Pobre Pedro, assim se intitulava o email que circulou pela
internet.
Pretensamente escrito por um antigo colega do atual primeiro
ministro, dos tempos da juventude partidária.
Pobre porque afastado dos ideais juvenis de solidariedade com as
pessoas.
Com ou sem veracidade, o email suscita a reflexão sobre as elites
deste país, a sua contribuição ao longo do tempo para o bem ou mal da
comunidade, como se acede à elite, e também a sua avaliação.
Do dicionário Houaiss:
elite -
minoria que detem o prestígio e o domínio sobre o grupo social; o que há de
melhor e de mais valorizado num grupo social; carater de impressão
correspondente a 12 letras por polegada; do latim eligere, escolher,eleger, por
via do francês.
Dito assim, a natureza democrática de uma sociedade pareceria
estar garantida se o formalismo do ato de "escolher, eleger" as
elites conduzisse a uma delegação ou a uma representação dos eleitores junto ou
pelas elites.
Apesar do antipático “domínio sobre o grupo social”.
Infelizmente, esse antipático é demasiado forte para nos
contentarmos com o estado atual da democracia.
Não é só o antipático do que se diz durante o ato de eleger e
escolher já não ser o que se pratica quando se é primeiro ministro, é
principalmente a incipiencia e a ineficiência das instituições em termos de
participação dos cidadãos e cidadãs no debate e nas tomadas de decisões.
Por outras palavras, as elites dominam mesmo os grupos sociais.
As elites são então pequenos grupos que por delegação ou
incumbência de outros pequenos grupos exercem o poder e dominam os grupos
sociais compostos pela maioria da população.
Digamos que a origem do poder estará então nos pequenos grupos das
grandes empresas internacionais, dos grandes bancos, dos grandes grupos
financeiros, que precisam, todos eles, de elites para gerirem os seus negócios
e para ganhar o voto dos eleitores para se poder dizer que os representam.
Se é assim, não vale a pena pedir a convocação de eleições
antecipadas quando se chega a um ponto de rotura social, com o agravamento do
coeficiente da desigualdade de Gini e o abaixamento contínuo do rendimento
individual da maioria e do PIB nacional.
A experiencia mostra que, em casos extremos, que poderão
classificar-se como de “armadilha social” (armadilha
– aparelho para captura de animais ou artifício ou ardil para logro de
pessoas, que não permite a libertação depois de se cair nele, mesmo utilizando
a força e os meios que em condições normais garantem a liberdade de movimentos
do capturado; do castelhano do século XIII armadilla
com origem no latim arma, arma) a
população prejudicada por elites que aplicaram políticas que a prejudicaram
valida, em novas eleições, as mesmas elites ou que defendem as mesmas
políticas.
Haverá alguma sabedoria nesta decisão, porque por definição de
armadilha a saída é difícil.
As experiencias que demonstraram a dificuldade de sair da
armadilha são as ultimas eleições na Grécia e na Bulgária, em que os eleitores
recearam mudar de elites ou assumir formas de organização da sociedade em
democracia direta (aliás, por definição de armadilha, sem intervenção exterior
e alteração das condições de relação com o exterior a armadilha dificilmente poderá ser
vencida; entretanto, mantendo-se a armadilha, até os investimentos que serão
rentáveis noutras condições não trarão neste caso retorno).
Não se pôs com suficiente intensidade a solução da população aceder à área decisória, em vez de votar para mudar de elite ou mantê-la.
A democracia direta não é um sonho.
Alguns dos seus componentes são até utilizados para a manutenção
de regimes que nem formalmente cumprem critérios de democracia como eleições
periódicas; fazem-no através de assembleias de controle popular no nível de maior
proximidade das populações.
Por outro lado, algumas experiencias de iniciativa popular, vulgo
“sociedade civil”, têm apontado caminhos em países mais desenvolvidos.
Cito novamente “A sabedoria das multidões” de James Surowiecki,
como repositório do tipo de organizações e métodos de democracia direta.
O objetivo principal é o de deixar de depender de elites
aumentando o grau de participação popular e de acessibilidade aos mecanismos de
decisão (ou alterar estes mecanismos de modo a reduzir a componente de delegação
ou de representação e alargar a participação social), acabando com a
prevalência da oligarquia (oligarquia – regime
em que o poder é exercido por um pequeno grupo de pessoas; do grego oligarkhia, governo por um pequeno grupo
de pessoas ou famílias).
Mais perto de nós, o testemunho de António Coutinho, já referido
em
…”deveria
ser reformulado o papel dos partidos, centrando-os na ação formativa, sem
prejuizo da sua liberdade ideológica, evidentemente, mas reservando a
representação dos cidadãos no Parlamento a técnicas de amostragem (amplamente conhecidas da estatística, da
sociologia, das metodologias das sondagens).
Isso permitiria
uma mais perfeita representação da vontade e do sentir da população … a
ideia do interesse egoísta como motor económico pode ser muito interessante nas
sebentas das universidades dos economistas, mas é um monstro que derrota a
dignidade dos profissionais e o bem estar das comunidades e é uma mentira que
ilude os eleitores”…
Se
o estado do país é lamentoso, foram as elites que o conduziram até ele; nunca
as populações exerceram o poder direto nem definiram os montantes dos
empréstimos e os rácios da dívida.
Mas
as elites não querem reconhecer o seu falhanço, e insistem nas suas políticas e
no auto elogio.
Segundo
Tim Harford, no seu livro “Adapte-se”, pagina 285 da 1ª edição da Ed.Presença,
são três as fases que as elites seguem quando cometem os seus erros:
- negação
– por mais evidente que seja o erro, a elite considera-se superior à
realidade e nega-a
- ampliação
das perdas – em vez de seguir o caminho de tentativa e erro aprendendo com
este, a elite prefere insistir no erro, ampliando os efeitos negativos,
compensando os erros com mais erros
- revisão
hedonista – qualquer pequeno êxito ou insucesso é ampliado ou valorizado pela
perceção da elite e apresentado como grande sucesso, justificando assim as
politicas destrutivas seguidas.
Choca
um pouco o levantamento destes comportamentos já estar feito, já se ter chegado
à conclusão de que a participação efetiva dos cidadãos e cidadãs na vida
pública tem de aumentar, e serem tão pouco palpáveis os progressos.
Há alternativas ao que os nibelungos estão a fazer. Dizer que não há alternativas é uma forma de insistir na negação e no erro. Se se acaba com as obras públicas e com o emprego, é natural que o desemprego aumente, as despesas com a segurança social aumentem e as suas receitas baixem. é como uma crinça partir um brinquedo e depois dizer que foi ele que se partiu.
Há alternativas, mas os nibelungos, ou melhor, as elites e os Alberich que os comandam, acham que não se deve aplicar a taxa das transações financeiras, nem alargar a base de incidencia fiscal reduzindo impostos de acordo com a lei de Laffer, nem simplificar as burocracias, nem investir em obras públicas de infraestruturas de transporte ferroviário (as cimeiras ibéricas têm sido fumo de diversão) ou de produção de energia solar com fundos comunitários, nem renegociar as taxas de juro, nem pressionar o BCE e a UE para a união bancária e fiscal e o fim dos subsidios ao monopólio dos bancos (aquilo de obrigar os governos a contrair empréstimos nos bancos, em vez de diretamente ao BCE).
Só nos resta ir tentando divulgar as alternativas até às próximas eleições.
PS em 15 de maio - manda o respeito pela verdade deixar registado que, entre secretários de Estado e técnicos ao serviço dos ministérios ou seus conselheiros, existe ainda alguma lucidez. Por exemplo, nas medidas de simplificação burocrática para atividades turisticas, ou na intenção de manter a receita fiscal do IRC através da sua diminuição com aumento da base de incidência (medida válida se, e só se acompanhada de simplificação burocrática e de confiança nos critérios declarativos dos cidadãos, em clara aplicação da lei de Laffer).