domingo, 15 de agosto de 2010

O problema de Fermat-Weber da localização ótima e das distancias ponderadas, a lei de Zipf e a conjetura de Manfred Ruder sobre o traçado de novas linhas de metropolitano

'


Eis um título digno de um dia quente de verão, duma apresentação num congresso de transportes, com os distintos técnicos assistentes a encomiar a organização e os conferencistas.
Mas neste blogue, é apenas a evocação de dois artigos do prof.Buescu na revista da Ordem dos Engenheiros, Ingenium, e do resultado da visita de um colega de um metropolitano alemão a Lisboa, numa passada reunião da UITP.

1 – o problema de Fermat-Weber – Trata-se, por exemplo, de encontrar a localização ótima de um armazém ou de um hipermercado que sirva 3 cidades, ponderando o número de habitantes de cada cidade, de modo a minimizar as deslocações.
Seja A uma povoação com 10.000 habitantes, B também com 10.000 e C com 15.000 habitantes. A, B e C formam um triangulo equilátero. P é o ponto de localização ótima.


Feitas as contas para a minimização das distancias ponderadas com a habitação, verifica-se que, muito pouco democraticamente, o ponto P coincide quase com C, a povoação que pouco mais tem do que 40% do total de habitantes.
Deve notar-se que o ponto de vista do interesse é aqui o do dono do hipermercado. A ótica do interesse global da comunidade (obviamente um supermercado em cada povoação) já foi tratada noutra mensagem deste blogue  (ver em 2 de Janeiro de 2010, em
  http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/01/economicomio-xxxvi-economia-dos.html  )
e não coincide, pese o idealismo adamsmithista, com o interesse do distribuidor (que vai chamar a atenção para as economias de escala e da centralização).
O problema de Fermat-Weber demonstra a atracão que um ponto de ponderação mais importante exerce sobre uma ação comum.
Exemplifica a concentração em grandes cidades dos recursos de um país.
2 – A lei empírica de Zipf – na origem da lei de Zipf está a verificação de que a frequencia de utilização das palavras mais usadas, em qualquer texto, é muito maior do que a das palavras menos usadas.
É mais uma partida pouco democrática que a matemática prega às comunidades, porque a generalização desta lei conduz à lei da dimensão das cidades de um país: a cidade mais populosa pode ter o dobro da segunda cidade, o quádrupulo da terceira e por aí fora. Trata-de de uma função proporcional a uma potencia cujo expoente é negativo (proporcional ao inverso da potencia), correspondendo a base ao número de ordem da cidade ou elemento

3 – a conjetura de Manfred Ruder – Durante uma visita de trabalho a Lisboa, Manfred Ruder verificou que o principal problema do Metropolitano de Lisboa era a desertificação da cidade e o não crescimento do número de passageiros transportados. Assim, para aumentar o volume de negócios e as receitas do metropolitano, embora correndo o risco de aumentar também as despesas enquanto o passe social não deixar que as receitas cubram as despesas de operação, terão de se procurar passageiros onde eles existam construindo linhas que os vão buscar, ou incentivar claramente o “repovoamento” (como diria D.João II e os seus ministros) de Lisboa.
Isto é, Lisboa, aproximando-se rapidamente dos 500.000 habitantes (em 1980 tinha 800.000 habitantes) está a desobedecer claramente à lei de Zipf, embora o conjunto da área metropolitana de Lisboa não o faça.
As próprias freguesias de Lisboa, em termos de grandeza de habitação, estão também a fugir à lei.
Na simplicidade da voz popular de alguns presidentes de câmara dos municípios envolventes de Lisboa, ou de presidentes de juntas de freguesia de Lisboa, está-se a viver um movimento de novas centralidades, que mais não são do que exemplos da atração do ponto P pelo ponto C do desenho acima.
A conjetura de Manfred Ruder diz que, para aumentar as receitas através do aumento de passageiros transportados, as novas linhas que vierem a ser projetadas terão de considerar, por um lado, a forte atração dos novos núcleos de população crescente (exemplo: a zona da Expo, que neste momento absorve os serviços anteriormente instalados na Baixa; os grandes baisrros suburbanos e as zonas industiais dos municípios envolventes de Lisboa), e por outro, a necessidade de implementar medidas contrariando esta tendência (medidas essas de natureza democrática, tendo em conta o interesse da comunidade em perspetiva integrada).
Por outras palavras, a conjetura diz que, se as novas linhas seguirem o movimento de crescimento das zonas da matriz emprego/habitação, em vez de reabilitar o tecido urbano pré-existente (incluindo as atividades industriais), a deslocação do ponto P continuará a afastar-se do centro da cidade, rarefazendo o movimento de passageiros no interior dos limites do município de Lisboa . Por outro lado, se se densificar a oferta de novas de linhas de metro no interior desses limites, corre-se o risco de a procura dos passageiros não corresponder à oferta (isto é,  o "repovoamento" e a redinamização industrial e de serviços do centro de Lisboa não depende apenas de novas linhas de metro).
É possível que a conjetura de Manfred Ruder tenha alguma verdade porque, por exemplo, no movimento do transporte individual, estima-se (estima-se porque se aguarda a realização de inquéritos confiáveis) que entre 400.000 a 600.000 automóveis entrem diariamente no município, mas que 60 a 70% serão tráfego de travessia.
O que quer dizer que grande parte de cidadãos ativos trabalha num ponto da matriz fora dos limites do município, mas habita noutro ponto também fora desses limites.
Da conjetura se conclui que, para reduzir o tráfego do transporte individual, substituindo-o por transporte metropolitano de melhor rendimento energético e menores emissões de CO2 por passageiro.km, haverá que projetar novas linhas exteriores aos limites do município.
Porém, tal como se verificava com a localização dos hipermercados, se quisermos economizar a nível global (neste caso, a nível da área metropolitana da grande Lisboa) a energia das deslocações, teremos de adotar medidas que contrariem a tendência de desertificação, como por exemplo a instalação de serviços na Baixa, de algumas industrias e oficinas nos Bairros de Lisboa, de demolição parcial de habitações antigas para emparcelamento e reabilitação das habitações (paradoxalmente, a existência de parques de estacionamento automóvel particulares nos edificios de habitação gera a fixação no interior de Lisboa).

Conclusão: as observações de Manfred Ruder constam dos relatórios da UITP, que não se cansam de destacar a importância e a interdependência das politicas de urbanismo das cidades no planeamento das redes de transporte.
Em Lisboa, tudo indica que é um campo de atuação privilegiado para a Autoridade da Área Metropolitana de Transportes e para os seus técnicos, em articulação com a Autoridade Metropolitana das câmaras da sua área. E seria um ótimo campo para aplicação das metodologias da "Sabedoria das Multidões" de James Surowiecky.
Esperemos que o seu trabalho seja frutífero.


_____________________

Sem comentários:

Enviar um comentário