Fico a dever à exposição organizada pela Fundação EDP a informação sobre Fastigimia.
Tomé Pinheiro da Veiga foi procurador geral do reino e chanceler-mor.
Em 1605 teve de se deslocar à corte de Filipe III em Valadolid.
Ao regressar, escreveu Fastigimia, tentando comparar a cultura portuguesa e a cultura castelhana.
Fastigimia pertence , juntamente com a Arte de Furtar do Padre Manuel da Costa, e os textos do Padre António Vieira e de Francisco Manuel de Melo, ao conjunto das principais obras literárias portuguesas do século XVII.
Nesse tempo, as estruturas dirigentes de ambos os países desprezavam a economia. O poder dominante, a corte espanhola, endividava-se de forma galopante, para alem de desenvolver uma política europeia desastrosa.
No entanto, Tomé da Veiga apontou várias características negativas dos portugueses, relativamente aos castelhanos:
- que os portugueses têm as suas terras partidas aos palmos com suas paredinhas de pedra a separá-las, como quem diz «Isto é meu, não é teu, não me furtes as minhas uvas» ; isto é, como se diz agora, os portugueses gostam muito de se fechar nos seus compartimentos estanques e pôr cortinas nas janelas;
- que os portugueses tratam mal as suas mulheres, ao contrário dos castelhanos, que, ao menos as tratavam como suas irmãs e filhas dos seus pais, cristãs e bichinhos que boliam e sabiam falar; isto é, a sociedade castelhana da época parece ter sido já nessa época mais aberta e interventiva.
Associo esta informação à que a correspondente do DN em Madrid reportou há uns dias: o embaixador castelhano que se deslocou a Lisboa para reclamar os direitos de Filipe II à coroa portuguesa, ao apresentar depois o seu relatório ao rei, referindo-se às entidades com quem tinha falado e argumentado, descreveu-as como sendo "uma gente estranha".
De facto, analisando a gestão da coisa pública e das grandes empresas portuguesas, a falta de consideração da Ciência como fator indispensável da equação, a rejeição dos métodos de resolução de problemas de que é exemplo a ignorância votada a livros como "A sabedoria das multidões" (estou-me a repetir, mas pode ser que numa das repetições algum dirigente que eventualmente seja meu leitor resolva ler o livro) sinto-me a ceder à tentação de considerar os dirigentes de sucesso do meu país como "gente estanha".
E assim não me podem acusar de não propor soluções.
Interessa estudar a história para ajudar a compreender o presente.
E tentar pistas para o futuro, perdoe-se-me o truísmo comum.
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