Sem ter feito muito para isso, estive num tribunal do trabalho num julgamento como testemunha.
Por seu turno, sem que o tivesse feito propositadamente, a senhora doutora juiza ensinou-me uma coisa que me resolveu uma questão antiga.
Foi o caso de me ter perguntado se o que eu tinha feito, na matéria relacionada com o julgamento, embora não o fosse formalmente, o tinha sido na realidade.
Que é como quem diz, se o meu comportamento tinha sido mesmo a essencia e o conteudo dos factos, sem que a forma tivesse preenchido, no contexto, todos os requisitos formais.
Claro que respondi à senhora doutora juiza que o que fiz, o fiz na prática como se formalmente todas as questões estivessem reguladas, embora não o estivessem apesar de eu oportunamente o ter requerido.
E aí está como um sentimento habitual em mim, olhar para o essencial e secundarizar o acessório, só porque o verbalizei à senhora doutora juíza, de repente me esclarece a questão do meu tribunal interior.
Por exemplo, o grupo de dirigentes do BCP que foi proibido de continuar a gerir o banco concedia-se mutuamente e aos filhos e afilhados empréstimos a juros baixos para fins de entretenimento e enriquecimento privado, com mais ou menos off-shores.
Neste caso, dado haver legislação com alguma clareza, coincidem o meu tribunal interior e o tribunal oficial.
Mas consideremos o caso noticiado hoje, com uma sorridente fotografia do senhor Triché (enganado), perdão, do senhor Tricheur (trapaceiro), perdão, estou com dislexia e dificuldade em dominar o francês, do senhor Trichet, senhor do BCE: o BCE tinha emprestado a dois bancos privados, para que eles não sofressem de angustia, 575 milhões de dólares a um prazo de sete dias mas a um juro de 1,1%.
E que se preparava para mais empréstimos de dólares até ao fim de 2011, com prazos de três meses.
Bem, como disse, agora entendo melhor estas coisas: o comportamento do senhor Trichet só difere dos trapaceiros do BCP por estar à vista de todos.
Mas para mim, mesmo que seja falta minha de sensibilidade e de discernimento, o comportamento é, na prática, o mesmo, embora formalmente não o seja, tal como a senhora doutora juíza me ensinou, e eu prezo muito o que me ensinam.
É que até é simples de demonstrar, embora haja o tal vazio legal que impede que um cidadão faça queixa a um tribunal e proponha a prisão ou, pelo menos, o impedimento do senhor, com base em favorecimento ilícito de bancos privados a juros baixos, sabendo-se que vão depois emprestar a juros altissimos (já passaram os 100% à Grécia? no mercado secundário ou no primário, que interessa?) porque há uma disposição da União Europeia que protege os bancos privados (o protecionismo económico não é um dos adversários da União Europeia, ou anda-se a dormir com os bandidos?) ao proibir o BCE de emprestar diretamente aos bancos centrais.
E a demonstração é pela negativa, é que o senhor Trichet desempenha um cargo não eleito pelas cidadãs e pelos cidadãos.
Podemos não gostar da senhora Angela (não a Davis, a Merkel) e assobiar para o lado quando o senhor Sarkozy se põe em bicos dos pés e nega a pés, juntos e em sapatos compensados, que recebeu sacos azuis quando era maire de Neully ou ministro das finanças.
Mas eles foram eleitos, e apresentaram programas eleitorais.
Quem dirige o BCE deveria fazê-lo de acordo com politicas sujeitas previamente ao sufrágio eleitoral, perdoem-se-me as sucessivas redundancias, mas é para sublinhar a traço forte, como dizia o professor Ilharco.
E tenho muito prazer por me ver acompanhado nesta opinião por alguns comentadores favoráveis ao partido atualmente no poder em Portugal.
É que é impossivel uns poucos enganarem todos durante todo o tempo, embora este intervalo de tempo possa ser grandemente estendido em função de uma gestão sábia dos tempos de causa-efeito e dos períodos entre eleições.
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