terça-feira, 30 de agosto de 2011

De Pablo Neruda, Ode à cebola



Ode à Cebola


Cebola
Luminosa redoma
Pétala a pétala
Cresceu a tua formosura
Escamas de cristal te acrescentaram
E no segredo da terra escura
se foi arredondando o teu ventre de orvalho.
Sob a terra
foi o milagre
e quando apareceu
o teu rude caule verde
e nasceram as tuas folhas como espadas na horta,
a terra acumulou o seu poderio
mostrando a tua nua transparência,
e como em Afrodite o mar remoto
duplicou a magnólia
levantando os seus seios,
a terra
assim te fez
cebola
clara como um planeta
a reluzir,
constelação constante,
redonda rosa de água,
sobre
a mesa
das gentes pobres.
Generosa
desfazes
o teu globo de frescura
na consumação
fervente da frigideira
e os estilhaços de cristal
no calor inflamado do azeite
transformam-se em frisadas plumas de ouro.
Também recordarei como fecunda
a tua influência, o amor, na salada
e parece que o céu contribui
dando-te fina forma de granizo
a celebrar a tua claridade picada
sobre os hemisférios de um tomate,
mas ao alcance
das mãos do povo regada
com azeite polvilhada
com um pouco de sal,
matas a fome
do jornaleiro no seu duro caminho.
Estrela dos pobres,
fada madrinha
envolvida em delicado papel,
sais do chão eterna,
intacta,
pura como semente de um astro
e ao cortar-te a faca na cozinha
sobe a única lágrima sem pena.
Fizeste-nos chorar sem nos afligir.
Em tudo o que existe celebrei,
cebola
Mas para mim
és mais formosa
que uma ave de penas radiosas
és para os meus olhos globo celeste,
taça de platina baile imóvel de nívea anêmona
e vive a fragrância da Terra
na tua natureza cristalina.

                                           Pablo Neruda

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