terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O eleitor

O eleitor está sentado num banco de jardim em frente da sede da Fundação Gulbenkian.
Não foi votar nas eleições para presidente da república de janeiro de 2011.
O seu voto está então classificado, pelos senhores bem pensantes que sabem interpretar as leis melhor do que os cidadãos comuns, como de abstenção.
Sou capaz de estar a interpretar mal.
Como os senhores bem pensantes têm deficiente formação matemática e grande dificuldade de entendimento do conceito de zero, é provável que considerem que este eleitor não votou.
Pessoalmente eu acho que sim, que votou, votou marginalizado porque o puseram num banco de jardim com uma garrafa de cerveja na mão.
Se o escorraçam do exercício da democracia o que ele faz ou não faz tem de ser contabilizado nas contas da democracia.
Que foi marginalizado tambem está no letreiro que tem aos pés do banco e em que apela à caridade.
Depois da declaração dos direitos do homem ainda se apela à caridade?
Porquê? porque têm medo de que os investidores deixem a conomia desacelerar?
Não tenham.
O banco até está na Gulbenkian e a Gulbenkian até deixa estar o eleitor aqui; até deixava que o governo arranjasse formas de colaboração com os dinheiros da Fundação se com isso melhorasse o coeficiente de Gini.
Mas vamos que não votou.
Quantos como ele?
Tal como ele mais de metade dos eleitores.
E da outra metade e um pouco menos, há uma metade que foi ajudada pelos senhores bem pensantes a ser um bocadinho mais que metade para poder eleger o senhor presidente.
Porque, assim como marginalizaram fisicamente o eleitor da fotografia, também marginalizaram o pensamento de muitos cidadãos que entregaram o seu voto em branco.
Já desde 1982 que os senhores bem pensantes escreveram, com aquela capacidade de desprezo pela realidade pequenina quando comparada com a grandeza da sua sabedoria, que para as contas da mais de metade que define a eleição só entram os votos "validamente expressos".
Como se o silencio não fosse válido.
Como se o zero não tivesse a mesma existencia dos outros digitos embora não haja dedo para ele (deve ser por isso, dificuldade de abstração para compreender o conceito de zero e de significado do silencio e do branco).
Cerca de um quarto dos eleitores votou no senhor presidente.
Mas vamos à classificação por ordem decrescente de preferencia dos eleitores, com base nos resultados finais:

abstenção .................................................    53,37%
candidato 1 ...............................................................    23,16%
candidato 2 ...............................................................      8,64%
candidato 3 ...............................................................      6,17%
candidato 4 ...............................................................      3,12%
brancos ....................................................................      1,99%
candidato 5 ...............................................................      1,97%
nulos ........................................................................      0,90%
candidato 6 ...............................................................      0,69%
_________________________________________
total de eleitores inscritos (9.629.630) ........ 100,00%

Salvo melhor opinião, seria este o quadro a orientar as  grandes estratégias nacionais, pelo que significa um valor tão alto para a abstenção como falhanço de organização de uma sociedade.
Um valor tão alto significa que a pessoa não pôde votar porque é doente, porque é pobre, porque é assaltante, porque não é autónoma, porque não interpreta os dados.
A matemática faz falta às regras eleitorais.
Já daquela vez em que o matemático Charles Bordas propôs a regra proporcional na assembleia francesa Napoleão Bonaparte mandou dizer que não podia ser, que a dissolvia, não gostava de ouvir as minorias.
E Napoleão sabia porquê, porque também tinha formação matemática.
O ramo da matemática que se ocupa das regras eleitorais também já explicou a forma mais correta para uma eleição por sufrágio direto: cada eleitor dispõe de um conjunto de votos de valores diferentes que tem de distribuir por vários candidatos segundo a ordem da sua preferencia (é, é o método para as canções da eurovisão).
Ver em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2009/08/homenagem-schulberg-e-governabilidade.html
Mas está bem.
Considerando que a iliteracia matemática em Portugal é um dado maioritário, não vamos discutir.
Mantenham os votos brancos de fora, apesar de eles e as abstenções estarem a ameaçar atingir valores insustentáveis.
Mas publiquem o que os eleitores dos votos nulos escreveram nos seus boletins.
Temos direito a essa informação, não temos?

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