Mais um episódio da tormentosa novela do acordo ortográfico de 1990.
Foi editada a obra integral de António Vieira, sermões e cartas, segundo o novo acordo.
Os opositores ao novo acordo marcaram uma manifestação de protesto na sessão de apresentação da obra (a obra completa serão 30 volumes e resulta de uma cooperação de universidades portuguesas e brasileiras).
Toda esta questão é interessantissima, por mostrar a paixão com que os portugueses se entregam a discussões bizantinas e se baseiam em pormenores acessórios, e não me parece bizantinice tentar investigar por que as pessoas gostam de discussões bizantinas.
Há dias, tive a ousadia, por não ter gostado de que o grande poeta Vasco Graça Moura me tivesse chamado pantomineiro em artigo no DN (fê-lo de forma indireta e generalista, claro) de tentar analisar por que nesta discussão as pessoas se ofendem:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2013/01/a-tormentosa-novela-do-acordo.html
E de facto, basta consultar os blogues em que se discute o acordo para ver a facilidade com que os opositores se ofendem e o barulho que se faz por questões que me parecem menores mas que a outros parecem essenciais e indispensáveis à identidade nacional.
Que ficamos sem saber se "para" é do verbo parar ou se é a preposição. De facto é uma armadilha para quem está a ler, ter de olhar ao contexto, mas isso já acontecia com "conserto" (verbo consertar) e "conserto" (arranjo), "sede" (de água) e sede (de uma firma), gelo (verbo gelar) e gelo (água congelada). O dicionário Houaiss sugere, em caso de dúvida, que o autor escreva entre parenteses (á) no caso do verbo parar. Outra hipótese seria escrever "ah" ou, já que os opositores ao novo acordo chamam ignorantes a quem concorda com ele, "aa", para recordar como se escrevia e falava na idade média portuguesa (vêde como são abertas as vogais no norte do país). Na verdade, parece-me boa ideia eliminar os acentos que sempre complicam os teclados, mas o novo acordo não é tão radical que o faça na totalidade. Mas é apenas uma opinião, não a quero impor nem desconsiderar quem não concorde com ela.
A mim, em caixas de comentários, chamaram-me cabeça de alho chocho, e que Camões devia voltar para me trespassar com a sua espada (que dirá agora este ilustre e bem educado cidadão de quem pôs Vieira a escrever segundo o novo acordo?).
Vamos ver como evolui esta novela, na esperança de que a capacidade de entendimento entre os portugueses melhore, e que não se ofendam tanto uns aos outros.
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