quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Antigono de António Mazonni

O Centro Cultural de Belem apresentou nos dias 21 e 22 de janeiro de 2011 a ópera Antigono de Antonio Mazzoni.
Foi a terceira e ultima ópera cantada, e também estreada, no teatro da ópera do Tejo, mandada construir por D.José, antes de ser destruida pelo terramoto de 1755.
Nunca mais foi representada e, para o ser agora, foi necessário o empenho da orquestra Divino Sospiro, residente no Centro Cultural de Belem e a reconstrução pelo musicólogo Nicholas McNair da partitura , conservada na biblioteca da Ajuda.


Este é um caso curiosissimo, num país em que se acha mal gastar dinheiro com a cultura.
Apesar de tudo, existe nele quem trabalhe em cultura e obtenha resultados.
Pelo menos esperam-se resultados com a repetição desta produção em festivais como o de Innsbruck e a venda a televisões estrangeiras.
O que só confirmaria o estudo do professor Mateus, que a cultura é rentável.

Voltando ao Antigono:
1 - o rei D.José aplicou o dinheiro do ouro do Brasil em espetáculos de ópera e na construção de um teatro real (nacional); esta orientação era diferente da de D.João V,  que preferia empregar musicos instrumentais  (Scarlatti, por exemplo) porque os espetáculos de ópera eram considerados algo imorais pela sua mentalidade religiosa;
2 - choca a quantidade de dinheiro que veio do Brasil e foi utilizada para o entretenimento do rei, dos aristocratas e da hierarquia religiosa; porém a evolução da sociedade permitiu, enquanto a revolução francesa triunfava, o acesso à cultura da burguesia, e esse sentido de evolução, extensível a toda a população, é positivo;
3 - o diretor da Divino Sospiro, falando sobre esta reconstrução de Antigono, disse:
"Um povo que tem consciência da sua cultura, estará melhor. Talvez seja bom recuperar essa confiança. Sou italiano e tenho agora o Berlusconi no meu país, mas posso olhar para trás, para o Leonardo Da Vinci, por exemplo. Sei de onde venho e sinto-me bem, porque tenho uma cultura para onde me posso virar. Recuperar o nosso passado é também resolver alguma coisa do nosso presente".
Não é uma maravilha? Especialmente para quem acha que é melhor saber fazer contas do que distinguir o Tomas More do Tomas Mann;
4 - Se é assim, o Antigono é a metáfora do desaparecimento da sociedade rica dependente do ouro do Brasil, e a viragem para a cultura ao serviço do povo.
5 - Não estou a romantizar a cultura ao serviço do povo; vejam como canta Berenice na cena 11 do 1º ato:
"... as extremas misérias perturbam a razão. Se eu pudesse dizer quão infelizes somos, sei que moveria à piedade até os inimigos"; podia pensar-se que no século XVIII era uma situação vulgar e agora não devia ser, mas como as coisas estão parece atual
6 - Outra curiosidade: durante a reconstrução da partitura pôs-se a  hipótese do teatro da ópera do Tejo não ter sido completamente destruido; as paredes laterais e as empenas extremas e intermédias ter-se-ão mantido e... integradas no atual edificio do arsenal da Marinha; vendo no Google Earth, é uma planta com 120 metros de comprimento e 20 metros de largura, os lados maiores a dar para a rua do Arsenal e para o pátio da Marinha, com o palco a ocupar a maior parte do espaço, do lado do Terreiro do Paço; por baixo passa o Metro; é uma hipótese interessante, que confirma a outra hipótese: que houve limites ao método de reconstrução da baixa: demolição e construção geométrica; mas terá sido uma pena, ão ter reconstruido a ópera do Tejo; as fundações afinal terão aguentado as paredes; foi um problema de telhados e de pavimentos;
7 - E sim, posso garantir, a orquestra tocou mesmo muito bem, e os cantores foram ótimos.

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