Montaigne, pensador francês do século XVI, autor da frase "o proveito de um é o prejuízo do outro".
Adam Smith e David Ricardo, economistas do classicismo da economia vieram dizer o contrário, que a necessidade de um se encontra harmoniosamente "no mercado" com a oferta do outro, e que de vantagens comparativas se faz um negócio vantajoso para o vendedor e para o comprador.
Talvez Montaigne tenha intuido o que ia acontecer, ou simplesmente observou a realidade, em vez de a querer subordinar a leis ideais.
Tal como La Fontaine o fez, quando ilustrou a lei da selva, com o lobo a defender a sua liberdade, sua dele, de comer o cordeiro.
Dificilmente se encontram mercados ideais.
A ideia pura dos mercados acaba por ser inquinada pela dureza da realidade através da assimetria de informação que permite negócios de elevada rentabildade mas só para alguns, através da escassez que permite aberrações de desenvolvimento económico assentes nas caraterísticas limitadas e não renováveis dos combustíveis fósseis, através das externalidades da afetação de todos por uma atividade proveitosa para apenas alguns, como as alterações climáticas devidas à emissão de CO2 ou o aumento de epidemias ou da mortalidade por dificuldade de acesso das populações mais carenciadas aos cuidados de saúde.
A verdade é que os sistemas económicos entregues a si próprios estimulam o desenvolvimento continuado dos fortes relativamente aos fracos.
Não vale a pena negar a história e as suas evidencias.
É a lei de Fermat-Weber.
Embora valha a pena os economistas que seguem as ideias dominantes do BCE e do eixo franco-alemão repetir os dogmas do neo-liberalismo muitas vezes, porque uma mentira repetida muitas vezes é percecionada como verdade.
A corrente dominante vai continuar a conter os preços em vez de controlar uma ligeira inflação que estimulasse o consumo e a produção.
As infra-estruturas vão continuar estagnadas, o desemprego vai continuar a aumentar, bem como o índice de desigualdades sociais, o abandono escolar, a criminalidade e a mortalidade.
Montaige também escreveu: "o que me admira não é a sabedoria dos políticos no poder, o que me admira é a multidão de admiradores que têm".
Como já não se fazem revoluções no nosso bairro, e os economistas dominantes conseguiram atrair a maioria dos eleitores e se recusam a aceitar estes argumentos, resta-nos ler Montaigne, século XVI:
O proveito de um é o prejuízo do outro
O ateniense Dêmades condenou um homem da sua cidade que tinha por ofício vender as coisas necessárias para os enterros, sob a alegação de que exigia um lucro excessivo e esse lucro não lhe podia vir sem a morte de muitas pessoas. Tal julgamento parece estar mal pronunciado, na medida em que não se obtém benefício algum a não ser com prejuízo de outrem, e que dessa maneira seria preciso condenar toda a espécie de ganho.
O mercador só faz bem os seus negócios por causa da devassidão dos jovens; o lavrador, pela carestia dos cereais; o arquitecto, pela ruína das casas; os oficiais de justiça, pelos processos e contendas dos homens; mesmo as honras e a actividade dos ministros da religião provêm da nossa morte e dos nossos vícios. Nenhum médico se alegra com a saúde mesmo dos seus amigos, diz o antigo cómico grego, nem o soldado com a paz da sua cidade; e assim sucessivamente. E o que é pior: cada um sonde dentro de si mesmo, e descobrirá que a maioria dos nossos desejos íntimos nascem e alimentam-se às expensas de outrem.
Considerando isso, veio-me à mente que nisso a natureza não contradiz a sua organização geral, pois os naturalistas afirmam que o nascimento, desenvolvimento e aumento de cada coisa são a alteração e degeneração de uma outra: Pois quando algo se transforma e muda de natureza, imediatamente há morte no objecto que existia antes (Lucrécio).
(de http://www.citador.pt/)
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