quinta-feira, 21 de junho de 2012
Os 40% dos pilotos, ou o peso dos fatores de produção e os constrangimentos externos
Declaração de interesses: o humilde escriba deste blogue depende em 99% dos rendimentos da sua pensão, correspondente a 40 anos de descontos relativos a salários que estavam claramente abaixo da média nacional para a sua categoria profissional até meados dos anos 90, quando efetivamente a ultrapassaram. Apesar dos cortes dos dois subsidios considera-se privilegiado relativamente à maioria dos portugueses e não vê com bons olhos a campanha contras as “regalias” dos trabalhadores com convenções coletivas de trabalho, considerando que os esforços de nivelamento deverão sempre tender para que ele se faça por cima e não por baixo e respeitando um justo equilíbrio entre os rendimentos do capital e os do trabalho.
Eis porque, meu caro cronista preferido, peço desculpa por o tratar assim, que sou mais velho, e me encanto, mesmo sendo indiferente ao futebol, com o humanismo de crónicas como:
http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=2614815&seccao=Ferreira Fernandes&tag=Opini%E3o - Em Foco
me choca lê-lo em:
http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=2619195&seccao=Ferreira Fernandes&tag=Opini%E3o - Em Foco
a zurzir nos 40% de espaço agasalhado nas cobertas das naus da Índia para os comerciantes que pagavam 30.000 reis e para a tripulação, para trazerem as sedas que pudessem para alem da pimenta do rei:
http://nautarch.tamu.edu/shiplab/01monteiro/CarreiraIndias02.htm
É que se insinua subliminarmente nas mentes dos leitores uma correlação forte entre esta taxa, de 40%, classificada como chantagem dos assalariados poderosos da cabina de condução (ai o salto fácil para o cockpit dos pilotos da TAP e para os maquinistas do metropolitano de Lisboa e da CP), e o triste fim da Companhia das Índias.
Ora, consultados os textos da história económica deste País, fiquei com a ideia de que a aproximação do fim do século de 500 coincidiu com a lenta agonia do comércio da pimenta que alimentava a casa real (o rei da pimenta, ali ao terreiro do paço) porque:
- a companhia holandesa das Indias e os ingleses se estabeleceram também no Índico e combatiam os portugueses (grande ajuda nesse sentido deram os espanhóis com a união pessoal dos Filipes; o eclipse da companhia das Índias portuguesa coincide temporalmente com o fim do comércio com a Holanda por pressão espanhola - 1620);
- as quantidades de pimenta trazida foram diminuindo e as margens de lucro da pimenta foram baixando, pela simples razão que as margens de lucro de outras mercadorias foram subindo (era o mercado a funcionar), embora, graças à inflação, os valores não variassem muito
- graças à inflação (andámos metidos nas aventuras da Armada Invencível, não foi? Houve epidemias também de peste negra e crises cerealíferas), os custos de construção das naus foram-se agravando
- numa tentativa de aumentar a produtividade, fez-se a má escolha tecnológica de construir naus maiores mas menos resistentes ao temporal dado que eram sobrecarregadas (lá está, o tal espaço dos agasalhados vinha sobrelotado; naus maiores significava menos tripulações a quem pagar)
- o numero de naufrágios aumentou (natural que os salários e prémios, com o aumento do risco, subissem, não? engraçado, os superpetroleiros sul-coreanos e chineses também começaram a dar problemas por esses mares fora por causa da ganância da grande construção a baixo preço)
- a estratégia dos ocupantes filipinos mudou para a exploração das rotas africana e sul-americana em detrimento das rotas do Índico, para melhor explorar o açúcar brasileiro e os escravos africanos (foi, não gostámos que o município de Queen’s rejeitasse a estátua de Catarina, mas o negócio negreiro ensombra mesmo a história deste País, não é?)
Isto é, então como agora, já uns diriam que os 40% que os agasalhados exigiam do espaço das naus eram uma consequência da evolução do mercado, enquanto outros diriam que o mercado da pimenta estava a evoluir mal por causa dos 40% do pessoal do cockpit (quem apareceu primeiro, o ovo ou a franga?).
Em vez de se analisarem as coisas com base em dados recolhidos cientificamente, tratá-los cientificamente e debater soluções cientificamente, mesmo que a TAP faça como o presidente Obama fez com a GM, que fez dos sindicatos acionistas (porque carga de água é que só os pilotos é que podem ser acionistas? O resto do pessoal não pode?).
E está a vender bem, a GM.
Eu não sei se a opinião pública já endogeneizou uma coisa que o senhor secretário de estado dos transportes já disse, que o problema da dívida do metropolitano e das empresas públicas de transportes é dos financiamentos para a construção das estações e das linhas, o que pressupõe que não são as regalias dos maquinistas que furam as contas (eu também não concordo que se estejam a prejudicar os passageiros com paralisações, nem sequer concordei com o não serviço do RockinRio; mas que se deve expressar discordância duma politica de transportes como esta, deve; por mim, preferiria greves de zelo com ligeiros atrasos na circulação para pedagogia aos passageiros sobre procedimentos de segurança, como se faz nos aviões, e troca de impressões sobre as dificuldades de emprego dos passageiros).
Créditos - História económica de Portugal 1143-2010, Leonor Freire Costa, Pedro Lains e Susana Munch Miranda, ed.a esfera dos livros
Etiquetas:
Ferreira Fernandes,
naus da India
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário