Devo isto ao professor Daniel Barbosa, que dava aulas de economia no IST nos anos 60.
Vamos que uma destiladora produz 500.000 garrafas de whisky por mês (é uma hipótese).
O custo unitário poderá ser de 3 unidades de conta à saida da fábrica (é uma hipótese).
Mas eis que a empresa produtora, beneficiando das potencialidades da sua maquinaria, aumentou a produção para 700.000 garrafas.
As primeiras 500.000 garrafas ficaram-lhe ao custo unitário de 2,8 unidades de conta e as restantes garrafas ao custo de 0,8 unidades de conta.
Vamos também que a destiladora vende as 500.000 garrafas aos distribuidores escoceses ou irlandeses a 3,1 unidades de conta a garrafa, mas vende aos importadores portugueses as 200.000 a 0,9 unidades de conta.
Os distribuidores agravarão com os custos de transporte e as suas margens de lucro.
Poderão por exemplo vender a garrafa a 8 unidades de conta, com um lucro da ordem de 8 - (0,9 + transporte + armazenamento) ~ 6 unidades de conta.
Eis que alguem da distribuidora portuguesa se lembra de "oferecer" um desconto de 50% sobre as garrafas de whisky que vende por 4 unidades de conta.
Reduziu portanto o seu lucro para 2 unidades de conta.
É dumping?
É; porque se tivesse comprado as garrafas pelo seu preço médio à saida de fábrica (2,47 unidades de conta) estaria a vendê-las por preço inferior aos custos de produção.
Mas facilmente apresentará à entidade "reguladora" um papelinho em como as comprou a 0,9 e teve com elas custos de 1,1 de transporte e armazenamento.
E a "reguladora" que não pense em fazer voz grossa ao fabricante escocês ou irlandês, porque este apresentará outro papelinho, à "reguladora" da terra, comprovando que aquelas 200.000 garrafas foram produzidas a 0,9 unidades de conta cada, o chamado custo marginal, fruto da produtividade e rendibilidade devidas à escala da produção.
Isto é, apesar das almas crédulas nas virtudes dos mercados a funcionar livremente, que repetem como a personagem de Armando Cortês num programa de passagem do ano dos tempos da televisão monocanal "o que era bom era que a televisão transmitisse"- o que era bom era que a reguladora regulasse, "isto", como se diz em linguagem corrente, não vai com "regulações".
Como André Macedo, do DN e Dinheiro Vivo diz hoje, o problema não está nos descontos nem no dumping, o problema está no duopólio Pingo Doce - Continente.
Podem os cidadãos crer firmemente que com a concorrencia ficam a lucrar, mas não ficam; os preços baixos do Pingo Doce devem-se a uma escandalosa predominancia de importações que contribuem para o aumento do endividamento de todos nós.
E vamos todos assistindo à luta dos dois campeões, à espera que um deles caia para o lado, para que o vencedor possa subir os preços à sua vontade (caminho seguido pelos estaleiros sul-coreanos na construção naval).
Pena os nossos decisores não repararem no sistema norte-americano, com as suas leis anti-cartel, fruto da experiencia com o funcionamento dos mercados, em vez de insistirem em taxas que as distribuidoras duma maneira ou outra encaixarão umas vezes nas suas largas margens de lucro, e outras vezes farão subtilmente repercutir nos custos dos consumidores.
Já o profeta do Jordão dizia que os economistas dos grandes grupos, perdão, os filhos das trevas, são muito mais inteligentes que os filhos da luz.
E os consumidores deixam-se alegremente embalar pelo canto da sereia dos descontos e da concorrencia, mas pagando, enquanto comunidade, o predomínio corrosivo das importações.
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