Caro colega e amigo
Não me tendo sido possível comparecer no plenário de dia 15 de setembro de 2015 sobre o futuro do nosso metropolitano, para o qual amavelmente me convidou, envio-lhe este pequeno texto.
Como reformado do metro, tenho assistido impotente à ofensiva do atual governo contra as empresas públicas de transporte enquanto prestadoras de um serviço público.
Não reconheço competência técnica, na área dos transportes, nem aos decisores do governo, nem aos seus mentores da troika, para as decisões que têm tomado. Estes, especialmente, deveriam conhecer os resultados negativos das privatizações dos transportes ferroviários em Inglaterra.
Esta ofensiva é um insulto a todos os que dedicaram ou dedicam o seu esforço à construção, exploração e crescimento do metropolitano.
Todos sabemos que se integra na desvalorização do fator trabalho e na transferência dos rendimentos para o capital, contribuindo para o acentuar das desigualdades e das dificuldades de desenvolvimento das novas gerações (as privações na infancia dificultam o desenvolvimento intelectual).
A gestão privada da exploração do metropolitano, precisamente por ser privada, terá sempre como objetivo apresentar lucro, em detrimento da segurança, da qualidade e de perspetivas de desenvolvimento.
Mesmo que a curto prazo suporte um défice, como parece ser o caso da subconcessão à Avanza, em cujo primeiro ano eu estimo um prejuízo de 9 milhões de euros se cumprido o caderno de encargos, o que configurará uma prática de dumping.
Por mais que o repitam, o lucro obtido nunca será menor do que o diferencial de eficiência dos resultados entre a gestão pública e uma eventual mais eficiente gestão privada.
Isto é, o que a gestão privada possa vir a ganhar, reduzindo custos de pessoal com o consequente comprometimento da segurança e qualidade (desde o guarnecimento das estações, à redução das tarefas de manutenção, aos tempos de condução, à redução dos rendimentos do trabalho, à redução de ações de formação e reciclagem) não será suficiente para garantir lucro aos acionistas, considerando a razoabilidade dos indicadores que a gestão pública do metropolitano apresentava quando comparado com os metropolitanos estrangeiros.
Ou então, sem redução da qualidade, o lucro é conseguido à custa de maiores encargos para o Estado concedente.
É justificável que num serviço público de transportes as receitas de exploração possam não cobrir as despesas.
O diferencial a suportar pelas contas públicas servirá assim de contribuição para o rendimento dos particulares e das empresas, nestas como componente nos custos gerais dos custos de transporte dos seus funcionários (esta é também a fundamentação para a taxa de financiamento dos transportes que a legislação francesas aplica às empresas com mais de 5 funcionários em zonas metropolitanas, o chamado “versement transport”).
Seguramente que as receitas não poderão cobrir os encargos dos juros e amortizações devidos aos elevados investimentos realizados, que desde há muitos anos o metropolitano vinha reivindicando deverem ser levados às contas públicas e não da empresa.
Porque o que fundamenta a existência de um metropolitano é a sua maior eficiência energética quando comparado com o transporte individual ou com o transporte rodoviário.
Daí resulta uma economia na importação de combustíveis fósseis, de que o país sofre forte dependencia, sempre que se transferem deslocações do transporte individual para o metropolitano, coisa que o atual governo não verá com bons olhos, dadas as receitas fiscais que obtem com a venda de combustíveis.
E é aqui que assentará o futuro do metropolitano.
Com a garantia do conhecimento e do profissionalismo dos seus trabalhadores, a todos os níveis, o metropolitano manterá esse carater de economizador de energia no panorama nacional.
É portanto essencial manter os níveis de conhecimento das tarefas e funções em todas as categorias profissionais, preservando os procedimentos devidamente registados nas respetivas fichas de funções, nomeadamente as normas que se relacionam com a segurança, mantendo as ações de reciclagem e os setores de estudos, qualidade e projetos.
Não deveremos cruzar os braços perante a falta de dinheiro para novos investimentos.
As normas europeias permitem aplicar fundos comunitários no desenvolvimento dos metropolitanos, precisamente porque isso aumenta a eficiência energética e reduz, comparativamente com o transporte individual, a emissão de gases com efeito de estufa de acordo com os objetivos da união europeia.
A extensão à Reboleira é exemplo disso, pois beneficia do QREN 2007-2013. Foi escandaloso o atraso com que o processo se arrastou na comissão de coordenação de Lisboa e Vale do Tejo e sabe-se lá mais por onde, quando os projetos estavam mais que concluidos, mas não interessa agora perseguir culpados. Interessa que todos se dediquem a que o prolongamento à Reboleira seja levado a bom termo e que a sua colocação em serviço siga as normas de segurança.
Para beneficiar dos fundos comunitários é necessário porém que os projetos estejam devidamente concluídos e fundamentada a sua utilidade. Esta é mais uma razão para manter o “saber como” no metropolitano, uma vez que não é possível encontrá-lo no mercado nacional em todas as especialidades necessárias.
Outros exemplos de aplicação de fundos comunitários que requerem a colaboração de todos:
- a adaptação dos cais a 6 carruagens, acesso a pessoas de mobilidade reduzida e remodelação da ventilação principal nas estações de Areeiro e Arroios,
- acesso de pessoas com mobilidade reduzida nas principais estações que dele ainda não dispõem, nomeadamente nas estações de correspondencia,
- reforço dos níveis de segurança da circulação com sistemas de proteção automáticos do tipo ATP/ATO para redução da probabilidade de ocorrencia de acidentes,
- completamento do esquema básico da rede com prolongamento da linha vermelha até à linha suburbana de Cascais, com correspondência entre Alcantara e Algés e com correspondência com parque de estacionamento em Campolide para o transporte individual da A5,
- estudo de novo material circulante para satisfação do previsível aumento da procura a médio prazo (por um lado é expetável que a economia venha a crescer com consistência, e por outro lado é provável que o preço do petróleo suba, desincentivando o transporte individual)
Parece-me ser este o caminho a tentar no futuro, a empenhar os trabalhadores do metro, uma vez que na concessão em curso não se prevê que o subconcessionário contribua com estudos para o desenvolvimento do metro.
E aguardar que a subconcessão possa ser renegociada e revertida.
Relativamente aos reformados, mantém-se a esperança, enquanto os tribunais não decidem, que um novo governo reponha, pelo menos parcialmente, os complementos de reforma.
Penso que a maioria dos reformados concorda com a formalização de uma contribuição saída dos seus complementos de reforma, no pressuposto de que todos temos de fazer sacrificios, esperando-se que, nessa perspetiva, ideias como a taxação sobre as transações financeiras e sobre os lucros das financeiras e dos bancos sejam igualmente postas em prática (notar que o famoso sigilo bancário está sendo mitigado internacionalmente).
Votos das maiores felicidades
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