Não estou pensando em nada
E essa coisa central, que é coisa nenhuma,
É-me agradável como o ar da noite,
Fresco em contraste com o verão quente do dia,
Não estou pensando em nada, e que bom!
Pensar em nada
É ter a alma própria e inteira.
Pensar em nada
É viver intimamente
O fluxo e o refluxo da vida...
Não estou pensando em nada.
E como se me tivesse encostado mal.
Uma dor nas costas, ou num lado das costas,
Há um amargo de boca na minha alma:
É que, no fim de contas,
Não estou pensando em nada,
Mas realmente em nada,
Em nada...
Poema de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa, em "Poemas"
Fernando Pessoa aprendeu o inglês como língua natural em Durban, para onde os pais emigraram quando tinha 5 anos.
Pensava portanto em inglês e isso foi muito bom quando voltou a Portugal com 17 anos e tomou contacto a fundo com a literatura portuguesa e com os poetas modernistas e simbolistas portugueses seus contemporâneos.
Pensar em inglês é uma forma mais económica, dado que o pensamento inglês foi estruturado à volta das trocas comerciais que o povo fazia numa linguagem contendo o máximo de informação com o mínimo de componentes, enquanto a corte inglesa falava em francês e fazia os seus jogos de poder segundo a estratégia francesa de ideias .
É portanto, o pensar em inglês, mais eficaz ao abordar uma questão, estudá-la, propor saídas e finalmente apresentar a conclusão.
Dito assim pode parecer fácil, que sistematizar uma questão seria resolvê-la.
Nada disso, Fernando Pessoa teve de criar heterónimos para atacar de diversos pontos de perspetiva as questões.
Mas talvez tenha pensado muitas delas em inglês, "just in english", e por isso os portugueses não o tivessem compreendido na altura.
Pode ser-se incompreendido, quando se pensa em inglês.
Por exemplo, não se diz que se pôs a máquina de lavar roupa a correr, diz-se que se ligou a máquina.
Mais uma razão para, quem vem de fora, fazer o esforço para pensar em português, para automatizar a construção das frases em português, o que só se conseguirá com o alargamento do vocabulário dominado e com a aceitação desta famosa maneira de ser, "à portuguesa".
Tem vantagem de não se perder tempo a "traduzir mentalmente" de inglês para português.
Nota - Dedicado ao autor , e à sua superchefe de gabinete, do neologismo "descompetividade", como sinónimo de falta de competitividade.
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