Lembram-se dos excelentes espetáculos de ópera no S.Carlos com Niobe, rainha de Tebas?
Ver em http://fcsseratostenes.blogspot.com/search?q=s.carlos
Pois imaginem que as Bodas de Fígaro, a última ópera da direção do diretor demitido pela senhora ministra, voltou a ser um sucesso. Além de que é um prazer ver o soprano português Joana Seara num dos principais papeis (Susana).
É uma pena.
Como Beethoven dizia, não era o critério dos espetadores que ele seguia para escrever sinfonias.
É uma pena perder-se a colaboração do diretor demitido, que evangelicamente se contentou com uma indemnização igual a uma pequena fração do correspondente ao tempo que lhe faltava para o fim do contrato (facto logo aproveitado pela senhora ministra para cantar aos ventos que tinha feito um grande negócio).
O novo diretor certamente conseguirá produções razoáveis, mas é uma pena perder-se a colaboração com o teatro de Erfurt.
É possível que a maioria dos espetadores não goste da explicitação do que Lorenzo da Ponte escreveu e Mozart compôs: a reivindicação da igualdade pelas classes do povo e do respeito pela mulher.
A ópera estreou-se em 1786, data que, como se sabe, está perto da revolução francesa.
Mas está lá escrito com todas as letras:
- referindo-se ao direito do senhor feudal sobre as noivas: “Renunciando (o senhor) a um direito que ofende e ultraja” (a un dritto cedendo, che oltraggia, che offende).
- e também: “No mundo, meu amigo, sempre foi um perigo medirmos forças com os grandes: dão noventa por cento e ganham mesmo assim” (nel mondo, amico, l’accozzarla co’grandi fu pericolo ognora, dan novanta per cento e han vinto ancora).
- e mais: “sob uma pele de burro podemos fugir às vergonhas, aos perigos, ao ultraje e à morte” (ch’onte, pericoli, vergogna e morte col cuojo d’asino fuggir si può)
- e uma pequena homenagem aos amores adolescentes: “já não sei o que sou, nem o que faço…qualquer mulher me faz corar, qualquer mulher me faz palpitar” (non so più cosa son, cosa faccio…ogni donna cangiar di colore, ogni donna mi fa palpitar - ver em:
http://www.youtube.com/watch?v=hQdT7DZNAcY ).
Convenhamos que para século XVIII, na catolicissima e imperial Viena, era uma mensagem forte de libertação social e do pensamento.
O que me leva a achar precipitada a demissão do diretor pela senhora ministra, citando abusivamente os espetadores (de cujo conjunto faço parte), como se fosse o presidente de um clube de futebol que perdeu um jogo (o Morcego) e ganhou os outros com táticas e estratégias de que muitos adeptos não gostam (mas não todos).
O que me leva a formular votos para que o senhor presidente da Republica não deixe o camarote principal vago, e assista a um dos últimos espetáculos, até dia 8 de Maio de 2010, concentrando a sua atenção naquela frase “nel mondo, amico, l’accozzarla co’grandi fu pericolo ognora, dan novanta per cento e han vinto ancora” e se abalance a abençoar uma taxação de rendimentos que tenda para a igualização dos cidadãos.
Como diz o mote da revolução francesa.
E como se deduz da observação de que 90% dos rendimentos se concentram em 10% dos cidadãos e muito maus cidadãos serão, tão maus que é mesmo melhor mudar de país, se se assustarem e fugirem com os seus investimentos por lhes aumentarem as taxas.
Que viva Mozart.
As suas óperas serão extremamente atuais enquanto a desigualdade dos rendimentos for tão grande.
Podem comprar os bilhetes em:
http://www.saocarlos.pt/gca/?id=654
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