sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

A novela do PET aos 13 de janeiro de 2012

Os governantes voluntariosos falavam em outubro de 2011 que poderiam dar seguimento ao requisito da Comissão Europeia de avançar com a ligação ferroviária de passageiros para Madrid com um quarto dos custos anteriormente previstos.
Isto porque a Comissão Europeia chamou a atenção que não bastava a ligação para mercadorias.
Na altura foi anotada a capacidade de fazer orçamentos e a rapidez com que dominavam todas as variáveis que entram num processo tão complexo e pluridisciplinar.
Mas nunca mais disseram nada, os governantes, sobre o novo projeto que ficaram de apresentar à Comissão Europeia.
Ela até contribuía, mas precisa de ver o projeto.
Ai o que acontece quando os governantes não se contêm ou falam de coisas que não dominam.
Mais tinha a Comissão Europeia chamado a atenção para que o plano estratégico apresentado pelo governo carecia exatamente do que ostentava no título, de estratégia, que um plano não é apenas um enunciado de intenções e de princípios, e que num plano estratégico de transportes tem de haver um diagnóstico e medidas de eficiência energética (o consumo do setor dos transportes é cerca de um terço da energia primária consumida).
É possível que o grupo de trabalho para a reformulação dos transportes nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto tenha recebido do governo também a incumbência de atenuar, no que lhes diz respeito, aquelas falhas do PET.
É possível, porque o secretismo continua, mais de um mês depois da entrega do relatório.
Este secretismo é inaceitável.
Os próprios deputados da Assembleia da Republica não têm ainda acesso ao relatório.
A democracia, por definição, é anti secretismos, e infelizmente verifica-se que a democracia não dispõe de mecanismos para evitar o secretismo.
O secretismo não é a alma do negócio, é o seu assassino.
Sabe-se isso desde o desenvolvimento do método científico, assente na partilha do conhecimento.
Consta que os dados que fundamentam o relatório até são consistentes e em quantidade razoável, embora continue a não se realizar um inquérito fiável à mobilidade nas áreas metropolitanas.
Consta ainda, apesar do secretismo, que uma das propostas estudadas no grupo de trabalho foi a criação d um passe-cidade Carris-Metro-CP, mas que as empresas privadas se opuseram terminantemente, agarradas que estão à distribuição de receitas que as favorece, conforme o inquérito desatualizado de 1998, porque nessa altura a rede do metro era menor.
Aliás, consta também que as empresas privadas não estão interessadas em divulgar o número de passageiros.km que transportam (e que é o produto de uma empresa de transportes de passageiros), só o número de passageiros.
E consta também que o grupo chegou à conclusão que a cobertura dos custos operacionais (incluindo gastos com pessoal)  pelas receitas na Carris e no Metro até é muito razoável no contexto dos transportes metropolitanos dos outros países , contrariando assim as críticas escandalizadas do senhor ministro da economia e transportes aos preguiçosos e   privilegiados trabalhadores do setor dos transportes.
Enfim, como o secretismo é compatível com a colocação de hipóteses, e constando também que o ministério da economia e transportes se sente obrigado a apresentar qualquer coisa brevemente, receia-se que a política demagógica e ignorante de cortar por cortar, sempre com o argumento de não haver dinheiro (e contudo, há dinheiro para desperdiçar em combustíveis fósseis na entrada e passagem  de automóveis em Lisboa e Porto), se sobreponha à análise profissional.
Aguardemos.

Ver:
http://www.cm-lisboa.pt/archive/doc/MOV_21_2_Jan_2012.pdf

PS - Pouco depois de escrever esta mensagem, leio no DN de hoje que o senhor ministro da economia e transportes adiou sine die a audiência pedida pela comissão de coesão social da assembleia metropolitana de Lisboa (AML) e marcada para 16 de janeiro.
O objetivo era debater questões como o desemprego na AML, as politicas de emprego e a rede de transportes  das áreas metropolitanas.


Se é verdade, trata-se de uma manifestação de desprezo e uma falta de respeito pelos cidadãos e cidadãs representados pela AML e pelos princípios básicos da democracia representativa.
Se é verdade que nem se consegue marcar uma data, só pode revelar ignorância e incompetência técnica sobre as questões de transportes.
Se é verdade, é provável que a razão tenha sido porque o grupo de trabalho tratou seriamente os dados recolhidos que contrariam os disparates que os senhores governantes anteriormente disseram sobre o tema (por exemplo, que 10.000  passageiros por dia é uma procura baixa, ou aquela da oferta ser 400% da procura), apregoando a aplicação como panaceia universal da religião da minimização do estado e das privatizações.
É apenas uma hipótese, mas o secretismo imposto pelo governo faz pensar assim.


Na verdade, pode não haver dinheiro, mas a incapacidade já revelada para os senhores governantes dominarem as questões de transportes ultrapassou, do ponto de vista técnico, os limites do razoável.
Deontologicamente, compete aos técnicos do setor denunciar isso.
E se não há dinheiro, só pode fazer-se o que qualquer entidade, singular ou empresarial faz num caso desses: uma auditoria para saber por tipo de despesas e de receitas quanto está a gastar e quanto está a receber.
Para se saber onde, quanto e em quê se pode ainda investir.
Mas a compreensão da necessidade de haver dados fiáveis para servirem de base a decisões não faz parte do dicionário.


Não pretendo que tudo isto seja mais uma razão para as greves do setor dos transportes, porque neste momento estas dão pretexto ao governo para pôr a população contra os trabalhadores do setor, e portanto a própria greve acaba por servir os interesses que pretendia combater. Por isso, seria mais lógico utilizar os mecanismos legais para fazer greves com serviços mínimos superiores a 90% ou outros protestos como a realização de paineis de debate das questões, convidando os senhores governantes para participarem, para apresentarem dados fiáveis e argumentos, seguindo-se a divulgação pública das conclusões. Isto é, dar a prioridade aos argumentos relativamente à tomada de posições de força, segundo o princípio de que a força da razão está na própria razão e não na força, podendo perder-se a razão se a força é mal utilizada.











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