segunda-feira, 3 de junho de 2013

Continuação em maio-junho de 2013 da novela com o senhor secretário de Estado dos transportes

Confessa este blogue que, de um ponto de vista de análise gestionária, sente que o atual governo tem um problema com vários dos seus secretários de Estado.
A sua função é muito difícil, de articulação entre os decisores das estratégias e as entidades do mundo real, num contexto de desmantelamento e desarticulação como o que se vive.
Quando o contexto deveria ser o de investimento com retorno.
No caso dos transportes, essa dificuldade é agravada com a complexidade dos sistemas de tranportes em si, que requerem múltiplas disciplinas de uma forma transversal, e com a condição básica de que o objetivo não é obter lucro, mas utilidade social (e económica, como facilitador da presença de mão de obra no local de trabaho e como eficiencia na utilização da energia primária).
Dado que ninguém pode ser especialista de tudo, é natural que a ignorancia dos decisores se destaque, assim como a ignorancia dos críticos tambem possa manifestar-se.
O senhor secretário de Estado dos transportes começou por destacar-se por ter estado do outro lado da barricada, negociando contratos de parceria publico-privada para, por exemplo, o TGV Caia-Poceirão (BI -banco de investimento da CGD). Tambem esteve ligado, depois de 2008 e respetivas dificuldades dos bancos, à negociação das concessões rodoviárias das autoestradas do Douro Litoral, do Marão, do Baixo Tejo, do Baixo Alentejo, do Algarve Litoral, do Douro Interior e do Litoral Oeste.
Ficou registada a sua afirmação em 2010 (o atual governo tomou posse em junho de 2011) que o chumbo do Tribunal de Contas aos contratos com as concessionárias era uma "nuvem que tinha de desaparecer para o sol voltar").
Evidentemente que numa economia pequena como a nossa os decisores que se destacam e que são chamados para funções governativas dificilmente poderão evitar conflitos de interesses numa definição restritiva de conflito de interesses.
E assim chegamos a uma situação em que assuntos de elevada componente técnica, dum ponto de vista de engenharia, são resolvidos (?) por economistas de acordo com os seus modelos abstratos de simulação de uma realidade da qual se afastam por evidente desconhecimento das questões técnicas, de um ponto de vista de engenharia.
Verifica-se assim uma analogia, guardadas as devidas distancias porque uma metáfora não é uma simulação rigorosa ou sequer aproximada da realidade, com as metáforas de que o melhor guardador do ouro será o ladrão, porque conhece os métodos de obtenção expedita de ouro, ou de que o bairro mais seguro será o da rua vermelha de Amsterdão, porque os empreendedores de lenocínio não quererão afastar os clientes e fonte de receitas, com conflitos com a polícia.
E provavelmente porque o senhor conhece bem o negócio tem apresentado resultados na negociação com as concessionárias, as quais terão reduzido as taxas de rentabilidade de 14%  para 8% (este humilde blogue, baseado no cálculo grosseiro do engenheiro Pompeu dos Santos de que a ponte Vasco da Gama, por comparação com a ponte do Carregado, poderia ter ficado por metade do preço de custo se administrado por concurso público normal, diria que a taxa de rentabilidade deveria ser reduzida para 7%).
No entanto, aos exitos do senhor secretário de Estado contrapõe ele próprio os zigzags e inseguranças da sua política de privatizações (embora estivessem previstas no malfadado memorando com a troika, razões técnicas do ponto de vista de engenharia e o principio constitucional de que assuntos deste calibre são para obterem a aprovação prévia explícita, e não escondida em eleições legislativas, de 75% de votos expressos de eleitores, aconselham que não se façam, pelo menos como o atual governo pretende, embora confessadamente ele ainda não saiba como o quer fazer).
Segundo entrevista de 3 de maio de 2013, os contratos "swap" vieram atrasar o processo de concessão a privados.
Parecerá a este blogue que é uma desculpa simplesmente de mau pagador, continuando a utilizar metáforas não no sentido literal de caloteiro, mas de falta de capacidade técnica para cumprir calendários.
Sobre este assunto das concessões continua este blogue a achar que a decisão de concessionar só deveria ser tomada depois de verificados os cálculos e as respetivas conclusões já apresentadas neste blogue
(http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2013/05/privatizar-ou-nao-privatizar-novela-em.html  ).
Mas como é evidente, vozes de burro não chegam ao céu e o interesse dos grupos privados nas concessões e nas subsequentes indemnizações compensatórias para prestar o serviço público (deuses, se é para pagar indemnizações compensatórias e não receber renda, mais vale não mexer; veja-se a sobranceria da empresa de camionagem que deixou de aceitar o passe social por não concordar com a repartição de receitas) é de facto muito forte.
E porque a força do memorando prevalece, o senhor secretário de Estado diz com um sorriso ao dinheiro vivo (DN/31 de maio de 2013) que desde janeiro de 2011 já saíram das empresas públicas de transportes urbanos de Lisboa e Porto 2600 trabalhadores (59 milhões de euros de indemnizações) , e que está previsto sairem mais 600.
Isto numa altura em que é necessário transferir passageiros.km do transporte individual para o transporte ferroviário se se quiser reduzir a balança de pagamentos de combustíveis fósseis (que imagens aflorarão aos cérebros dos senhores economistas, que cortam quadros de pessoal, quando se utiliza este argumento da fisica? acharão que os 2600 trabalhadores afastados não seriam capazes de gerar mais valias superiores aos seus vencimentos menos 59 milhões de euros? terá o senhor secretário de Estado informações concretas da parte dos técnicos "no terreno", como se costuma dizer, se essa inequação é possível ou não?).
E porque têm de sair 3200 trabalhadores? Porque sim, porque dá 20% de redução e 20% fica bem nos powerpoints?
Enfim, no primeiro trimestre de 2013 as receitas dos transpores urbanos de Lisboa e Porto baixaram 4 milhões de euros para 143 milhões de euros e o EBITDA está em 3,5 milhões de euros negativos (lá se foi a manutenção da promessa precipitada feita no princípio de 2012 de que o EBITDA seria nulo).
Lembraram-se então que uma boa justificação seria o aumento das fraudes. Que são 15% (na verdade, conviria aferir a fórmula de cálculo dessa taxa, que é estimada em 25% na Carris e em 12% no metro) e compará-la com a fraude nos anos anteriores. Também seria interessante tentar a curva de correlação entre o nivel das tarifas e a taxa de fraudes, e entre a taxa de desemprego e a taxa de fraudes. Talvez se pudesse então afirmar com mais propriedade onde está a origem da quebra de receitas.
Fundamentalmente, acha este blogue, no arrefecimento da economia , no desemprego e na redução da oferta e da procura - um sistema como o metro, se é relegado para baixos niveis de oferta como atuamente não  pode retirar da exploração todo o seu potencial de rentabilidade; acresce que para reduzir a fraude é sempre necessário aumentar os custos de vigilancia, fiscalização e repressão; cortes neste meios conduzem à diminuição da atratabilidade do transporte coletivo e à natural diminuição da procura, e das receitas.
Entretanto, surgem noticias verdadeiramente alarmantes de que na linha do Sado grupos de jovens que não querem pagar título de transporte atacam maquinista, revisor e passageiros. A lógica diria que o Estado, por incapacidade de garantir a segurança das populações, deveria indemnizar as empresas de transportes com a perda de receitas e os custos de material de vigilancia e de brigadas de segurança e de fiscalização.
Mas o senhor secretário de Estado contenta-se com a fraude como justificação.
O que me sugere o comentário que "assim não".
De registar ainda a ação de protesto que impediu a conferencia do senhor secretário de Estado no seminário organizado pela Autoridade Metropolitana de Transportes "A região metropolitana, a mobilidade e a logística" com palavras de ordem como "Queremos o nosso dinheiro, este Governo para a rua" e "swaps? Basta de alimentar especuladores com o roubo dos nossos salários".
Deixa este blogue registado que  a expressão de opiniões por mais de um minuto (metade do tempo de espera na hora de ponta do metro antes da crise) de uma forma que impeça a realização de uma ação pública prevista como uma conferência, não tem o  seu acordo, ou não acreditasse em Voltaire. 
O direito à expressão prevalece. 
Por isso mesmo, este blogue considera que o atual governo, contrariamente ao que afirma, não procura o debate alargado e portanto não é adepto da livre expressão de opiniões contrárias (não basta estar à espera de pedidos de entrevistas) das questões de transportes e não tem com os técnicos do setor uma relação saudável (exemplos: a forma secretista como se está a desenvolver o terminal da Trafaria sem o fecho da Golada; a recusa de divulgação do relatório final do acidente de fevereiro em Alfarelos;  a incapacidade de ampliar a participação de técnicos portugueses na elaboração dos projetos dos metros de Argel e de S.Paulo ).

Lamenta este blogue, portanto, que a ação de protesto se tenha prolongado para além do desejável ou tolerável, sem prejuízo de manifestar o seu acordo com as palavras de ordem, e que o senhor secretário de Estado não queira aceitar que deve mudar de política e de relacionamento com os agentes do setor, radicalmente.






Sem comentários:

Enviar um comentário