisões dos pescadores tenham falhado.
Relativamente às afirmações do presidente da associação para maior segurança no mar, é verdade que com o acrescento do molhe as embarcação apanham as rebentações com algum angulo de través (recordo que há vantagem num ligeiro angulo de ataque para diminuir a elevação da embarcação relativamente à superfície da água, mas ondas de 3 m de rebentação facilmente desorientam quem vai a governar), mas a geometria do molhe destina-se a reduzir o assoreamento da barra (as ondas rebentam tanto mais quanto mais assoreada), pelo que a saída da barra com ondas de 3 metros e período curto deveria ser interdita a embarcações com um pontal (altura da borda) da mesma ordem de grandeza.
De assinalar ainda que a reciclagem dos pescadores em normas e equipamento de segurança (recordo a morte de pescadores a norte da Nazaré há uns anos por inexistencia de radiobalizas de alarme, a morte frequente por não uso de coletes de segurança ou por uso de vestuário e calçado desapropriado, mesmo em águas pouco fundas e abrigadas) se defronta com um problema gravissimo que é o da falta de capacidade financeira (os grandes importadores põem o peixe longínquo, que deveria ser taxado com taxas de emissão de CO2, à venda nos supermercados a preços muito mais baixos do que os das lotas, agravados estes pelos custos de intermediação), o que justificaria ações de apoio com fundos comunitários.

Em resumo, enquanto as pessoas bem falantes peroram sobre a economia do mar, desejar-se-ia uma campanha de reciclagem dos pescadores em equipamentos e normas de segurança, seu financiamento com fundos comunitários, lançamento de taxa de CO2 sobre o peixe importado, controle sobre os lucros da intermediação das lotas e revisão das condições de segurança das embarcações em serviço e em projeto.



1ª onda: embarcação apanhada por uma onda de rebentação irregular (fundos irregulares? configuração do molhe?falha do motor ou do hélice? tentativa falhada de fuga para a zona de não rebentação? velocidade excessiva agravando o impacto com a onda? frequencia de ressonancia da oscilação lateral com a frequencia da ondulação aumentando a amplitude do balanço? ), talvez com angulo de ataque demasiado; a embarcação em primeiro plano aguardava melhor oportunidade; estava-se próximo da maré cheia, durante a enchente a rebentação tem tendencia para ser menor do que na vazante, embora a configuração do molhe possa reduzir esse efeito; verifica-se que os pescadores não têm colete de segurança nem o vestuário é o adequado; as portas das cabinas  estão abertas

Parece ter sido esta a onda que virou a embarcação, que nesta foto parece já estar naposição de não retorno; pela presença de uma outra embarcação que não se via na primeira foto, esta pode ter sido a 2ª (que teria atravessado a embarcação e projetado água para o seu interior por afundamento da proa depois da 1ª onda) ou  uma 3ª onda (o angulo de ataque até nem parece muito afastado da perpendicular, pondo-se a hipótese de desequilibrio por embarque de água, carga solta ou falha do motor , hélice, leme ou quilha)
a embarcação já está virada; a embarcação que a seguia resistiu bem à onda que virou a primeira


PS em   6 de novembro - uma estação de televisão mantem o tema em debate entrevistando o diretor do porto de Aveiro e Figueira da Foz. É chocante ouvi-lo dizer que o acidente não teve nada que ver com a ampliação do molhe (o objetivo é reduzir o assoreamento e portanto a rebentação). Mais chocante ainda é ouvir o secretário de estado do mar dizer que os pescadores precisam de mudar para uma cultura de segurança. É em grande parte verdade, mas falar assim, ignorando as dificuldades financeiras dos pescadores (obrigados a competir com peixe importado que não paga taxa de carbono), é de grande insensibilidade e falta de respeito por eles dando a impressão que é sua exclusiva culpa . E se pode dizer que a profundidade é razoável (11m?) não tem o direito de dizer que o acidente não se deveu tambem à ampliação do molhe depois de dizer que o acidente ainda está a ser investigado. O mar estava desencontrado, possivelmente por influencia do sudoeste, a rebentação era incerta e de 3m e a policia marítima deveria ter impedido  a saida, pelo menos dos barcos com menos de 12m . Deveria tambem fiscalizar o uso de equipamento de segurança (sei que não é obrigatório, mas a situação era de perigo). Ou as funções da policia marítima estão dependentes da polémica escolastico-juridica que os ministérios da defesa, do mar e da administração interna manteem? A reportagem termina com imagens de uma embarcação saindo a barra, com pescadores à proa, envergando camisolas de lã e botas de cano alto assassinas. É verdade que tem sido fornecido equipamento de segurança às associações de pescadores, mas não basta. Não se atire as culpas de tudo para quem trabalha. Experimentem os senhores diretor do porto e secretário de estado sair a barra nestas embarcações.


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