segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Parecer sobre o RECAPE (relatório de conformidade ambiental do projeto de execução) do lote 2 - Construção dos toscos da estação Santos (inclusivé, a Cais do Sodré)

 

 https://participa.pt/pt/consulta/projeto-e-construcao-dos-toscos-lote-2-execucao-dos-toscos-entre-a-estacao-santos-e-c-sodre

RECAPE Lote 2 - parecer

O presente parecer é uma discordância e uma reclamação pelos mesmos motivos já expressos nos comentários aos RECAPE dos lotes 1 e 3 que não mereceram acolhimento pela APA. É emitido apesar de não esperar que seja considerado, no exercício do direito de liberdade  de expressão consagrado na Constituição da República, reclamando ao mesmo tempo, no exercício do direito à informação e à participação em assuntos públicos, igualmente consagrado na CRP:

- a divulgação pública dos estudos de procura e de viabilidade repetidamente citados pelo Governo e pelo Metropolitano de Lisboa como justificativos da opção pela linha circular e nunca divulgados apesar do pedido explícito da Assembleia Municipal (recomendação 122/04 de novembro de 2020)

- a correção pública dos erros do EIA, sobre o qual se baseia a DIA, o TUA e o RECAPE, com as subsequentes inconsistências, nomeadamente:

- a incompatibilidade clara do plano de 2009 e traçado da linha circular com as diretrizes do PROTAML de 2002 que previam o prolongamento da linha amarela para Alcântara, para correspondência com a linha de Cascais em Alcântara Mar (aliás, o próprio PDM  e o PAMUS em 2016 não previam a linha circular, antes o prolongamento a Alcântara)

- a interpretação abusiva, ardilosa e repetida de que basta um despacho ministerial (MOPTC, 2009-09-11) para legitimar um plano de expansão, quando um plano de mobilidade exige uma consulta pública e não apenas a apresentação de projetos de expansão para câmaras adjacentes a Lisboa sem prioridades definidas, nos termos da CRP relativos à participação dos cidadãos nos assuntos públicos. O referido plano ficou inerte até 2016 quando a Secretaria de Estado Adjunta do Ministério do Ambiente o repristinou incumbindo o metropolitano de estudar comparativamente a ligação Rato-Cais do Sodré com o prolongamento a Campo de Ourique da linha vermelha sem qualquer estudo ou consulta pública para avaliar outras prioridades (curiosamente, a estação Estrela estava integrada na linha vermelha, por razões técnicas ligadas à diminuição da sua profundidade comparativamente com a localização agora prevista). Se o argumento da suficiência de um despacho fosse válido, deveriam repristinar-se os projetos da terceira travessia do Tejo e a alta velocidade Poceirão-Caia, seus contemporâneos

- a falsidade que o aumento da frequência de comboios é assegurado pela linha circular relativamente a linhas independentes, quando os principais fatores são a disponibilidade de maquinistas, material circulante e sistema de controle de circulação

- a falsidade que são atualmente necessários dois transbordos na rede de metro para ir de Cais do Sodré para a zona do Saldanha, quando basta um, pela linha verde e correspondência em Alameda com a linha vermelha

- a omissão de que uma linha circular sem términos intermédios flexíveis, como é o caso, tem maiores dificuldades de recuperação após perturbações do que duas linhas independentes equivalentes, bem como um índice de fiabilidade inferior

- a menorização artificial do volume de passageiros da linha de Odivelas obrigados a fazer o transbordo em Campo Grande, por comparação com o volume de passageiros em Cais do Sodré que atualmente tomam o metro

- desvalorização pelo Governo, APA e Metropolitano de Lisboa das movimentações de  cidadãos que originaram as petições na AR e que se sentem prejudicados pela opção da linha circular.

 

Relativamente à expressão “fora do âmbito do RECAPE” no anterior RECAPE do lote1 relativa a fatores contrários à opção linha circular, observo que as avaliações ambientais pressupõem um conceito abrangente da engenharia ambiental que implica a consideração das outras engenharias, neste caso da engenharia dos transportes incluindo as vertentes de operação e de manutenção, porque a deslocação de elevados volumes de passageiros é um fenómeno de grande impacto ambiental. Daí os fatores negativos da linha circular relativos às dificuldades de operação e, no troço do lote 2, à agravante dos encargos de manutenção devidos às curvas de pequeno raio e ao declive elevado. Não deverão por isso ser considerados “fora do âmbito do RECAPE”; será um precedente para procedimentos abusivos e ardilosos em que basta deixar erros do EIA por corrigir para obter a validação de um projeto. Assinalo ainda neste domínio a maior pegada ecológica na construção do túnel, não referida no EIA, do método de escavação escolhido com alimentação por combustível diesel, quando comparado com o método TBM com alimentação elétrica, por maioria de razão no “âmbito do RECAPE”.

Explicito ainda que não são só as incorreções e omissões do EIA que por si só justificariam pelo menos a suspensão e uma auditoria  à decisão de avançar com a linha circular (a implementar mediante concurso público internacional para evidência dos procedimentos corretos para observância futura, não para apuramento de responsáveis), mas também porque a lei 2/2020 de 2020-03-31 da Assembleia da República expressamente o determinava (negociando evidentemente com os empreiteiros essa suspensão, embora a ignorância de uma lei não seja desculpa para ninguém). Efetivamente, o art.282 determinava que o Governo promovesse as medidas necessárias para o metropolitano suspender a construção da linha circular, para dar prioridade ao prolongamento a Alcântara  e para a elaboração do plano de mobilidade da AML. Seguiu-se a assinatura dos contratos para os 3 lotes e a obtenção dos vistos do TdC em claro desrespeito da lei, que, como o próprio nome indica, não era uma recomendação, era uma lei, por mais respeito que mereça quem disser que é uma recomendação. As verbas comunitárias previstas poderão ser aplicadas noutros investimentos (a concluir até 2023) e a renegociação dos contratos poderá passar pela transferência da adjudicação para a adaptação das estações em falta à acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida conforme o art.283 da lei 2/2020 e, como referido, na sequência de concurso público internacional para auditoria do procedimento e de outro concurso público internacional para elaboração em 12 meses do plano de mobilidade da AML (incluindo avaliação do prolongamento para Alcântara na vertente de correspondência cómoda com a linha de Cascais em viaduto).

Não parece portanto sustentável continuar a justificar a linha circular.

Especificamente sobre o lote 2 refiro:

- a documentação no site “participa” não está identificada na lista documentos pelos conteúdos dos documentos, o que dificulta o acesso (o Vol.III – Interferências e instrumentação, por exemplo, encontra-se na lista em 17º lugar em “anexos” sem qualquer designação ou referência ao seu conteúdo, tal como os outros volumes)

- a executar-se o lote2 como previsto, perde-se a oportunidade de fazer uma ligação pedonal inferior, sob a av.24 de julho, entre o lado norte da avenida, o novo átrio e a zona da margem norte do Tejo, contrariando o desígnio de facilitar o acesso dos cidadãos ao rio

- em relação ao plano de instrumentação para monitorização da estabilidade dos edifícios e terrenos, não se identificam, salvo falha minha, os meios disponíveis em permanência para intervir para estabilização dos terrenos e contenção de danos nos edifícios com injeções de betão e microestacas, sugerindo que seja aumentada pelo menos para de 2 em 2 dias a frequência de leitura dos sensores, e a colocação destes pelo menos até 100 m de distancia da escavação (o que provavelmente conduzirá à reavaliação de edifícios considerados fora da zona de influencia no quadro das medidas de mitigação do vol.III)

- embora encarecendo a obra, será possível manter a circulação dos elétricos 25 entre o largo de Santos e a rua da Boavista, eventualmente em túnel e não a céu aberto (que aliás poderia ser compatível com aquela circulação)  nem que seja em via única, pelo que sugiro a adaptação do projeto

- conviria divulgar publicamente a identificação dos edifícios cujas fundações serão recalçadas e o respetivo calendário para desocupação temporária

- sugiro a indicação da altura mínima de 2 m das tomadas de ar e grelhas de extração dos ventiladores principais de estação e de meio troço, para além dos referidos no RECAPE níveis máximos de ruído (55 dB), medida de natureza especificamente ambiental.

 

Leituras adicionais :

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2018/01/ultima-tentativa-ultima-chamada-da.html

 

 

 


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