domingo, 31 de março de 2013

O conflito entre a produção e a distribuição

A citação de frases de figuras conhecidas pode ser apenas a projeção no seu autor dos desejos de afirmação de quem cita,  ou numa tentativa mais ou menos iludida de validação das convicções do citador.
Mas são muitas vezes interessantes, as citações.
Vejam-se estas duas de Dinis Machado, o autor de "Que diz Molero":

"Matam-se pessoas ou faz-se-lhes mal; ou ajuda-se quem é possível ajudar se sobra vontade e desejo de o fazer neste nosso universo tão feito de alcatruzes da nora. Há um letreiro invisível: escolha o seu lugar. Escolha bem ou escolha mal porque terá sempre a sua apropriada claque."

É isso, por maior que seja o nosso disparate, teremos sempre ao nosso lado quem pratique o mesmo disparate. Melhor será, para o disparate não ser tão grande, aceitar a colaboração com o outro lado, o lado dos outros disparates, já que a realidade é difusa e sofre da dialética de manifestar sintomas de causas opostas.
O que nos leva à segunda citação:

"A base dos conflitos que se agitam hoje nas sociedades nasce da fricção constante entre a produção e a distribuição"

Não só já existe um grave problema em produzir, veja-se o caso do PIB tão pequeno em Portugal, como depois a redistribuição dos benefícios falha estrondosamente, agravando o coeficiente de Gini das desigualdades.
Dificil sair deste impasse, ou melhor, desta armadilha da pobreza e da zona de rendimentos decrescentes em que a austeridade provoca recessão maior do que a calculada pelos sábios do FMI (todos os economistas com experiencia de economias frágeis sabiam que o efeito recessivo das medidas de austeridade colocaria a economia numa zona em que os investimentos têm baixissimo retorno.
Infelizmente, as pessoas que na altura alertaram para este efeito pernicioso vão continuar a ser ignoradas pelo detentores do poder politico, e apesar de tudo, ainda há cidadãos e cidadãs que tiveram a sorte de trabalhar em áreas rentáveis. 

Dos pacotinhos de aperitivos no Pingo Doce ao Caribe, aos automóveis alemães e depósitos a prazo de mais de 100.000 euros

Vale a franqueza com que o Pingo Doce manda escrever nos pacotinhos de aperitivos a sua origem.
Caju com piri piri da India, amendoim torrado da China, milho frito de Espanha, sultanas douradas da Africa do Sul, passas de uva da Africa do Sul.
Eu penso que a tentação da globalização é muito grande, porque parece haver vantagem económica.
Mas globalização é também importar com a vantagem económica a atrofia da economia local.
E assim continuamos a importar dois terços dos alimentos e dois terços da energia primária que consumimos.
Impossivel sobreviver com autonomia se não produzimos o valor do que comemos e do que queimamos.
Impossivel sobreviver com os apelos das agencias de viagens a poupar 4 euros por dia durante 8 meses para viajar ao Caribe.
Impossivel sobreviver com as páginas de publicidade dos jornais cheias de anuncios de automóveis alemães de 48.000 euros.
Impossível sobreviver quando os fazedores de opinião rasgam as vestes por se taxarem depósitos superiores a 100.000 euros e assobiaram para o lado quando os contribuintes trabalhadores por conta de outrem tiveram de pagar o resgate dos bancos que não eram deles, contribuintes, na Irlanda, na Grécia, em Espanha, em Portugal.
Só agora terão entendido os decisores da união europeia que tinham razão, os cidadãos e cidadãs islandeses, quando logo ao princípio disseram que não tinham nada que pagar as dívidas dos bancos especuladores?

PS em 3 de abril de 2013 - Amável e discreto comentador criticou a minha crítica à teoria da vantagem comparativa de David Ricardo. Não era a intenção, será pouco rentável a produção de caju em Portugal. Tal como o economista defendeu, devemos investir na produção de vinho em que Portugal tem tradição e qualidade, e quem diz vinho diz passas de uva e milho. 

sábado, 30 de março de 2013

Diálogo breve num posto de combustível

- Que maçada, aumentou outra vez, a gasolina
- E vai continuar a aumentar.
- A cotação do petróleo até está baixa, mas as distribuidoras estão sempre a fazer dinheiro à nossa custa.
- É interessante. Por um lado é verdade, até a troika tem razão, os combustíveis como fator de produção, como fator que entra para a composição do preço de qualquer produto, estão demasiado caros. Mas também é verdade que a energia é um bem escasso e não renovável, no caso dos combustíveis fósseis, e portanto só pode ser caro.
- Mas o petróleo está barato.
- Artificialmente barato, por motivos políticos e no interesse dos grandes grupos económicos e financeiros. Imaginemos que se voltava aos tempos do padrão ouro e se substituia o ouro pela energia. O preço das coisas seria referido ao preço da energia e expresso em unidades de energia. Acontece que há 50 anos se gastava pouca energia para extrair o petróleo. Por cada unidade gasta obtinham-se 50 unidades de nova energia. Agora, com o petróleo cada vez mais escondido e de dificil acesso, uma unidade obtem apenas cinco.
- Mas o petróleo pouco mais caro está agora do que há 50 anos.
- É verdade, porque o aumento dos custos da extração são diluidos por toda a economia, ou melhor, são repercutidos em toda a economia. Tudo está orientado para sustentar o baixo preço do petróleo. É natural que a economia esteja distorcida. E com a globalização, a distorção propaga-se como um virus de que a humanidade não se vê livre.
- E assim vamos de crise em crise, em sucessivas alternancias de bem estar e mal estar.
- É pena. A ciencia económica já tinha tido tempo para sistematizar uma organização melhor das comunidades, estruturalmente imune às vagas recessivas. Mas para isso precisava de conseguir a autonomia relativamente aos combustiveis fósseis e, sobrepondo o interesse público ao da concorrencia dos grandes grupos e às forças de mercado, desenvolver as energias renováveis.
- Aí está uma boa utopia.
- Tu o dizes.

sexta-feira, 29 de março de 2013

As contas da Ivalandia nos finais de Março de 2013 e a estratégia da aranha




O ministro das finanças da Ivalandia afirmou em meados de Março que o défice de 2012 seria de 4,9% do PIB.
Nos finais de março de 2013, de acordo com o Eurostat, o défice é de 6,4% do PIB.
Trata-se de um erro superior a 30%.
O senhor ministro tinha sido avisado por economistas  nos jornais que não devia contar com a privatização da ANA para o défice e já antes tinha sido avisado de que a transferência dos fundos de pensões ia aumentar a despesa.
Mas achou, no conforto do seu gabinete, que estava acima dessas miudezas.
Também nos idos de Março o senhor ministro apresentou à troika as contas do endividamento público.  A dívida seria  123% do PIB. Não era, foi corrigida para 123,6% , atingindo 204,5 mil milhões de euros, em grande parte da responsabilidade da gestão do atual governo.
Na dívida pública incluem-se 4 mil milhões de euros de ajuda à banca (setor  privilegiado) que desde há 3 anos, desde o anterior governo, o estado nela vem injetando, sendo que essa injeção vai continuar. Aliás, a senhora secretária do Tesouro confirmou que se enganaram nas contas das imparidades do BPN e empresas SLN.
Continuamos sem conhecer os resultados de uma auditoria à dívida pública e à dívida privada, para hierarquização dos credores e controle da evolução.
Falta ainda incluir na dívida pública as dívidas de empresas públicas e hospitais de parceria (aos anos que os relatórios e contas das empresas públicas de transportes chamam a atenção dos governos para a necessidade do Estado assumir as dívidas dos investimentos em infraestruturas de longa duração dessas empresas).

Perante o exposto, se considerarmos os contribuintes como acionistas do Estado, será fácil adivinhar o que os acionistas pensariam do CFO e equipa da empresa Estado.
Em assembleia de acionistas diriam que estavam fartos dos seus erros e que desejariam substituir o CEO, o CFO e o chairman.
Julgo eu.
Imagino o senhor CFO a defender-se, que o défice estrutural primário em 2012 foi de 0% (saldo sem juros e sem considerar os efeitos recessivos externos). E a dizer que tudo estaria bem se não fossem os juros, a recessão, as medidas extraordinárias e as dívidas herdadas (variante economista da anedota da avó torta que seria viva se não tivesse morrido).
Mas como é ficção, e como a democracia que vivemos não tem meios de defesa contra este tipo de gestão, ou melhor, como os meios previstos são ineficazes se os órgãos que os podem acionar não o quiserem fazer, muitos seremos vítimas da estratégia da aranha, anestesiados pelo veneno e enrolados nos fios da teia.
Mas outros sobreviverão à estratégia de aniquilamento.
Sempre foi assim, a humanidade ter resistido aos abusos das classes dirigentes.
No futuro, a democracia terá meios mais eficazes de lhes resistir, estará mais próxima duma democracia direta, com possibilidade de intervenção de grupos de cidadãos sem líderes iluminados, com recurso a referendos  e através das estruturas autárquicas de base (será também por isso que o governo atual quer reduzir o número de freguesias para além do razoável?).

Para o senhor Schauble - Fur Herr Schauble




In letzter Zeit abwesend die Zeitung lesen, Kanal Mezzo vai Springen von Genre zu Genre der Musik in der Musik.
Plötzlich kommt der Aranjuez Konzert, Joaquin Rodrigo.
Das Adagio.
Simon Ratel und die Berliner Philharmoniker, die Umgebung des goldenen Saal der Residenz des Orchesters.
Der Solist ist Spanisch, und ich konnte nicht beheben den Namen.
Ich bin mir nicht sicher, was genau die Stücke Rodrigo schrieb, aber die Interpretation ist herrlich.
Simon Ratel wird komplett auf Musik gegeben.
Die deutschen Musiker, kompetent, auch.
Die Hilfe konzentriert.
Ich lese die Zeitung.
Mezzo sprang zum anderen und noch ein anderes Musikstück.
Ich sehe eine beleibte Herr, in Weiß gekleidet, auf eine Bühne zu springen.
Holen Sie sich einen Posaune Sticks und beginnt seine Interpretation des Adagio Concerto de Aranjuez.
Es ist ein Jazz-Musiker, schwarz, mit seiner Band.
Ich bin kein großer Fan von Jazz-Musik, aber ich blieb auf dem Bildschirm, wie ich Musik zu hören.
Macht Variationen oder Improvisationen, wie die Amateure Jazz bevorzugen, und plötzlich fühlen, weil ich wieder einmal gestehen, dass ich eine emotionale, eine kleine Träne herab sein Gesicht bin.
Da die Menschheit ist in der Lage die besten Dinge der Welt als die Musik von allen Farben und Breiten zu verbinden.
Als ich an internationalen Treffen von Experten, die die Sprache seiner Arbeit zu verstehen, auch die Disziplin der Musik verbindet Menschen (ja, ich schrieb Disziplinlosigkeit entdeckt hatte, ist es nicht klar, welche Art von Disziplinlosigkeit dies, dass die Menschen ermöglicht, ist Verständnis wechselseitig?).
Wie, dann, in Neid untereinander, Herr Schäuble sprechen?
Neid?






Enquanto, de tarde, leio distraidamente o jornal, o canal Mezzo vai saltando de género de música em género de música.
Bruscamente surge o concerto de Aranjuez, de Joaquin Rodrigo.
O Adagio.
Simon Ratel e a orquestra filarmónica de Berlim, na sua residencia dourada.
O solista é espanhol e não consegui fixar o nome.
Não sei se interpreta exatamente o que Rodrigo escreveu, mas a interpretação é esplendida.
Simon Ratel está completamente entregue à música.
Os músicos alemães, proficientes na sua técnica apurada, também.
A assistencia concentrada.
Continuo a ler o jornal.
O Mezzo saltou para outra peça musical e outra ainda.
Vejo um senhor corpulento, vestido de branco, saltar para um outro palco.
Pega num trombone de varas e começa a sua interpretação do adagio do concerto de Aranjuez.
É um musico de jazz, negro, com a sua banda.
Não sou grande apreciador da música de jazz, mas fico preso ao ecran enquanto escuto a música.
Faz variações, ou improvisações , como os amadores de jazz preferirão, e de repente sinto, porque mais uma vez tenho de confessar que sou um emotivo, uma pequena lágrima a descer pela face.
Porque a humanidade é capaz das melhores coisas do mundo como juntar-se a tocar a musica de todas as cores e latitudes.
Como eu já tinha descoberto em encontros internacionais de técnicos, que se entendem com a linguagem do seu trabalho, também a indisciplina da musica une as pessoas (sim, escrevi indisciplina; não se entende que tipo de indisciplina é esta que permite às pessoas compreenderem-se mutuamente?).
Como, pois, falar em inveja de uns por outros, Herr Schauble?
Inveja?


terça-feira, 26 de março de 2013

O ministro das finanças da Ivalandia em Nova York

O ministro das finanças da Ivalandia deslocou-se a Nova York e à sede do FMI.
Falou também com o secretário do Tesouro dos USA, Timothy Geitner, um dos principais atores da crise associada ao Lehman Brothers (como diziam os gregos, a mordedura de um cão cura-se com a baba do cão; quando se cura, claro).
Mais uma vez os soberanos financeiros devem ter ficado abismados com a sapiencia do senhor ministro , a quem garantiram toda a compreensão neste momento dificil.
Os cidadãos e cidadãs que ganham a sua vida com o seu esforço sabem que nem a confiança dos mercados nem a compreensão dos dirigentes financeiros internacionais servem para comprar melões ou sementes de couve.
Sabem também, infelizmente por experiencia própria, o que pensar de quem apresenta desculpas como aquela do programa estar mal desenhado (os programas desenham-se ou concebem-se, elaboram-se, escrevem-se? os mercados não terão ficado nervosos sabendo que a troika anda a desenhar mal?).
E de quem ainda faz humor com as previsões meteorológicas, quando as conquistas científicas permitem a predição pela análise de dados.
Nem pensarão nada de mal, terão misericórdia na apreciação.
Mas é bom para a auto estima do senhor, falar com ar pausado com gente tão importante.
Duvido que tenham discutido formas de aumentar o PIB com investimento produtivo de modo à mesma despesa pública corresponder a uma percentagem menor do PIB (aquela ideia de exigir fatura na compra do DN também é boa para aumentar o PIB; 82 milhões de faturas enviadas pela internet para o ministério das finanças em dois meses e meio por restaurantes e algumas oficinas e cabeleireiros de pois de terem sido forçados a adquirir 1000 a 1500 euros de equuipamento e software,  é obra; mas não aumenta a capacidade produtiva de bens ou serviços ditos transacionáveis) .
Duvido que tenham discutido a aplicação de uma taxa sobre as transações financeiras.
Ou sobre cada movimento do multibanco sem repercussão no cliente.
Ou sobre a construção de uma central solar térmica de sais fundidos (por acaso já em construção nos USA).
Ou sobre medidas para diminuir a influencia dos off-shores tipo Cayman e dos in-shores tipo Suiça, Holanda ou Londres.
Era pedir muito.

segunda-feira, 25 de março de 2013

What did you say, doctor Abebe Selassie?


What did you say, doctor Abebe Selassie?
Unemployment result unhappy?
Worst than expected?
Disappointing to increase competition, lower demand and electricity prices not lowering?

Oh Dear!

Sabe, os manuais da London School nem sempre contêm a informação toda, especialmente a referente a países de economia pequena e com especificidades nem sempre compreendidas por estrangeiros.
É um pouco como a armadilha da pobreza.
Estar-se numa zona da curva dos rendimentos decrescentes em que os investimentos não trazem retorno, e em que medidas de austeridade se repercutem segundo leis de ressonância (fenómeno de amplificação de amplitudes de variáveis no tempo) aumentando cada vez mais a recessão do PIB.
Mas é estranho que o senhor doutor venha dizer que o desemprego foi pior do que o esperado.
Pensava que a London Schools tinha melhor conhecimento da interdependência das variáveis económicas, apesar dos seus economistas preferirem os gabinetes à realidade mal cheirosa dos indemnizados que foram despedidos por imposição da troika.
Sabe, os despedidos podem receber uma indemnização maior do que na Alemanha ou nos USA mas grande parte deles pode entrar em depressão e vão ter muita dificuldade em encontrar emprego.
Até podemos pensar que a troika acha muito bem estar-se a investir o dinheiro da segurança social para pagar indemnizações e subsídios de desemprego e esgotar assim os dinheiros da dita segurança social.
Ah, mas o senhor doutor acha que despedir aumenta o desemprego com os despedidos mas vai criar mais empregos graças à confiança dos empregadores.
Isto é, a London Schools e a escola de Chicago acham que despedir cria mais empregos do que suprime.
What fairy tales you believe, Dear!
E se fosse assim, estaria o governo português a usar o dinheiro das indemnizações e dos subsídios de desemprego para financiar novos empregos… não é ilegal, por prejudicar a concorrência que não despediu?(brinco com os seus argumentos, claro, porque eles são muito jocosos; dizer que o desemprego é pior do que o esperado é jocoso, embora também seja trágico).
Speak frankly, unemployment is a goal of London School and Chicago School.
Desemprego serve para conter os preços e fazer baixar os custos de produção do fator trabalho.
Sabe isso muito bem.
Porque veste então a pele do santo inocente e candido?
Ah, é verdade, quanto aos preços da energia.
Não quer aceitar a ideia de que a energia é um bem estratégico que deve estar subordinado ao conceito de serviço público, pelo que a concorrência não é para aqui chamada?
Eu sei que seria despedido se pensasse como eu, mas ao menos eu posso exprimir o que penso; não sei se o senhor doutor pode fazer o mesmo.
Quanto a preços de energia, conhece o senhor doutor o caso da desregulação da eletricidade na Califórnia e correspondente aumento de preço como consequencia da concorrencia?
Se não conhece recomendo.
Mundo cão, a economia da eletricidade.
Avessa aos dogmas da escola de Londres e da escola de Chicago.
Best Regards


domingo, 24 de março de 2013

Uma conversa delicada sobre depósitos bancários




Não, o tema da conversa não é a tentativa de explicação da desagradável forma de expressão dos governantes, desde a inflexibilidade e a não vacilação do primeiro ministro perante a dissonância entre a realidade e as suas convicções, até às frases triclínicas do ministro das finanças de grande desapontamento com o desemprego, quando um desemprego alto faz parte da sua bíblia de conter o custo de vida e baixar os custos de produção do fator trabalho.
O tema da conversa é a proposta de taxação dos depósitos bancários em Chipre.

Já se propôs neste blogue o levantamento do sigilo bancário (e, sob condições que contrariem a extorsão, a divulgação das declarações de rendimentos), a taxação das transações financeiras e a taxação, sem custos para o cliente, das operações no multibanco.
Os poucos comentadores deste blogue têm sido simpáticos e têm-se abstido de manifestar escândalo perante essas propostas.
Provavelmente porque já estão escandalizados com os cortes dos subsídios de férias e com as sobretaxas extraordinárias sobre salários e pensões.
Talvez que o argumento contra as propostas deste blogue seja a famosa confiança dos investidores e dos depositantes.
Que tais propostas afugentariam e enervariam “os mercados”, apesar deste mesmo blogue já ter proposto a identificação dos ditos mercados, nomeadamente os credores, não para exercer violência sobre eles, mas identificar a legitimidade da dívida e as prioridades e faseamento da sua liquidação.
Pensa este blogue que numa altura em que grandes empresas transferem as suas sedes para in-shores como a Holanda, Londres ou Suíça, esse argumento é fraco.
Acresce que este blogue tem presente, tal como qualquer cidadão ou cidadã de hoje que tenha conhecido de perto representantes da classe média dos anos 20 e 30 do século passado em Portugal, que era frequente a posse, por cidadãos e cidadãs dessa classe média de contas bancárias na Suíça, em França ou na Inglaterra.
Isto numa altura em que os pobres ministros das finanças da I República lá iam equilibrando mais ou menos as contas, na ressaca da bancarrota de 1892 (o célebre equilíbrio do manholas de Santa Comba vem na sequencia de uma curva progressiva, sem brusquidão e portanto sem espanto) e os governos, tan bien que mal, lá iam reformando a justiça e a educação (nomeadamente o ensino técnico secundário e o ensino técnico superior), enquanto a industria lentamente crescia e as concessões de serviços e monopólios como o do tabaco ajudavam ao crescimento.
Faltava o dinheiro para as classes de menores rendimentos, mas a classe média lá ia exportando divisas e recuperando alguns juros para reinvestir em Portugal.
Isto apenas para dizer que não espanta que haja fugas de capital numa altura crítica para o país, pelo que a taxação de depósitos bancários poderá agravar uma situação, mas não a cria.
Tentemos algumas contas comparativas.
Este blogue não surpreenderá  os leitores, sendo adepto do levantamento do sigilo bancário, se os informar que o seu escrevinhador tem cerca de 50.000 euros em certificados de aforro (mérito da capacidade de investimento das gerações anteriores).
Valor inferior ao limite de 100.000 euros de garantia pelo BCE.
Baixa da taxa de juro dos certificados de aforro - Aconteceu, há cerca de 7 anos, um senhor secretário de Estado do Tesouro se ter lembrado de reduzir as taxas de juro dos certificados de aforro com o fim confesso de afugentar os aforristas (pobre secretário de Estado convencido; uns anos depois ficou demonstrado o seu disparate).
Supondo que o diferencial entre uma taxa justa e a taxa artificialmente baixa foi ao longo destes 7 anos de 1%, temos que o humilde bloguista foi prejudicado durante esse tempo em 500 euros por ano, isto é, num total de 7x500=3.500 euros.
Não vi um único comentador lamentar este prejuízo, nem rasgar as vestes por estarem a violar o sagrado direito à propriedade das poupanças e das expetativas da sua rendibilidade, possivelmente porque entenderiam que o escrevinhador deveria ter levantado o seu dinheiro e investido no Lehman Bros ou na AXA (como alguns dos seus colegas fizeram) ou no BPN, ou no BPP, ou no BCP ou …
Taxação de depósitos em Chipre - Se os 50.000 euros tivessem sido taxados  a 6% como parece ter sido a primeira ideia para os depósitos em Chipre (segundo outras informações, a taxa para este montante seria de 3%; suponho ainda que se trata de depósitos a prazo ou obrigações, e ignoro se a proposta previa a conversão de metade do dinheiro obtido com a taxação em obrigações, ou de obrigações em outras de prazo superior e juro inferior), o escrevinhador teria sido prejudicado em 3.000 euros (em 1.500 euros se só metade fosse confiscado), valor portanto inferior ao da baixa da taxa de juro dos c.a.
Taxa extraordinária sobre as pensões – Não se estranhará também a divulgação da pensão bruta do escrevinhador: 4.450 euros. A sobretaxa que está descontando é de cerca de 350 euros, o que dará por ano 350x14=4.900 euros. O que faz pensar o que leva tantos comentadores a escandalizarem-se com a taxação dos depósitos de Chipre.
Possivelmente o facto de 40% dos depósitos (total dos depósitos em Chipre 68.000 milhões de euros – em Portugal 130.000 milhões; PIB de Chipre 18.000 milhões – em Portugal 165.000 milhões; mais uma vez, baixas taxas per capita em Portugal) serem superiores a 100.000 euros e serem provenientes de cidadãos russos, ingleses e holandeses que acharam que Chipre era um ótimo off-shore para pagar menos impostos. Na verdade, a maior parte do esforço iria recair nos depositantes estrangeiros, a uma taxa de 9,9% (embora esse esforço fosse aliviado à custa dos depositantes entre 20.000 e 100.000 euros).
Que culpa têm as pessoas de menores rendimentos, que nem sequer têm depósitos de 20.000 euros a render no banco, para sofrerem com esta crise?
Racionalização da proposta de taxação de depósitos – Existe  uma concordância interessante entre o escrevinhador e o comentador de economia no Dinheiro Vivo, aliás professor na universidade de Columbia, Ricardo Reis, sobre esta questão.
Digo interessante porque o ponto se vista deste economista é essencialmente liberal, o que não é propriamente o ponto de vista do escrevinhador.
Mas as coisas estarão acima de pontos de vista, quando é o interesse da comunidade que se pretende servir.
Diz Ricardo Reis que a taxação de depósitos bancários deverá seguir a regra da senioridade quando o banco abre falência (o nosso BPN parece que demonstrou que não havia dimensão em Portugal para tantos bancos e que falência por falência mais valia evitar a fastura de 8.000 milhões a pagar pelos contribuintes).
Quem primeiro deve ser pago, usando os ativos do banco falido, serão os depositantes com menos de 20.000 euros (o escrevinhador incluirá também aqui a garantia de emprego ou de subsidiação para os trabalhadores não decisores, mas será esta outra discussão) .
Depois, os depositantes com mais de 20.000 euros e menos de 100.000.
Depois os depositantes com mais de 100.000 euros e os investidores.
Finalmente, os acionistas, embora nessa altura pouco deverá restar.
Que diabo, estas coisas estão tratadas há muito tempo nos manuais universitários, porque cargas de água os senhores políticos, quer os decisores do destino do BPN (e dos ativos da SLN), quer os senhores de Bruxelas taxadores de depósitos ignoram os manuais?
Faz lembrar a distancia entre a universidade e a industria (no pressuposto de que em casos concretos o know-how existe nas universidades).
Que coisa.
Não seria melhor taxar os depósitos a prazo do que cortar em salários e em pensões? do que estar a castigar as pessoas de menores rendimentos?

Dificil, cumprir a lei - o PNPA



As duas primeiras fotografias mostram manifestantes em protesto contra a falta de apoios a pessoas com mobilidade reduzida (PMR) .
Esses apoios, em que se inclui a eliminação das barreiras arquitetónicas limitadoras da mobilidade destas pessoas, são objeto de diretivas europeias já transpostas para a legislação nacional e, como tal, elegíveis para beneficiar de fundos europeus (desde que os respetivos projetos de execução estejam bem elaborados).

desmontagem de estaleiro antes da instalação da vedação da paragem da obra

local do elevador de superficie


As duas fotografias seguintes são motivo de descontentamento e frustração.
A obra de instalação de elevadores na estação Colégio Militar foi interrompida na sequencia de um contencioso entre o metropolitano e o empreiteiro.
À superfície foi desmontado o estaleiro.
Já estava executada a abertura para a instalação do elevador de superfície e ligação ao átrio de bilheteiras.
No site do metro e nas informações aos passageiros nas estações pode ler-se que existe um plano de adaptação de todas as estações a pessoas com mobilidade reduzida:
“… para os clientes cuja mobilidade se encontra por algum modo reduzida, está a ser desenvolvido um programa gradual de implementação de acessibilidades nas estações ainda não preparadas para esse efeito”.
Com o devido respeito, o referido plano não está a ser desenvolvido, já foi desenvolvido (à exceção dos projetos de alteração das 6 estações de menor movimento) e nunca posto em prática por oposição surda de anteriores administrações do metropolitano.
Não quero diabolizar ninguém, apesar das orientações desses administradores serem as de responder às perguntas das entidades oficiais e da imprensa sobre o plano com listas de atividades em curso, ou que deveriam estar em curso; a opinião desses administradores opôs-se à diretiva comunitária, argumentando que ficava mais barato assegurar a mobilidade em pequenos autocarros e motoristas vocacionados para o apoio às pessoas PMR (de facto, a lista de todas as intervenções necessárias para o cumprimento do plano em 14 estações e nas 112 unidades triplas estava orçamentada em 40 milhões de euros; excluída a orçamentação, em rubrica separada,  de 6 estações da linha verde de que Alvalade e Roma, parcialmente, já dispõem entretanto de elevadores);  mas esquecendo que tomar essa decisão em nome dos interessados é limitar o direito dessas pessoas a escolherem o seu modo de transporte.

Sinto uma grande frustração por ter estado ligado a esse plano de 2004 a 2009 (o chamado Plano Nacional para a Promoção das Acessibilidades) e nunca ter conseguido formalizar o protocolo, com o INR - instituto nacional de reabilitação  (anteriormente SNRIPD – secretariado nacional para a reabilitação e integração de pessoas com deficiência) , do compromisso de realização desse plano, apesar da colaboração com instituições como a ACAPO e a APD,  e de ter deixado, com os meus colaboradores, os projetos prontos para concurso em várias estações.
Assisti, impotente, ao passar dos anos com sucessivas prorrogações dos prazos de conclusão das obras de adaptação das estações ao PNPA. Primeiro, conforme a transposição da diretiva europeia, até 2009.
Atualmente fala-se em 2020 e eu duvido. Infelizmente, receio que as minhas reservas se confirmem, porque não se vêem as equipas de projeto a trabalhar nisso, e os fundos comunitários exigem projetos bem elaborados. Estações de correspondência como Campo Grande, Jardim Zoológico, Colégio Militar, Entrecampos e Praça de Espanha sofrem da deficiência gravíssima de não estarem adaptadas às PMR, quanto aos acessos, aos percursos de correspondência e quanto às instalações sanitárias.
É impressionante como é fácil levantar obstáculos, ou simplesmente deixar que pela inércia inoperante se impeça a realização de uma obrigação legal, invocando dificuldades financeiras que poderiam ser levantadas com fundos comunitários. 

 





As duas ultimas fotografias são um sinal de esperança, ténue, mas ainda assim real. Está instalada no acesso da Rua do Crucifixo, da estação Baixa-Chiado, embora ainda não ensaiada, uma plataforma elevatória para utilização por pessoas com mobilidade reduzida.
Projetou-se a sua instalação por ser mais económica do que o projeto inicial de dois elevadores para a superfície na vertical do prédio comprado pelo metropolitano para o efeito em 1997, no numero 34 da Rua Ivens (estimativa na altura: 5 milhões de euros).
A desvantagem deste sistema é que exige a presença de pessoal da estação para a sua movimentação.
Ultimamente tem-se verificado uma melhoria na operacionalidade dos elevadores desta estação, de ligação do átrio de bilheteiras aos cais.
Ignoro se está prevista a conclusão da obra de instalação de WC adaptados a pessoas com mobilidade reduzida, cuja obrigação tambem faz parte da diretiva comunitária.

Dificil, cumprir a lei.
Espera-se que a ACAPO, a APD e todos os grupos ou pessoas defensores do direito de mobilidade insistam com o metropolitano para manter a operacionalidade da plataforma elevatória e convide os seus associados a requerer a sua utilização para que seja demonstrada a sua utilidade.
E que continuem a sua luta pelas acessibilidades nas estações do metropolitano, para que se tornem visíveis sinais de progresso sem comprometer os prazos acordados com o INR.
A existência daquelas instituições e das pessoas que em grupo ou individualmente, através da internet, da televisão pública, de intervenções da provedoria de Justiça se interessam pela mobilidade das PMR, é assim um motivo de esperança, pese embora a inércia que esconde e impede o progresso da execução do plano.

Dificil, cumprir a lei; ver:
- site da parceria da RTP2 com o INR http://www.rtp.pt/programa/tv/p23317     e  http://magazineconsigo.blogspot.pt/
- relatório da provedoria de Justiça de 2012 em que o metropolitano deu à provedoria prazos otimistas pelo irrealismo: 

sábado, 23 de março de 2013

Ouvido na Antena 2: Prefiro rosas, meu amor, à pátria


Ouvido na Antena2, no dia internacional da Poesia:

Prefiro Rosas, meu Amor, à Pátria

Prefiro rosas, meu amor, à pátria, 
E antes magnólias amo 
Que a glória e a virtude. 

Logo que a vida me não canse, deixo 
Que a vida por mim passe 
Logo que eu fique o mesmo. 

Que importa àquele a quem já nada importa 
Que um perca e outro vença, 
Se a aurora raia sempre, 

Se cada ano com a primavera 
As folhas aparecem 
E com o outono cessam? 

E o resto, as outras coisas que os humanos 
Acrescentam à vida, 
Que me aumentam na alma? 

Nada, salvo o desejo de indiferença 
E a confiança mole 
Na hora fugitiva. 

Ricardo Reis, in "Odes" 
Heterónimo de Fernando Pessoa


Ainda existe serviço público na rádio, agora que os nibelungos que nos governam e à cultura entendem sinergias como maneiras de gastar menos e de baixar a qualidade.
No programa da Antena 2 falou-se da casa de Fernando Pessoa e da introdução de tecnologias visuais eletrónicas, um totem, até jogos (Fernando Pessoa a tentar agarrar Ofélia, ou só a fingir que queria agarrá-la, sabendo-se que Ofélia nem se importaria).
E afirmou-se uma coisa interessantíssima: que Fernando Pessoa, educado em criança na língua inglesa, pensava em inglês e escrevia em português.
Por isso foi inovador.
De facto, a língua portuguesa não é a ideal para a expressão clara de ideias e conceitos e terá provocado desvios de insuficiência de pensamento aos portugueses ao longo dos séculos.
É uma hipótese com muitos exemplos históricos a confirmá-la… com a atualidade a confirmá-la, desde a preferencia por discutir os comentadores em detrimento do estudo e análise das questões por eles comentadas para se pensar pela própria cabeça, de preferir as discussões bizantinas ao trabalho de equipa.
É isso, Fernando Pessoa como saída da crise.

segunda-feira, 18 de março de 2013

Da estação CP/REFER de Areeiro para a estação metro Areeiro






vista do lado do átrio de bilheteiras da estação da CP/REFER;  seria desejável que os tapetes rolantes tivessem comando económico de movimento em função da presença de passageiros

átrio de saída para acesso à estação de metro


saída CP/REFER, a cerca de 180m do átrio norte da estação de metro Areeiro, e a 130m do átrio  da estação CP/REFER



Estas são imagens da estrutura enterrada anexa à estação ferroviária do Areeiro que serve as linhas suburbanas de ligação a Sintra, Setúbal e Azambuja.
A ideia desta estrutura era fazer a ligação subterrânea à estação de metro Areeiro.
Quando a CP/REFER executou a obra de quadruplicação da linha de cintura construiu também um terço da ligação ao metro.
A administração deste, na altura, achou um desperdício facilitar a correspondência entre as duas estações, argumentando com a ilusão de que um dia essa correspondência se faria na estação Olaias.
Em questões de planeamento de redes urbanas o provérbio dos dois pássaros a voar tem muita força e gorou-se também a construção de uma nova estação da CP/REFER nas Olaias (era aliás um dos melhores sítios para localizar a estação de ligação à margem sul através da terceira travessia do Tejo).
Dirão os críticos das obras públicas que não há dinheiro para isso.
Penso que há dois argumentos de peso: um, o de que os fundos comunitários QREN (agora horizonte 2020) são exatamente para isso; outro, a resposta ao jornalista de uma passageira moradora na margem sul, com a creche da sua criança em Sacavém e trabalhando na zona da Av.Almirante Reis: “que mal fiz eu para ter esta vida?”
A produtividade depende das condições de comodidade do transporte casa-emprego e do apoio à vida familiar (localização distribuida e controle de custos de creches, por exemplo), pelo que as perdas de uma má produtividade subsequente de más condições de viagem são custos de não se fazer um investimento, ou devem descontar-se ao valor do investimento, coisas de difícil aceitação pelos seguidores da escola de Chicago.
A ligação subterrânea, com tapetes rolantes, entre a estação da CP/REFER e a do metro facilitaria a viagem aos moradores na margem sul que trabalham em zonas servidas pelo metro. Encontra-se realizada uma extensão coberta de 130m, faltando cerca de 180m até ao átrio norte da estação de metro.
Numa altura em que até os adeptos da escola de Chicago parece reconhecerem que o investimento público, dada a diminuição do investimento privado, pode contribuir para o aumento da procura e do PIB, e em que é urgente concluir projetos que possam beneficiar de fundos do horizonte 2020, é interessante recordar que o projeto de ampliação em curso da estação do metro Areeiro é compatível, por já prever a sua possibilidade, com a  execução da ligação subterrânea pedonal entre o átrio norte da estação de  metro e a estrutura já existente da CP/REFER.
Salvo melhor opinião, seria altamente desejável obter os fundos necessários à execução desta ligação.

PS em 18 de março de 2013 - Façamos as contas com base na observação direta e mostrando imagens cerca das 9:30  de um dia útil. 
Por dia útil, param nesta estação cerca de 2x200 comboios suburbanos procedentes (indicam-se os términos em cada par agrupado pela barra) de Mira Sintra/Oriente, Alcantara Terra/Azambuja, Setubal(ou Coina)/Areeiro (esta última linha explorada pela FERTAGUS).
Estimando que numa hora de ponta o tráfego de passageiros é um décimo do diário, que numa hora de ponta chegam  10 comboios  e 40 passageiros por comboio fazem o trajeto entre as estações CP/REFER e Metro, e que cerca de um quarto desses passageiros acedem ao Metro,  temos que (40/4)x10x10=1000 passageiros  por dia útil fazem a correspondencia entre as duas estações em cada sentido, ou 2000 utilizações diárias da correspondencia.
Ou aproximadamente 2000x300=600.000 correspondencias por ano (seriam mais se a economia não estivesse tão contida pelo esforço do atual governo, que a melhoria da correspondencia seria um fator de atratividade para o aumento da procura).
Ou 600.000 subidas e descidas de 20 degraus (3,4m).
Se o custo da obra coberta dos 180m que faltam, incluindo equipamentos, for de 5 milhões de euros a amortizar em 20 anos a uma taxa de 1% (preço para banqueiro, claro), e os custos de manutenção e operação forem  de 50 mil euros por ano, temos que a poupança anual dos decisores, ao não quererem fazer a obra, será de 230 mil euros de capital, 50 mil euros de juros e 50 mil euros de exploração, equivalendo ao custo de 55 centimos por degrau subido.
Se admitirmos uma comparticipação QREN/horizonte 2020 de 85% (o que tem o grave inconveniente de exigir o projeto pronto, embora não seja tão grave como isso porque ele já está alinhavado) temos que o investimento nacional será apenas de 750 mil euros, correspondendo a custos anuais de capital para amortização de 34 mil euros, mais 7,5 mil euros de juros e 50 mil euros de exploração.
O que dará 15 centimos por degrau subido.
Estes números , cuja verificação ou correção seriam benvindas do ponto de vista do método científico, que não pode limitar-se à observação , à colocação de hipóteses com os respetivos cálculos e à formulação da teoria/tese, mas exige o referendo, revelarão assim o profundo desprezo que os decisores sentem pelo esforço de quem trabalha.
Outra maneira de fazer os cálculos seria estimar o tempo perdido pelas pessoas a subir e descer as escadas dos dois acessos e contabilizar o seu valor.
Mas com a política de desvalorização do fator trabalho que o atual governo galhardamente conduz, seria obsceno entrar no cálculo com um valor demasiado baixo para o salário horário.
Na verdade, a melhor solução seria acabar com a deslocação dos senhores ministros em automóveis pagos pelos contribuintes, alugar-lhes, com o referido dinheiro dos contribuintes, uma casa no Seixal para habitação enquanto desempenharem as funções ministeriais e um escritório ministerial a meio da Avenida Almirante Reis.
Não seria para castigo, especialmente em dias de chuva, mas apenas para, sofrendo os senhores ministros  da sindroma dos economistas de gabinete, tomarem conhecimento da realidade concreta de quem trabalha e do papel das empresas de transportes como fator de produção de bens tambem transacionáveis  (a propósito, sabiam que há sobreposição de carreiras rodoviárias no percurso do Areeiro para o Pragal? os senhores decisores ainda não aceitaram que é preciso reduzir as emissões de CO2 ou estão à espera da aprovação da taxa sobre as transações financeiras?).



9:35 de segunda feira, saída do átrio da estação CP/REFER 
9:25 de segunda feira, junto da saída para a superficie, a 130m  do átrio da estação CP/REFER

Percurso pedonal à superfície de 180m entre a saída da estação CP/REFER e o acesso Metro; à direita, os locais de partida das carreiras rodoviárias de sobreposição até à travessia da ponte 25 de Abril

o mesmo percurso pedonal

PS em julho de 2017, quando se pensa retomar a obra de remodelação do átrio norte da estação Areeiro, cometo a inconfidencia de anexar o desenho do projeto de ligação pedonal subterrânea, da autoria do arq.Alberto Barradas. Vanos ver, como se costuma dizer


As ovelhas e a esperança



Talvez não se possa dizer como o presidente da Islândia, que num país em que há mais ovelhas que pessoas ninguém passará fome por não cumprir os procedimentos do FMI, mas é uma réstia de esperança ver ovelhas a pastar. Não é muito longe de Lisboa, estão a 22km do Campo Grande.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Risco de atropelamento nas passadeiras de peões


Eu sei que a maioria dos condutores acha que 45 km/h é uma velocidade segura, demasiado segura e que por isso podem andar mais depressa, podem achar inadmissível  conduzir tão lentamente.
Não é uma velocidade segura para circular na cidade.
É uma velocidade mortal num atropelamento.
E ninguém pode garantir ter tempo para parar perante um peão com dificuldades motoras ou de visão.
Não queiram ser desumanos como os nazis que diziam que o Estado não tinha dinheiro para responder às necessidades dessas pessoas.
Deixemos as emoções e a presunção do direito à velocidade e analisemos.
Esta é uma fotografia da realidade quotidiana.
Propiciadora, juntamente com a vontade da velocidade, de atropelamentos.




Uma pessoa com mobilidade ou visão reduzida, considerando o limitado campo de visão deixado pelo automóvel estacionado no recorte (demasiado próximo da passadeira), pode iniciar a travessia no instante 1 quando o automóvel se encontra a 60 metros.
O automóvel desloca-se a 45km/h (12,5m/s) e o peão a 0,5m/s .

1 segundo depois, no instante 2, o peão  estará  a 0,5m do passeio e o automóvel a 47,5m da passadeira.
Condutor e peão vêem-se mutuamente.
Admitindo um tempo de reação de 1,5 segundos, no instante 3 as posições serão:
O peão a 1,25m do passeio, o automóvel a 28,7m da passadeira.
O condutor pressiona o pedal do travão; a reação do equipamento será de 0,5s , o que leva o automóvel a deslocar-se mais 6,3m, ficando a 22,4m da passadeira.
Inicia-se a travagem, admitindo uma desaceleração de 3m/s2 (se o pavimento estiver húmido, por exemplo).
O espaço até ao peão será percorrido em  2,7s  até colidir com ele no instante 4 a 16km/h, velocidade que pode ser mortal.
Se o tempo de reação considerado for de 2s, a colisão será a 27km/h, aumentando a probabilidade de morte.
É uma barbaridade, castigar assim quem não tem agilidade ou acuidade visual.
Ainda acham baixa a velocidade de 45km/h  ou  12,5m/s?
Acham que pode haver racionalidade no olhar do condutor que vejo pelo retrovisor, escandalizado porque vou a 45 km/h e abrando sistematicamente ao aproximar-me de uma passadeira, com ou sem peões à vista?

Hipóteses de melhoria:

- aumento da eficácia da fiscalização do estacionamento
- idem da velocidade excessiva
- instalação de radares de velocidade e outras medidas dissuassoras e de acalmia do tráfego (semáforos temporizados, zonas de velocidade limitada, lombas, bandas sonoras)
- divulgação do código da estrada, nomeadamente da obrigação de reduzir a velocidade à aproximação das passadeiras de peões, com campanha específica na TV
- alteração do código da estrada com explicitação da limitação a 30km/h na passagem pelas passadeiras independentemente da presença de peões
- discriminação fiscal penalizadora dos automóveis de maior altura por limitarem a visibilidade (independentemente de estarem bem ou mal estacionados)
- inviabilização de estacionamento numa distancia à passadeira inferior a 5m em recorte no passeio ou inferior a 20m na via
- promoção do transporte coletivo


Nota: A fotografia acima é de um cruzamento da Av.Rio de Janeiro, em Lisboa, com as coordenadas 38º45'09,92"N e 9º08'16,31"W , já intervencionado com lombas e sinais de limitação a 30km/h, que raramente é cumprida:

PS em 17 de março de 2103
Está em curso uma iniciativa de cidadãos para propor uma iniciativa legislativa comunitária sobre a limitação a 30km/h em zonas residenciais. Ver em:
http://www.imtt.pt/sites/IMTT/Portugues/Noticias/Paginas/30KmhDandovidaruas.aspx http://en.30kmh.eu/


Ver neste blogue:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2013/04/contra-sinistralidade-rodoviaria.html





quarta-feira, 13 de março de 2013

Nós, os portugueses - a cor dos taxis


Gosto dos portugueses, mesmo que seja um auto elogio dizê-lo, porque também sou português.
Os portugueses têm muitos defeitos; eu tenho.
Mas gosto deles porque se sente afabilidade quando se fala com eles.
Bom, desde que não se esteja em conflito.
Talvez que o principal defeito dos portugueses seja o de terem dificuldade em identificar os defeitos, em reconhecê-los, em compensá-los, em corrigi-los, em sublimá-los, em utilizar os métodos para isso.
Questão de emotividade, talvez, sobreposição da parte emocional à racionalidade.
Mas como reconhecer um defeito, se nos sentimos afáveis e simpáticos uns para os outros, se nos sentimos bem? (bom, desde que não se esteja em conflito, individual ou em grupo, e mesmo em conflito, reparem na facilidade com que silenciosamente se suportam as opressões).
Os outros, os não portugueses, têm os mesmos defeitos, que o código genético é igual há mais 50.000 anos.
Mas encontram com mais facilidade o caminho da correção, talvez por maior fidelidade ao método científico.
Por exemplo, o presidente alemão rapidamente se demitiu depois de ser conhecido um caso de favorecimento em seu benefício na concessão de um empréstimo para aquisição de casa.
Ou o primeiro ministro da Croácia que foi preso por ter aceite subornos de uma companhia petrolífera em troca de uma concessão.
Ou o primeiro ministro do Paquistão, por ter feito o mesmo em contratos de energia.
Nós portugueses gostamos de entusiasmar-nos com coisas novas.
É o deslumbramento da inovação.
Os não portugueses também; até nos enviaram os seus gurus de marketing e de coaching, de reorganização de empresas, insistir na tecla de que só as empresas inovadoras sobrevivem e aumentam a quota de mercado.
Mas como não eram portugueses, não sabiam que a nossa emotividade nos leva a ter dificuldade em distinguir entre o acessório e o essencial, entre a inovação supérflua ou contra producente, e a inovação fundamental para o progresso do negócio.
Inovação, palavra mágica.
Por exemplo, há uns anos, a cor dos táxis mudou.
Que as chuvas em dias de vento do norte de África deixavam o preto manchado de poeira saariana.
Mudaram para uma cor clara.
De vez em quando mandavam-me parar, a mim, que tinha um carro de cor parecida.
Reparem na fotografia recente:



Muitos voltaram à cor antiga.
É que a inovação não era essencial.
Assim somos.
Gostamos de bizantinamente discutir a cor dos táxis.

terça-feira, 12 de março de 2013

Die Donner-Ode – Ode ao Trovão, de Telemann






Através da Fundação Gulbenkian, a orquestra e coro do maestro Tom Koopman, especialistas de musica barroca, apresentaram a Ode ao Trovão, de Georg Philip Telemann.
Para os portugueses, que apesar da crise têm o privilégio de trazer estes especialistas ao nosso país, há nesta peça musical o especial interesse de ter sido composta e executada, pela primeira vez, num concerto de solidariedade com as vítimas do terramoto de 1755.
A iniciativa foi da cidade-estado de Hamburgo, que também enviou dois navios com provisões de auxílio.
É interessante analisar o impacto que o fenómeno teve na Europa, desde a lucidez de Voltaire (ver o Candide) à culpabilização pelo padre Malagrida dos pobres lisboetas que tinham provocado a ira divina.
Um pouco à maneira do que se passa agora com a crise.
Para uns culpa dos pobres cidadãos que têm de ser punidos, mesmo que a análise serena dos dados aponte para causas naturais, se considerarmos como naturais as relações de causa e efeito entre as práticas do sub-prime, dos investimentos virtuais  e dos off-shores, e a transferência de rendimentos das classes de menores rendimentos para as de maiores rendimentos.
Telemann foi um expoente da musica barroca, dominada na Alemanha pela religiosidade luterana.
A ode ao trovão comemora o terramoto sem falar dele, apenas na força dos fenómenos naturais, numa adaptação de salmos da Bíblia.
Tradução do texto do troço reproduzido no youtube (fonte: Programa do concerto na Gulbenkian):

O trovão troa para que glorifiquem o Senhor.
Mostrai-lhe gratidão no seu templo!
Do templo ressoou até aos confins da Terra,
longo e altíssono, o cântico de louvor.”

É fascinante, como dizia Mr Spock, da nave Enterprise do Star trek, a formação do mecanismo de agradecimento depois de um suposto castigo e de uma tragédia tão extensa.
Também deveríamos agradecer aos beneméritos da troika, cujos bancos têm lucros garantidos com o empréstimo a Portugal?
Por exemplo, o banco da Holanda, país do atual presidente do Eurogrupo, prevê atingir 3,2 mil milhões de proveitos entre 2013 e 2017 com as operações financeiras de apoio as países do sul (fonte: Daniel Oliveira e  http://www.rijksoverheid.nl/ministeries/fin/nieuws/2013/02/15/duidelijkheid-over-winstafdracht-dnb.html ).
Isto é, a dívida dos países do sul anda a financiar os países do norte.
É uma pena não se corrigir a politica financeira da Europa (aquela coisa da união financeira).
Seria um negócio “win-win”, salvo melhor opinião.

sábado, 9 de março de 2013

Artesanato popular II



A fotografia mostra um objeto de artesanato popular relativamente raro.
Tem origem no Alentejo e a sua utilidade é a de moer alhos (ver a superficie tronco cónica inferior).
Na parte superior uns entalhes ajudam a firmar os dedos para melhor dirigir a força de moagem.
Formas torneadas e entalhadas muito interessantes fazendo lembrar uma peça de xadrez.



PS em 11 de março de 2013 - Tambem me faz lembrar peças africanas. Terá mesmo alguma coisa de africano, este pequeno pilão? Acho que tenho de dar uma volta pelo museu de Etnologia, ali na Avenida da Ilha da Madeira, no Restelo.

sexta-feira, 8 de março de 2013

As amoras, os mirtilos, as framboesas e Alexandre Soares dos Santos





Segui com interesse a entrevista na RTP de Alexandre Soares dos Santos, presidente da Jerónimo Martins/Pingo Doce, promovendo as conferencias Exit Talks, conversas sobre a exportação, em Abril próximo, na Universidade de Aveiro, de que é patrocinador.
É evidente a capacidade de gestão do senhor.
Sou seu devedor, através dos livros da fundação Francisco Manuel dos Santos, cujo lema é “pense pela sua cabeça”.
Não partilhando das suas ideias, aprecio que ocupe o seu espaço na economia do país (quem é mais prevaricador, quem muda sedes sociais para off-shores e in-shores ou quem os legaliza?).
Toca-me o senhor reconhecer que toda a sua vida gostou de ter projetos para fazer e desenvolver, e agora aos 78 anos sente que está calmamente num comboio à espera que chegue à estação, embora fale com entusiasmo nos seus projetos na Colombia.
Aprecio também as medidas sociais que toma no seu Pingo Doce e até agradeço que publicamente assuma que o segredo não são salários baixos (existe uma correlação entre qualidade inferior e custos de produção baixa), mas não resisto a contar que, sempre que vou a um Pingo Doce, fico parado a olhar para alimentos vindos de longe.
É verdade que existe a globalização, mas eu penso que a globalização não devia ser para isto, devia ser mais para a solidariedade internacional, além de que o preço baixo das embalagens do que vem do outro lado do mundo não reflete o prejuízo da externalidade das emissões de CO2 do seu transporte.
A senhora do balcão da peixaria estranhou, eu ficar ali parado, a olhar para os vermelhinhos camarões cozidos vindos da Tailândia.

E a senhora dos frescos também, nem sei se receosa, ao ver-me a olhar fixamente para as amoras vindas do México, os mirtilos vindos da Argentina e as framboesas vindas da Beira Baixa, misturados na embalagem elegante  projetada nos moldes da Marinha Grande (ou terá sido na China?).
Terá mesmo de ser assim?
Será um caso de vantagem comparativa?
Esquecemos as amoreiras das amoras carnudas e folhas tenras para o bicho da seda, encomendadas pelo marquês de Pombal, e mandamos vir as amoras do México?
Não haverá outras coisas que pudéssemos comprar aos mexicanos e eles contentes por nos poder comprar outras?
Será um case study a analisar nas conferencias Exit Talks da Universidade de Aveiro, em Abril de 2013, patrocinadas pela Jerónimo Martins, BPI, AICEP,  e com uma coorte ilustre de oradores, a explicar aos empresários como se exporta? (a propósito, não tem sido noticiado o trabalho que técnicos do metropolitano de Lisboa, por enquanto empresa pública, estão a desenvolver para o metropolitano de Argel, nem tampouco se ouve falar em eventuais apoios do ministério da Economia ou da AICEP ou da secretaria de estado dos transportes a essa exportação…será um caso de assimetria…)


O dia da regulação e da autoridade da concorrência




A regulação é uma palavra mágica para quem acredita na ideologia dominante, de que o mercado funciona em concorrência.
A publicação da lei da regulação foi assim um dia feliz para esses cidadãos.
Na verdade, todos concordam que é bom quando o mercado funciona em concorrencia.
Mas infelizmente a experiencia e a teoria demonstram que, se houver assimetria de informação (por exemplo, manipulação de preços de ações ou de leilões de bens ou serviços, ocultação de opprtunidades de negócio ou industrialização) , escassez ou condições privilegiadas de acesso ao bem (por exemplo, acesso  a preços especiais de ações) ou se se tratar de uma externalidade de que muitos sofrem as consequências sem para ela terem  contribuído (por exemplo, custos de importação de combustíveis) , lá se vai a lisura da concorrência e a eficácia do funcionamento do  mercado.
Foi por isso que se criou o mito da regulação.
Que a entidade reguladora vigiará e supervisionará.
A experiencia e a teoria também já demonstraram que, para uma supervisão ser eficaz, quem a pratica deve ter experiencia do negócio que supervisiona.
Então, para isso, ou existe promiscuidade entre o regulador e os regulados (daí falar-se no período de nojo de dois anos ente o exercício de cargos nos dois lados) ou simplesmente a regulação pode ser residual e se aceita o que o catecismo da ideologia do mercado não autoriza: que possam existir empresas públicas, que possa exercer-se o serviço público, com a cultura antiga do servidor público.
Um bom exemplo desta ultima  condição são as empresas de transporte público e as produtoras e transportadoras de energia francesas.
Nós por cá, possivelmente porque a regulação responde ao desejo de ver tudo bem regulamentado (a experiencia e a teoria ensinam que é impossível prever todas as situações) , o que é uma variante do complexo do escrúpulo, vamos assistindo às investigações sobre a cartelização dos spreads dos bancos, da concertação sobre os preços dos combustíveis, das tarifas de energia e de telecomunicações.
É verdade que seria difícil aos eventuais prevaricadores (quem é mais prevaricador, quem pratica o ilícito, ou quem promove um regime em que é possível praticar o ilícito? Quem é o criminoso, quem puxa o gatilho ou quem promoveu o negócio de venda de armas?) evitar condenações se o sigilo bancário fosse revogado. Além de que ninguém assina uma ata da reunião em que se tenha acordado um cambão.
E com tanta regulação, é sempre possível desenvolver novas técnicas de fuga à supervisão; o perigo aguça o engenho.
Não acreditam?
Sério?
Acreditam que é possível seguir este caminho, de mercado livre e regulação, para evitar a distorção da concorrencia?
Como dizem os americanos, em que conto de fadas estão a acreditar?

Nota – evidentemente que também é possível dizer que acreditar no sucesso da solução de empresas públicas a operar livremente no mercado é acreditar em contos de fadas (porque cargas de água o Estado, como proprietário dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, não pode injetar 180 milhões de euros? Não pode aumentar-se o capital de uma empresa que é paga pelos contribuintes? Prejudicaram-se empresas privadas? E a contabilização dos prejuizos para o Estado português em consequência da paralisação dos estaleiros, da falta de patrulheiros e de um navio polvalente, por exemplo,  conta menos do que isso? Penso que o direito comunitário não perderia nada em rever estas proibições, em deixar-se de fanatismos e dogmatismos).
Pode ser , mas existem de facto bons exemplos, há espaço para empresas públicas e privadas  e o mal não está em as empresas serem públicas, o mal pode estar na incorreta nomeação dos seus dirigentes; no caso português, sistematicamente por critérios políticos, independentemente do conhecimento dos negócios e da capacidade técnica para os gerir. A mexer-se seria aí, não na extinção dogmática das empresas públicas.


quinta-feira, 7 de março de 2013

A manifestação de 2 de março de 2013




Ouvido na manifestação:
- Porque viemos à manifestação, se sabemos que não vai mudar nada?
- Porque é uma forma de expressão. Pode ser apenas um desabafo, mas é a forma de nos exprimirmos.
Pode ser que não seja suficiente a força de quem se manifestou para mudar; quando comparada com a força dos senhores da finança de Bruxelas e Frankfurt e com a força de inércia dos senhores das nossas elites dirigentes.
Pode ser que, como escreveu Urbano Tavares Rodrigues, “os mais atingidos não ousem queixar-se”.
Pode ser que seja mesmo assim, que nesta apagada e vil tristeza persista a nossa incapacidade de nos organizarmos em equipas; não é por falta de alternativas a esta política, é por falta de entendimento entre as pessoas.
Pode ser que seja este o caminho, o caminho da desigualdade cada vez maior; que, tal como Paul Tomsen da troika logo ao princípio disse, na sua primeira entrevista, que em Portugal se ganhava mais do que o que se produzia, que tinham de ser reduzidos os rendimentos, que o fator trabalho estava demasiadamente bem remunerado.
É então apenas isso, um roteiro de empobrecimento e de desemprego, apesar de serem quase 30% as crianças que vivem na pobreza, sabendo-se a correlação forte entre as condições de vida das crianças na pobreza e a insuficiência da média de desenvolvimento intelectual.
A manifestação exprime a indignação das pessoas perante  a ignomínia deste roteiro, mas vem o primeiro ministro e diz que a indignação não é uma resposta para  a crise.
Convencido de ter sido eleito para desempenhar uma missão salvadora, todas as críticas que se lhe façam só reforçam essa convicção.
Falharam todos os  mecanismos constitucionais para repor o funcionamento regular das instituições.
O poder legislativo do Parlamento submete-se ao poder executivo através dos mecanismos partidários, sem por em prática mecanismos de representação e de participação dos eleitores.
O poder judicial nem bom exemplo dá, com a estrutura jurídica paralisante que temos e o delírio e fúria legisladora de sucessivos governantes.
O presidente da República hesita.
Não é chamado o povo a consultas referendárias.
Formalmente, o atual governo tem então legitimidade para mais dois anos, quase.
Pessoalmente, não ia tão longe como os manifestantes pediram, a demissão do governo.
Para não se gerar  mais perturbação, bastava demitir o primeiro ministro, o ministro das finanças e o dos assuntos parlamentares, indicando o partido mais votado novo primeiro ministro.
Os outros podiam ficar até às próximas eleições.
Não é uma questão política, é apenas uma questão de gestão, neste caso da coisa pública.
Que diabo, é assim que funcionam as democracias.
bandeira negra da falta de solidariedade

não vale a pena discutir números, mas os riscos de multidões deslocando-se em ruas estreitas e  em acessos de metropolitano sem planos de absorção e de evacuação de emergencia não são toleráveis

será um exemplo da não contenção de algumas despesas públicas? robô aéreo telecomandado para filmagem de manifestações; este sobrevoou a manifestação por diversas vezes, no Terreiro do Paço

 


domingo, 3 de março de 2013

O condomínio, a empregada da limpeza do dr Vítor Bento e a anuidade



O condomínio recebeu uma carta das Finanças, ou melhor, como agora se auto-intitulam, da autoridade tributária.
- Venham cá dar o numero de contribuinte da vossa empregada da limpeza.
- Ah, mas a senhora ganha menos do que o ordenado mínimo.
- Não interessa, agora têm de mandar para cá todos os meses a declaração J de quanto lhes pagam. Senão ela não tem segurança social.
Na verdade, a autoridade é autoritária com os fracos e compreeensiva com os fortes.
Os fracos são os que andam a trabalhar neste condomínio, naquele condomínio, naquela família, nesta família, nas tardes de segunda, nas manhãs de terça e de quinta, e a autoridade quer recolher as quantias todas para poder compor o IRS da senhora, para poder até preenchê-lo antecipadamente.
Cumprimentos à sagacidade da autoridade, que assim alarga a base tributária e faz crescer o PIB e a receita fiscal.
Mas, e há sempre um mas sempre que a sagacidade tem um assomo destes.
Mas aqui entra o dr Vítor Bento.
Que o governo faz mal em andar a cruzar tantos dados por cima da privacidade dos cidadãos.
Primeiro, reforça o clima de desconfiança dos cidadãos em relação aos serviços fiscais.
E depois, por simples aplicação do princípio da reciprocidade, que diz que Estado pode fazer as injustiças que quiser que o cidadão fará as que puder, estimula a fuga fiscal.
Pense-se um bocadinho.
A senhora da limpeza do condomínio onde mora o dr Vítor Bento trabalha também num restaurante afamado muito frequentado pelas elites (pobre meio este, o das elites deste país; que resultados tão pobres de elites tão distintas).
Que desde que o IVA aumentou 23% teve uma quebra de faturação de 40%.
Que horror, o que o aumento do IVA faz à restauração.
Ou será que a perseguição fiscal originou um software de fuga?
Enquanto donos de restaurantes honestos lutam para equilibrar as suas contas e outros desistem até ao suicídio (como dizia um deputado da maioria, é a seleção natural, havia restaurantes a mais), há sempre quem dê a volta.
A quebra de faturação real deve ter sido de 20% e assim nem foi preciso repercutir o aumento do IVA nos preciosos clientes.
Melhor seria os pensadores da autoridade tributária serem menos rígidos no seu pensamento e na sua ação.
Melhor seria estimular um clima de confiança mútuo, com fixação de tabelas contributivas razoáveis, por acordo participado.
Mas a autoridade tributária prefere perseguir a senhora da limpeza.
Poderei estar a ver mal, mas não é só a autoridade tributária que unilateralmente decide a aplicação de impostos.
O meu banco também lança impostos sobre os seus clientes.
A anuidade que aparece no extrato bancário é um  imposto silencioso cobrado por uma entidade privada como se fosse a remuneração de um serviço.
É a usurpação de um direito da comunidade organizada em Estado, porque ninguém elegeu em eleições públicas os banqueiros.
Quem os elegeu foi uma elite restrita de acionistas, não foram os eleitores.
Oito euros, incluindo comissões, foi quanto me descontou o meu banco, unilateralmente.
Os cidadãos depositam o seu dinheiro no banco, o banco pode utilizá-lo para os seus investimentos, pelo menos uma parte, vamos que quatro quintos.
Se a média do depósito à ordem for de 1700 euros, temos que quatro quintos são 1350 euros e que os 8 euros representam um juro de 0,6%.
Coisa pouca, 0,6%, mas quem emprestou ao banco foi o cliente e quem recebeu o juro foi o banco tomador do empréstimo.
Ao contrário  do que se vê por aí, que é quem empresta receber também juros, e tanto mais altos quanto o meio bancário e financeiro acha que o devedor mais dificuldade tem em os pagar, os juros.
Repito que depositar o seu dinheiro para o ter seguro é uma necessidade pública dos cidadãos que não tem de ser um negócio para alguns.
Não é um serviço que esses alguns prestam para depois se vangloriarem dos lucros que obtiveram em assembleias de acionistas.
É um serviço público.
Como dizia o presidente Andrew Jackson, vocês, banqueiros, são um ninho de víboras.
Ou como já disse este blogue, são uns meninos maus.