segunda-feira, 30 de novembro de 2009
Religo III – Frei Miguel Contreiras
Religo III – Frei Miguel Contreiras
Divertidíssima a descoberta do que já se sabia.
Que não há documento histórico que prove a existência de Frei Miguel Contreiras, apresentado como fundador da Santa Casa da Misericórdia e confessor da rainha Dona Leonor.
O primeiro documento histórico de que se dispõe, referindo este Frei Miguel Contreiras, data de mais de 70 anos depois da sua suposta morte (i.é, quando à face da lei actual os seus direitos de autor teriam caducado).
Fica assim como mais provável a hipótese de que terão sido os frades da ordem da Trindade a criar o mito para obter do papa a manutenção da sua ordem e a importância do seu papel na vida das Misericórdias.
Seria interessante aplicar o mesmo método científico à comprovação da existência histórica das personagens religiosas e nacionais que tanto acarinharam a nossa infância, ver os testemunhos históricos de outras fontes…
A própria igreja católica já riscou muitos santos do seu hagiológio, por exemplo Santa Filomena.
E aqueles episódios de intervenção divina nas batalhas de Ourique e dos Atoleiros, que não sendo protagonizados por personagens fictícias, tão bem representam a capacidade de enganar as populações? Certamente em nome de uma boa causa…
A criação artificial de figuras também se justifica pelas boas causas.
Por exemplo, o matemático Nicolas Boubaki. Durante muitos anos, já na segunda metade do século XX, assinou artigos que fizeram avançar a matemática moderna. Foi muito respeitado pela comunidade científica, mas não existia; era o pseudónimo de um grupo de matemáticos franceses. Dos melhores exemplos do que é uma inteligência colectiva, sem génios condutores de homens. Que os deuses nos livrem dos grandes génios, ou, como dizia Camões, das maravilhas fatais que nos governam (Camões não pedia aos deuses que nos livrassem das maravilhas fatais que nos governam, que isso a Inquisição não iria deixar, mas chamava maravilha fatal a quem governava os cidadãos da época; foi, na verdade, fatal, D.Sebastião).
Vem-me também à ideia o Tenente Kije.
Kije entrou para o exército do czar Paulo I de todas as Rússias como oficial da sua guarda, em consequência de uma confusão de pronuncia que o secretário do czar não teve coragem de desfazer depois de o czar aprovar o tenente Kije (em russo “tenente Kije” pronuncia-se de forma muito semelhante à de “os tenentes, contudo” )
O tenente Kije fez comissões de serviço na Sibéria, casou, teve filhos, ganhou medalhas em batalhas, foi promovido. Quase como o nosso santo António, quase coronel do exército português.
O tenente Kije é uma novela de Iuri Tinianov, dos soviéticos anos 20, que foi passada ao cinema em 1934 com música de Prokofief. Ver acima o cartaz do filme. O mesmo Prokofief que respondeu a Estaline, depois deste o ter criticado por não achar a sua música politicamente forte: e eu não acho a sua política musicalmente forte. Coisa que é aplicável a muitos bons governantes.
Não percam a música do tenente Kije e não deixem de ir ao Teatro Maria Matos e aos cinemas King, na Av.Frei Miguel Contreiras.
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Educação VIII - A cimeira ibero-americana
Prolongo a mensagem de Sofia de Melo Breyner sobre a necessidade da educação indiscriminada de todos os cidadãos. O presidente de El Salvador , Maurício Funes, tem um rasgo de lucidez e diz aos seus confrades:
“Abrir a porta à Educação não é uma questão de ideologia, é uma questão de sobrevivência … é a única possibilidade de grande parte da população sair da pobreza”.
É assim tão difícil de entender, ou não querem mesmo que grande parte da população saia da pobreza ? (da pobreza, da taxa de natalidade excessiva, do seguidismo da tradição alienante, do aproveitamento pelas organizações religiosas, da exploração pelos critérios adam smithistas, etc. etc, mas depois dizem que escrevo por questão de ideologia…)
“Abrir a porta à Educação não é uma questão de ideologia, é uma questão de sobrevivência … é a única possibilidade de grande parte da população sair da pobreza”.
É assim tão difícil de entender, ou não querem mesmo que grande parte da população saia da pobreza ? (da pobreza, da taxa de natalidade excessiva, do seguidismo da tradição alienante, do aproveitamento pelas organizações religiosas, da exploração pelos critérios adam smithistas, etc. etc, mas depois dizem que escrevo por questão de ideologia…)
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Religo II - Castrati
Oiço na Antena 2 um programa sobre os castrati, com as descrições pormenorizadas da selecção e da “operação”dos pobres moços, entre os 8 e os 10 anos, comprados aos pais (engraçado pensar, guardadas as devidas distâncias à barbárie sanguinária, nas semelhanças com o apoio de alguns pais aos filhos candidatos às carreiras artísticas na televisão e à carreira futebolística, em detrimento da escola) .
Consta que até o Marquês de Pombal meteu uma cunha em Itália para mandar vir um castrato de sucesso para cantar na corte portuguesa.
É que a Igreja proibia a actuação pública de cantoras (século XVIII, século das luzes).
E o interessante é que o programa passou uma gravação histórica do último castrato.
O que quer dizer que não foi assim há tantos anos que deixou de se castrar crianças com boa voz para cantar a música religiosa.
Pobre também dos chefes da Igreja católica, terem mais esta no seu currículo, quando dá tantos jeito acusar outras religiões de retrocesso.
Ver no sítio de Cecília Bartoli, cantora mezzo-soprano, o anúncio do seu CD “Sacrificium”, com música para castrati.
http://www.ceciliabartolionline.com/cms/homepage.html
Consta que até o Marquês de Pombal meteu uma cunha em Itália para mandar vir um castrato de sucesso para cantar na corte portuguesa.
É que a Igreja proibia a actuação pública de cantoras (século XVIII, século das luzes).
E o interessante é que o programa passou uma gravação histórica do último castrato.
O que quer dizer que não foi assim há tantos anos que deixou de se castrar crianças com boa voz para cantar a música religiosa.
Pobre também dos chefes da Igreja católica, terem mais esta no seu currículo, quando dá tantos jeito acusar outras religiões de retrocesso.
Ver no sítio de Cecília Bartoli, cantora mezzo-soprano, o anúncio do seu CD “Sacrificium”, com música para castrati.
http://www.ceciliabartolionline.com/cms/homepage.html
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sábado, 28 de novembro de 2009
Educação VII - Sofia de Melo Breyner
Oiço na Antena 2 uma entrevista de Sofia de Melo Breyner.
Cito de cor: Do ponto de vista cultural estamos divididos em castas. É uma alienação cultural e uma discriminação entre as pessoas que impede que o que se escreve seja entendido por todos. Só o ensino poderá fazer a desalienação, para que as pessoas compreendam.
Subscrevo, mas se bem interpreto, isto quer dizer que as escolas devem ser eficientes para todos, sem “rankings”, porque todas têm de ser boas.
Infelizmente, continua a vigorar o conceito mazdeista de bons e maus.
Recomendamo-nos pôr os filhos nas escolas privadas que são melhores.
Aceitamos a degradação do ensino público, fatal quando 50% dos professores pediram a reforma no último ano.
Foi tão fácil enganar (alienar, i.é, afastar da realidade) os cidadãos e as cidadãs com toda aquela propaganda da “avaliação dos professores” e dos “professores titulares”…
E depois não pedem desculpa aos cidadãos e cidadãs…
Pelo contrário, continuam a explicar aos cidadãos e cidadãs o que eles devem pensar.
É uma pena.
Assim vamos continuar a ser discriminados, uns privilegiados e outros não.
Cito de cor: Do ponto de vista cultural estamos divididos em castas. É uma alienação cultural e uma discriminação entre as pessoas que impede que o que se escreve seja entendido por todos. Só o ensino poderá fazer a desalienação, para que as pessoas compreendam.
Subscrevo, mas se bem interpreto, isto quer dizer que as escolas devem ser eficientes para todos, sem “rankings”, porque todas têm de ser boas.
Infelizmente, continua a vigorar o conceito mazdeista de bons e maus.
Recomendamo-nos pôr os filhos nas escolas privadas que são melhores.
Aceitamos a degradação do ensino público, fatal quando 50% dos professores pediram a reforma no último ano.
Foi tão fácil enganar (alienar, i.é, afastar da realidade) os cidadãos e as cidadãs com toda aquela propaganda da “avaliação dos professores” e dos “professores titulares”…
E depois não pedem desculpa aos cidadãos e cidadãs…
Pelo contrário, continuam a explicar aos cidadãos e cidadãs o que eles devem pensar.
É uma pena.
Assim vamos continuar a ser discriminados, uns privilegiados e outros não.
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quinta-feira, 26 de novembro de 2009
Alcantara, Alcantara
Tive de ir a Alcantara, ao IPTM.
IPTM significa Instituto Portuário e de Transportes Marítimos e é ele que nos renova, a nós marinheiros de recreio , as cartas de navegação (não seria melhor a antiga designação de marinheiros amadores? Bom, não é grave; como dizia o doce rabi, devemos ser como as criancinhas e viver o recreio em paz).
Quando cheguei perto do edifício deparou-se uma rede de vedação. O simpático segurança brasileiro que me atendeu na barraquinha do lado, a 5m de distancia da porta do IPTM informou-me que por ali não havia passagem.
Tive de contornar 200m de rede até ao edifício da Capitania, junto da Avenida de Brasília e retornar até ao IPTM por um corredor entre a rede e a doca do espanhol.
Graças à informação e à emissão prévia do requerimento de renovação pela Internet demorei 15 minutos entre a entrada e a saída.
Resta-me aguardar o envio da nova carta pelo correio.
Contraste nítido com a formalização burocrática do IMTT na loja do cidadão para renovar a carta de condução.
Mas empate na simpatia e na eficiência de todas as senhoras que me atenderam.
Isso contrasta com a situação 3 anos atrás, em que me vi grego para explicar ao senhor funcionário do IPTM que me tinham roubado a carteira com a carta de navegação dentro e que aquela certidão da PSP atestava que eu tinha participado o roubo.
Porém maior era o contraste no ambiente à volta do edifício.
Parece um episódio de guerra, com um cenário de destruição e de ocupação por destacamentos motorizados, tudo com muita poeira no ar.
O parque de estacionamento antigo ocupado agora por camiões e reboques de longo curso, filas de camiões com contentores para entrar no espaço vedado, comboios de camiões a chegar com inscrições de empresas de todos os pontos do país, de mármores, de mobiliário, de corticeiras, de laminados de madeira, de têxteis e vestuário.
Grandes extensões de terreno ocupado com pilhas de contentores, outras como terreiros sem os antigos edifícios , mas ainda com restos deles, à espera de novas construções.
O IPTM é uma ilha no território conquistado pelos generais da Liscont. E a sua tropa tem a eficiência dos soldados insectos altruístas (para quem se tenha esquecido das aulas de Ciencias da Natureza: formigas, abelhas…).
Vê-se a economia a funcionar.
O próximo comboio de vagões com contentores que cortar o transito na 24 de Julho levará tudo o que a comunidade autónoma de Madrid precisa que venha da China, e será puxado por uma locomotiva e um maquinista da Takargo (empresa de transportes ferroviários de mercadorias do mesmo grupo que explora os contentores e que já factura mais do que a CP carga).
O outro comboio da Takargo que virá em sentido contrário trará tudo o que a comunidade autónoma de Madrid precisa de vender a Angola.
É. A economia está mesmo a funcionar.
E vamos prescindir da parte do PIB que o terminal de contentores de Alcantara está a gerar para nos contentarmos com a náutica de recreio e com os pudicos passeios dos reformados dos navios de cruzeiro dos países da Europa do Norte?
Não quero isso, de facto, mas queria que fizessem a vontade aos especialistas de portos que estudaram o assunto.
Assim como não gosto que não oiçam o que digo quando sei o que digo, não gosto que não oiçam os meus colegas que sabem o que dizem.
O local do terminal de contentores é no fecho da Golada.
O senhor ministro das Finanças que faça o favor de arranjar o empréstimo que for preciso para poder construi-lo, a ele terminal na Golada, e às respectivas acessibilidades.
E se não quiser fazer esse favor que pergunte ao colega de Madrid se quer ser ele a fazer isso.
Regresso ao carro e tiro a fotografia que vêem acima.
Deliro com o reflexo do sol na superfície do Tejo porque me imagino a dar ordens ao COPCON para ir ao escritório do senhor engenheiro Jorge Coelho, intimá-lo a reunir um grupo dos seus melhores técnicos e conduzi-los a uma empresa pública. O destacamento do COPCON já tem ordens para acompanhar a casa os gestores dessa empresa pública.
Jorge Coelho e a sua equipa estão contrariados mas a força das armas fala mais forte.
Rapidamente identificam com quem podem trabalhar pedindo simplesmente aos que melhor e mais convincentemente falam que se limitem a ouvir, de preferência a uma distancia de segurança.
Trabalham com afinco para que os indicadores da empresa pública melhorem.
Isso sim seria a economia a funcionar a sério.
Mas era apenas um delírio. Pacificamente envio por telemóvel a imagem para o meu blogue e tomo o caminho da empresa pública em que não falo convincentemente.
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Terminal de alcantara
Economicómio XXXI - George Steiner
George Steiner recebe hoje, 26 de Novembro de 2009, o grau de doutor honoris causa numa universidade de Lisboa.
Interessa-me reter uma frase dele:
“Vivemos numa época selvagem. Porque não conseguiram as Humanidades e a Ciência criar uma barreira contra o inumano?”
Relevemos o lugar comum de que vivemos numa época selvagem.
Sempre vivemos. La Fontaine explicava isso quando o lobo defendeu a sua, sua dele ,liberdade de comer o cordeiro, por mais argumentos que este apresentasse que ele, cordeiro, tinha direito à vida.
Primeira conclusão: os conceitos de “liberdade” e de “o mais forte” indissociam-se (claro que estou a pensar nos adam smithistas mais adam smithistas do que Adam Smith).
E porque não conseguiram as Humanidades e a Ciência vencer o inumano?
Se Steiner não sabe a resposta, não sou eu que saberei.
Mas posso dizer o costume. Que não há uma relação de causa e efeito mas uma correlação forte entre os critérios que orientam os nossos gestores e as consequências a que assistimos.
Por via democrática temos os gestores que temos. Isso significa que os gestores que temos são a emanação das populações.
Por exemplo, se as populações privilegiarem o direito indiscriminado ao consumo (“tudo isto será teu se prostrado me adorares”), o direito de poder usufruir de privilégios de que o vizinho não pode usufruir, e o direito de supremacia deum grupo sobre outro grupo (futebolístico, bairrista, de utilizadores de uma droga específica, religioso, político, étnico), é natural que os candidatos a gestores que os defendem acabem mesmo como gestores.
E estes direitos ajustam-se como uma luva de tamanho bem escolhido, e é essa a correlação, ao que está por trás: o apelo ao mercado livre, à contenção dos preços apesar das regras económicas determinarem o seu aumento, à insensibilidade de querer conter os preços à custa do aumento do desemprego, à insensibilidade de privilegiar os indicadores económicos em detrimento da segurança das pessoas e da paz entre os povos, de recusar sistematicamente o desarmamento e o predomínio da escola.
Porque não conseguem as Humanidades e a Ciência vencer o inumano?
Por existir esta correlação: a escola das Humanidades e da Ciência não é privilegiada. Os nossos gestores preferem deixar as crianças entregues ao abandono escolar ou a escolas de banditismo; e os indicadores económicos sim, são privilegiados.
No dia seguinte à administração Obama (detentor de um prémio Nobel da Paz e comandante supremo do exército que utiliza aviões telecomandados com efeitos colaterais e fatais sobre civis no Afeganistão), ter recusado o fim do fabrico de minas terrestres com o argumento de que as minas terrestres são essenciais para a defesa dos estados Unidos, e no dia em que em Portugal é lançado o livro da intolerância portuguesa, é o que se me oferece dizer em resposta à pergunta de George Steiner.
Interessa-me reter uma frase dele:
“Vivemos numa época selvagem. Porque não conseguiram as Humanidades e a Ciência criar uma barreira contra o inumano?”
Relevemos o lugar comum de que vivemos numa época selvagem.
Sempre vivemos. La Fontaine explicava isso quando o lobo defendeu a sua, sua dele ,liberdade de comer o cordeiro, por mais argumentos que este apresentasse que ele, cordeiro, tinha direito à vida.
Primeira conclusão: os conceitos de “liberdade” e de “o mais forte” indissociam-se (claro que estou a pensar nos adam smithistas mais adam smithistas do que Adam Smith).
E porque não conseguiram as Humanidades e a Ciência vencer o inumano?
Se Steiner não sabe a resposta, não sou eu que saberei.
Mas posso dizer o costume. Que não há uma relação de causa e efeito mas uma correlação forte entre os critérios que orientam os nossos gestores e as consequências a que assistimos.
Por via democrática temos os gestores que temos. Isso significa que os gestores que temos são a emanação das populações.
Por exemplo, se as populações privilegiarem o direito indiscriminado ao consumo (“tudo isto será teu se prostrado me adorares”), o direito de poder usufruir de privilégios de que o vizinho não pode usufruir, e o direito de supremacia deum grupo sobre outro grupo (futebolístico, bairrista, de utilizadores de uma droga específica, religioso, político, étnico), é natural que os candidatos a gestores que os defendem acabem mesmo como gestores.
E estes direitos ajustam-se como uma luva de tamanho bem escolhido, e é essa a correlação, ao que está por trás: o apelo ao mercado livre, à contenção dos preços apesar das regras económicas determinarem o seu aumento, à insensibilidade de querer conter os preços à custa do aumento do desemprego, à insensibilidade de privilegiar os indicadores económicos em detrimento da segurança das pessoas e da paz entre os povos, de recusar sistematicamente o desarmamento e o predomínio da escola.
Porque não conseguem as Humanidades e a Ciência vencer o inumano?
Por existir esta correlação: a escola das Humanidades e da Ciência não é privilegiada. Os nossos gestores preferem deixar as crianças entregues ao abandono escolar ou a escolas de banditismo; e os indicadores económicos sim, são privilegiados.
No dia seguinte à administração Obama (detentor de um prémio Nobel da Paz e comandante supremo do exército que utiliza aviões telecomandados com efeitos colaterais e fatais sobre civis no Afeganistão), ter recusado o fim do fabrico de minas terrestres com o argumento de que as minas terrestres são essenciais para a defesa dos estados Unidos, e no dia em que em Portugal é lançado o livro da intolerância portuguesa, é o que se me oferece dizer em resposta à pergunta de George Steiner.
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terça-feira, 24 de novembro de 2009
Securitarium II - Romeu e Julieta, ou a obsessão mortal
Romeu irrompeu irado pela capela onde Julieta se confessava a frei Lourenço.
Derrubou o frade que se interpusera no caminho para Julieta e agarrou-a violentamente enquanto gritava: “Se não és minha, não serás de ninguém”.
Desrolhou o frasco , forçou a boca da ex-namorada e despejou meio conteúdo do veneno na garganta da pobre Julieta.
Frei Lourenço , soerguendo-se a custo, recebeu, ainda inclinado para a frente, uma pancada violenta com o cabo do punhal de Romeu que o deixou prostrado e inconsciente.
A acção do veneno foi fulminante na pobre rapariga, que cometera o pecado de anunciar a Romeu, em mensagem que a aia lhe tinha feito chegar, que estava tudo acabado entre eles.
Que ele era ciumento e desconfiava de qualquer olhar ou palavra dirigida por Julieta a outro homem. Que queria saber tudo o que Julieta pensava ou fazia. E assim, não valia a pena viver uma vida em comum com quem tão inseguro era. E isso não tinha nada que ver com o facto de serem Montecchios ou Capuletos.
O que Romeu fizera tinha sido premeditado.
Sem Julieta não havia motivos que o prendessem à vida. Vivia-se um período de calmaria guerreira, as actividades bancárias da sua família não o seduziam, o que é forma de dizer que não conseguia concentrar-se na matemática, e na verdade já andava entediado dos jogos de armas e das festas com que se entretinha. Também não se via a administrar as propriedades agrícolas da família de Julieta se, por bençãos de frei Lourenço, o casamento viesse a realizar-se.
A obsessão de Romeu por Julieta compensava-o da sua incapacidade em se afirmar noutras actividades. A separação de Julieta deixá-lo-ia no vazio e, acima de tudo, despeitado perante o seu orgulho de macho da classe superior de Verona.
Frei Lourenço, que fora o preceptor dos dois, não tinha supervisionado convenientemente o desenvolvimento intelectual de Romeu, deixando que predominassem as actividades lúdicas, as actividades guerreiras de sobre-valorização do eu afirmativo , e as de entretenimento e de contemplação narcisista. Os pais também não estiveram muito atentos, preocupada a mãe com as obras pias e o pai com os lucros do seus bancos.
E assim, Romeu bebeu o resto do veneno e tudo acabou em tragédia, não exactamente como Shakespeare imaginou ou os habitantes de Verona quiseram que se acreditasse.
Este texto é dedicado às vítimas da violência passional.No momento em que escrevo, morre em Portugal 1 mulher de 13 em 13 dias, vítima de violência passional.
O assunto é principalmente do foro da psiquiatria, não da estatística. Existem causas sociais e psicológicas, desde os imperativos sociais à auto-estima, do stress profissional ao estigma do desemprego ou medo dele.
Mas fundamentalmente, no fim de tudo , é porque não se quer entender que a relação entre duas pessoas deve ser uma ligação livre, em que cada um decide e tem vida própria.
É preciso que a mensagem passe nas escolas e nos meios de comunicação social:
O que é normal é cada um decidir e não ser castigado por isso.
O que é anormal é querer que alguém seja de alguém.
E os servidores dos imperativos sociais que pensem nisso, que deixem de julgar, como pedia o doce rabi.
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segunda-feira, 23 de novembro de 2009
Mais um apelo - quando um primeiro ministro controla os meios de comunicação social
Quando um primeiro ministro controla os meios de comunicação social é mais fácil convencer os eleitores.
Desde que os ditos meios de comunicação social dêem aos eleitores o que eles esperam.
Já repararam nos concertos?
Quando surge uma peça conhecida a multidão aplaude.
Se a peça é nova, por mais genial que seja, não há muitos aplausos.
Por isso as maiores audiências na televisão correspondem ao que nada traz de novo aos espectadores.
A rotina faz subir as audiências e não é um apelo à mudança que motiva os eleitores.
A imprensa, apesar de tudo e da dependência das receitas da publicidade, é livre, constitucionalmente, mas há limites para a tranquilidade dum primeiro ministro.
Vem isto a propósito da acção com pedido de indemnização de 1,3 milhões de euros que o presidente do senado italiano, grande amigo e apoio do primeiro ministro Berlusconi, interpôs contra António Tabucchi, escritor italiano que também traduziu escritores portugueses para italiano.
Como se sabe, o primeiro ministro Berlusconi é dono dos principais meios de comunicação social italianos, e era a esse primeiro ministro que eu me referia.
Tabucchi, há mais de um ano, recordou que o presidente do senado, advogado siciliano, tinha sido investigado por suspeita de ligações à máfia siciliana e absolvido. (Existe uma guerra entre a legalidade e as máfias; a guerra já dura há tantos anos; as máfias, através da obtenção de empregos para a população, têm o apoio desta; dir-se-ia que não há solução policial para este problema, e que deveriam entabular-se negociações intermediadas; mas será a minha mania de pregar a não violência de Gandhi…)
O Le Monde lançou uma petição que já foi assinada por muitos “intelectuais”, chamando a atenção para que este é um exemplo das relações violentas entre o poder e a imprensa.
É uma pena eu não poder apelar a que também assinem a petição, porque pelos vistos os não intelectuais não podem fazê-lo, talvez porque já tenham fechado a dita petição.
Mas posso apelar a que se interessem porque, como escreveu Berthold Brecht, primeiro vêm buscar os comunistas, depois os judeus (nos tempos que correm, também pode ser que venham buscar os palestinianos), depois o meu vizinho e, finalmente, vêm-me buscar a mim.
Afinal, apesar de tudo, assiste-se a fenómenos de concentração dos meios de comunicação social em cada vez menos grupos. Em menos de 20 anos, o número de grupos detentores de grandes jornais passou, nos USA, de 80 para 8. Dir-se-ia que se está a copiar o pior da experiencia soviética, em vez de aproveitar os aspectos positivos. Dirão os economistas neo-liberais que é o mercado a funcionar; dirão os economistas neo-marxistas que é o poder económico a condicionar o poder político, movido, o poder económico, pelo motor do complexo militar-industrial (conforme o conceito definido pelo presidente Eisenhower há 50 anos)
Dá que pensar, quando há bem pouco tempo uma estagiária da EPAL foi proibida de continuar o estágio porque criticou por email o contrato da EPAL com uma empresa israelita de abastecimento de águas…
Mas falta-me informação sobre o caso da estagiária da EPAL (seria interessante estudar a utilização dos emails nas empresas?).
O que também é preocupante, porque o comunicado da EPAL não foi completamente esclarecedor.
Desde que os ditos meios de comunicação social dêem aos eleitores o que eles esperam.
Já repararam nos concertos?
Quando surge uma peça conhecida a multidão aplaude.
Se a peça é nova, por mais genial que seja, não há muitos aplausos.
Por isso as maiores audiências na televisão correspondem ao que nada traz de novo aos espectadores.
A rotina faz subir as audiências e não é um apelo à mudança que motiva os eleitores.
A imprensa, apesar de tudo e da dependência das receitas da publicidade, é livre, constitucionalmente, mas há limites para a tranquilidade dum primeiro ministro.
Vem isto a propósito da acção com pedido de indemnização de 1,3 milhões de euros que o presidente do senado italiano, grande amigo e apoio do primeiro ministro Berlusconi, interpôs contra António Tabucchi, escritor italiano que também traduziu escritores portugueses para italiano.
Como se sabe, o primeiro ministro Berlusconi é dono dos principais meios de comunicação social italianos, e era a esse primeiro ministro que eu me referia.
Tabucchi, há mais de um ano, recordou que o presidente do senado, advogado siciliano, tinha sido investigado por suspeita de ligações à máfia siciliana e absolvido. (Existe uma guerra entre a legalidade e as máfias; a guerra já dura há tantos anos; as máfias, através da obtenção de empregos para a população, têm o apoio desta; dir-se-ia que não há solução policial para este problema, e que deveriam entabular-se negociações intermediadas; mas será a minha mania de pregar a não violência de Gandhi…)
O Le Monde lançou uma petição que já foi assinada por muitos “intelectuais”, chamando a atenção para que este é um exemplo das relações violentas entre o poder e a imprensa.
É uma pena eu não poder apelar a que também assinem a petição, porque pelos vistos os não intelectuais não podem fazê-lo, talvez porque já tenham fechado a dita petição.
Mas posso apelar a que se interessem porque, como escreveu Berthold Brecht, primeiro vêm buscar os comunistas, depois os judeus (nos tempos que correm, também pode ser que venham buscar os palestinianos), depois o meu vizinho e, finalmente, vêm-me buscar a mim.
Afinal, apesar de tudo, assiste-se a fenómenos de concentração dos meios de comunicação social em cada vez menos grupos. Em menos de 20 anos, o número de grupos detentores de grandes jornais passou, nos USA, de 80 para 8. Dir-se-ia que se está a copiar o pior da experiencia soviética, em vez de aproveitar os aspectos positivos. Dirão os economistas neo-liberais que é o mercado a funcionar; dirão os economistas neo-marxistas que é o poder económico a condicionar o poder político, movido, o poder económico, pelo motor do complexo militar-industrial (conforme o conceito definido pelo presidente Eisenhower há 50 anos)
Dá que pensar, quando há bem pouco tempo uma estagiária da EPAL foi proibida de continuar o estágio porque criticou por email o contrato da EPAL com uma empresa israelita de abastecimento de águas…
Mas falta-me informação sobre o caso da estagiária da EPAL (seria interessante estudar a utilização dos emails nas empresas?).
O que também é preocupante, porque o comunicado da EPAL não foi completamente esclarecedor.
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domingo, 22 de novembro de 2009
Economicómio XXX – Apelo para uma subscrição pública
Os dias de Natal vão caindo sobre nós, economistas ou não, mas duma maneira que os economistas devem saber explicar melhor do que eu.
Não podendo eu explicá-lo de acordo com as regras da economia, apenas posso manifestar os factos que observo, com muita pena de não ver nenhum economista a explicar os ditos factos.
E os factos que vejo e que desta forma testemunho são, numa grande superfície comercial, onze bancadas cobertas de caixas e saquinhos de chocolates para serem consumidos nesta época de Natal.
Admitindo, de acordo com os princípios dos problemas de Fermi, que cada bancada tem 9 m2 de área, que estão sobrepostos 5 caixas ou saquinhos, cada um com uma área média de 200 cm2 e com 100g de chocolates, teremos que nas 11 onze bancadas foram postos à disposição dos consumidores 25 toneladas de chocolates.
O que chamou a minha atenção para o fenómeno foi que só encontrei uma das onze bancadas com chocolates com a etiqueta do código de barras a começar por 560, isto é, o indicativo de que tinham sido manufacturados em Portugal. Devo dizer que, fazendo o papel do velhinho com obsessões particulares, mas inofensivas, espreitei por amostragem grande quantidade de códigos de barras. Só noutra bancada encontrei chocolates 560, mas numa pequena porção. A esmagadora maioria (esmagadora até pela tonelagem em jogo), era chocolate vindo de Espanha, França, Bélgica, Suíça, Polónia, Indonésia, China, Brasil, Inglaterra.
Poderá afirmar-se que naquela cadeia de hipermercados se importou 90% do chocolate a vender neste fim de ano (desprezo, nesta contabilidade, a matéria prima importada).
As grandes marcas portuguesas de chocolate estavam modestamente representadas.
Como sou do contra, ou, pelo menos, faço por retirar da globalização o que bem entendo, tirei para o meu carrinho de compras 3 saquinhos, de 100 g cada, de amêndoas cobertas de chocolate, saídos da confeitaria da Ajuda, cujas operárias gosto de ver quando calha passar à hora do almoço pela rua do centro cultural do meu bairro (Alvalade).
Eu sei que sou ignorante em economia, mas gostava que os economistas e os eleitos das autarquias compreendessem que os bairros devem ter oficinas e industria. Por causa do PIB, entre outras coisas, mas principalmente por razões de fixação das pessoas às povoações. Da forma como escrevi, parece uma redundância, e é-o na verdade, mas os decisores da câmara de Lisboa têm dificuldade em perceber, e deixam fechar as oficinas, as marcenarias, as fábricas de chocolate (lembram-se da Favorita?).
E agora andamos a subsidiar os fabricantes de chocolate estrangeiros.
Damned. Temos mesmo de os subsidiar?
Se pensarmos que 80% dos alimentos que consumimos são importados, fechamos o quadro do pessimismo (reforçado, esse pessimismo, com a ideia de que, para termos cá esses 80% de alimentos, temos de emitir mais umas doses de CO2 para ajudar ao efeito de estufa).
A importar esta quantidade de alimentos só podemos continuar a endividarmo-nos cada vez mais.
Provincianamente, e contra o parecer de Drucker, o guru dos anos 80 e 90, abandonámos a produção tradicional (o chocolate era uma delas, a metalomecânica ligeira e a pesada também, ainda bem que ainda se faz vinho, azeite e cortiça) e vamos indo atrás de algumas modas.
A Zara salvou, de momento, a industria têxtil do vale do Ave. As T-shirts vão de camião do vale do Ave para Madrid e de Madrid são distribuídas por todo o mundo, por exemplo, por camião para Setúbal, para Lisboa e para as Caldas da Rainha, e por avião para Macau e Hong Kong.
A Zara é um case study nas universidades norte americanas. Já encheu páginas da Harvard Business Review.
Mas, quem salva as fábricas de sapatos?
É que a Aerosoles, uma companhia americana, deixou cair a sua pequena filial portuguesa (será o método GM a funcionar? Como fizeram na Alemanha com a Opel?).
E agora, para os lados de Esmoriz, só criando uma nova empresa com o apoio do Governo.
Mas se não vier o apoio do Governo acabou-se (a fábrica, não o Governo).
Há um ano que os trabalhadores da Aerosoles almoçam um pão e uma sopa (está nos registos da cantina).
Há anos e anos que há mercado internacional para absorver os sapatos produzidos em Portugal. Mas a produção tinha de ser em grandes quantidades. Por causa do efeito de escala. Trabalho artesanal infantil, daquele que se leva para casa, não dá.
E o Governo diz que não tem dinheiro mas que gostava de resolver o problema (ou o que diz é por ordem inversa).
Antigamente, no tempo em que os caixeiros viajantes da Favorita e da Regina colocavam os seus chocolates nas festas de Natal das empresas, quando faltava o dinheiro, fazia-se uma subscrição pública (podiam chamar-lhe aumento de capital por emissão de acções ou de obrigações, mas também podia acontecer por efeito de solidariedade).
Agora existem o micro-crédito, os business angels, os especialistas da bolsa, o instituto de apoio ao investimento para a exportação e a provável falência das soluções para os trabalhadores da Aerosoles.
Então eu pergunto:
Alinham numa subscrição pública para lançar a Investvar, independente da Aerosoles?
Já existe uma agência de publicidade que faz a campanha e só recebe quando os resultados chegarem.
Ou será que não querem que o mercado funcione?
Eu, por mim, até acho que a empresa podia ser pública, assim como assim, como temos de nos endividar por causa da importação dos 90% de chocolate, endividámo-nos mais um bocadinho para fabricar sapatos em escala industrial.
Mas como a maioria dos portugueses vota de acordo com regras económicas contrárias, parece que a única solução é fazermos a subscrição.
Alinham?
PS - Não conheço os pormenores da organização, mas talvez tenha interesse participar na conferencia sobre o consumidor responsável. Ver em http://www.transportesemrevista.com/Default.aspx?tabid=390
Não podendo eu explicá-lo de acordo com as regras da economia, apenas posso manifestar os factos que observo, com muita pena de não ver nenhum economista a explicar os ditos factos.
E os factos que vejo e que desta forma testemunho são, numa grande superfície comercial, onze bancadas cobertas de caixas e saquinhos de chocolates para serem consumidos nesta época de Natal.
Admitindo, de acordo com os princípios dos problemas de Fermi, que cada bancada tem 9 m2 de área, que estão sobrepostos 5 caixas ou saquinhos, cada um com uma área média de 200 cm2 e com 100g de chocolates, teremos que nas 11 onze bancadas foram postos à disposição dos consumidores 25 toneladas de chocolates.
O que chamou a minha atenção para o fenómeno foi que só encontrei uma das onze bancadas com chocolates com a etiqueta do código de barras a começar por 560, isto é, o indicativo de que tinham sido manufacturados em Portugal. Devo dizer que, fazendo o papel do velhinho com obsessões particulares, mas inofensivas, espreitei por amostragem grande quantidade de códigos de barras. Só noutra bancada encontrei chocolates 560, mas numa pequena porção. A esmagadora maioria (esmagadora até pela tonelagem em jogo), era chocolate vindo de Espanha, França, Bélgica, Suíça, Polónia, Indonésia, China, Brasil, Inglaterra.
Poderá afirmar-se que naquela cadeia de hipermercados se importou 90% do chocolate a vender neste fim de ano (desprezo, nesta contabilidade, a matéria prima importada).
As grandes marcas portuguesas de chocolate estavam modestamente representadas.
Como sou do contra, ou, pelo menos, faço por retirar da globalização o que bem entendo, tirei para o meu carrinho de compras 3 saquinhos, de 100 g cada, de amêndoas cobertas de chocolate, saídos da confeitaria da Ajuda, cujas operárias gosto de ver quando calha passar à hora do almoço pela rua do centro cultural do meu bairro (Alvalade).
Eu sei que sou ignorante em economia, mas gostava que os economistas e os eleitos das autarquias compreendessem que os bairros devem ter oficinas e industria. Por causa do PIB, entre outras coisas, mas principalmente por razões de fixação das pessoas às povoações. Da forma como escrevi, parece uma redundância, e é-o na verdade, mas os decisores da câmara de Lisboa têm dificuldade em perceber, e deixam fechar as oficinas, as marcenarias, as fábricas de chocolate (lembram-se da Favorita?).
E agora andamos a subsidiar os fabricantes de chocolate estrangeiros.
Damned. Temos mesmo de os subsidiar?
Se pensarmos que 80% dos alimentos que consumimos são importados, fechamos o quadro do pessimismo (reforçado, esse pessimismo, com a ideia de que, para termos cá esses 80% de alimentos, temos de emitir mais umas doses de CO2 para ajudar ao efeito de estufa).
A importar esta quantidade de alimentos só podemos continuar a endividarmo-nos cada vez mais.
Provincianamente, e contra o parecer de Drucker, o guru dos anos 80 e 90, abandonámos a produção tradicional (o chocolate era uma delas, a metalomecânica ligeira e a pesada também, ainda bem que ainda se faz vinho, azeite e cortiça) e vamos indo atrás de algumas modas.
A Zara salvou, de momento, a industria têxtil do vale do Ave. As T-shirts vão de camião do vale do Ave para Madrid e de Madrid são distribuídas por todo o mundo, por exemplo, por camião para Setúbal, para Lisboa e para as Caldas da Rainha, e por avião para Macau e Hong Kong.
A Zara é um case study nas universidades norte americanas. Já encheu páginas da Harvard Business Review.
Mas, quem salva as fábricas de sapatos?
É que a Aerosoles, uma companhia americana, deixou cair a sua pequena filial portuguesa (será o método GM a funcionar? Como fizeram na Alemanha com a Opel?).
E agora, para os lados de Esmoriz, só criando uma nova empresa com o apoio do Governo.
Mas se não vier o apoio do Governo acabou-se (a fábrica, não o Governo).
Há um ano que os trabalhadores da Aerosoles almoçam um pão e uma sopa (está nos registos da cantina).
Há anos e anos que há mercado internacional para absorver os sapatos produzidos em Portugal. Mas a produção tinha de ser em grandes quantidades. Por causa do efeito de escala. Trabalho artesanal infantil, daquele que se leva para casa, não dá.
E o Governo diz que não tem dinheiro mas que gostava de resolver o problema (ou o que diz é por ordem inversa).
Antigamente, no tempo em que os caixeiros viajantes da Favorita e da Regina colocavam os seus chocolates nas festas de Natal das empresas, quando faltava o dinheiro, fazia-se uma subscrição pública (podiam chamar-lhe aumento de capital por emissão de acções ou de obrigações, mas também podia acontecer por efeito de solidariedade).
Agora existem o micro-crédito, os business angels, os especialistas da bolsa, o instituto de apoio ao investimento para a exportação e a provável falência das soluções para os trabalhadores da Aerosoles.
Então eu pergunto:
Alinham numa subscrição pública para lançar a Investvar, independente da Aerosoles?
Já existe uma agência de publicidade que faz a campanha e só recebe quando os resultados chegarem.
Ou será que não querem que o mercado funcione?
Eu, por mim, até acho que a empresa podia ser pública, assim como assim, como temos de nos endividar por causa da importação dos 90% de chocolate, endividámo-nos mais um bocadinho para fabricar sapatos em escala industrial.
Mas como a maioria dos portugueses vota de acordo com regras económicas contrárias, parece que a única solução é fazermos a subscrição.
Alinham?
PS - Não conheço os pormenores da organização, mas talvez tenha interesse participar na conferencia sobre o consumidor responsável. Ver em http://www.transportesemrevista.com/Default.aspx?tabid=390
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segunda-feira, 16 de novembro de 2009
Economicómio XXIX - Cumulative advantage
Talvez eu tenha sido excessivamente crítico das filhas dos presidentes, no Economicómio XXVIII, relacionando-as com informação e posição assimétricas contrariando o princípio da igualdade de oportunidades e de direitos e, naturalmente, o princípio de funcionamento da concorrência em mercado livre.
Pesquisando nos manuais, lá vem uma expressão mais conciliadora: “cumulative advantage”.
Na continuação do Freakonomics, de Steven Levitt e Stephen Dubner, a que os autores puseram o nome de Superfreakonomics (só encontrei a versão inglesa, é possível que a portuguesa saia antes do Natal), dá-se um exemplo do que é a “cumulative advantage”, que justifica uma vantagem adicional de alguém relativamente a outrem.
Um amigo de um dos autores, visitando uma senhora cortesã, reparou que ela tinha na mesinha de cabeceira o Freakonomics.
Palavra puxa palavra, e arranjou-se um belo almoço para o autor recolher informações preciosas para o novo livro, sobre uma actividade económica que tanto contribui para o PIB, directamente da senhora cortesã com capacidade intelectual. Informações que qualquer outro autor interessado em estudar a dita contribuição de tão nobre actividade para o PIB, por não ter tido a sorte de ser lido por ela, dificilmente poderia recolher.
Cumulative advantage é isso.
A diferença para a violação do princípio da igualdade é muito ténue, como ténue, ténue mas custosa, é a diferença entre o dólar desonesto e o dólar honesto de que falava Lucky Luciano, há uns blogues atrás.
Mas o exemplo, até pelo tipo de actividade que foca, parece adequado à realidade. Parece ser um modelo fidedigno.
Ninguém tem culpa de que o pai seja amigo de um banqueiro e que o banqueiro dê ordens ao seu banco para comprar ou vender os títulos que muito bem entender.
Ninguém tem culpa de que o pai seja presidente de uma republica que facilita os negócios entre as grandes empresas de desenvolvimento tecnológico e os familiares do presidente (se nos USA é assim…).
E assim como assim, comprando umas revistas cor-de-rosa qualquer jovem mulher pode imaginar-se filha do presidente.
Para se produzirem tantas revistas cor-de-rosa é preciso investir grandes montantes que vão direitinhos para a contribuição para o PIB.
Logo, não se poderá dizer que as revistas cor-de-rosa é que educam (como se dizia dantes para o fado), mas que contribuem para o PIB, contribuem.
Não poderemos portanto atirar pedras às filhas do presidentes (falando por hipérbole, claro), que tanto contribuem par ao PIB, falando agora em termos reais.
Mas posso recordar uma tia minha, que nunca enriqueceu, mas que me ensinou, ainda não tinha 10 anos, eu, que pelo facto de pertencer a uma família privilegiada (quem pode tirar um curso superior sem ter de ganhar o dinheiro para isso só pode ser privilegiado, não é?) não era mais do que os outros.
E prefiro dar razão à minha tia, do que às mentes brilhantes que justificam as filhas dos presidentes.
Pesquisando nos manuais, lá vem uma expressão mais conciliadora: “cumulative advantage”.
Na continuação do Freakonomics, de Steven Levitt e Stephen Dubner, a que os autores puseram o nome de Superfreakonomics (só encontrei a versão inglesa, é possível que a portuguesa saia antes do Natal), dá-se um exemplo do que é a “cumulative advantage”, que justifica uma vantagem adicional de alguém relativamente a outrem.
Um amigo de um dos autores, visitando uma senhora cortesã, reparou que ela tinha na mesinha de cabeceira o Freakonomics.
Palavra puxa palavra, e arranjou-se um belo almoço para o autor recolher informações preciosas para o novo livro, sobre uma actividade económica que tanto contribui para o PIB, directamente da senhora cortesã com capacidade intelectual. Informações que qualquer outro autor interessado em estudar a dita contribuição de tão nobre actividade para o PIB, por não ter tido a sorte de ser lido por ela, dificilmente poderia recolher.
Cumulative advantage é isso.
A diferença para a violação do princípio da igualdade é muito ténue, como ténue, ténue mas custosa, é a diferença entre o dólar desonesto e o dólar honesto de que falava Lucky Luciano, há uns blogues atrás.
Mas o exemplo, até pelo tipo de actividade que foca, parece adequado à realidade. Parece ser um modelo fidedigno.
Ninguém tem culpa de que o pai seja amigo de um banqueiro e que o banqueiro dê ordens ao seu banco para comprar ou vender os títulos que muito bem entender.
Ninguém tem culpa de que o pai seja presidente de uma republica que facilita os negócios entre as grandes empresas de desenvolvimento tecnológico e os familiares do presidente (se nos USA é assim…).
E assim como assim, comprando umas revistas cor-de-rosa qualquer jovem mulher pode imaginar-se filha do presidente.
Para se produzirem tantas revistas cor-de-rosa é preciso investir grandes montantes que vão direitinhos para a contribuição para o PIB.
Logo, não se poderá dizer que as revistas cor-de-rosa é que educam (como se dizia dantes para o fado), mas que contribuem para o PIB, contribuem.
Não poderemos portanto atirar pedras às filhas do presidentes (falando por hipérbole, claro), que tanto contribuem par ao PIB, falando agora em termos reais.
Mas posso recordar uma tia minha, que nunca enriqueceu, mas que me ensinou, ainda não tinha 10 anos, eu, que pelo facto de pertencer a uma família privilegiada (quem pode tirar um curso superior sem ter de ganhar o dinheiro para isso só pode ser privilegiado, não é?) não era mais do que os outros.
E prefiro dar razão à minha tia, do que às mentes brilhantes que justificam as filhas dos presidentes.
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domingo, 15 de novembro de 2009
O nemátodo
Há 6 meses atrás, o senhor ministro da agricultura do governo do meu país desvalorizou o alerta duma associação do centro de Portugal, de que a praga do nemátodo do pinheiro estava a entrar na fase incontrolável.
Nos dias que correm, a mesma associação informa que a situação piorou e é necessário organizar esquemas eficazes de combate à praga.
O nemátodo é um verme microscópico e a doença propaga-se entre Abril e Outubro através de um insecto vector, o longicórneo, vagamente semelhante ao grilo.
A doença é lenta mas é sempre mortal.
A legislação em vigor, comodamente, atribui toda a responsabilidade pelas acções de combate aos proprietários.
De forma semelhante ao que faz com a limpeza dos matos.
Este espírito conduz à realidade actual: a praga saiu do controle e ameaça exterminar o pinheiro bravo.
No terreno ao lado do meu, o cadáver de um pinheiro, assinalado há 10 anos pelos serviços oficiais, já quebrado ao meio, apodrece de ano para ano, pasto do nemátodo.
Ignoro se o maldito insecto já propagou a doença a alguns pinheiros mansos do meu terreno.
Ignoro se o senhor ministro da agricultura do actual governo tem mais conhecimento desta realidade e dos meios de combate do que o seu antecessor.
Permito-me sugerir que a solução é indicar aos proprietários, nos quais me incluo, o endereço de firmas que, a preços controlados e limitados, por objectivo tabelado, combatam a praga, e que o montante dispendido pelos particulares seja deduzido ao rendimento colectável e passível de liquidação a prazo.
Não conheço nenhuma dessas firmas, o que não quer dizer que não existam.
Mas o facto de não conhecer indicia que o mercado da iniciativa privada não está a funcionar.
A teoria económica é muito clara: quando o mercado não está a funcionar e o interesse é colectivo, compete ao governo desencadear acções para responder a esse interesse.
Duvido muito que aceitem a minha sugestão, o que fortalece em mim a ideia de que a praga vai desenvolver-se ainda mais.
Se assim for, parafraseando o texto evangélico, temos de os perdoar, que não sabem o que fazem.
Maldito verme que corrompe os mecanismos de raciocínio da nossa espécie humana.
Nos dias que correm, a mesma associação informa que a situação piorou e é necessário organizar esquemas eficazes de combate à praga.
O nemátodo é um verme microscópico e a doença propaga-se entre Abril e Outubro através de um insecto vector, o longicórneo, vagamente semelhante ao grilo.
A doença é lenta mas é sempre mortal.
A legislação em vigor, comodamente, atribui toda a responsabilidade pelas acções de combate aos proprietários.
De forma semelhante ao que faz com a limpeza dos matos.
Este espírito conduz à realidade actual: a praga saiu do controle e ameaça exterminar o pinheiro bravo.
No terreno ao lado do meu, o cadáver de um pinheiro, assinalado há 10 anos pelos serviços oficiais, já quebrado ao meio, apodrece de ano para ano, pasto do nemátodo.
Ignoro se o maldito insecto já propagou a doença a alguns pinheiros mansos do meu terreno.
Ignoro se o senhor ministro da agricultura do actual governo tem mais conhecimento desta realidade e dos meios de combate do que o seu antecessor.
Permito-me sugerir que a solução é indicar aos proprietários, nos quais me incluo, o endereço de firmas que, a preços controlados e limitados, por objectivo tabelado, combatam a praga, e que o montante dispendido pelos particulares seja deduzido ao rendimento colectável e passível de liquidação a prazo.
Não conheço nenhuma dessas firmas, o que não quer dizer que não existam.
Mas o facto de não conhecer indicia que o mercado da iniciativa privada não está a funcionar.
A teoria económica é muito clara: quando o mercado não está a funcionar e o interesse é colectivo, compete ao governo desencadear acções para responder a esse interesse.
Duvido muito que aceitem a minha sugestão, o que fortalece em mim a ideia de que a praga vai desenvolver-se ainda mais.
Se assim for, parafraseando o texto evangélico, temos de os perdoar, que não sabem o que fazem.
Maldito verme que corrompe os mecanismos de raciocínio da nossa espécie humana.
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sexta-feira, 13 de novembro de 2009
Vaira Vike Freiberga
Vaira Vike Freiberga já foi presidente da república da Letónia.
O povo da Letónia tem uma história de repressão por ocupantes externos.
O filme André Rubliev (autor do ícone que ilustra este texto), do realizador russo André Tarkovsky, de 1971, contem um episódio da cristianização forçada deste e dos outros povos do Báltico nos séculos XIV e XV, submetidos pelos cavaleiros teutões, polacos e russos, e obrigados a abandonar o paganismo.
Um dos povos desapareceu mesmo. Puro genocídio.
De modo que Vaira Vike Freiberga tem autoridade moral para falar.
E que disse ela?
Que a União Europeia tem de deixar de funcionar como a antiga União Soviética.
O que permite deduzir que tem funcionado como tal e induzir que se não deixar de funcionar assim, deverá implodir.
Pessoalmente, apesar dos inconvenientes que vejo na União Europeia, como seja:
- o fundamentalismo da “concorrência” (disparate, estar a separar a produção , o transporte e a distribuição da electricidade; pode gerar “apagões”; além de que a experiência ensina que a concorrência pode levar ao abaixamento da qualidade exactamente para viabilizar custos baixos)
- o excesso de burocracia (i.é, eurocracia; poderia ser a isto que a senhora Vaira Vike se referia, quando se mostrou disponível para ser presidente da U E, criticando a obscuridade das negociações de bastidores para selecção de candidatos…)
- os riscos de que uns iluminados se reunam outra vez nos Açores e mandem soldados para a terra dos outros (não estou muito certo que a senhora queira referir-se a isto),
julgo que os benefícios superam os inconvenientes, pelo que não concordo com a senhora.
Não impludamos a UE.
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terça-feira, 10 de novembro de 2009
Economicómio XXVIII - Welwitschia mirabilis e as filhas dos Presidentes
Com a devida vénia, transcrevo da Wikipédia a descrição desta maravilhosa planta angolana do deserto:
Welwitschia é um género monotípico de plantas verdes gimnospérmicas[1][2] cuja única espécie é a famosa Welwitschia mirabilis Hook.f., que só existe no deserto do Namibe, na Namíbia e em Angola. As Welwitschias são plantas gnetófitas da classe Gnetopsida, pertencentes à ordem Welwitsciales e família Welwitschiaceae.
É uma planta rasteira, formada por um caule lenhoso que não cresce, uma enorme raiz aprumada e duas folhas apenas, provenientes dos cotilédones da semente; as folhas, em forma de fita larga, continuam a crescer durante toda a vida da planta, uma vez que possuem meristemas basais. Com o tempo, as folhas podem atingir mais de dois metros de comprimento e tornam-se esfarrapadas nas extremidades. É difícil avaliar a idade que estas plantas atingem, mas pensa-se que possam viver mais de 1000 anos.
A Welwitschia mirabilis é uma planta dióica, ou seja, os cones masculinos e femininos nascem em plantas diferentes. Tradicionalmente, esta espécie foi classificada como uma gimnospérmica (juntamente com os pinheiros e plantas semelhantes), mas actualmente é classificada como uma gnetófita, uma divisão das plantas verdes que produzem sementes (espermatófitas).
Apesar do clima em que vive, a Welwitschia consegue absorver a água do orvalho através das folhas. Esta espécie tem ainda uma característica fisiológica em comum com as crassuláceas (as plantas com folhas carnudas ou suculentas, como os cactos): o metabolismo ácido - durante o dia, as folhas mantêm os estomas fechados, para impedir a transpiração, mas à noite eles abrem-se, deixam entrar o dióxido de carbono necessário à fotossíntese e armazenam-no, na forma dos ácidos málico e isocítrico nos vacúolos das suas células; durante o dia, estes ácidos libertam o CO2 e convertem-no em glicose através das reacções conhecidas como ciclo de Calvin.
Em Angola põe-se o nome desta flor a meninas, como em Portugal pomos Margarida ou nos USA Iris (lírio).
Corre em Angola o rumor de que Welwitschea José escreveu para a sede da MultiChoice, na Africa do Sul, , informando, parece que a carta dizia informo, que a partir de 2010-01-01 a sua (sua de Tchi-zé, que é o nome por que é mais conhecida Welwitschea José, filha do presidente da Republica de Angola) participação no capital social da MultiChoice Angola, a empresa que explora a televisão por satélite em Angola, subirá para 75%.
Não pode afirmar-se que seja este o facto, apenas se pode afirmar que corre o rumor.
E o facto nem seria ilegal.
Mas a este propósito, é possível que Sarkozy, mais uma vez, dissesse que não era este o capitalismo que queríamos.
O que é natural, que não fosse este o capitalismo que queríamos, nem o dos detentores do capital da empresa de catering que abastece o exercito americano no Iraque, nem o dos detentores do capital da empresa que explora o petróleo do Iraque, mais ou menos ligados a membros do governo da administração Bush.
Como estamos de acordo…como desejaríamos que as filhas dos presidentes da republica, em sintonia com as disposições igualitárias dos textos fundamentais das Constituições dos Estados, estivessem ao nosso lado com as mesmas dificuldades com que nos defrontamos nas lutas quotidianas, com os mesmos comportamentos de cidadãos e com os mesmos níveis de rendimento em função do trabalho executado ou do capital investido que nós temos.
Isso sim, seria o capitalismo que nós desejávamos, embora seja uma utopia, claro.
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A casa nova de Joana e o desperdício II
Joana está orgulhosa da casa nova.
Toda em tons de branco, com iluminação indirecta.
A casa não é bem nova, é o primeiro andar de um prediosinho de 2 andares, dos anos 20 do século passado, laboriosamente remodelado em tons claros, eu não diria reconstruído, numa rua da Lapa a descer para o Tejo.
Nesta casa de Joana não terá havido desperdício na iluminação. As lâmpadas são economizadoras, do tipo fluorescentes compactas, e não há que temer a exposição às radiações não ionizantes devidas às altas frequências que elas produzem porque estão lá em cima, por trás das sancas do tecto.
Enquanto esperamos a afinação das formas comerciais de grande consumo da iluminação por leds, é uma boa solução.
Não temos aqui a restituição de cores quentes da iluminação por halogéneo, mas temos a claridade.
Então porque falo de desperdício?
Porque, deuses e deusas dos lares, a casa é pequenina. A sala , o quarto, a cozinha. Tudo se ajusta ao ar delicado e discreto de Joana sem que se expanda em grandes espaços.
Assim se desperdiça Joana numa casa pequenina, como qualquer jovem que queira morar em Lisboa e não possa adquirir um andar de áreas grandes.
Porque a construção antiga raramente era espaçosa e a recuperação dos edifícios teria de passar pelo sacrifício ou pelo “emparcelamento” (anexação) de alguns prédios para que as áreas por fogo aumentassem.
Que possibilidades terão a nova associação de casas antigas (http://www.ap-casas-antigas.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=7&Itemid=8&lang=pt) e também o Grémio das empresas de conservação e restauro do património arquitectónico (http://www.gecorpa.pt/gecorpa1.html), ou outras associações de cariz mais ou menos democratizante, privadas, públicas, municipais, seja o que for, para executar ou participar na execução de um programa consistente de reabilitação dos prédios de Lisboa?
Assim se desertifica a cidade, perante o olhar impotente dos cidadãos e a sobranceria auto-satisfeita dos eleitos da vereação, porque os jovens preferem os andares espaçosos da periferia, a espera nas filas do transito e o estacionamento nos passeios.
Que desperdício, deixar fenecer esta cidade (e os seus habitantes?).
Toda em tons de branco, com iluminação indirecta.
A casa não é bem nova, é o primeiro andar de um prediosinho de 2 andares, dos anos 20 do século passado, laboriosamente remodelado em tons claros, eu não diria reconstruído, numa rua da Lapa a descer para o Tejo.
Nesta casa de Joana não terá havido desperdício na iluminação. As lâmpadas são economizadoras, do tipo fluorescentes compactas, e não há que temer a exposição às radiações não ionizantes devidas às altas frequências que elas produzem porque estão lá em cima, por trás das sancas do tecto.
Enquanto esperamos a afinação das formas comerciais de grande consumo da iluminação por leds, é uma boa solução.
Não temos aqui a restituição de cores quentes da iluminação por halogéneo, mas temos a claridade.
Então porque falo de desperdício?
Porque, deuses e deusas dos lares, a casa é pequenina. A sala , o quarto, a cozinha. Tudo se ajusta ao ar delicado e discreto de Joana sem que se expanda em grandes espaços.
Assim se desperdiça Joana numa casa pequenina, como qualquer jovem que queira morar em Lisboa e não possa adquirir um andar de áreas grandes.
Porque a construção antiga raramente era espaçosa e a recuperação dos edifícios teria de passar pelo sacrifício ou pelo “emparcelamento” (anexação) de alguns prédios para que as áreas por fogo aumentassem.
Que possibilidades terão a nova associação de casas antigas (http://www.ap-casas-antigas.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=7&Itemid=8&lang=pt) e também o Grémio das empresas de conservação e restauro do património arquitectónico (http://www.gecorpa.pt/gecorpa1.html), ou outras associações de cariz mais ou menos democratizante, privadas, públicas, municipais, seja o que for, para executar ou participar na execução de um programa consistente de reabilitação dos prédios de Lisboa?
Assim se desertifica a cidade, perante o olhar impotente dos cidadãos e a sobranceria auto-satisfeita dos eleitos da vereação, porque os jovens preferem os andares espaçosos da periferia, a espera nas filas do transito e o estacionamento nos passeios.
Que desperdício, deixar fenecer esta cidade (e os seus habitantes?).
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segunda-feira, 9 de novembro de 2009
Economicómio XXVII - “Um gajo tem de trabalhar onde há trabalho”
Homenagem aos trabalhadores portugueses do viaduto de Andorra.
Um dos colegas dos trabalhadores mortos disse uma evidencia que para a comodidade das vidas de muitos de nós choca pelo contraste com essa mesma comodidade.
Estamos entretidos com a ascensão e queda de um pequeno funcionário duma dependência bancária de Tras os Montes, com os concursos e as telenovelas da televisão, enquanto alguns de nós vão e vêm , através da fronteira com Espanha.
Os mesmos que iam à India e traziam a pimenta e cujas viúvas nada recebiam se a nau naufragasse com eles.
Os economistas que nos governam tinham-nos avisado: com a crise (excesso de produtos nas prateleiras das lojas, preços baixos e desemprego alto), quem tivesse emprego fixo ficava melhor, quem não o tivesse ficava pior.
A necessidade de ir trabalhar para longe resulta, não por correlação mas por relação de causa e efeito, duma coisa (utilizo o termo na acepção de entidade desumanizada) que nos entusiasmou há uns anos, pelo menos à maioria de nós, e que é a globalização.
A globalização permite o abaixamento dos preços no consumidor.
Esse é um facto.
Porém, através da concentração da produção em regime quase de monocultura (especialização elevada em qualquer local do mundo, longe do centro de gravidade dos consumidores), e do aproveitamento dos transportes baratos, a produção está longe, muito longe dos consumidores.
O Automóvel Clube é capaz de me expulsar, mas os combustíveis estão baratos, que diabo, muito baratos, e a globalização é uma das provas que estão baratos: produzir localmente deveria ser mais barato por estar perto do centro de gravidade dos consumidores; se me falarem da economia de escala falem-me também das melhorias de produtividade em pequenas produções graças à evolução tecnológica.
Não é só a produção que está longe.
É o próprio trabalho que está longe, em Andorra.
O trabalho deveria estar mais perto da aldeia dos trabalhadores do viaduto de Andorra.
O país é pobre mas o trabalho tem de aparecer.
As mentes bem pensantes que o querem atrasar não têm de ir e vir a Andorra, e quanto mais o atrasarmos mais portugueses morrerão nas estradas de Espanha a ir e vir para o trabalho.
Se quisermos avaliar as vantagens da globalização, temos de avaliar também as suas desvantagens.
Uma análise não deve ser apenas de benefícios (que os tem, a globalização, neste caso tem os salários dos trabalhadores e a sua contribuuição para o equilíbrio da balança de pagamentos do país, pobre como sabemos).
Devem contabilizar-se os custos. E neste caso, nos custos, estão as perdas de vidas humanas, estão a desertificação de extensas área do interior do norte do país, estão o abaixamento da produção interna.
Porque não fazem os economistas que nos governam contas a isto? (já disse que não me refiro aos economistas do governo; refiro-me aqui aos que alimentam a ideia que vivemos numa nova economia maravilhosa, em que a crise do Lehman Bros até ilustra as maravilhas do sistema, e que portanto governam, ou querem governar, a nossa consciência).
Ofereço este argumento ao governo, de que não gosto, mas nisto concordamos (assim já posso criticá-lo no que discordamos).
Sinto ainda que devo referir que, apesar das limitações que nos são próprias, tem-se verificado em Portugal um aumento da cultura da segurança no trabalho.
É verdade que houve uma grande transferência da força de trabalho ao nível de licenciados para esta disciplina, graças também a uma legislação vinculativa, e isso tem custos.
Têm sido raros os acidentes mortais em obras do Metropolitano de Lisboa, por exemplo (último acidente fatal em 2002, com um gruista na obra de Telheiras). Na última expansão, da Alameda para S.Sebastião, apesar das pressas, não houve acidentes fatais devidos à obra. Apesar do desastre do túnel do Terreiro do Paço em Junho de 2000, também não os houve na expansão da Baixa para Santa Apolónia.
Existem muitas dúvidas de que os empreiteiros nas obras dos viadutos espanhóis cumpram os procedimentos de segurança.
Também tivemos cá acidentes, muitas vezes nas mesmas circunstancias de pressas e de falha dos apoios da cofragem da betonagem (situação mais crítica devido à sobrecarga da água), mas a situação agora parece mais controlada, e nesse sentido não devemos criticar o não cumprimento da promessa de conclusão da CRIL antes de 2009-09-27. Só devemos criticar a promessa.
Nota (créditos, como dizem os anglo-saxónicos): como na realidade as minhas ideias são poucas, pelo que estou sempre a repetir-me, como também dizia Jorge Luis Borges, tive nesta apreciação sobre a globalização de me socorrer das ideias de James Kunstler, no seu livro “O fim do petróleo”, que me foi recomendado por um dos leitores ocasionais deste blogue, e que recomendo vivamente, desde que não se deixem impressionar pelo seu tom levemente catastrofista.
Um dos colegas dos trabalhadores mortos disse uma evidencia que para a comodidade das vidas de muitos de nós choca pelo contraste com essa mesma comodidade.
Estamos entretidos com a ascensão e queda de um pequeno funcionário duma dependência bancária de Tras os Montes, com os concursos e as telenovelas da televisão, enquanto alguns de nós vão e vêm , através da fronteira com Espanha.
Os mesmos que iam à India e traziam a pimenta e cujas viúvas nada recebiam se a nau naufragasse com eles.
Os economistas que nos governam tinham-nos avisado: com a crise (excesso de produtos nas prateleiras das lojas, preços baixos e desemprego alto), quem tivesse emprego fixo ficava melhor, quem não o tivesse ficava pior.
A necessidade de ir trabalhar para longe resulta, não por correlação mas por relação de causa e efeito, duma coisa (utilizo o termo na acepção de entidade desumanizada) que nos entusiasmou há uns anos, pelo menos à maioria de nós, e que é a globalização.
A globalização permite o abaixamento dos preços no consumidor.
Esse é um facto.
Porém, através da concentração da produção em regime quase de monocultura (especialização elevada em qualquer local do mundo, longe do centro de gravidade dos consumidores), e do aproveitamento dos transportes baratos, a produção está longe, muito longe dos consumidores.
O Automóvel Clube é capaz de me expulsar, mas os combustíveis estão baratos, que diabo, muito baratos, e a globalização é uma das provas que estão baratos: produzir localmente deveria ser mais barato por estar perto do centro de gravidade dos consumidores; se me falarem da economia de escala falem-me também das melhorias de produtividade em pequenas produções graças à evolução tecnológica.
Não é só a produção que está longe.
É o próprio trabalho que está longe, em Andorra.
O trabalho deveria estar mais perto da aldeia dos trabalhadores do viaduto de Andorra.
O país é pobre mas o trabalho tem de aparecer.
As mentes bem pensantes que o querem atrasar não têm de ir e vir a Andorra, e quanto mais o atrasarmos mais portugueses morrerão nas estradas de Espanha a ir e vir para o trabalho.
Se quisermos avaliar as vantagens da globalização, temos de avaliar também as suas desvantagens.
Uma análise não deve ser apenas de benefícios (que os tem, a globalização, neste caso tem os salários dos trabalhadores e a sua contribuuição para o equilíbrio da balança de pagamentos do país, pobre como sabemos).
Devem contabilizar-se os custos. E neste caso, nos custos, estão as perdas de vidas humanas, estão a desertificação de extensas área do interior do norte do país, estão o abaixamento da produção interna.
Porque não fazem os economistas que nos governam contas a isto? (já disse que não me refiro aos economistas do governo; refiro-me aqui aos que alimentam a ideia que vivemos numa nova economia maravilhosa, em que a crise do Lehman Bros até ilustra as maravilhas do sistema, e que portanto governam, ou querem governar, a nossa consciência).
Ofereço este argumento ao governo, de que não gosto, mas nisto concordamos (assim já posso criticá-lo no que discordamos).
Sinto ainda que devo referir que, apesar das limitações que nos são próprias, tem-se verificado em Portugal um aumento da cultura da segurança no trabalho.
É verdade que houve uma grande transferência da força de trabalho ao nível de licenciados para esta disciplina, graças também a uma legislação vinculativa, e isso tem custos.
Têm sido raros os acidentes mortais em obras do Metropolitano de Lisboa, por exemplo (último acidente fatal em 2002, com um gruista na obra de Telheiras). Na última expansão, da Alameda para S.Sebastião, apesar das pressas, não houve acidentes fatais devidos à obra. Apesar do desastre do túnel do Terreiro do Paço em Junho de 2000, também não os houve na expansão da Baixa para Santa Apolónia.
Existem muitas dúvidas de que os empreiteiros nas obras dos viadutos espanhóis cumpram os procedimentos de segurança.
Também tivemos cá acidentes, muitas vezes nas mesmas circunstancias de pressas e de falha dos apoios da cofragem da betonagem (situação mais crítica devido à sobrecarga da água), mas a situação agora parece mais controlada, e nesse sentido não devemos criticar o não cumprimento da promessa de conclusão da CRIL antes de 2009-09-27. Só devemos criticar a promessa.
Nota (créditos, como dizem os anglo-saxónicos): como na realidade as minhas ideias são poucas, pelo que estou sempre a repetir-me, como também dizia Jorge Luis Borges, tive nesta apreciação sobre a globalização de me socorrer das ideias de James Kunstler, no seu livro “O fim do petróleo”, que me foi recomendado por um dos leitores ocasionais deste blogue, e que recomendo vivamente, desde que não se deixem impressionar pelo seu tom levemente catastrofista.
domingo, 8 de novembro de 2009
A polémica da maternidade de Elvas
A polémica da maternidade de Elvas já passou à história.
Há 3 anos que os bebés vão nascer a Badajoz e todos andam felizes.
Feita a estatística, estão a nascer 23 alentejaninhos por ano em Badajoz.
Os contribuintes portugueses contribuem para isso com 1.800 euros por cada nascimento, o que dá por ano cerca de 414.000 euros, excluindo despesas extraordinárias.
Eu preferiria que a cidade de Elvas estivesse devidamente equipada, mas esta solução também não me desagrada.
Porém, tenho de ser coerente, e saltando para um domínio de actividade mais próximo de mim, quer-me parecer que seria uma boa solução, analogamente, colocar em mentes espanholas, estremenhas, andaluzes, madrilenas, catalãs, bascas ou valencianas, a resolução de problemas de transportes que nos trazem embaraçados (na acepção portuguesa), por exemplo, na aplicação de técnicas de decisão sobre traçados de linhas e modos de transporte, sobre organização dos espaços metropolitanos e das plataformas de importação e exportação.
Poderíamos, por exemplo, criar na REFER uma extensão espanhola, e no Metropolitano de Lisboa também, já que a RENFE e o Metro de Madrid formam com aqueles, dois pares muito parecidos com a rã a encher o peito e o boi.
Assim como assim, foi para isso que aderimos à União Europeia, para que fosse possível a qualquer gestor europeu concorrer a um lugar em qualquer país da comunidade, não foi? E do ponto de visto económico até deu resultado, com a experiencia da importação da casa de Lencastre, no fim do século XIV, não foi?
Temos de tirar partido dos benefícios da UE.
Sim, parece que foi boa ideia, contratar a maternidade de Badajoz.
Há 3 anos que os bebés vão nascer a Badajoz e todos andam felizes.
Feita a estatística, estão a nascer 23 alentejaninhos por ano em Badajoz.
Os contribuintes portugueses contribuem para isso com 1.800 euros por cada nascimento, o que dá por ano cerca de 414.000 euros, excluindo despesas extraordinárias.
Eu preferiria que a cidade de Elvas estivesse devidamente equipada, mas esta solução também não me desagrada.
Porém, tenho de ser coerente, e saltando para um domínio de actividade mais próximo de mim, quer-me parecer que seria uma boa solução, analogamente, colocar em mentes espanholas, estremenhas, andaluzes, madrilenas, catalãs, bascas ou valencianas, a resolução de problemas de transportes que nos trazem embaraçados (na acepção portuguesa), por exemplo, na aplicação de técnicas de decisão sobre traçados de linhas e modos de transporte, sobre organização dos espaços metropolitanos e das plataformas de importação e exportação.
Poderíamos, por exemplo, criar na REFER uma extensão espanhola, e no Metropolitano de Lisboa também, já que a RENFE e o Metro de Madrid formam com aqueles, dois pares muito parecidos com a rã a encher o peito e o boi.
Assim como assim, foi para isso que aderimos à União Europeia, para que fosse possível a qualquer gestor europeu concorrer a um lugar em qualquer país da comunidade, não foi? E do ponto de visto económico até deu resultado, com a experiencia da importação da casa de Lencastre, no fim do século XIV, não foi?
Temos de tirar partido dos benefícios da UE.
Sim, parece que foi boa ideia, contratar a maternidade de Badajoz.
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Bufus marinus
Com a devida vénia, retiro a informação da Enciclopédia da Estória Universal, de Afonso Cruz, cidadão escritor, ilustrador, autor de filmes de animação, fabricante de cerveja artesanal e habitante de um monte alentejano, que oiço num programa da Antena 2.
O Bufus marinus, ou sapo dos canaviais (América do Sul, Austrália) tem umas glândulas nas costas que segregam, para além de toxinas venenosas contra os predadores, um alcalóide, a bufotonina, alucinogénea e euforizante, equiparável à heroína e à cocaina.
Termina aqui a informação científica desta entrada da enciclopédia, porque o resto, tal como nas outras entradas da enciclopédia, é uma ficção, as citações e as histórias.
O que me faz crer na humanidade.
Será talvez o lugar comum de que o que nos surpreende pode ser valioso.
Ou será o alívio de que os disparates que nos vêm à cabeça também vêm à cabeça dos outros e ainda bem que há quem seja capaz de os imaginar e de os passar a letra de forma.
E não seria mais lógica uma realidade em que aquelas citações e aquelas histórias tivessem sido reais?
Da existência da bufotonina e da experiencia dos naturalistas medievais e das suas poções se deduz uma fantasia que os irmãos Grimm desenvolveram.
Beijar as costas dum sapo é absorver uma dose alucinogénea de bufotonina, imaginada equivalente a uma pastilha de ecstasy.
E quando se entrou na ilusão da droga, vê-se aquilo que se deseja, acredita-se naquilo que se quer.
E está explicado como o sapo se transformou no príncipe encantado.
Pobre cinderela, que se lambesses as costas do bufus marinus morrias intoxicada, com o sistema nervoso paralisado, os lindos olhos muito abertos e fixos no infinito, porque é muito pequena a percentagem de bufotonina na secreção das glândulas do sapo.
Mas talvez não seja o bufus marinus a origem do mito do príncipe encantado escondido no sapo.
A psicologia humana precisa dos conceitos do bem e do mal, pelo menos desde que os mazdeistas os definiram para ajudar à formação das grandes religiões monoteístas.
E se o bem fosse a ausência do mal? Se o sapo fosse a personificação do mal? Se o sapo fosse o diabo, mas se o diabo fosse o mal apenas porque se sente só, desprezado e naturalmente diabolizado?
Então o beijo no sapo é o beijo no diabo que de repente já não se sente só ou, se estava acompanhado, achava que ninguém lhe ligava a agora, finalmente que a Cinderela o beijou, deixou de ser um sapo e é um príncipe.
Já dizia Freud (citação da Enciclopédia ou minha?) que a origem da agressividade e das guerras está na insegurança, e que se tratássemos o inimigo como um ser inseguro, cheio de certezas porque desconfiado delas, mas a acreditar nelas apenas para se agarrar a alguma esperança, porque, como dizia Karl Marx (citação minha ou da Enciclopédia?) a religião não é só ópio para o povo, é uma esperança, então, se beijássemos o inimigo vencíamos a guerra.
Interesseiras as religiões altruístas, amar o inimigo mais do que a nós mesmos, para o vencer.
Se beijarmos o sapo, ele transformar-se-á no príncipe da paz e a guerra termina.
É isso, vou comprar a Enciclopédia da estória universal para ver se aprendo mais coisas.
O Bufus marinus, ou sapo dos canaviais (América do Sul, Austrália) tem umas glândulas nas costas que segregam, para além de toxinas venenosas contra os predadores, um alcalóide, a bufotonina, alucinogénea e euforizante, equiparável à heroína e à cocaina.
Termina aqui a informação científica desta entrada da enciclopédia, porque o resto, tal como nas outras entradas da enciclopédia, é uma ficção, as citações e as histórias.
O que me faz crer na humanidade.
Será talvez o lugar comum de que o que nos surpreende pode ser valioso.
Ou será o alívio de que os disparates que nos vêm à cabeça também vêm à cabeça dos outros e ainda bem que há quem seja capaz de os imaginar e de os passar a letra de forma.
E não seria mais lógica uma realidade em que aquelas citações e aquelas histórias tivessem sido reais?
Da existência da bufotonina e da experiencia dos naturalistas medievais e das suas poções se deduz uma fantasia que os irmãos Grimm desenvolveram.
Beijar as costas dum sapo é absorver uma dose alucinogénea de bufotonina, imaginada equivalente a uma pastilha de ecstasy.
E quando se entrou na ilusão da droga, vê-se aquilo que se deseja, acredita-se naquilo que se quer.
E está explicado como o sapo se transformou no príncipe encantado.
Pobre cinderela, que se lambesses as costas do bufus marinus morrias intoxicada, com o sistema nervoso paralisado, os lindos olhos muito abertos e fixos no infinito, porque é muito pequena a percentagem de bufotonina na secreção das glândulas do sapo.
Mas talvez não seja o bufus marinus a origem do mito do príncipe encantado escondido no sapo.
A psicologia humana precisa dos conceitos do bem e do mal, pelo menos desde que os mazdeistas os definiram para ajudar à formação das grandes religiões monoteístas.
E se o bem fosse a ausência do mal? Se o sapo fosse a personificação do mal? Se o sapo fosse o diabo, mas se o diabo fosse o mal apenas porque se sente só, desprezado e naturalmente diabolizado?
Então o beijo no sapo é o beijo no diabo que de repente já não se sente só ou, se estava acompanhado, achava que ninguém lhe ligava a agora, finalmente que a Cinderela o beijou, deixou de ser um sapo e é um príncipe.
Já dizia Freud (citação da Enciclopédia ou minha?) que a origem da agressividade e das guerras está na insegurança, e que se tratássemos o inimigo como um ser inseguro, cheio de certezas porque desconfiado delas, mas a acreditar nelas apenas para se agarrar a alguma esperança, porque, como dizia Karl Marx (citação minha ou da Enciclopédia?) a religião não é só ópio para o povo, é uma esperança, então, se beijássemos o inimigo vencíamos a guerra.
Interesseiras as religiões altruístas, amar o inimigo mais do que a nós mesmos, para o vencer.
Se beijarmos o sapo, ele transformar-se-á no príncipe da paz e a guerra termina.
É isso, vou comprar a Enciclopédia da estória universal para ver se aprendo mais coisas.
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sexta-feira, 6 de novembro de 2009
Energis VIII – A casa nova de Joana e o desperdício I
A nova urbanização
Joana tinha-me dito: “Um dia destes vai lá ver a minha casa nova”. E eu fui.
Joana trabalha no Parque das Nações.
Esteve 3 anos em Angola numa consultora internacional donde passou para uma grande companhia angolana de bebidas. Este ano conseguiu uma colocação na dependência dessa companhia em Lisboa.
É uma executiva de sucesso, pelo menos enquanto houver petróleo em Angola.
A casa nova de Joana fica numa urbanização recente no fim do prolongamento da rua principal de Prior Velho, quase sobranceira à curva do Trancão, antes de passar por Sacavém e se lançar no Tejo (o Trancão, não a urbanização).
Apesar da crise imobiliária, os novos andares têm-se vendido bem e já se vêem muitos automóveis estacionados.
A desertificação de Lisboa
Temos aqui um sintoma da desertificação da cidade de Lisboa (considerando os seus limites municipais).
Os jovens executivos preferem ir viver para a periferia.
E na verdade, a casa nova de Joana é grande . Ocupará talvez 180 m2, para além de um terraço onde já está uma casota de cão e se poderá montar uma festa para 80 pessoas.
É muito difícil encontrar pelo mesmo preço e qualidade de construção e de acabamentos, áreas semelhantes em Lisboa.
Queixam-se os decisores de que as pessoas abandonam a cidade, queixam-se os arquitectos de que os habitantes que ficam cometem atentados como o fecho das marquises (ainda não compreenderam que se as pessoas fecham as marquises é porque têm pouco espaço em casa?).
Não querem reflectir que as áreas disponíveis, os preços e a qualidade da construção são, regra geral, muito maus.
Já perceberam que tem de haver reabilitação dos edifícios e dos quarteirões.
Mas estão a ir pelo caminho do “o que era bom era que houvesse uma reabilitação do parque habitacional”.
E faltam os planos das intervenções e os projectos de execução integrados. Refiro-me a intervenções e projectos reais e profundos, não a recuperação de fachadas.
Integrado significa aqui inter-disciplinar. Outra dificuldade em Portugal, em que reina a compartimentação estanque.
Anteriores intervenções, como o projecto e a construção dos bairros de Chelas, por exemplo, não geram o reconhecimento pelos autores, com humildade, dos erros cometidos. Pelo contrário, orgulham-se da obra.
Assim é difícil.
As novas intervenções são entretanto preparadas com o secretismo que caracteriza os decisores em Portugal. Não há debate participativo.
O debate público
Dirão os novos gestores da câmara de Lisboa que sim, que há muito debate público.
É verdade, dele resultou a proliferação das vias cicláveis a que se assiste. Resultou de debate público.
Não resultou porém desse debate a decisão de acabar a prazo com o terminal de Alcantara (o problema real não é a altura do muro de contentores, 4 ou 5, é a própria existência do terminal e a inexistência de um plano a prazo para o seu desaparecimento).
Nem de garantir que não mais hotéis nem urbanizações de arquitectos famosos se construam à beira do Tejo.
Nem que se elabore um plano congruente para a zona das comendadeiras , nem que a estratégia seja a fusão de municípios da área metropolitana, nem que se tenha tento com a problemática dos museus de Belém, nem que se estanque a hemorragia da Baixa pombalina.
A restituição das cores
Joana estava radiante com a casa nova. Todos os tectos da casa são falsos, abrigando iluminação de halogéneo. Como o pequeno João corria a bom correr pelo corredor e por todas as divisões da casa, as luzes estavam acesas na sua máxima potência.
O que era bom, por um lado, porque a iluminação de halogéneo restitui as cores num ambiente quente e realça os pormenores. Por isso se adivinhavam os contornos da roupa interior sob a saia, travada como manda a moda deste ano, obrigando Joana a alguns trabalhos de equilíbrio porque ao efeito da saia se juntavam os saltos altos de 10 cm com sola compensada de 2 cm (“Estou da tua altura” dizia Joana).
Mas por outro lado, só a sala grande tinha 30 lâmpadas de 35 W, o que dava mais de 1 kW. Potência instalada só para iluminação: 4 kW.
O problema do consumo
Vá que no telhado do prédio uma pequena instalação solar térmica reduzia o consumo de gás da caldeira central de cada fogo, para aquecimento de águas e de radiadores, mas uma iluminação com lâmpadas fluorescentes compactas permitiria reduzir 3 ou 4 vezes o consumo .
E o problema é que o tecto já está esburacado para as pequenas dicróicas de iluminação de halogéneo …
Joana não vai ter as luzes sempre acesas, mas talvez vá consumir, de electricidade para iluminação (ficando de fora a electricidade para o ar condicionado e o gás para cozinha e aquecimento de águas e ar) cerca de 180 kWh/mês (50 lâmpadas de 35 W acesas 100 horas por mês).
Quando consumiria, se a instalação previsse as lâmpadas fluorescentes compactas (na realidade um projecto cuidadoso fá-lo-ia, para tratar convenientemente as tonalidades deste tipo de lâmpadas), cerca de 45 kWh.
Ao fim do ano são 1.500 kWh de desperdício de energia importada em 80%. Naquele prédio serão 15.000 kWh de desperdício. Naquela urbanização serão 300.000 kWh = 0,3 GWh de desperdício por ano em iluminação.
Um sucesso, licenciado pela respectiva câmara municipal (neste caso, Loures).
Epílogo
Temos aqui um exemplo de que, na realidade, os projectistas ligam mais ao imediato, sendo neste caso o imediato a moda e o conforto da iluminação por luminárias de halogéneo encastradas em tecto falso, do que às regras de economia durante a vida útil da obra. O imediato permite uma publicidade atractiva para vender os andares e consegue-o.
Assim é difícil, muito difícil.
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quarta-feira, 4 de novembro de 2009
Rodoviarium X –A bala e o jipe, ou a velocidade assassina
As variações dos fenómenos estatísticos permitiram que o massacre da sinistralidade rodoviária dos últimos dias e Portugal continental tenha sido menos intenso.
Estarão as autoridades mais esperançadas que o acréscimo de mortos, relativamente ao ano passado, não seja muito grande.
Inútil insistir que não é através destas comparações estatísticas que se deve atacar o assunto, mas eu não desisto, pelo menos para já.
Peço desculpa pela morbidez do tema de hoje.
É a comparação entre o poder mortífero de uma bala e de um veículo automóvel, e tem por objectivo avaliar se é mais seguro atravessar a linha de fogo de um atirador numa carreira de tiro, ou uma passadeira para peões.
Tomemos uma Magnum .357 .
.357 significa o calibre da pistola. Balas de cerca de 9 mm de diâmetro (0,357 polegadas).
A Magnum é uma das armas preferidas pelas polícias para defesa.
O conceito de defesa, em termos militares, poderá não coincidir com o sentido lato, mas estas coisas já foram pensadas.
Na impossibilidade real, pelo menos enquanto não for praticado o tal ensino obrigatório e monitorizado que “lave o cérebro” das criancinhas impedindo-as de aderirem à criminalidade, e enquanto não for reformada a última reforma penal do senhor ministro que coordenou a comissão dessa reforma, que já foi condenada (a reforma) pelo Procurador Geral da Republica e pela Associação dos Juízes há mais de 2 anos e agora pelo Observatório da Justiça, mas que continua em vigor assim como o seu coordenador continua como ministro demonstrando que é grande a distancia ente a realidade dos técnicos e a burocracia gestionária e virtual dos decisores, prejudicando assim o interesse da comunidade, comunidade essa que no entanto, por insondáveis desígnios dos fenómenos estatísticos, na altura da votação valida a política do partido que mantem o senhor como ministro, para continuar a prejudicá-la, a ela à comunidade, como ia dizendo, temos de concordar que as polícias sim, devem preocupar-se com as armas de defesa.
E temos assim que a Magnum .357 tem a vantagem de não ter por objectivo principal matar o atacante (não podemos dizer só mal da polícia, não é?).
As balas têm um pequeno espaço oco , na parte da frente, para ficarem mais leves e provocarem, graças à elevada velocidade, um efeito de atordoamento.
Chama-se a isso o “stopping power”, ou capacidade de parar o adversário, sem o matar, para o poder dominar enquanto estiver atordoado com o impacto da bala.
Claro que, se virem agentes da polícia com espingardas ou metralhadoras, o objectivo será outro…
Mas quantifiquemos (porque, como dizia Lord Kelvin «Se não podes medir aquilo de que estás a falar, nem expressá-lo em números, o teu conhecimento é pobre e insatisfatório»[1], embora devamos tratar esta máxima com prudência, quando estivermos a falar de física quântica, economia moderna ou beleza feminina), à moda de um problema de Fermi (ver um dos blogues anteriores) :
No caso da pistola Magnum .357 :
Massa de uma bala: 10 g
Velocidade da bala: 400 m/s
Energia cinética da bala: 0,5 x 0,01 x 4002 = 800 J
No caso de um jipe, ou melhor dizendo, de um crossover car (relativamente modesto para os padrões dos nossos apreciadores) com :
Potência: 106 CV
Peso com condutor: 1580 Kg
Velocidade com que se aproxima da passadeira de peões: 12,5 m/s (45 Km/h)
Energia cinética com que bate no peão: 0,5 x 1580 x 12,52 = 123437 J
Podemos então afirmar que o condutor dispõe de uma arma, o seu crossover, que atinge a vítima com uma energia cerca de 150 vezes superior à obtida com a pistola.
Desprezando a massa da vítima na conservação do movimento, admitindo que o crossover travou depois de bater na vítima, e que a queda se faz segundo uma linha a 45º relativamente à superfície, teremos que a vítima bateu no chão à velocidade de (componente vertical):
12,5 x sen 45º =8,8 m/s (32 km/h)
Considerando que o pavimento não sofre deformação, e admitindo 0,2 s para a imobilização da vítima (em 0,2 s o corpo percorria, à velocidade de que vinha animado, 1,8 m) , a passagem da velocidade de 8,8 m/s para 0 m/s em 0,2 s, corresponderá a uma desaceleração de:
8,8/0,2 = 44 m/s2
equivalente a 4,5 G e a uma queda na posição horizontal de uma altura de 4 m , o que provocará na maior parte das pessoas hemorragias internas irreversíveis.
A velocidade de 45 km/h é já uma velocidade assassina.
Temos assim, de um lado, uma pistola que, na maior parte dos casos, não perfurando nenhum orgão vital, atordoa um cidadão; admitamos que mata em 40% dos casos.
Do outro, um veículo que, na maior parte dos casos, mata um cidadão, admitamos que em 95% dos casos.
Admitamos que numa linha de uma carreira de tiro se disparam 20 carregadores por hora (intervalos de 3 minutos) e na passadeira para peões, sem semáforos, a seguir à curva ali ao pé do Hospital da Luz, para quem vem da Avenida Marechal Teixeira Rebelo e quer atravessar a Avenida dos Condes de Carnide, passam 20 carros por hora.
Simplificando o cálculo das probabilidades (10 segundos para disparar um carregador, 10 segundos para atravessar a passadeira, 1 travessia por hora), admitamos que a probabilidade de se ser atingido na carreira de tiro é 20x10/3600 = 0,056 <> 5,6% e igual à do atropelamento na passadeira para quem atravessa aleatoriamente as duas zonas de risco, 1 vez por hora.
A probabilidade de morte no caso da carreira de tiro será de :
0,056 x 0,4 = 0,0228 <> 2,28% (2 fatalidades em 100 travessias ou 100 horas)
E, no caso da passadeira, de:
0,056 x 0,95 = 0,0532 <> 5,32% (5 fatalidades em 100 travessias ou 100 horas)
Vem então a ser mais seguro atravessar a correr, aleatoriamente, a linha da carreira de tiro.
A probabilidade seria da mesma ordem de grandeza para 2 atiradores a disparar na carreira de tiro…
Para diminuir a probabilidade de acidente nas passagens de peões, o código da estrada é claro: devem os automobilistas abrandar à aproximação das passadeiras para peões de modo a poder parar se um peão tiver iniciado a travessia.
Costumam ver os automobilistas a abrandar à aproximação de uma passadeira?
Interroguemo-nos sobre o significado da licença de porte de armas: exige testes psicotécnicos que comprovem estabilidade emocional.
O significado da licença de condução deveria ser o mesmo. Talvez que o número de automobilistas baixasse drasticamente.
Teriamos de adaptar a essa situação o transporte colectivo.
Poupava-se no consumo de energia…
MAS A MENSAGEM A TRANSMITIR AOS NOSSOS CONDUTORES E CONDUTORAS APRESSADAS É ESTA:
1 - A PARTIR DO MOMENTO EM QUE ALCANÇO A VELOCIDADE ASSASSINA DE 45 KM/H, SE ATINGIR UM PEÃO, QUER SEJA ELE QUE NÃO ME TENHA VISTO, QUER SEJA EU QUE O NÃO TENHA VISTO, COM ELEVADA PROBABILIDADE… MATO-O
2 – NINGUÉM PODE GARANTIR QUE NÃO TENHA UM LAPSO DE ATENÇÃO
3 – LOGO, É UMA OBRIGAÇÃO MÍNIMA CUMPRIR OS LIMITES DE VELOCIDADE
[1] Fonte: Boletim de Comunicação, Informação, Cultura e Identidade Cultural da Gestão da Manutenção
do Metropolitano de Lisboa, E.P.E. Ano I - Número 9 – Novembro 2009, ou
http://www.fisicastronomorais.com/pdf/SIeNTR.pdf , ou
http://www.sociologia.ufsc.br/cadernos/Cadernos%20PPGSP%2026.pdf
Estarão as autoridades mais esperançadas que o acréscimo de mortos, relativamente ao ano passado, não seja muito grande.
Inútil insistir que não é através destas comparações estatísticas que se deve atacar o assunto, mas eu não desisto, pelo menos para já.
Peço desculpa pela morbidez do tema de hoje.
É a comparação entre o poder mortífero de uma bala e de um veículo automóvel, e tem por objectivo avaliar se é mais seguro atravessar a linha de fogo de um atirador numa carreira de tiro, ou uma passadeira para peões.
Tomemos uma Magnum .357 .
.357 significa o calibre da pistola. Balas de cerca de 9 mm de diâmetro (0,357 polegadas).
A Magnum é uma das armas preferidas pelas polícias para defesa.
O conceito de defesa, em termos militares, poderá não coincidir com o sentido lato, mas estas coisas já foram pensadas.
Na impossibilidade real, pelo menos enquanto não for praticado o tal ensino obrigatório e monitorizado que “lave o cérebro” das criancinhas impedindo-as de aderirem à criminalidade, e enquanto não for reformada a última reforma penal do senhor ministro que coordenou a comissão dessa reforma, que já foi condenada (a reforma) pelo Procurador Geral da Republica e pela Associação dos Juízes há mais de 2 anos e agora pelo Observatório da Justiça, mas que continua em vigor assim como o seu coordenador continua como ministro demonstrando que é grande a distancia ente a realidade dos técnicos e a burocracia gestionária e virtual dos decisores, prejudicando assim o interesse da comunidade, comunidade essa que no entanto, por insondáveis desígnios dos fenómenos estatísticos, na altura da votação valida a política do partido que mantem o senhor como ministro, para continuar a prejudicá-la, a ela à comunidade, como ia dizendo, temos de concordar que as polícias sim, devem preocupar-se com as armas de defesa.
E temos assim que a Magnum .357 tem a vantagem de não ter por objectivo principal matar o atacante (não podemos dizer só mal da polícia, não é?).
As balas têm um pequeno espaço oco , na parte da frente, para ficarem mais leves e provocarem, graças à elevada velocidade, um efeito de atordoamento.
Chama-se a isso o “stopping power”, ou capacidade de parar o adversário, sem o matar, para o poder dominar enquanto estiver atordoado com o impacto da bala.
Claro que, se virem agentes da polícia com espingardas ou metralhadoras, o objectivo será outro…
Mas quantifiquemos (porque, como dizia Lord Kelvin «Se não podes medir aquilo de que estás a falar, nem expressá-lo em números, o teu conhecimento é pobre e insatisfatório»[1], embora devamos tratar esta máxima com prudência, quando estivermos a falar de física quântica, economia moderna ou beleza feminina), à moda de um problema de Fermi (ver um dos blogues anteriores) :
No caso da pistola Magnum .357 :
Massa de uma bala: 10 g
Velocidade da bala: 400 m/s
Energia cinética da bala: 0,5 x 0,01 x 4002 = 800 J
No caso de um jipe, ou melhor dizendo, de um crossover car (relativamente modesto para os padrões dos nossos apreciadores) com :
Potência: 106 CV
Peso com condutor: 1580 Kg
Velocidade com que se aproxima da passadeira de peões: 12,5 m/s (45 Km/h)
Energia cinética com que bate no peão: 0,5 x 1580 x 12,52 = 123437 J
Podemos então afirmar que o condutor dispõe de uma arma, o seu crossover, que atinge a vítima com uma energia cerca de 150 vezes superior à obtida com a pistola.
Desprezando a massa da vítima na conservação do movimento, admitindo que o crossover travou depois de bater na vítima, e que a queda se faz segundo uma linha a 45º relativamente à superfície, teremos que a vítima bateu no chão à velocidade de (componente vertical):
12,5 x sen 45º =8,8 m/s (32 km/h)
Considerando que o pavimento não sofre deformação, e admitindo 0,2 s para a imobilização da vítima (em 0,2 s o corpo percorria, à velocidade de que vinha animado, 1,8 m) , a passagem da velocidade de 8,8 m/s para 0 m/s em 0,2 s, corresponderá a uma desaceleração de:
8,8/0,2 = 44 m/s2
equivalente a 4,5 G e a uma queda na posição horizontal de uma altura de 4 m , o que provocará na maior parte das pessoas hemorragias internas irreversíveis.
A velocidade de 45 km/h é já uma velocidade assassina.
Temos assim, de um lado, uma pistola que, na maior parte dos casos, não perfurando nenhum orgão vital, atordoa um cidadão; admitamos que mata em 40% dos casos.
Do outro, um veículo que, na maior parte dos casos, mata um cidadão, admitamos que em 95% dos casos.
Admitamos que numa linha de uma carreira de tiro se disparam 20 carregadores por hora (intervalos de 3 minutos) e na passadeira para peões, sem semáforos, a seguir à curva ali ao pé do Hospital da Luz, para quem vem da Avenida Marechal Teixeira Rebelo e quer atravessar a Avenida dos Condes de Carnide, passam 20 carros por hora.
Simplificando o cálculo das probabilidades (10 segundos para disparar um carregador, 10 segundos para atravessar a passadeira, 1 travessia por hora), admitamos que a probabilidade de se ser atingido na carreira de tiro é 20x10/3600 = 0,056 <> 5,6% e igual à do atropelamento na passadeira para quem atravessa aleatoriamente as duas zonas de risco, 1 vez por hora.
A probabilidade de morte no caso da carreira de tiro será de :
0,056 x 0,4 = 0,0228 <> 2,28% (2 fatalidades em 100 travessias ou 100 horas)
E, no caso da passadeira, de:
0,056 x 0,95 = 0,0532 <> 5,32% (5 fatalidades em 100 travessias ou 100 horas)
Vem então a ser mais seguro atravessar a correr, aleatoriamente, a linha da carreira de tiro.
A probabilidade seria da mesma ordem de grandeza para 2 atiradores a disparar na carreira de tiro…
Para diminuir a probabilidade de acidente nas passagens de peões, o código da estrada é claro: devem os automobilistas abrandar à aproximação das passadeiras para peões de modo a poder parar se um peão tiver iniciado a travessia.
Costumam ver os automobilistas a abrandar à aproximação de uma passadeira?
Interroguemo-nos sobre o significado da licença de porte de armas: exige testes psicotécnicos que comprovem estabilidade emocional.
O significado da licença de condução deveria ser o mesmo. Talvez que o número de automobilistas baixasse drasticamente.
Teriamos de adaptar a essa situação o transporte colectivo.
Poupava-se no consumo de energia…
MAS A MENSAGEM A TRANSMITIR AOS NOSSOS CONDUTORES E CONDUTORAS APRESSADAS É ESTA:
1 - A PARTIR DO MOMENTO EM QUE ALCANÇO A VELOCIDADE ASSASSINA DE 45 KM/H, SE ATINGIR UM PEÃO, QUER SEJA ELE QUE NÃO ME TENHA VISTO, QUER SEJA EU QUE O NÃO TENHA VISTO, COM ELEVADA PROBABILIDADE… MATO-O
2 – NINGUÉM PODE GARANTIR QUE NÃO TENHA UM LAPSO DE ATENÇÃO
3 – LOGO, É UMA OBRIGAÇÃO MÍNIMA CUMPRIR OS LIMITES DE VELOCIDADE
[1] Fonte: Boletim de Comunicação, Informação, Cultura e Identidade Cultural da Gestão da Manutenção
do Metropolitano de Lisboa, E.P.E. Ano I - Número 9 – Novembro 2009, ou
http://www.fisicastronomorais.com/pdf/SIeNTR.pdf , ou
http://www.sociologia.ufsc.br/cadernos/Cadernos%20PPGSP%2026.pdf
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terça-feira, 3 de novembro de 2009
Economicómio XXVI – Luis Sepulveda e o liberalismo
Luis Sepulveda é um escritor chileno que pertenceu à juventude do partido de Salvador Allende.
Oiço-o em entrevista na Antena 2: o Chile antes de Pinochet produzia tecnologia e tinha um parlamento com 136 anos de vida democrática; agora o Chile só exporta frutos, peixe congelado, camarões e vinho. As fábricas e as minas fecharam como consequência lógica do neo-liberalismo imposto pela intervenção estrangeira.
Todos podemos comprovar nos hipermercados a presença dos frutos , do peixe congelado, dos camarões e do vinho chilenos.
É um facto histórico a intervenção nas bolsas, em 1973, para baixar a cotação do cobre de que o Chile era um grande exportador. E também é um facto histórico o financiamento pela CIA da revolta de Pinochet contra o governo constitucional saído de eleições democráticas (em 1936 também houve uma revolta semelhante em Espanha, de Franco contra o governo republicano constitucional, saído de eleições democráticas, só que sem intervenção da CIA).
É outro facto histórico que os economistas chilenos de Pinochet decidiram experimentar os conceitos neo-liberais de Milton Friedman. E acabou a indústria chilena. Claro que não podia competir. Por que temos de suportar este dogma da competição que nos afoga a todos? Até à GM?
Reagan e e Tatcher encarregaram-se de espalhar o neo-liberalismo pelo mundo, enquanto a abundância de petróleo o permitiu (já é do domínio público que o mar do Norte já passou o pico, não é?). Fecharam indústrias e reduziu-se a capacidade agrícola nos países mais desenvolvidos e nos menos desenvolvidos e, graças à tecnologia, a produção aumentou. Convenceram-se jovens economistas, que os jovens são fáceis de iludir, das virtudes do liberalismo e do mercado a funcionar. Os jovens são generosos e não ligaram aos avisos de que o mercado não funciona se a informação for assimétrica, ou se houver escassez e nem deve funcionar se uma necessidade social se sobrepuser.
Até à recessão de 2009.
Mas já vamos lançados em voltar ao aumento da produção.
Mesmo depois de avisarem o pessoal, mais uma vez, que este tipo de desenvolvimento não é sustentável. Isto é, estamos a consumir mais do que o que produzimos e a dissipar os recursos não renováveis. Temos de mudar o padrão de consumo (citação do discurso de Santo António aos peixes, uns grandes e acumuladores de mais valias, outros pequenos e pasto dos predadores).
Intervenção americana no Chile em 1973 (honra a Jack Lemmon que fez um filme denunciador).
Apoio americano à UNITA e à guerra civil desde 1975, contrariando a recomendação do encarregado de negócios americano.
Invasão do Iraque em 2003.
Golpe de estado no Irão em 1953 para deposição de Mossadeg (colaboração CIA-M16, devidamente comprovada). Bombardeamentos no Afeganistão em 2009 com vítimas civis.
Não será altura de parar?
Havendo relação entre isto tudo, como parece que há (a ocasião faz o ladrão…), poderemos acusar o neo-liberalismo de crimes contra a humanidade?
Oiço também na Antena 2 a entrevista de um jornalista francês que descreveu o processo de libertação da África do Sul do aparteid. A dado passo, comentando o ambiente propício do liberalismo à livre iniciativa de associações criminosas, cita Lucky Luciano: “É mais difícil ganhar um dólar desonesto do que ganhar um dólar a trabalhar honestamente”. Difícil, nos tempos que correm de contenção dos preços com taxas altas de desemprego, é arranjar trabalho para ganhar o dolar honesto. Sabedoria de mafioso.
Sim, acho que posso acusar o neo-liberalismo de crimes contra a humanidade, mas estejam descansados, não vou lançar nenhuma petição.
É um tribunal interior, não há legislação de suporte para julgar os responsáveis, que para mim são criminosos ao nível de Lucky Luciano mas com a diferença que a sua actividade económica tem cobertura legal.
Não são os únicos (claro que não, não se pode negar a evidência das experiências, efectivamente falhadas e tão combatidas dos antigos partidos comunistas) mas são, de acordo com o meu critério, criminosos.
Foram os governos e as políticas liberais que tiveram mais força no período nas últimas décadas do século XX. Logo… a sua responsabilidade será maior. Já não se pode atirar as culpas para cima dos comunistas (violavam os direitos humanos, não era? O derrube de Salvador Allende e os assassínios dos seus partidários são o quê?).
E, no entanto, Michelle Bachelet, que foi militante da juventude do partido de Salvador Allende, tal como Luis Sepulveda, é agora presidente da republica chilena.
Recomecemos, pois, como os manifestantes silenciosos de Gandhi que se levantavam depois da polícia os derrubar a paulada.
Oiço-o em entrevista na Antena 2: o Chile antes de Pinochet produzia tecnologia e tinha um parlamento com 136 anos de vida democrática; agora o Chile só exporta frutos, peixe congelado, camarões e vinho. As fábricas e as minas fecharam como consequência lógica do neo-liberalismo imposto pela intervenção estrangeira.
Todos podemos comprovar nos hipermercados a presença dos frutos , do peixe congelado, dos camarões e do vinho chilenos.
É um facto histórico a intervenção nas bolsas, em 1973, para baixar a cotação do cobre de que o Chile era um grande exportador. E também é um facto histórico o financiamento pela CIA da revolta de Pinochet contra o governo constitucional saído de eleições democráticas (em 1936 também houve uma revolta semelhante em Espanha, de Franco contra o governo republicano constitucional, saído de eleições democráticas, só que sem intervenção da CIA).
É outro facto histórico que os economistas chilenos de Pinochet decidiram experimentar os conceitos neo-liberais de Milton Friedman. E acabou a indústria chilena. Claro que não podia competir. Por que temos de suportar este dogma da competição que nos afoga a todos? Até à GM?
Reagan e e Tatcher encarregaram-se de espalhar o neo-liberalismo pelo mundo, enquanto a abundância de petróleo o permitiu (já é do domínio público que o mar do Norte já passou o pico, não é?). Fecharam indústrias e reduziu-se a capacidade agrícola nos países mais desenvolvidos e nos menos desenvolvidos e, graças à tecnologia, a produção aumentou. Convenceram-se jovens economistas, que os jovens são fáceis de iludir, das virtudes do liberalismo e do mercado a funcionar. Os jovens são generosos e não ligaram aos avisos de que o mercado não funciona se a informação for assimétrica, ou se houver escassez e nem deve funcionar se uma necessidade social se sobrepuser.
Até à recessão de 2009.
Mas já vamos lançados em voltar ao aumento da produção.
Mesmo depois de avisarem o pessoal, mais uma vez, que este tipo de desenvolvimento não é sustentável. Isto é, estamos a consumir mais do que o que produzimos e a dissipar os recursos não renováveis. Temos de mudar o padrão de consumo (citação do discurso de Santo António aos peixes, uns grandes e acumuladores de mais valias, outros pequenos e pasto dos predadores).
Intervenção americana no Chile em 1973 (honra a Jack Lemmon que fez um filme denunciador).
Apoio americano à UNITA e à guerra civil desde 1975, contrariando a recomendação do encarregado de negócios americano.
Invasão do Iraque em 2003.
Golpe de estado no Irão em 1953 para deposição de Mossadeg (colaboração CIA-M16, devidamente comprovada). Bombardeamentos no Afeganistão em 2009 com vítimas civis.
Não será altura de parar?
Havendo relação entre isto tudo, como parece que há (a ocasião faz o ladrão…), poderemos acusar o neo-liberalismo de crimes contra a humanidade?
Oiço também na Antena 2 a entrevista de um jornalista francês que descreveu o processo de libertação da África do Sul do aparteid. A dado passo, comentando o ambiente propício do liberalismo à livre iniciativa de associações criminosas, cita Lucky Luciano: “É mais difícil ganhar um dólar desonesto do que ganhar um dólar a trabalhar honestamente”. Difícil, nos tempos que correm de contenção dos preços com taxas altas de desemprego, é arranjar trabalho para ganhar o dolar honesto. Sabedoria de mafioso.
Sim, acho que posso acusar o neo-liberalismo de crimes contra a humanidade, mas estejam descansados, não vou lançar nenhuma petição.
É um tribunal interior, não há legislação de suporte para julgar os responsáveis, que para mim são criminosos ao nível de Lucky Luciano mas com a diferença que a sua actividade económica tem cobertura legal.
Não são os únicos (claro que não, não se pode negar a evidência das experiências, efectivamente falhadas e tão combatidas dos antigos partidos comunistas) mas são, de acordo com o meu critério, criminosos.
Foram os governos e as políticas liberais que tiveram mais força no período nas últimas décadas do século XX. Logo… a sua responsabilidade será maior. Já não se pode atirar as culpas para cima dos comunistas (violavam os direitos humanos, não era? O derrube de Salvador Allende e os assassínios dos seus partidários são o quê?).
E, no entanto, Michelle Bachelet, que foi militante da juventude do partido de Salvador Allende, tal como Luis Sepulveda, é agora presidente da republica chilena.
Recomecemos, pois, como os manifestantes silenciosos de Gandhi que se levantavam depois da polícia os derrubar a paulada.
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segunda-feira, 2 de novembro de 2009
Economicómio XXV_A conferência na Gulbenkian “o ambiente na encruzilhada” ou “au carrefour de l’environement”
Comentário à recente conferência por eminentes pensadores, na Fundação Gulbenkian, subordinada ao tema “O Ambiente na encruzilhada” ou, se quisermos um toque mais cosmopolita, na melhor tradição provinciana, como dizia Sofia de Melo Breyner, “au carrefour de l’environement” .
Ver por favor (saltar por cima do primeiro recorte) em
http://www.gulbenkian.pt/index.php?section=49
e o programa em
http://www.parlamentoglobal.pt/parlamentoglobal/cidadania/Fundação+Gulbenkian/2009/10/19/191009+conferencia+gulbenkian+programa.htm
Pessoalmente, sinto-me arrependido por ter faltado.
Perdi uma oportunidade de testemunhar as intervenções das mentes brilhantes convidadas, de que são exemplo David King e Gilles Lipovetsky.
Não conheciam, pois não? Eu também não. Somos ignorantes.
Tentemos uma análise técnica.
No sentido de análise feita do mesmo modo que as feitas por um técnico que procure a causa ou raiz da falha do sistema; o que é que falhou aqui; e o que falhou aqui, para já, foi não haver ligação de conhecimento entre o trabalho destes senhores, David King e Gilles Lipovetsky, e pessoas ignorantes como este humilde escriba.
(Esta da raiz da falha do sistema é uma pequena homenagem ao meu colega que anda sempre a pregar, nem sempre com êxito que o programa é complicado de aplicar, as maravilhas do programa de análise de falhas RCFA – root cause failure analysis)
Refiro-me somente à falha de circulação de informação entre as mentes brilhantes e as não brilhantes, e não às causas dos horrores e das ameaças à sustentabilidade da nossa (nossa da espécie humana) presença no planeta, que essa análise só está ao alcance das mentes brilhantes.
E já que as mentes brilhantes fugiram um bocadinho à conclusão de que existe mesmo uma falha de comunicação entre o trabalho delas e a realidade dos restantes membros da espécie humana, tenta o humilde escriba divulgar um pouco da conferência.
1 – David King – Pregou uma transformação cultural como se estivéssemos no Renascimento, ou em nova revolução industrial.
Uma educação global e obrigatória poderia por exemplo levar a uma diminuição da taxa de natalidade nas sociedades com menos recursos económicos (terá falado em Malthus?). Mais uma vez, serão as mulheres e as mães que têm de tomar as decisões que irão garantir o futuro sustentável da espécie.
Por outro lado, a produção , nomeadamente de alimentos, deslocalizou-se. Graças à globalização, os países de menores recursos soçobraram na produção de alimentos porque os alimentos que vêm do outro lado do mundo são mais baratos. O problema é que produzir alimentos já cria gases com efeitos de estufa. Ainda por cima, transportá-los gera mais gases. Logo, objectivo: descentralizar a produção.
2 – Gilles Lipovetsky – Anda à volta do conceito do hiperconsumo. Desperta em mim saudades da minha professora de filosofia, em 1961, a dizer que o grande problema era que era preciso produzir para pagar aos operários, e portanto a produção tinha de crescer cada vez mais porque as necessidades consumistas dos produtores cresciam também sempre.
Os hiperconsumidores são a multidão de escravos que os adam smithistas desejam ardentemente para alimentar o aumento dos lucros, porque acreditam como qualquer seguidor de uma religião que o interesse individual dos apropriadores das mais valias se converte por milagre no interesse colectivo dos hiperconsumidores.
O senhor Lipovetsky receia, e eu também, e se um sábio receia uma coisa que é receada por um ignorante, é porque a coisa é mesmo feia, dizia eu que o senhor Lipovetsky receia que a reacção à crise financeira, agora que as taxas de juro e de inflação parece quererem subir e a recessão parar, seja a de voltar ao mesmo, isto é, ao “business as usual”.
Por outras palavras, a tentar desmesuradamente aumentar a produção e os lucros, quando o senhor Lipovetsky pede para reduzirmos o hiperconsumo (diria a minha professora de filosofia que isso conduz a fechar fábricas) , ou talvez que as empresas sejam menos predadoras, que possam reduzir as margens de lucro, para não ser só pedir aos trabalhadores para reduzirem os seus salários.
A ameaça é que as conquistas da tecnologia (pobre Marx que pensava que o progresso das tecnologias servia para satisfazer as necessidades básicas da espécie humana e a seguir trazer-lhe a felicidade; afinal não houve amanhãs a cantar), como por exemplo o desenvolvimento das energias renováveis, sirva apenas para subir um nível no caminho para a desgraça do hiperconsumo, permitindo manter o mesmo modo de vida de desperdício durante mais um tempo.
Como dizia o professor Ilharco, a energia é o problema fundamental da humanidade. E continuar de modo não sustentável, ou sustentável a poder de tecnologia mas apenas durante mais três ou quatro gerações, vai ser mau.
Porque democraticamente, num sistema como este de elevadíssima inércia, as decisões de mudança só serão maioritárias depois do desastre, não antes, e o desastre do Lehman Bros não é nada, comparado com a ameaça.
Pode ser que a imprensa não esteja a ajudar muito, insistindo com temas superficiais (estou a seguir a conferência)…
E há sempre a dúvida se, com as taxas de desemprego elevadas necessárias a manter os preços baixos, de modo a evitar a revolta social, será possível conter essa mesma revolta social e a criminalidade.
Conclusão beatífica da conferência: conter o hiperconsumo, moderar a competição entre indivíduos, estimular a solidariedade social…
Acham que será possível com as ideias liberais que orientam os nossos governos?
Não será essencial centrarmo-nos na educação pública obrigatória e monitorizada?
Mesmo correndo o risco de sermos acusados de querer lavar o cérebro às criancinhas, normalizando-as egualitariamente e prescindindo do orgulho de pertencer ao colégio mais bem colocado no “ranking”?
Seguimos a recomendação do senhor David King?
Cuidado que é preciso mudar a política do nosso ministério da Educação…menos competição individual… predomínio da função social da empresa relativamente à preocupação pelo lucro…
Ver por favor (saltar por cima do primeiro recorte) em
http://www.gulbenkian.pt/index.php?section=49
e o programa em
http://www.parlamentoglobal.pt/parlamentoglobal/cidadania/Fundação+Gulbenkian/2009/10/19/191009+conferencia+gulbenkian+programa.htm
Pessoalmente, sinto-me arrependido por ter faltado.
Perdi uma oportunidade de testemunhar as intervenções das mentes brilhantes convidadas, de que são exemplo David King e Gilles Lipovetsky.
Não conheciam, pois não? Eu também não. Somos ignorantes.
Tentemos uma análise técnica.
No sentido de análise feita do mesmo modo que as feitas por um técnico que procure a causa ou raiz da falha do sistema; o que é que falhou aqui; e o que falhou aqui, para já, foi não haver ligação de conhecimento entre o trabalho destes senhores, David King e Gilles Lipovetsky, e pessoas ignorantes como este humilde escriba.
(Esta da raiz da falha do sistema é uma pequena homenagem ao meu colega que anda sempre a pregar, nem sempre com êxito que o programa é complicado de aplicar, as maravilhas do programa de análise de falhas RCFA – root cause failure analysis)
Refiro-me somente à falha de circulação de informação entre as mentes brilhantes e as não brilhantes, e não às causas dos horrores e das ameaças à sustentabilidade da nossa (nossa da espécie humana) presença no planeta, que essa análise só está ao alcance das mentes brilhantes.
E já que as mentes brilhantes fugiram um bocadinho à conclusão de que existe mesmo uma falha de comunicação entre o trabalho delas e a realidade dos restantes membros da espécie humana, tenta o humilde escriba divulgar um pouco da conferência.
1 – David King – Pregou uma transformação cultural como se estivéssemos no Renascimento, ou em nova revolução industrial.
Uma educação global e obrigatória poderia por exemplo levar a uma diminuição da taxa de natalidade nas sociedades com menos recursos económicos (terá falado em Malthus?). Mais uma vez, serão as mulheres e as mães que têm de tomar as decisões que irão garantir o futuro sustentável da espécie.
Por outro lado, a produção , nomeadamente de alimentos, deslocalizou-se. Graças à globalização, os países de menores recursos soçobraram na produção de alimentos porque os alimentos que vêm do outro lado do mundo são mais baratos. O problema é que produzir alimentos já cria gases com efeitos de estufa. Ainda por cima, transportá-los gera mais gases. Logo, objectivo: descentralizar a produção.
2 – Gilles Lipovetsky – Anda à volta do conceito do hiperconsumo. Desperta em mim saudades da minha professora de filosofia, em 1961, a dizer que o grande problema era que era preciso produzir para pagar aos operários, e portanto a produção tinha de crescer cada vez mais porque as necessidades consumistas dos produtores cresciam também sempre.
Os hiperconsumidores são a multidão de escravos que os adam smithistas desejam ardentemente para alimentar o aumento dos lucros, porque acreditam como qualquer seguidor de uma religião que o interesse individual dos apropriadores das mais valias se converte por milagre no interesse colectivo dos hiperconsumidores.
O senhor Lipovetsky receia, e eu também, e se um sábio receia uma coisa que é receada por um ignorante, é porque a coisa é mesmo feia, dizia eu que o senhor Lipovetsky receia que a reacção à crise financeira, agora que as taxas de juro e de inflação parece quererem subir e a recessão parar, seja a de voltar ao mesmo, isto é, ao “business as usual”.
Por outras palavras, a tentar desmesuradamente aumentar a produção e os lucros, quando o senhor Lipovetsky pede para reduzirmos o hiperconsumo (diria a minha professora de filosofia que isso conduz a fechar fábricas) , ou talvez que as empresas sejam menos predadoras, que possam reduzir as margens de lucro, para não ser só pedir aos trabalhadores para reduzirem os seus salários.
A ameaça é que as conquistas da tecnologia (pobre Marx que pensava que o progresso das tecnologias servia para satisfazer as necessidades básicas da espécie humana e a seguir trazer-lhe a felicidade; afinal não houve amanhãs a cantar), como por exemplo o desenvolvimento das energias renováveis, sirva apenas para subir um nível no caminho para a desgraça do hiperconsumo, permitindo manter o mesmo modo de vida de desperdício durante mais um tempo.
Como dizia o professor Ilharco, a energia é o problema fundamental da humanidade. E continuar de modo não sustentável, ou sustentável a poder de tecnologia mas apenas durante mais três ou quatro gerações, vai ser mau.
Porque democraticamente, num sistema como este de elevadíssima inércia, as decisões de mudança só serão maioritárias depois do desastre, não antes, e o desastre do Lehman Bros não é nada, comparado com a ameaça.
Pode ser que a imprensa não esteja a ajudar muito, insistindo com temas superficiais (estou a seguir a conferência)…
E há sempre a dúvida se, com as taxas de desemprego elevadas necessárias a manter os preços baixos, de modo a evitar a revolta social, será possível conter essa mesma revolta social e a criminalidade.
Conclusão beatífica da conferência: conter o hiperconsumo, moderar a competição entre indivíduos, estimular a solidariedade social…
Acham que será possível com as ideias liberais que orientam os nossos governos?
Não será essencial centrarmo-nos na educação pública obrigatória e monitorizada?
Mesmo correndo o risco de sermos acusados de querer lavar o cérebro às criancinhas, normalizando-as egualitariamente e prescindindo do orgulho de pertencer ao colégio mais bem colocado no “ranking”?
Seguimos a recomendação do senhor David King?
Cuidado que é preciso mudar a política do nosso ministério da Educação…menos competição individual… predomínio da função social da empresa relativamente à preocupação pelo lucro…
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