Caro Deputado
Hugo Costa
Caros
Deputados da CEIOPH
Tomámos
conhecimento com satisfação da realização do fórum parlamentar
hispano-português em 4 de outubro.
Os temas
tratados vêm ao encontro das preocupações de muitos de nós e a tomada de
medidas concretas e não contemporizadoras é indispensável para o crescimento
económico e o bem estar dos cidadãos.
No domínio
das interligações ferroviárias com a Europa vimos novamente (foi-nos concedida
uma audiência em abril de 2021), agora no contexto da próxima cimeira de 28 de
outubro, solicitar os esforços da CEIOPH no sentido da alteração da
estratégia de exclusividade da bitola ibérica e promoção do cumprimento dos
objetivos da rede única europeia TEN-T conforme expresso nos regulamentos 1315
e 1316/2013 segundo os padrões totais da interoperabilidade, que envolvem,
entre outros, a bitola e o ERTMS.
Tais
objetivos obrigam a uma intensa coordenação com os nossos vizinhos espanhóis e
a uma posição firme nas negociações para que Espanha não constitua um obstáculo
às trocas comerciais com o resto da Europa, imperativo partilhado com as
interligações energéticas de eletricidade e gás, e na gestão da água.
Como justificação da nossa pretensão enumeramos:
- A
natureza vinculativa dos regulamentos da UE, isto é, são lei. Embora o
ECA (Court of European Auditors, o
Tribunal de Contas Europeu) sublinhe a competência dos Estados Membros em
definir as datas de execução, não deixa de referir que os regulamentos são
linhas de orientação vinculativas. Verificando-se contemporização por
parte da CE, da DG MOVE e do próprio coordenador do corredor atlântico, o
qual reconhece com displicência que em 2030 Portugal e parte significativa
de Espanha não estarão ligados em bitola UIC ao resto da Europa, cabe-nos
denunciar esta situação ilegal que não pode ser ultrapassada com lisura
apenas alterando a letra no processo de revisão dos regulamentos.
Não se contesta a maior parte das
meritórias ações em curso de recuperação da rede e do material circulante
existentes, mas não podemos aceitar a obstrução por omissão, quer em Portugal
quer em Espanha, à introdução da bitola UIC e do ERTMS no corredor atlântico,
que permitiriam aumentar as exportações.
Compreendemos a estratégia concertada pela IP com os operadores privados de transporte
de mercadorias (cuja competência não se põe em causa) e defendida pela IP nos
agrupamentos europeus de interesse económico AVEP (Alta velocidade Espanha
Portugal) e RFC4 (corredor atlântico anterior ao regulamento 1315) de que fazem
também parte a ADIF, a SNCF e a DB.
Os constrangimentos financeiros convidam a adiar os investimentos e
paliativos como travessas polivalentes ou eixos variáveis ajudam a esconder o
problema, mas o objetivo 2030 é uma lei da UE que deve ser cumprida, beneficiando
do financiamento comunitário e, se necessário, da aplicação da regra
vinculativa da subsidiariedade quando localmente não há recursos ou capacidade
para a execução.
- As exportações portuguesas por todos os modos
para a Europa além Pirineus ultrapassam já, segundo as estatísticas do
INE, o valor das exportações para Espanha (o facto de em tonelagem isso
não acontecer mostra que os produtos para Espanha têm menor valor
acrescentado).
O valor das
exportações por todos os modos para a União Europeia em 2020 (em milhões
de euros: 15,3 com origem na região norte, 8 na região centro, 13,3 na região
sul) justifica a proposta dos dois corredores norte e sul do corredor atlântico , juntamente
com o imperativo do regulamento 1316 de transferência do modo rodoviário de
mais de 300 km para o modo ferroviário. Para este objetivo considera-se
essencial, a exemplo de Espanha, promover o transporte de camiões ou de
semirreboques em vagões de caminho de ferro.
O porto de Sines, se
ligado à Europa segundo os padrões da interoperabilidade poderá também
desempenhar um papel importante no crescimento da economia nacional,
considerando as perspetivas de industrialização da região e que a viagem de
barco até Hamburgo, Roterdão ou Antuérpia pode ultrapassar dois dias enquanto
uma ligação ferroviária a Mannheim, segundo aqueles padrões, poderá ser cerca
de um dia e meio.
Recordamos o projeto
Poceirão-Caia em bitola UIC cujo valor negociado foi inferior a 1500 milhões de
euros e com garantia de um financiamento comunitário de 60% . A aquisição pelo
Estado dos direitos do projeto de execução do consórcio ELOS para a ligação
Poceirão-Caia, em vez do pagamento da indemnização por anulação do contrato,
poderia ser um momento decisivo no arranque de uma nova política, conducente à
viabilização numa primeira fase da ligação em alta velocidade Pinhal
Novo-Madrid e de mercadorias Sines/Setúbal-Madrid em bitola UIC e ERTMS .
- A construção de linhas novas, em que a diferença
de custos de instalar bitola ibérica ou bitola UIC é irrelevante, permite,
por redução das pendentes e das curvas, ganhos energéticos e redução de
emissões de gases com efeito de estufa significativos, como aliás estudos
da IP confirmam, bem como
uma superior competitividade tanto no transporte de passageiros como de
mercadorias.
Compreende-se a atribuição por
Espanha de um menor grau de prioridade em garantir um percurso em bitola UIC
para os comboios de passageiros ou de mercadorias de Portugal para a
Europa (ou de garantir uma ligação ferroviária Lisboa-Madrid competitiva
com o avião) dado que Portugal não oferece continuidade dessas linhas em
bitola UIC no território português. Esta razão e a necessidade em Espanha de
priorizar investimentos gerou o interesse em investir primeiro no
corredor mediterrânico e no Y basco (este integrado no atlântico). No entanto,
por razões de coesão nacional nenhuma região de Espanha será marginalizada,
prevendo-se posteriormente a extensão da rede de bitola UIC a todas as regiões
de Espanha. É assim inaceitável a manutenção da natureza periférica da ferrovia
nacional, por mais cordatas, mas contemporizadoras, que possam ser as
declarações da comissária europeia dos transportes ou do coordenador do
corredor atlântico em eventos como os do 2021 Year of the Rail.
Ainda contra
o argumento por demais utilizado de que Espanha nada faz para melhorar a sua
ligação em UIC ao resto da Europa, permitimo-nos enviar duas ligações em que se
pode ver o entusiasmo e a mobilização com que é tratado o desenvolvimento do
corredor mediterrânico, em contraste com o atlântico:
https://elcorredormediterraneo.com/estado-de-las-obras/
Recordamos
ainda os pareceres críticos do ECA sobre a ineficiência da Comissão Europeia
nos trabalhos de implementação da rede única europeia ferroviária nos
relatórios de 2016 e de 2020 (ver neste último a página 8 com o mapa das redes
TEN-T incluindo o corredor atlântico a amarelo, e a página 19 relativa à
Península Ibérica):
https://www.eca.europa.eu/Lists/ECADocuments/SR16_08/SR_RAIL_FREIGHT_PT.pdf
https://www.eca.europa.eu/Lists/ECADocuments/SR20_10/SR_Transport_Flagship_Infrastructures_EN.pdf
Caso os deputados da CEIOPH queiram
aprofundar ou encarregar assessores de o fazer, poderão encontrar mais
informação em:
https://1drv.ms/w/s!Al9_rthOlbweviVamDcu4_uspt3j?e=BdjXbe
V.Exas
perdoarão a assertividade do que afirmamos, mas a estratégia seguida pelo XXII
Governo não serve o interesse público e compromete, dado o prazo longo de
execução de grandes investimentos, o cumprimento dos objetivos dos regulamentos
1315 e 1316 de integração na rede única europeia e de redução das emissões de
gases com efeito de estufa.
A construção dos 2 ramos
nacionais/internacionais do Corredor Atlântico (Aveiro-Salamanca e
Sines/Lisboa-Badajoz) é urgente, dada a melhoria tanto da nossa competitividade
externa daí resultante como da acessibilidade internacional que é um dos
fatores essenciais para a atração de investimento industrial internacional e de
fixação e crescimento económico.
A Assembleia da República, com
competências definidas na Constituição no ordenamento do território e na apreciação
da construção da União Europeia, constitui assim, através da CEIOPH, uma
esperança de mudança favorável ao crescimento económico.
Estamos ao
vosso dispor para esclarecimentos adicionais
Lisboa 20 de
outubro de 2021
Arménio Matias engenheiro. ex presidente da CP
Eugénio Sequeira engenheiro, ex presidente da Liga de Proteção
da Natureza
Fernando Mendes engenheiro, empresário
Fernando Santos e Silva engenheiro, ex técnico do metropolitano de
Lisboa
Henrique Neto empresário
Luis Cabral da Silva engenheiro, ex
técnico da REFER
Manuel Ferreira dos Santos engenheiro
Mario Lopes engenheiro, professor universitário do IST
Mario Ribeiro engenheiro, ex técnico da TAP
Rui Rodrigues consultor de transportes