segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Carissima senhora jornalista



O seu texto foi publicado já há uns dias no DN, mas eu penso que concordará que o tema é oportuno.
Escrevo-lhe porque na sua crónica diz com desalento que não tem uma conclusão esclarecedora.
E contudo, depois do acidente que relata, fez o que devia. Sofreu com a sua reconstituição mas divulgou como pôde as causas e as circunstancias em que ele se deu, não guardou silencio.
Quem não fez  o que devia foram "as autoridades", como costumam designar-se as entidades que, mais do que exercerem a autoridade deveriam, ao serviço da comunidade, aplicar soluções para diminuir a sinistralidade rodoviária.
Dificilmente diminuiremos a sinistralidade sem a realização de análises rigorosas a cada acidente e proposta de soluções para os evitar.
E não vemos "as autoridades" a fazê-lo.
Quando se pedem relatórios de acidentes, o que as "autoridades" mostram são estatísticas não comentadas.
Eu penso que o jornalismo poderia aqui ajudar, levando a opinião pública a exigir o esclarecimento dos acidentes e publicando os resultados dos inquéritos.
Já teria então uma conclusão esclarecedora.
Não para o seu acidente, mas para contribuir para parar a morte nas estradas.
Escolhi para ilustrar este meu comentário a imagem de um acidente na VCI do Porto, felizmente sem mortes nem feridos graves, que retirei do DN.
O leitor ao vê-la poderá pensar que são coisas que só acontecem aos outros, ou que teve a sorte de não estar lá. Mas se fosse informado, uns dias mais tarde, das recomendações e conclusões do inquérito, poderia corrigir algum erro de condução que inconscientemente pratique, ou poderia ir criando uma cultura de exigência de segurança. Neste caso, pelo rasto dos pneus no asfalto e pela posição do camião deitado e da carrinha que o precedia, a primeira hipótese a analisar (sublinho hipótese, porque só um inquérito poderá apurar as causas) será  excesso de velocidade,  não respeito da distancia de segurança para o veículo de frente, com eventual colisão com a carrinha que o precedia, e insuficiente fixação do tanque ao trator (é importante investigar se a ligação ao pivot se soltou antes ou depois do camião se ter deitado; no primeiro caso a fixação era deficiente e ter-se-à partido durante a travagem e derrapagem, no segundo caso as condições de estabilidade do camião eram precárias).
Mas sobre o assunto cairá o silencio, tal como na generalidade dos casos. Fica-se sem se saber como e porque aconteceram os acidentes, embora os técnicos das companhias de seguros cheguem normalmente a conclusões corretas. E aqui entramos num domínio delicado, uma vez que as conclusões dos inquéritos das seguradoras estão relacionadas com os montantes a pagar e certamente as companhias invocarão sigilo profissional (mais uma vez o sigilo como inimigo do interesse comum).
Os inquéritos devem ser realizados por entidades oficiais ou independentes de seguradoras e não ter por objetivo a atribuição de culpas, coisa que faz parte da nossa cultura de pelourinho, antes devem ser realizados para determinar as circunstancias e as causas dos acidentes de modo a encontrar soluções para os evitar, conforme a cultura anglo-saxónica dos organismos de investigação de acidentes.
Salvo melhor opinião e sem querer ofender os seus profissionais, seria desejável que o jornalismo, se deu a notícia de um acidente, considerasse também como notícia o resultado da sua investigação e pressionar para que ela se fizesse em tempo útil.
Permito-me assim resumir o que proponho como medidas de redução da sinistralidade rodoviária, para o que julgo da maior importância a colaboração do jornalismo:

1 - divulgação sistemática da necessidade de conduzir sem excesso de velocidade, adaptando a condução às condições ambientais e guardando a distancia de segurança para o veículo precedente. Baixar a velocidade é uma medida de segurança para redução de atropelamentos, colisões e despistes, mas serve também para reduzir o consumo de energia e para preparar a aceitação de veículos elétricos
2 - divulgação obrigatória em todos os canais de TV, em horário nobre, de esclarecimentos sobre o código da estrada (regra das rotundas, restrições à mudança de via e de ultrapassagens)
3 - avaliação permanente do código da estrada e divulgação das novas medidas para aperfeiçoamento (o atual código da estrada é suscetível de melhorias na definição das condições ambientais como condicionadoras da condução, na regulação da circulação nas rotundas, na definição das condições de prioridade nas passadeiras de peões)
4 - existencia de orgãos independentes para análise de acidentes e divulgação pública das suas conclusões
5 - campanhas publicitárias intensivas de prevenção nas TVs em horário nobre, pela positiva, isto é, mostrando o comportamento correto em vez do comportamento de risco e evitando mostrar as consequencias trágicas, considerando que a reação normal das pessoas é que isso só acontece aos outros.

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