domingo, 11 de maio de 2014

Thomas Piketty, o capital no século XXI

Este blogue já tinha reparado na referencia que Manuel Maria Carrilho tinha feito ao livro, chamando a atenção para a sua tese, fundamentada na análise de dados reais ao longo de séculos, que a desigualdade na distribuição de rendimentos aumenta sempre que a taxa de retorno do capital é superior à taxa de crescimento da economia, que em consequencia existe acumulação de capital no seio dos 1% mais ricos em detrimento da maioria, aumentando a desigualdade.

http://en.wikipedia.org/wiki/Capital_in_the_Twenty-First_Century

Os comentadores televisivos de direita e os propagandistas do atual governo andam em pânico com o sucesso internacional do livro, mas não conseguem contestar os dados e a interpretação dos dados.
Fundamentalmente porque ele diz e prova o mesmo que  livros como os donos de Portugal e como os sindicalistas e os não sindicalistas das manifestações contra os cortes vêm dizendo: que a economia desregulada (os mercados...) conduz ao pagamento das emergencias pelos salários e pelas pensões (até o senhor doutor Catroga, na entrevista ao DN de 10 de maio de 2014 o diz: "as pessoas, nos países endividados,...são quem tem de financiar os custos do ajustamento") e ao reforço da direção da economia pelas famílias ricas e suas dinastias e pelos super-assalariados que os servem, como os funcionários do FMI e do BCE (isto é, oligarquia e plutocracia, ao invés de democracia; não é possível ter simultaneamente desigualdade e democracia).

E mais em pânico ficam quando Piketty propõe uma medida mitigadora: a taxação progressiva sobre os rendimentos dos capitais (seria esta a ameaça do atual primeiro ministro no caso do chumbo de medidas pelo tribunal constitucional?).
Lá vão os comentadores e propagandistas do governo (aguarda-se a reação de João Cesar das Neves, embora o papa Francisco também não goste de fossos de desigualdade) ameaçar com a fuga dos capitais para a Holanda, Inglaterra e restantes off-shores (a menos que os respetivos governos e os eurocratas tenham lido o livro). Talvez achem que Piketty é marxista e contentam-se em mandá-lo para o inferno e pô-lo no index.
Podiamos começar pelo fim do sigilo bancário. Numa altura em que o comércio ilegal internacional de armas, droga, escravatura e matérias primas é feito de sangue, não seria mau começar por aí.
Que dirá Ban-ki-moon?
Ou podiamos ser mais modestos, em Portugal. Acelerar a taxa Tobin e, de forma inovadora, transformar, por exemplo, 40% da valorização bolsista dos donos de Portugal em propriedade do Estado com fins exclusivos de transação na bolsa e injeção dos proveitos na segurança social. Poupava nas transferencias, não se ia aos depósitos das grandes fortunas, cumpria-se a sugestão de Piketty, combatia-se a desigualdade, não era?
Podia-se discutir isto na campanha eleitoral para 25 de maio...

Curioso reparar na reação do senhor ex-ministro João Salgueiro quando se saiu no programa Olhos nos olhos, perante o espanto de Judite de Sousa e o silencio cumplice de Medina Carreira, que "os últimos dados não dizem que a desigualdade tenha aumentado". Cumplice porque os indicadores de pobreza e o coeficiente de Gini dão resultados diferentes se modificarmos os patamares definidores da pobreza (90 centimos por dia) e a paridade do poder de compra.
Devia mesmo discutir-se isto na campanha eleitoral.

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