quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Limitação da velocidade máxima a 45 km/h ou a 60 km/h?



Ensinaram-nos na universidade técnica que o objetivo da profissão era a produção de trabalho ou de bens úteis com economia de recursos.
Definiu-se produtividade como o quociente entre a grandeza de um produto e a grandeza do meio usado para a sua produção, e que o esforço se deveria centrar em produtividade elevada.
Mas ensinaram-nos também que qualquer máquina, para produzir trabalho útil, tem também de desperdiçar energia, normalmente sob a forma de calor.
Não existem máquinas com rendimento de 100%
Até os maravilhosos motores de automóvel com rendimentos maiores graças ao “common rail” nos motores diesel e à regulação do tempo e da abertura das válvulas nos motores multi-air de gasolina, não conseguem atingir os 50%.

Cada domínio de aplicação deve ser analisado com dados concretos para se fazer o balanço do rendimento adequado.
Mas a tentação é grande, dado que os progressos são constantes, até por razões económicas (a tal competitividade associada à economia de meios de produção) para o senso comum esperar que se podem reduzir os desperdícios indefinidamente.

No caso da energia elétrica, é comum afirmar-se que bastaria melhorar a eficiência da utilização da energia elétrica para dispensar o programa de construção de barragens e de parques eólicos.

No caso da economia política, o senso comum enche as caixas de comentários na internet com soluções para a crise através dos cortes dos grandes ordenados e das grandes despesas do Estado.
E no entanto, não são apresentados os cálculos na forma de benefícios-custos desses cortes.

Faltam-nos dados, as estatísticas não conseguem traduzir toda a realidade.

A coisa chegou ao ponto de estar inscrita no memorando de entendimento com a troika sob a forma do ajustamento orçamental conseguido em 2/3 com cortes na despesa pública e em 1/3 com receita pública.
Só que os cálculos concretos não foram feitos (poderá falar-se na exceção no ministério da saúde, em que as administrações hospitalares apresentaram, como é normal em qualquer empresa pública, planos de redução de custos operacionais; mas continuo a duvidar que tenham sido contabilizados os prejuízos decorrentes desses cortes, para comparação com os benefícios).

Isto é, mantem-se aquela expressão popular tão portuguesa “o que era bom era…” , sempre sem os cálculos fundamentadores.

Infelizmente, como era de esperar, o aumento de receitas públicas foi insuficiente para o tal “ajustamento orçamental” e voltou-se ao ponto de partida: cortes da despesa pública no valor de 2/3 do dito ajustamento, sendo que o que há para cortar são serviços públicos essenciais para manter os indicadores
de qualidade na saúde, mna educação e na segurança social.
Claro que há sempre hipóteses de reduzir despesa melhorando a eficiência.
Tal como no consumo de enrgia elétrica, melhorando o rendimento na produção e reduzindo os desperdícios na transmissão , na distribuição e na utilização.
Mas não chega, infelizmente não chega.

Há ainda outra questão que costuma ser ignorada pelos senhores economistas e comentadores, provavelmente devido a um deficiente entendimento dos fenómenos físicos (os componentes de um sistema económico são fatalmente componentes de um sistema físico, subordinados a leis pelo menos análogas).
Na natureza, qualquer mudança brusca de estado provoca um regime transitório com amplitudes maiores do que em circunstancias normais e tanto maiores quanto mais brusca for a mudança.

Daí dever preparar-se a transição.
Um programa de corte de despesas públicas não pode ser brusco, tem de se estabelecer (ou renegociar juros de amortizações e de empréstimos, como no caso dos emréstimos da troika ou das famosas PPP) um plano ao longo de anos.
Eliminar bruscamente fundações ou observatórios, mesmo que inúteis ou criados para alojar clientela partidária (e contudo, é próprio de um país civilizado e desenvolvido ter instituições recolham e tratem os dados das atividades da comunidade; se essas instituições tiveram de ser públicas, foi porque a sociedade civil tinha antes falhado nessa tarefa de observação, análise e produção de medidas corretivas; um bom exemplo disso é o problema da sinistralidade rodoviária, em que falha a coordenação ministerial e em que a sociedade civil, mesmo com a participação das universidades, não conseguiu impacto social) pode provocar graves problemas de desemprego, com prejuízos eventualmente superiores aos benefícios das economias.

Tudo isto a propósito da medida de poupança de energia consumida no metropolitano, através da redução da velocidade limite de 60 km/h para 45 km/h.
A energia necessária para atingir uma dada velocidade é função  do valor dessa velocidade (proporcional à resistência ao movimento) e do seu quadrado (proporcional à energia cinética).
Mas também é verdade que a uma velocidade superior pode corresponder um número menor de comboios em linha, isto é, menor número de consumidores, o que pode levar a uma economia irrelevante quando se baixa a velocidade, especialmente se contabilizarmos o valor do tempo perdido pelos passageiros.
Perante esta dúvida, e enquanto os colegas do metropolitano analisam os resultados práticos da experiencia que decorre com a redução de 60 para 45 km/h da velocidade máxima durante as horas de exploração fora das horas de ponta, para outras variáveis como o intervalo entre comboios sem alteração, resolvi fazer uns cálculos para um modelo de exploração numa linha ideal com 10 inter-estações planas de 1000 m de comprimento cada.
Recordo que as expressões principais para o cálculo da exploração de uma linha são:

§         Capacidade horária da linha por secção e sentido            
                                      C = nºlugares por comboio x 3600/Δt
                                                   sendo Δt o intervalo entre comboios em segundos

§         Nº de comboios na linha     nc = T / Δt              
              sendo T o tempo da rotação completa incluindo as inversões nos términos

§         Taxa de ocupação  O = nºpassageiros.km/nºlugares.km

§         Velocidade comercial média numa rotação completa         
                                        vcom = L/T = L/nc. Δt     
               sendo L  o comprimento da rotação completa incluindo as inversões nos términos

(não confundir com velocidade máxima no arranque e na deriva, embora estejam obviamente  relacionadas;  para reduzirmos a velocidade, com o mesmo intervalo entre comboios, i.é, com a mesma capacidade horária da linha, são necessários mais comboios na linha; ou, com o mesmo número de comboios, terá de se adotar um intervalo maior para essa redução de velocidade)

§         Nº de comboios.km produzidos no tempo  t      
                                    comb.km = nc.t.vcom

§                   Nº de passageiros.km transportados no tempo t
                               Pass.km = nc.t.vcom.O. nºlugares por comboio

§                    Nº de passageiros transportados no tempo   t
                                    Pass = pass.km/percurso médio
                     


cuja imagem junto, e que por terem sido elaborados com alguma pressa, conterão imprecisões, podem ver-se as poupanças calculadas através deste modelo teórico de uma linha plana com 10 inter-estações de 1000 m.
Considerei uma fórmula empirica para a resistencia ao movimento, intervalos entre comboios de 300 e 420 seg. e 12 horas por dia para velocidade máxima de 45 km/h e 7 horas por dia para 60 km/h de velocidade máxima.
A economia que me deu para a energia elétrica consumida quando se passa de uma velocidade limite de 60 km/h para 45 km/h com um intervalo de 300  foi de 17,3% ou cerca de 400 euros por dia.

Porém, se considerarmos que há uma percentagem de população produtiva não desempregada que perde tempo por a velocidade comercial ter baixado, teremos que o respetivo prejuízo, na base de um salário de 4 euros por hora, será da ordem de  6.600 euros por dia (igualando a economia em energia com os prejuízos em termos de população ativa, teríamos um salário horário de 0,23 euros!  como tudo neste mundo , é uma questão de hierarquia de valores).

Já para a passagem de 300s para 420s, com menos comboios em linha, a economia é de 11,6% para velocidade limite de 45 km/h e de 8,7% para a velocidade limite de 60 km7h (ter atenção que, quando se aumenta o intervalo, há menos comboios em linha em cada instante e menor capacidade horária da linha por secção e sentido, para a mesma velocidade comercial).

A conclusão será a de que é sempre possível poupar, embora as poupanças possam não ser o essencial da questão, especialmente quando as compararmos com a qualidade do serviço, quer do sistema de transporte, quer da comunidade produtiva em geral, que se perde.





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