sábado, 1 de janeiro de 2011

Uma questão de manutenção - a neve

A comissão europeia e o governo inglês não gostaram do deficiente funcionamento dos aeroportos em condições de neve.
Talvez tenham reagido mais agressivamente do que no ano passado, quando os motores do eurotunnel se engasgaram com a liquefação à entrada dos tuneis. Nessa altura bastou à companhia dizer que estavam a mudar as grelhas de ventilação (pobre projeto se fosse só uma questão de grelhas de ventilação) e a comissão permneceu serena. Felizmente que desta vez os comboios aguentaram.
A entidade responsável pelo aeroporto de Helsinquia, lembrando humildemente que o seu tráfego é metade do de Heathrow, explicou que o segredo é ter 3 pistas para poder fazer manutenção numa,  e ter as outras duas a funcionar (uma para partidas, outra para chegadas). Heathrow tem duas pistas (confesso que pensava que tinha mais, com 5 terminais e só duas pistas...; a propósito, a Portela tem apenas uma pista utilizável de cada vez) e tem uma gestão privada, ganha por concurso, claro, mas em cujo caderno de encargos não estavam previstas condições de neve tão gravosas (a propósito, há 5 séculos atrás podia ir-se a pé entre as ilhas Orkney, e há dez séculos a Islandia estava coberta de florestas que não aguentaram o gelo que se agravou aos tais 5 séculos atrás; isto das alterações climáticas é um problema).

http://www.bbc.co.uk/news/world-europe-12042213

De modo que não me parece que haja fundamento legal para ralhar com a gestão privada do aeroporto de Heahtrow . Talvez até pudessemos ralhar agora com a comissão europeia por não se ter lembrado antes de exigir, no caderno de encargos, que a gestão privada do aeroporto tivesse um plano para tanta neve.  Porque a dita gestão privada vai agora  dimensionar os seus meios para enfrentar este tipo de situaçoes e vai apresentar o respetivo orçamento.
Se calhar, era mais prático ter mantido a gestão pública e agora fazer os ajustamentos orçamentais (ou, atempadamente, dado que costuma nevar nesta altura do ano), tal como faz o aeroporto público de Helsinquia.
Não fazer como um diretor a quem eu chamei a atenção para a necessidade de inscrever no orçamento uma verba, todos os anos, para a execução de um plano de proteção das estações e as grelhas de ventilação do metropolitano de Lisboa contra o risco de entrada de água junto do rio Tejo: foi-me respondido que todos temos de correr riscos e a probabilidade de isso acontecer nos próximos anos era pequena. No caso da neve, uma queda de 70 cm por dia também tem uma probabilidade reduzida, mesmo em Helsinquia.
Não , carissimos leitores, isto é apenas uma questão de manutenção, não tem nada de ideológico (o governo finlandês até é de direita). Se o objetivo é manter um aeroporto a funcionar, vamos pôr a questão do lucro de parte e concentrar-nos no objetivo.
Isto é, se o montante do lucro é inferior ao diferencial do valor de produtividade gestão adequada privada-gestão adequada pública, vezes a quantidade do fator de produção, não há gestão privada que aguente tanta neve.
É preciso flexibilidade para compreeender isto , não é? Parece que os finlandeses a têm (por exemplo, nesta altura do ano garantem emprego a 50 cidadãos para reforço das equipas de limpeza das pistas), para além de ficarem nos primeiros lugares do PISA  (agora que escrevo PISA, será que tudo isto não será apenas um problema de compreensão de dados? e à medida que a latitude desce, aumenta a dificuldade de compreensão?).
São coisas que não se resolvem com grandes gestores e grandes ministros.
É um problema de manutenção... e no caso inglês não admira.
O adamsmithismo primário de Tatcher ainda mantem vivas as suas consequencias no mundo dos transportes. Basta que neve. Felizmente o metro de Londres já não vai nisso. Nada tem que ver com a ideologia do presidente da câmara, que em Londres até é de direita. Tem que ver com o interesse e a capacidade técnica para atingir o objetivo de servir a comunidade e as suas necessidades de transporte.

Aguardemos se a lição da neve, isto é, considerar as necessidades da população, as condições e os dados reais, as soluções de projeto e de manutenção, vai ser seguida em Lisboa, agora que o objetivo estratégico de gestão integrada dos transportes foi definido (ui, se calhar estou a ser ingénuo; parece que só falaram em gestão comum Metro-Carris; é curto; e então, se o predomínio for a politica dos cortes, será paralisante). Ou estarão a pensar em privatizações às fatias? (não quererão considerar que decidir superiormente a privatização ou a reestruturação de um setor sem participação alargada dos técnicos que lá trabalham é estar a chamar incompetentes e incapazes aos técnicos? e que quem decide pode não ter habilitação académica e profissional para avaliar a incompetência ou a incapacidade de quem lá trabalha?).


Mais informação sobre o aeroporto de Helsinquia e a Finavia (gestão pública dos aeroportos finlandeses) em:
http://en.wikipedia.org/wiki/Helsinki_Airport

À consideração da ANA, ameaçada de privatização, da TAP, e dos decisores que não quereriam ter  baixa classificação PISA nas decisões que tomam (e se contratassem os finlandeses como consultores?).

2 comentários:

  1. caro amigo
    a sua última interrogação fez-me pensar que se calhar terá sido essa a razão que determinada empresa pública de transportes ferroviários urbanos e subeterrâneos de uma grande cidade do nosso pais, situada na zona centro, que não identifico, terá pago 130 e tal mil Euros para ser elaborado um estudo (mais 1) de restruturação da empresa, que acabou por ser alterado e elaborado pela rapaziada da casa.
    130 e tal mil euritos parece-me um bocadinho puxado para um trabalho de escrivão (porque na realidade o que se aproveitou foi o template do relatório do consultor).

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  2. Há uma teoria que diz de desgraça em desgraça até à graciosidade final. A probabilidade de se verificar num caso concreto é muito baixa. Mas não é zero. Consideremos os 130 mil euritos um investimento nesta teoria. Como se calcula, a probabilidade da teoria se verificar aumenta quando se tomam medidas que contrariem as desgraças anteriores. É um desafio apaixonante tentar que isso aconteça. Começando por tomar medidas para que a tal grande cidade passe a ser grande, o que não é verdade neste momento. É uma pequena e apagada cidade.

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