7 dias em Havana
Já se sabe que o cinema exerce um fascínio sobre os espetadores.
Uma das formas em que o faz agora é juntando várias histórias no mesmo filme, misturando personagens aparentemente sem relação.
Temos, por exemplo, Babel, de Alejandro Inarritu, 360º, de Fernando Meireles, Roma com amor, de Woody Allen.
E temos 7 dias em Havana, sete histórias em Havana, de sete realizadores, só um cubano.
É bom ver um filme assim, uma associação de pontos de vista sobre uma cidade e as pessoas que a habitam.
Não terá tido apoio do atual poder politico, que talvez não se tenha importado muito.
As imagens são mesmo de Havana, com a degradação dos edifícios coloniais e das habitações da sua parte antiga, que a despesa pública não pode ser direcionada para a manutenção dos atios habitacionais, com a degradação do seu parque automóvel, que não há divisas para importar carros de luxo alemães.
As pessoas vivem como podem, com as limitações de uma economia quase isolada.
Há raparigas que terão o seu trabalho, mal remunerado, mas que oferecem o seu carinho a jovens turistas americanos pelos seus dólares.
Há motoristas, de serviços de táxi clandestinos num Desoto de 1938, que já foram engenheiros, e outros que tocam trompete como os grandes musicos de jazz norte americanos.
Há a presença insistente do negócio sexual nos bares, quase sempre cheios de musica.
Uma psicóloga no hospital público que faz doces em casa que vende fora do circuito legal e que ainda vai à televisão fazer um programa de auto-ajuda.
A presença recorrente das imagens ou da sugestão da fuga para Miami.
A tentação da cantora negra por um contrato de ricos em Espanha e que nem emigra nem vai para a cama com o empresário espanhol apaixonado.
E uma rapariga que por ter um caso de amor lésbico é levada pelos pais para um exorcismo de ritual africano.
Aliás a presença africana é dominante nos ritmos das suas danças.
Será que a ilha, virada para si própria, com uma superfície superior à de Portugal continental, nem estará interessada na política, mas apenas na simples subsistência, na assistência social na educação e saúde, e na musica e na dança de raiz africana?
Quanto do sangue de Cuba veio de navios negreiros portugueses até ao século XIX?
Há um excerto de um discurso de Fidel de Castro.
O discurso não termina e quem espera pelo seu fim tem tempo para contemplar os destroços da cidade.
O discurso é claro: “Cuba resiste ao bloqueio e às tentativas de empobrecimento que o imperialismo americano impõe”.
E de repente vem ao meu cérebro a semelhança entre Cuba e Portugal.
Economias não auto-suficientes.
Uma, vítima de um bloqueio feroz e fechada sobre si própria, sem que os seus dirigentes tenham a coragem de aceitar a abertura à competição entre os elementos do próprio povo, a perda do estado social de assistencia e as consequentes desigualdades a que conduzem as sociedades livres.
Outra, vítima de uma abertura à globalização e à importação desenfreada que lhe destruiu grande parte dos setores primário e secundário.
Uma, em que o nivelamento social, dada a pouca riqueza da nação, conduziu a baixos salários.
Outra, em que a adesão à união europeia e aos critérios do FMI conduziu a baixos salários.
Tão irmanados, Cuba e Portugal, para quem tem rendimentos pequenos.
A conclusão parece ser a de que são ambos filhos de um deus menor, como dizia o romance.
Mas a força da musica cubana é enorme, quando na ultima história os habitantes do prédio se reúnem à volta do altar da virgem feito numa sala acanhada do primeiro andar da vidente, com os azulejos do edifício colonial abandonado, para cantar à virgem e à orixá Yemanjá, deusa do mar.
O filme só mostra pessoas e a cidade.
Não demonstra nada, nem como se resolvem os problemas financeiros de Cuba e de Portugal.
Mas como seria bom, se a democracia funcionasse, em Cuba e em Portugal.
Tanto para fazer e o imobilismo que se mantem.
Fascinante, o cinema.
Sem comentários:
Enviar um comentário