quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Hoje anuncio que me despeço

Uma amável comentadora deste blogue já tinha cometido a inconfidência de revelar a proximidade do termo da minha vida profissional .
Talvez este blogue tenha facilitado a transição, que tenha ajudado a preparar a nova forma de vida, que espero seja ativa, mas sem compromissos profissionais.
Não me iludo com a ideia de ir vender “know-how” e pôr a render a experiencia adquirida.
Os compradores de agora compram outras ilusões, que a experiencia desacredita o fator de produção mais concreto.
Este é o tempo da inovação e da imagem, em detrimento da comprovação e do conteúdo real. E já vem tudo feito.
Por isso, com a satisfação de ter vivido o tempo da nossa integração na comunidade europeia e de ter assistido à consolidação do sistema de segurança social, em sintonia com o artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, vou , sem beliscar a minha consciência, porque nunca quis chegar-me aos degraus e aos lugares da frente, libertar a minha empresa da obrigação de me pagar salário.
Por isso leio, como se quisesse que pudesse ser meu, este poema de Tolentino Mendonça:

Sobre um improviso de John Coltrane

Ainda espero o amor
Como no ringue o lutador caído
Espera a sala vazia

Primeiro vive-se e não se pensa em nada
Não me digam a mim
Com o tempo apenas se consegue
Chegar aos degraus da frente:
É difícil
É cada vez mais difícil entrar em casa

Não discuto o que fizeram de nós estes anos
A verdade é de outra importância
Mas hoje anuncio que me despeço
À procura de um país de árvores

E ainda se me deixo ficar
Um pouco além do razoável,
Não ouvem? O amor é um cordeiro
Que grita abraçado à minha canção

(José Tolentino Mendonça, Baldios, ed. Assírio & Alvim)


Vou trocar a minha casa em Lisboa por uma casinha térrea com um terreno à volta, com frisos azuis, na região de Kuçadaci, na costa ocidental da Ásia Menor, mesmo em frente da ilha de Samos.
Vou encher os olhos com o azul do Egeu e sentar-me nas ruínas romanas e gregas.
Como foi possível aos gregos antigos libertarem-se da ocupação exclusiva com a alimentação das populações e a produção de bens e o transporte entre ilhas, com os barcos e os meios de produção de que dispunham?
Como conviveram os escravos, os matemáticos, os filósofos, quando o clima convidava à inação?
Como foi possível sintetizar toda a cultura nascida para benefício de todos nós na região do Eufrates e do Tigre, de Babilónia e de Susa?
Quando a nós próprios nos custa fazer os cálculos dos juros compostos e só no século XVIII se conseguiu igualar a precisão do cálculo do arco do minuto da circunferência terrestre que Eratostenes conseguira no século II antes de Cristo…
Posso viver em Kuçadaci porque finalmente a Turquia foi admitida na União Europeia.
Mas também porque finalmente o PKK viu satisfeita a sua reivindicação de autonomia dos curdos, passando por cima do traçado disparatado das fronteiras que as tropas do império britânico impuseram aos povos da região a seguir à vitória na primeira grande guerra.
Irei à praia em Chipre sem sair da união europeia , mas também em Gaza, agora que os fundamentalismos do lado de Israel e do lado da Palestina cederam finalmente o passo aos tolerantes.

Bom, talvez dê um saltinho a Teerão, para matar saudades .
Por lá estão a construir o caminho de ferro Ancara-Damasco-Bagdad-Teerão-Kabul-Islamabad-Nova Deli e as mulheres já andam de cabelos soltos.
Finalmente.
Vai ser uma linha que não vai bater recordes de velocidade; não vão ser mais de 300 km/h , mas vai funcionar bem , certamente.
Material circulante chinês, com elevada probabilidade.
Serão 10 horas para ir de Ancara a Nova Deli sem ter de tomar o avião.
Os técnicos sempre se entenderam melhor do que os políticos para bem dos povos e para a compreensão entre eles.

Desde que o lucro deixou de ser a primeira prioridade das grandes empresas mundiais, que as transações bolsistas em qualquer mercado são taxadas de forma inversamente proporcional ao indicador de qualidade de vida e satisfação das populações mundiais, que o sigilo bancário in ou off-shore acabou, e que os governos começaram a aplicar a Declaração Universal dos Direitos do Homem, os conflitos foram desaparecendo e as comunidades concentraram-se no trabalho para o bem comum.
Espero viver ainda o suficiente para fazer a viagem a Nova Deli.
Não me esquecerei de descer em Bagdad e fazer um desvio por Babilónia, Susa e Persépolis até Pasargada, a rever todas as gravuras do meu livro de história antiga do próximo oriente e a encontrar Manuel Bandeira (Vou-me embora pra Pasárgada, aqui eu não sou feliz, lá a existência é uma aventura de tal modo inconsequente que Joana a Louca de Espanha, rainha e falsa demente, vem a ser contraparente da nora que nunca tive … Em Pasárgada tem tudo, é outra civilização, tem um processo seguro de impedir a concepção, tem telefone automático, tem alcalóide à vontade, tem prostitutas bonitas para a gente namorar. E quando eu estiver mais triste, mas triste de não ter jeito, quando de noite me der vontade de me matar - lá sou amigo do rei — terei a mulher que eu quero na cama que escolherei. Vou-me embora pra Pasárgada.)
Mas voltando à realidade, já vai avançado o projeto da linha de Nova Deli para Pequim.
Más notícias para as companhias de aviação; mas os consumos e as emissões também já estavam insustentáveis.

E boas perspetivas para o período de reforma que se avizinha.



PS – Se o leitor teve a paciência de chegar até aqui, duvidando certamente da posse em plenitude das faculdades mentais do autor destas linhas e citações, merece ser recompensado com um esclarecimento.
O autor apenas utilizou uma figura de estilo que equivale à caricatura no desenho.
Acentuando e exagerando traços de modo a perceber-se bem a diferença entre a realidade e aquilo que desejaríamos ser possível, imitando canhestramente o que Manuel Bandeira idealizou no seu poema.
E se concorda com o autor que a diferença é de facto incomensurável, provavelmente partilhará com ele o pensamento de que ao longo dos anos os dirigentes políticos, económico-politicos e religiosos nos foram conduzindo a todos à situação em que estamos, ao mesmo tempo que sistematicamente repetiam que eram os eleitos e os melhores para tomarem decisões, pelo que esta história nos ensina que devemos antes ser nós todos a tomar as decisões, de acordo com os métodos que não são do autor, mas de que já vos tem falado ao longo deste blogue.

Rodoviarium XX - 80 - 60 - 40

Quem desce pela auto-estrada de Cascais-Lisboa do alto de Monsanto, a caminho da ponte 25 de Abril e da entrada em Lisboa pela Avenida Calouste Gulbenkian, encontra vários sinais de limitação de velocidade para dar conta do declive acentuado e do traçado sinuoso.
Primeiro 80, depois 60 e por ultimo 40.
Estes valores estão bem escolhidos, e o seu cumprimento garante níveis razoáveis de segurança para quem percorrer estes caminhos.

Mas não é esse o entendimento da maioria dos utilizadores.
Tentei cumprir os limites e imediatamente vi no retrovisor automóveis que se aproximavam perigosamente. Na faixa da esquerda (agora diz-se na via da esquerda) passavam outros a velocidade superiores aos limites mais de 20 km/h, o que me colocou um problema de segurança rodoviária: como mudar para a via da esquerda, uma vez que o meu destino era a entrada pela Calouste Gulbenkian, sem ultrapassar os limites? Mas lá consegui, graças a um ligeiro incumprimento, julgo que sem comprometer a segurança de ninguém, passe embora a expressão ofendida do cidadão que de repente ocupou o meu retrovisor quando acedi à via da esquerda e que logo a seguir guinou repentinamente para a via da direita porque era para a ponte que ia o senhor.

O que eu gostaria de dizer à autoridade de segurança rodoviária é que, embora a zona não seja um ponto negro na sinistralidade, este comportamento dos condutores, de incumprimento dos limites de velocidade, é, enquanto se mantiver, um indício de que a redução significativa dos níveis de sinistralidade não é possível .

Por isso gostaria que a autoridade de segurança rodoviária considerasse a premência de:

- uma campanha publicitária eficaz, isto é, pela positiva, mostrando o comportamento correto que deve esperar-se dos condutores, e classificando adequadamente o comportamento incorreto

- a implementação de uma fiscalização eficaz, de preferência por elementos de forças policiais, embora existam sistemas automáticos de deteção de excesso de velocidade, identificação de matrículas e emissão e expedição de multas

Continuando como estamos, dificilmente os índices de sinistralidade baixarão, quer o governo queira ou não.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Abertura da semana da mobilidade de 2010 - o professor, o presidente da junta e o governante

Dia 22 de Setembro de 2010, 10:00, da Praça de Espanha para Jardim Zoológico


Comemorado em 22 de setembro de 2010 o dia da mobilidade sem carros, vou tentar comentar a sessão de inauguração da semana, no dia 16, na estação de metro de S.SebastiãoII.
Digo que vou tentar porque o problema dos transportes em Lisboa e em Portugal é de tal modo complexo, porque a estrutura urbana e a organização dos territórios ou se foram degradando ao longo dos anos ou nunca atingiram um estado satisfatório abrangendo a totalidade da população, que nenhum de nós, técnicos ou decisores políticos, consegue isolar soluções redentoras e imediatas.
Por outras palavras, por mais bonito que seja um discurso de um político ou por mais fundamentada que esteja uma proposta técnica, o estado do suporte (uma região urbana, por exemplo) sobre o qual deverá implantar-se a solução de transportes (uma rede ou uma linha de um modo de transporte) impõe um longo estudo pluridisciplinar e participado e a sua concretização exigirá muitos anos.
Como dizia Asterix, hoje não é a véspera desse dia; pelo que estarão longe os dias risonhos em que as cidadãs e os cidadãos, que se levantam cedo para trabalhar, possam deslocar-se para onde produzem mais valias, comodamente instalados em modos de transporte rápidos, seguros e energeticamente eficientes.
Mas isso não impede de pensar hipóteses e testá-las.
Pensar , ainda não paga impostos, e pouco sobrecarrega o orçamento de estado (na verdade é ausência de pensar que agrava os orçamentos).
É esse o sentido dos meus comentários, sem exigir perfeição aos discursos dos políticos, dada a complexidade que referi. Esse e a vontade de participar na solução.
Apenas critico a falta de debate alargado e o secretismo com que se tomam decisões, como foi o caso com a localização do aeroporto na Ota, com o traçado do TGV, com a reformulação do plano estratégico dos transportes .



                                                    O professor

O professor chegou à hora aprazada.
Ao cimo das escadas apertou o botão do casaco e com um olhar abrangente apreciou a plateia em frente do painel dos 3 conferencistas.
Não estavam muitos técnicos. Também não estavam muitos políticos, nem muitos decisores empresariais públicos ou privados, mas estavam ainda assim alguns representantes distintos do “meio dos transportes”.
Um cartaz projetava-se nos écrans com um logótipo novo destacando-se dos outros: uma seta subindo das sete horas para o centro de uma circunferência rompida nessas mesmas sete horas, como Lisboa abrindo-se recetiva à penetração dinâmica dos produtores das mais valias que das periferias demandam o centro produtor da cidade; e um título: “transportes de Lisboa”. Imediatamente abaixo, o logótipo da área metropolitana de transportes de Lisboa, feito de pequenos rastos de deslocação saindo do calcanhar de Mercurio, em escadinha com ponto ao cimo que talvez seja a cabeça , não o calcanhar do deus apressado.



O cartaz que anunciava a semana da mobilidade era apelativo e a mensagem clara: “Vá de transporte público”.
Mas olhando para ele, vi um velocímetro, e o ponteiro na posição de velocidade máxima. E a velocidade máxima estava na zona verde e o TI (transporte individual) estava na zona vermelha.
Que terá feito o subconsciente do especialista de marketing?
Associado contraditoriamente o ideal que vivem os automobilistas de viajar depressa à responsabilidade ambiental de viajar de transporte público?
Mesmo que tenha invertido os papeis do verde e do vermelho?
Ou o ponteiro mostrará o estado de carga da bateria de um veículo elétrico? Não utilizar se vermelho.
Mas escutemos os conferencistas.
O professor começa por aqui mesmo, por se congratular ter sido possível acordar um logótipo dos transportes de Lisboa,.
Talvez contribua para diminuir a perda de passageiros no TC, o transporte coletivo.
E talvez seja indício de ser possível o restante acordo, partilhar receitas. Uma missão impossível neste momento.
Porque não se fazem inquéritos fiáveis às deslocações, diria eu.
O professor continua: que se espera a adoção de uma política tarifária comum entre os vários operadores.
Sim, os produtores das mais valias agradeciam, para não terem de comprar um cartão recarregável num operador e outro cartão noutro operador, apesar do chip ser fabricado na mesma cidade chinesa.
Mas como se repartirão as receitas de forma justa se não há inquéritos fiáveis?
E porque tem de haver tantos operadores? Se não houvesse tantos não era tão difícil repartir receitas…Ah, sim, para permitir a concorrência.
Cidades como Paris, Milão, Bruxelas e Barcelona sempre se deram bem com a concorrência que existe, sim, mas com Régies (operador integrador de vários modos de transporte) . Quem quiser montar uma empresa de transportes monte, concorra à vontade, mas depois não venha pedir subsídios ao estado. O professor não disse isto sobre a concorrência, sou eu que não consigo conter-me, eu e os nossos colegas da RATP).
Mas continua o professor: o TC oferece opções de transporte orientadas para a intermodalidade, a segurança das deslocações e os modos suaves. E o entusiasmo continua apesar de interrompido pelo ruído da chegada de mais um comboio á estação.
Vejam, diz ele, como as estações de metro que se vão construindo são bonitas e bem iluminadas, e como os comboios estão sempre a chegar e a partir, não devia haver razão para o TC perder passageiros.
Choca-se-me o sentimento, e logo por duas razões: realmente o TC perde passageiros (possivelmente porque muitos preferem vir a ouvir musica no IC19 e ainda acreditam na Tatcher que decretou a seguinte barbaridade, no seu tempo de petróleo barato e abundante : “quem tiver mais de 30 anos e andar de autocarro considere-se um falhado na vida”), mas também tenho de lamentar o desperdício em volume de construção subterrânea das novas estações de metro, em energia de iluminação e ventilação, e a precariedade da solução do término da estação de S.Sebastião, com os passageiros a saírem e a entrarem do mesmo lado do comboio.
Porque uma urbanização de Campolide impôs ao traçado do metro, sigilosamente, a curva da Av.Duque de Ávila para a Marquês da Fronteira, em lugar de seguir em frente até à entrada de Campolide, mas numa cota não muito profunda.
Para onde está agora prevista, a construção da estação é profunda e onerosa, tanto que assustou os decisores que quiseram poupar no investimento.
E como a rampa de S.Sebastião para Campolide é de 4%, não é prudente estar a fazer inversões em exploração.
O que quer dizer que o comboio que quer partir de Saldanha para S.Sebastião tem de esperar que o que sai de S.Sebastião para Saldanha mude de via e liberte a respetiva agulha.
E quer dizer também que, se a procura de passageiros aumentar com os custos de combustível, a linha vermelha não vai ter capacidade de resposta e os passageiros amontoar-se-ão nos acessos aos comboios.
Só depois do prolongamento até Campolide teremos inversões normais, com passageiros a sair por um lado e a entrar pelo outro.
Mas a construção de metropolitanos é cara, talvez não se consiga agora por menos de 80 milhões de euros por km, sem contar o material circulante (ver em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/08/calculos-para-investimento-em-redes-de.html ).

E por isso o professor se volta para o governante e diz: só era preciso prolongar agora o metro até Campolide, para a câmara reorganizar os percursos pedonais em Campolide; o buraco já está feito, só precisávamos de dinheiro para isso.
Ah, professor, não está feito, não, o buraco ficou-se pela entrada da penitenciária (ah, é verdade, o metro não pôde fazer-se por baixo da penitenciária porque os decisores da segurança prisional não deixaram; agora a penitenciária foi vendida para o admirável mundo da imobiliária e o traçado do metro lá ficou, errado). Até à estação futura ainda faltam mais de 300m, e depois há que contar com o término e uma construção caríssima da estação, em poço, porque Campolide é, como se viu, demasiado profunda.
O professor aproxima-se do final da sua intervenção. Não quer fazer esperar os ouvintes nem o operador de televisão que o vai entrevistar depois da sessão sobre os novos esquemas de circulação na cidade.
Vamos todos lutar pela aplicação do tarifário integrado, pondo as empresas de acordo. É então que me recordo que não é a mim que me devem tentar convencer. Corria o ano de 1978 e eu tomei a iniciativa de convencer os decisores do metropolitano de então a alterar a largura dos bilhetes Edmonson de 30 mm para 42 mm de largura. O trabalho que deu aos nossos serralheiros… Apenas porque a companhia Carris tinha equipado os seus autocarros com obliteradores para bilhetes de 42 mm e não aceitou a nossa proposta de regressar aos 30 mm. Largura não é tarifário, mas a ideia na altura já era um cidadão comprar um bilhete num modo de transporte que lhe permitisse viajar noutro modo de transporte. Isto em 1978. Objetivo ainda não atingido em 2010. Não seria altura de ouvirem outras opiniões?
Mas esta foi uma pergunta interna minha, que o professor passou para outro tema candente:
Que temos de mudar, que todos têm de pagar os custos dos transportes (segundo alguns, pagar… já pagamos) e ainda bem que o conferencista seguinte preside à única câmara que mantem um serviço municipal de transportes, alem de presidir à junta metropolitana de Lisboa. Porque as autarquias têm de arranjar dinheiro para pagar os custos dos transportes, as empresas terão de retornar o benefício de lhes porem os funcionários no local de trabalho, e os operadores terão de se integrar.
Como diria Hermann José, têm de se organizar.
Mas ai, o problema do dinheiro, ai.


                                              O presidente da junta

Avança o segundo conferencista, que já se sabe preside à junta metropolitana de Lisboa.
Eu escrevo que preside porque não lhe quero chamar autarca . Que autarca significa uma coisa muito feia, que vem do grego, autoarkes, que significa governante de governo de um homem só, isto é, autocrata, que é coisa que não se deve ser.
E junta metropolitana é aquilo que se consegue no contexto em que vivemos, e é pouco, que os limites do município de Lisboa andam tão restritos, que podiam pôr os olhos em Londres e estudar a reforma das autarquias que lá fizeram em 1990.
Por isso o conferencista não se esquece de incluir o pedido de meios para que a junta funcione, a junta e a autoridade metropolitana de transportes, para que a mobilidade seja um fator de desenvolvimento e que Lisboa seja a cidade das duas margens, poli-nucleada, não dividida mas integrada.
Estas palavras puseram os ouvintes a meditar e eu em particular, a tentar medir a distancia entre elas e a concretização. Como conseguir convencer os presidentes das câmaras de Lisboa e das cidades envolventes a seguir o caminho da integração? E por onde é, o caminho? Eu não tenho a resposta, mas nestas questões de transportes não consigo esquecer-me de uma iniciativa de um dos anteriores ministérios dos transportes. Requisitou uns gurus de marketing e outros de gestão , requisitou dois pendolinos, um do Porto e outro de Lisboa, e embarcou tudo quanto era administrador e diretores de empresa publica de transportes com destino a Coimbra, num frio mas solarengo dia de Dezembro, já há uns anos. Depois, nas salas do estádio municipal, os gurus de gestão aplicaram a velha fórmula: divisão em grupos, apresentação das conclusões de cada grupo e sua integração no painel geral. Seria este o caminho em que o presidente da junta metropolitana estava a pensar? E se tivermos seguido este caminho e chegado a conclusões, os decisores terão humildade que baste para aplicara as conclusões de modo a que o interesse coletivo se sobreponha ao interesses particulares ou de grupo?
Mas a intervenção prossegue com mais uma lista de temas:
- formas de financiamento
-a descoordenação nos transportes coletivos
- como aumentar a adesão ao TC
- a integração tarifária
-os interfaces
- a interligação com a política de ordenamento e de organização territorial
- a mobilidade como fator de atratividade para as cidades
-o papel da regionalização na coordenação dos transportes

O presidente da junta termina manifestando a sua satisfação por ter sido possível realizar esta semana da mobilidade.
Partilho da satisfação, sinceramente, mas sinto novamente, como uma preocupação latente, a distancia entre o diagnóstico e a cura, a dificuldade em organizar as equipas pluri-disciplinares e pluri-empresas, a ineficência com se faz o levantamento dos problemas e das soluções.
Retenho da intervenção a imagem da cidade de duas margens poli-nucleada. Lembro-me de que Paris é isso, Londres, Praga, Budapeste, Hong Kong. Verdade que o Sena é como o rio da minha aldeia quando comparado com o Tejo e que não temos os fundos de que Hong Kong dispôs para construir os seus túneis subaquáticos rodoviários e ferroviários, mas o que nos impede de fazer os projetos corretos e discutir o financiamento depois? A tal ineficiência porque só alguns podem decidir?



                                            O governante


O orador seguinte será o último do painel e é governante.
Vai fazer uma lição, que professor é. E começa como os professores experientes sabem que devem começar quando querem acordar a assistência, com uma fraze contundente:
“Tal como está a mobilidade é insustentável”
Subjugados pelo carater definitivo do diagnóstico, tentam recuperar do choque os ouvintes enquanto escutam a fundamentação:
- que o transporte individual (TI) tem um peso excessivo
- que assim sofremos de excesso de:
- emissões de gases nocivos
- consumos energético
- congestionamento nas vias de comunicação

A exposição é interrompida pelo excesso de ruído de mais um comboio que chega e que é transformado num fator de regozijo porque a qualidade do TC está a aumentar. Custa-me a aceitar que um ineficiente tratamento acústico da estação seja considerado fator de qualidade, pese embora a inovação do relevo nos azulejos de revestimento. A ausência de tratamento acústico arquitetónico é confrangedora, assim como a insuficiente insonorização da via férrea, pese embora a utilização de manta elastómera sobe o leito betonado de via. Custa-me aceitar que as limitações de exploração do trabalho realizado estejam ocultas pela procura que não cresce.

Mas já o governante põe o dedo na ferida: o TC tem de aumentar e garantir uma taxa de ocupação elevada. É essa a questão. O metro sul do Tejo tem agora uma procura de 25% da que foi estimada em projeto, porque falhou a integração modal.
Se um modo de transporte pesado atinge o breakeven (as receitas igualaram as despesas) mais um incremento, então pode reduzir as suas tarifas, por exemplo, cobrar menos ao sábado e ao domingo, porque o problema do produto de uma empresa de transportes, o lugar.km, é não ser stockável , desaparece assim que produzido, é como o fogo de artifício (esta do fogo de artíficio não foi o conferencista que disse, fui eu que pensei). E outro problema é as empresas de TC andarem a querer cativar os clientes de outros modos de transporte coletivo, em vez de se centrarem na população alvo dos utilizadores do TI. Oh que concorrência suicida.

Fico um pouco confundido, porque isso já fazemos, já vendemos abaixo do preço do custo, apesar das receitas não conseguirem atingir as despesas. E se no metropolitano quisermos cobrir as despesas com as receitas teriamos de subir, subir as tarifas e ameaçar o carater social do passe (realmente, se os cidadãos recebem o mesmo subsidio quando compram um passe independentemente do seu rendimento, os cidadãos de menor rendimento estão a subsidiar os cidadãos de maior rendimento, a menos que se considere como um retorno para o cidadão de maiores recursos por ter pago mais imposto). O que me leva a manter a dúvida:  porque não se exerce o carater social em bonus de desconto automático nos bilhetes simples e se vai elimnado o passe, como politica de simplificação tarifária e aproximação dos custos às receitas? (mas isto são divagações minhas, no meio da insustentável dificuldade do problema).

Segue-se pelo conferencista uma lista de intenções:
- encontrar novas fontes de financiamento para os investimentos no TC garantindo que os novos meios financeiros são bem investidos;
- fazer a abordagem dos transportes de forma integrada (ver intervenções dos dois conferencistas anteriores)
- desenvolver a mobilidade através de planos municipais, dos planos das empresas e do apoio do IMTT (e aqui surpreendo-me a pensar: como poderá isto fazer-se, se não estamos a controlar a dessurbanização e a desertificação gritantes das nossas principais cidades? E como colaborar nesta meritória ação, se não dispomos ainda do prometido em fevereiro deste ano plano estratégico dos transportes atualizado?)
- internalizar os custos de externalidades

Aqui devemos deter-nos, primeiro para traduzir esta linguagem tão querida dos economistas, para o que vamos à wikipedia para ver o que é uma externalidade (ver em:
http://en.wikipedia.org/wiki/Externality  ).

Externalidade de uma transação económica é o impacto, ou o que se abate sobre (“spillover”), um cidadão ou uma cidadã que não estiveram diretamente envolvidos na referida transação. Vale dizer que o custo da transação não inclui os custos todos, não inclui as indemnizações aos prejudicados.
Como consequência de um cidadão encher o depósito de gasolina e consumi-lo a ir para o emprego ou a vender equipamentos em ambulatório, outros cidadãos respiram os gases nocivos do escape do seu automóvel, sofrem os efeitos do congestionamento nos seus veículos de TC, sujeitam-se às consequências da emissão adicional de gases de efeito de estufa, têm de pagar a manutenção das estradas, etc, etc.(“as alterações climáticas antropogénicas são o maior exemplo de falha do mercado”)
E então, haverá que internalizar estes custos. Isto é, de os incorporar nos esquemas de compensação aos cidadãos que não intervieram na referida transação, mediante as taxas a que a Wikipedia chama pigovianas.
Talvez que a ideia das indemnizações compensatórias fosse esta, mas o interessante será notar que numa externalidade negativa (é que também há positivas, a polinização das abelhas como efeito benéfico do negócio das colmeias) a oferta e da procura são duas curvas de oferta, uma social e outra privada, e uma curva de procura. Existe um custo privado (o que o automobilista paga no posto de gasolina e ainda se queixa de que é muito) e um custo social (o mesmo custo mais o custo da poluição e das emissões adicionas de gases com efeito de estufa).


Como o professor Daniel Barbosa ensinava, é na manipulação das quantidades que se deve atuar, e do gráfico se retira que a quantidade de lugares.km tem de ser reduzida para ajustar a quantidade ao preço social que é mais alto.
Isto é, tem de se reduzir o numero de veículos em transito recorrendo ao TC.
Por outras palavras, é a própria economia que explica que não se pode aumentar o tráfego de TI.
Pobre Adam Smith (ou melhor, a perceção que temos de Adam Smith, que o original devia ser muito melhor do que as cópias de agora) e pobres defensores do laissez-faire (que o laissez passer todos aceitamos mais ou menos nos tempos que correm) que não querem reconhecer que o mercado livre não resolve o problema dos transportes.


Mas tudo isto sou eu a divagar pela Wikipedia, porque o conferencista já atacava valentemente o problema: que o preço de venda deveria cobrar o preço da produção do transporte. Porque, como está, o transporte está a subsidiar as empresas, não só por pôr os empregados no local de trabalho, como por estar a levar os clientes aos centros comerciais. Além de que tem a ação social de permitir à maior parte da população o acesso à mobilidade (se as tarifas forem baixas).
Mas para as tarifas serem baixas o diferencial preço de custo – preço de venda terá de vir do orçamento de Estado, porque não vem dos beneficiários, das autarquias enquanto representantes das comunidades e das empresas, enquanto beneficiadoras e produtoras de mais valias.

Damned, virámos o rabo da pescadinha, assim não pode ser (agora sou eu a pensar, e realmente é, o pobre metro de Lisboa só consegue cobrir 23% dos custos de produção se contarmos com os encargos financeiros devidos aos investimentos, e 36% se deixássemos os encargos financeiros para o orçamento de estado ; as tais indemnizações compensatórias recebidas cobriram mais 10% e 17% com e sem encargos financeiros – como estamos abaixo da linha de flutuação).

E é por estas e por outras que o governante conferencista vocifera: para cobrir a diferença entre as despesas e as receitas, as empresas têm de recorrer à banca porque as indemnizações não chegam. Temos de reinventar a interligação das externalidades, porque estamos a financiar o dono do automóvel com os custos de saúde para as vítimas das externalidades, com os custos dos acidentes, com os custos das coberturas hospitalares e com os custos da manutenção de estradas, ruas e viadutos(e também com os custos da construção, se quisermos considerar os encargos dos investimentos).
E é por isso que o Estado terá de ir buscar ao imposto sobre os produtos petrolíferos ISP fundos não só para as estradas mas também para o complemento do TC. (Preocupa-me um pouco considerar o ISP como uma galinha de ovos de ouro, como diz o Automóvel Clube de Portugal, mas vamos aguardar as propostas do governo, porque na verdade, como manda a lei da oferta e procura, a quantidade de lugares.km do TI tem mesmo de baixar, é inevitável).

O conferencista regressa em tom mais conciliador à pedagogia do transporte: a integração faz-se através da definição e da coordenação das redes, não pela concorrência sobre os mesmos eixos ou entre percursos da matriz emprego-habitação (mas permanece a dúvida: como fazer isso sem estar definido o plano estratégico?); não esquecer também que os níveis da capacidade de transporte são específicos para cada modo de transporte; porém se o tráfego nos troços periféricos é menor, também é verdade que o traçado de uma rede de transportes pesados é estruturante do ponto de vista da urbanização. E enquanto a urbanização (habitação-serviços-comércio-oficinas) não chega, veja-se o bom exemplo da FERTAGUS : carreiras de autocarros e park and ride sobre a linha férrea (o contrato com o Estado também dá uma ajuda, penso eu).
E também se deve atrair os passageiros não cativos, com uma informação pela Internet mais evidente do que a atual e com um tarifário menos complexo do que o atual, informando “como ir” e “quanto custa”. E eu penso, OK, integremos, pois, que um título seja válido em qualquer modo e que o tarifário seja simples. Que a CP nos dê o braço a todos com a carga do Zapping e mais park and ride.
E eis o óbice, a repartição de receitas.

Decisores houve (agora sou eu a pensar) que ao longo dos anos acreditaram que os cartões com chip, sem contacto, eram a resposta a tudo o que desejavam; que podiam saber em que estação de metro o passageiro entrou e onde saiu, qual a carga dos troços por onde andou, qual a quota da receita a que cada modo de transporte tinha direito.
Ingenuidade. O sistema de controle de acessos não está operacional 100% do tempo em 100% dos locais, não evita a fraude, precisa, por razões de segurança, da presença de pessoal. Não valeu a pena obrigar os passageiros ao segundo esforço à saída para se saber a carga dos troços. E continuam a calcular-se os passageiros sem a validação de um inquérito profundo, á antiga, que permitisse uma repartição de receitas mais justa. Porém, se se pretende justiça, porque não levar a integração ao seu clímax, à fusão num operador único a exemplo de Paris, Bruxelas, Milão, Barcelona e agora em parte, Londres , depois da falência de uma das infracos? Porque os burocratas de Bruxelas incensam o dogma de Adam Smith? Da concorrência? Como se não fosse possível um grupo de técnicos honestos garantir a exploração e manutenção de uma rede transportes integrada…. Têm os técnicos de explicar isto aos decisores… (fecho da minha meditação).

O conferencista fecha a sua intervenção serenamente, invocando mais uma vez o ideal do bilhete familiar, mais barato aos sábados e domingos, e as vantagens do park and ride (ocorre-me que o prolongamento da linha vermelha do metro para Campolide, só Campolide, será mais um investimento de baixo rendimento por não ter uma dimensão suficiente; ai a lei dos rendimentos decrescentes tão dependente da dimensão do volume da produção; mas que um park and ride logo a seguir, a Poente das Amoreiras, na zona em que a CML está a pensar uma nova urbanização, viria a calhar para bem de todos, viria; até se podia pôr portagem na Duarte Pacheco, para quem não quisesse deixar o carro no novo parque de estacionamento das Amoreiras).

Terminou a intervenção. Deixou-me um certo sentido de incompletude porque esperava ouvir o governante sobre a importância estratégica da reabilitação dos edifícios, do repovoamento e da reurbanização da cidade de Lisboa (com habitação, serviços, comércio e oficinas em cada bairro) e da redefinição dos limites e agregação dos municípios da área metropolitana; e esperava também saber novas atualizadas e com um planeamento bem definido sobre a atualização do plano estratégico dos transportes, anunciada na ordem dos economistas em Fevereiro de 2010 pelo senhor ministro dos transportes como a muito curto prazo, e confirmado o anuncio em resposta a um grupo de deputados da Assembleia da Republica no mês seguinte.
Mas não.
Porém, maior frustração foi quando a simpática coordenadora do evento, depois da última intervenção, anunciou que estava encerrada a sessão, justamente quando eu estava à espera que a assembleia fosse dividida em grupos e que cada grupo apresentasse as suas conclusões sobre todas as questões estratégicas tratadas e que um painel de coordenação as sintetizasse em seguida.
Mas não.
Tal não aconteceu, mas isso não tirou o brilho ao resto da semana da mobilidade.

Very fast post in blog 27 - a Barnes and Noble

A Barnes and Noble, a grande cadeia de livrarias que secou as pequenas livrarias de New York como um grande eucaliptal (ver o filme com Tom Hanks e Meg Ryan) , uma espécie de FNAC, está a fechar grandes lojas e a abrir pequenas livrarias.
Será o efeito do teorema de Fermat-Weber, da experiencia da Wal-Mart, ou simplesmente para concorrer melhor com a venda de livros pela Internet.
Parafraseando Pascal, expulsem os teoremas, que eles voltarão a galope.

A conjetura do cantoneiro II

Colisão de comboios na Belgica em Arlon em 15SET201 - 30 feridos;
Colisão de comboios em 15FEV2010 na Belgica em Hal/Bruxelas – 18 mortos;
Explosão de gás (?) em Shaerbeek na Belgica em 25SET2010 - 2 mortos;
Explosão de gás em Liège em JAN2010 - 14 mortos;
Explosão de gás em San Bruno/San Francisco em 9SET2010 - 4 mortos;
Despiste de autocarro de passageiros em Marrocos e queda em vala – 9 mortos;
Despiste de autocarro perto de Berlim e colisão com pilar de viaduto – 13 mortos


A lista poderá parecer sado-masoquista, mas é apenas um elemento de análise de riscos.
Não há nenhuma razão para considerar que os sistemas de transportes e de distribuição de gás referidos atingiram o nível de intolerável.
Mas teme-se que esteja a ocorrer uma degradação a nível geral, possivelmente porque os conceitos de manutenção vão sofrendo alterações. Por isso, a consideração dos acidentes não é uma atividade sado-masoquista.
Pretende-se melhorar os níveis de segurança, e para isso é necessário investigar rigorosamente as causas e circunstancias de cada acidente, divulgá-las e propor e implementar recomendações.

Infelizmente nota-se demasiada discrição da parte das entidades investigadoras de acidentes, possivelmente porque as companhias de seguros induzem comportamentos nos julgamentos. Por exemplo, no caso do acidente do Concorde, não foi dado o devido relevo à ausência do espaçador no trem de aterragem. No caso do acidente da Spanair em Madrid não foi dado o devido relevo às péssimas condições da manutenção e dos reversers, dos flaps e dos slats. No caso do acidente do metro de Washington não foi dado o devido relevo à obsolescencia dos circuitos de via, incompatíveis com os sistemas de tração eletrónica.

Também não são dadas suficientes informações, porque ainda prevalece o secretismo, mas podemos sempre pôr hipóteses com base em experiencia anterior, e formular conjeturas, como já fiz a propósito das situações de catástrofes naturais.
(Ver em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/09/atrani.html  )

Retomo assim a conjetura do cantoneiro : se a vegetação à beira da estrada cresceu ao ponto de tapar o sinal de transito, isso é um indicador de que os recursos alocados à manutenção do sistema rodoviário foram reduzidos, normalmente por razões de economia de curto prazo, que o grau de cumprimento das ações de manutenção do sistema baixou e que a probabilidade de ocorrência de um acidente por esse motivo subiu.

No caso das explosões de gás (o facto de se manter a dúvida sobre a verdadeira causa do acidente em Schaerbeek apenas confirma que o secretismo continua a dominar, possivelmente porque alguém da polícia o decidiu) há claramente uma deficiência de manutenção já assumida pela distribuidora.

Eu recordo-me de ver nas ruas 2 funcionários da companhia do gás com duas varinhas e um detetor de fugas. Mas isso foi há muito tempo. Nos tempos que correm há muitas empresas certificadas a vistoriar instalações (diz a lei que a iniciativa deve partir dos proprietários… seria eficaz tal lei, se vivêssemos num mundo ideal), mas deixei de ver funcionários nas ruas a detetar fugas. Assim se compreende que seja interdita a instalação de redes de gás na Baixa de Lisboa.

Conclusão: a situação não é tranquilizante, em grande parte por se terem reduzido os custos da manutenção.

No caso dos acidentes ferroviários, teme-se que tenha sido atribuida uma menorização, por razões económicas , às funções de manutenção no domínio da sinalização ferroviária de segurança (o caso do acidente de 15 de Fevereiro foi gritante em termos de uma instalação não equipada com “train stop” por ultrapassgem de sinal vermelho), quando avaliadas comparativamente com os critérios de imagem e de satisfação dos requisitos de disponibilização das redes a distintos operadores.

Basta pensar um bocadinho: quando existe apenas uma entidade responsável pela manutenção e segurança de circulação de comboios e uma entidade de operação, já há conflitos e dúvidas sobre causas e circunstancias de ocorrências; se as entidades de manutenção variarem e se houver mais que uma entidade a operar as linhas, a entropia do sistema sobe e a probabilidade de incidentes também; porém, os burocratas europeus devem ter pouca experiencia de exploração ferroviária, e acharão que dogmas são mais importantes do que critérios de segurança. Evidentemente que compete aos engenheiros de segurança ferroviária implementar as condições de segurança em função do contexto. O mais que pode acontecer é um deles reagir como reagiu perante o acidente em Hal/Bruxelas,  lamentando que não tivesse havido dinheiro para acelerar o programa de instalação de sistemas ATP (Automatic Train Protection) .

Quanto aos acidentes de autocarro, dir-se-á que faltam cantoneiros para fazer o levantmetno de situações perigosas e para proteger os pilares de viadutos e as valas à beira de estradas contra despistes.

Falta também reforçar os pilares dos próprios autocarros para resistência a capotamento (inconveniente: aumenta o peso e os consumos) e convencer os fabricantes e os passageiros a instalar e utilizar religiosamente os cintos de segurança. Mas isso talvez não seja com os cantoneiros, talvez começar pelo IMTT e os requisitos de homologação.

Enfim, esperemos que os economistas, apesar da crise e do dogma da redução dos encargos com o pessoal, passem a ter mais respeito pelos cantoneiros, e autorizem o pagamento dos seus vencimentos, embora os economistas não devam querer viajar de autocarro, nem de comboio, nem de viver em subúrbios com redes de gás antiquadas.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Viva a Republica, e a arquelogia do betão armado




Em Setubal, ao fundo da Av.Antero de Quental, junto do entroncamento com a Estrada dos Ciprestes , quem vem da A12 ou do Jumbo, vê desde há uns anos a persistente degradação de um mirante de betão armado trabalhado.

Neste momento, tem junto do muro que o separa da rua um cartaz comemorativo da fundação da Republica, o sistema da coisa pública.

Está já adornado, a borla já pendente no topo e suspensa do ferro dobrado e nu, as colunas dissovendo-se no ar marítimo.

Terá servido de posto de contemplação do senhor da quinta, protegido do sol, enquanto observava as camponesas dobradas sobre as ervas.

E o senhor da quinta estava atento à evolução das tecnologias, passava-se isso no princípio do século XX.

Teria já introduzido tratores, apesar de gostar de ver as camponesas na sua faina, e sentiu-se seduzido pelas possibilidades arquitetónicas da nova tecnologia do betão armado, em contraponto com a arquitetura do ferro, então muito apreciada graças às obras em Portugal de Eiffel e Mesnier du Ponsard.

O mirante é muito bonito, com varandas rendilhadas e escadas, consolas e telhados moldados.

Mas está a cair. A inclinação das fundações teria de ser compensada com injeções sob pressão nos terrenos, os ferros expostos tratados e recobertos, a borla endireitada.

Não caberá no pobre orçamento da cultura a classificação pelo IGESPAR, e a sua recuperação, como obra de arte feita de cimento e ferro, como exemplo de arquelogia industrial do betão armado (seria um concorrente sério ao prémio SECIL, mas provavelmente seria só isso, um tempo condicional).

É pena.

Parafraseando o antigo ministro da Cultura, poderá deixar-se cair o mirante de Setubal, mas não deveria.

O metrobus, ou metro ligeiro sobre pneus, ou o megatroleibus da Reboleira

A Câmara da Amadora e o centro comercial Dolce Vita do Casal da Perdigueira apresentaram em 22 de Setembro de 2010 o MetroBus, para estar a funcionar em 2012.
Na humilde opinião deste blogue, o facto de um transporte estimado para mais de 2.500 passageiros por hora e sentido assentar em rodas de borracha e não de ferro contra carril será responsável por um adicional de consumo de energia e consequentes emossões de CO2 não desprezáveis.

Veio-me à memória uma apresentação pela então Secretária de Estado dos Transportes, em 3 de Janeiro de 2008, na estação da Amadora Este.
Achei tão mal (eu não tenho de achar enquanto técnico porque existe um deserto institucional no capítulo dos debates alargados sobre assuntos de transportes, mas enquanto cidadão tenho o direito que me dá o art.48º da Constituição, de exprimir o que sinto sobre uma questão, para mais fundamentando-a como se verá a seguir) que resolvi enviar um textosinho com uns cálculos aproximados sobre o adicional do consumo de energia pelo metro ligeiro de pneus relativamente ao metro ligeiro sobre carris. Deu-me à volta de 7,2 milhões de kWh/ano (ca de 3.000 toneladas de CO2 por ano, o equivalente a uma capacidade anual de sequestro do carbono por 300.000 árvores), só o adicional.
Ce n'est rien, como diriam os franceses, o que me leva a acreditar que o empreendimento vai mesmo para a frente, que foram persuasivos, os eventuais fornecedores (notar, porém, que prever linhas de transporte de massas para grandes centros comerciais minimiza o dispêndio de energia adicional associado a esses centros comerciais, conforme mostra o teorema de Fermat-Weber).

Eis então o artigo escrito em Janeiro de 2008, que com muita pena minha mantem a sua atualidade:




"De como se chama inovação ao metro ligeiro com pneus, num belo dia, na Falagueira


E de repente, quase de surpresa, somos convocados para uma cerimónia com cobertura mediática na estação de Amadora Este (na Falagueira).

Discurso do presidente em exercício do executivo da Câmara Municipal da Amadora e discurso da nossa engenheira Vitorino.

Nossa... significa que foi colaboradora da FERCONSULT e que assistiu, com a impotência com que nós assistimos, ao torcer do traçado da linha, logo a seguir à estação de Amadora Este, no sentido dos terrenos da antiga SOREFAME (a ideia original era levar a linha à estação central dos caminhos de ferro da Amadora, mas deu-se o desvio...), e depois, como se o fôlego ou o depósito de combustível numa corrida se esgotasse a um passo da meta, ao quedar-se o traçado à distancia de um grito da estação da Reboleira da linha do caminho de ferro.

Com elegância e com graciosidade, explica a engenheira Vitorino que agora vamos corrigir essa falta e vamos prolongar a linha até à estação da Reboleira (bom, vamos um bocadinho mais além, para construir um término operacional, para não se repetir o erro da falta de término em Santa Apolónia, e digo “se”, porque tinha de faltar à verdade se escrevesse “mos”, que eu sempre informei quem de direito que não se fazem estações de metro terminais sem términos ou cais centrais).

Fica o nosso coração cheio de jubilo porque corrigir um trabalho é bom, e do nosso trabalho resultará mais um ponto de correspondência com a linha suburbana Sintra-Lisboa.

Quem morar na linha de Sintra e trabalhar na zona de influência da nossa linha Azul, terá a vida ligeiramente facilitada e o IC19 menos trânsito.

Anuncia-nos depois o presidente da autarquia que o metro ligeiro da Amadora vai avançar.

O metro ligeiro com pneus.

Que será uma inovação tecnológica (inovação tecnológica, o trólei-carro, ou trolley-bus, de que eu me lembro, ainda menino, em Braga, no Porto, em Coimbra, onde lhe chamavam o pantufas?).

Interligará a linha suburbana e a linha do Metro, e servirá os bairros da Amadora até ao novo centro comercial, na extremidade nordeste do concelho, fronteira ao concelho de Odivelas.

E que, numa segunda fase, o metro ligeiro será prolongado até à estação de Senhor Roubado, já no concelho de Odivelas.

Não se enche agora o nosso coração de júbilo, mas de preocupação.

Porque os planos do metro ligeiro estão em elegantes expositores, os desenhos com legendas de conceituados gabinetes de arquitectura, de engenharia e de consultoria de transportes e urbanismo, mas os nossos ouvidos não estão habituados ao som “metro ligeiro com pneus”.

Porque os nossos olhos e ouvidos recordam-se da longínqua aula de Físico-Químicas no liceu (era, na altura chamávamos-lhe assim, à disciplina e à escola) e da figurinha no livro em que um grupo de homens era necessário para pôr em movimento uma vagoneta. Para manter a vagoneta em movimento, bastava um homem. E a figura a seguir era um automóvel com o mesmo peso. O grupo para o pôr em movimento já era maior, e para manter o movimento já não bastava uma pessoa. O professor Queirós Lopes (se cito o nome, é porque, ao contrário de uma afirmação da nossa ministra da Educação, reconhecendo que tinha perdido os professores para ganhar a população, eu, pessoalmente, não perdi a memória dos meus, nem da sua preparação científica, passe a pose altiva deste professor, nada simpática para os alunos) explicava a quem o queria ouvir (realmente, a quem o não queria ouvir, não explicava) que era por causa do atrito.

Que as rodas de ferro, em contacto com o ferro dos carris, não requeriam tanta energia para iniciar o movimento, nem para o manter, do que as rodas de borracha em contacto com o asfalto.

E que também, por causa disso, um automóvel pode travar num espaço muito menor do que um eléctrico.

E não nos deixava sair da aula sem nos impingir que já os romanos punham caminhos de tábuas sob as rodas das carroças em que extraíam os minérios (imaginem que até nos recomendou, para vermos uma recriação da exploração das minas romanas através da força física dos escravos, o filme Spartacus, com Kirk Douglas, estreado nesse ano) e que foi um salto tecnológico e um grande aumento de rendimento ou eficiência quando as minas inglesas, na explosão da revolução industrial do séc.XVIII, substituíram as pranchas de madeira por carris de ferro e as rodas de madeira por rodas de ferro (claro que nos contou a velha história: a bitola de 1435 mm dos carris manteve-se, porque era a distância média entre os eixos dos dorsos da parelha de cavalos que puxava as carroças).

Que era tudo uma questão de poupar energia, quer a energia viesse dos escravos, dos cavalos ou do vapor.

Ora, tendo a borracha com asfalto um coeficiente de atrito semelhante ao da madeira com madeira, que pensar de irmos para um metro ligeiro com pneus?

Só esquecendo estes factos, ou contentando-nos com uma abordagem de economista, para quem o valor duma mercadoria é quanto custa em euros (sabem aquela definição cínica de economista que um economista me ensinou, a mim e a todos os leitores dele: economista é quem sabe quanto custa uma coisa mas não sabe o valor dessa coisa) é que poderemos falar de inovação ao apresentar-se o conceito de metro com pneus.

Estão a ver o economista a falar das empresas de transporte ferroviário como empresas de capital humano intensivo e, portanto, a abater ?

E a fazer as contas ao custo do gasóleo, mais barato (por força de externalidades ao mercado) do que os kWh necessários para o mesmo trabalho produzido?

E, já agora, não esquecer que a catenária do trólei-carro sempre é um bocadinho mais cara do que a do eléctrico (embora os carris deste sejam mais caros, claro).

Fica-me assim a ideia, mau grado os economistas, que a inovação tecnológica de que fala o município da Amadora é voltar atrás na evolução tecnológica, cujo sentido é, como se de evolução natural se tratasse, o da poupança de energia.

Não vamos imaginar que os consultores cujos logótipos brilhavam nos expositores tivessem faltado às aulas do professor Queirós Lopes, porque certamente não ignoram que se poupa energia quando se utiliza o metro ligeiro com rodas de ferro.

Então, é porque fizeram as contas e, para o valor de tráfego de passageiros por secção e sentido da linha prevista (2.500 pass/hora), a poupança de energia não ia compensar os investimentos nos carris.

E quem sou eu para contestar essas contas, até porque o valor de 2.500 pass/h depende também da política urbanística e de criação de empregos nos bairros servidos?

Ou terá sido pela questão dos declives?

Que o metro ligeiro ferroviário não pode vencer mais de 7% de declive.

Pois, realmente 7% já é muito (embora o celebrado túnel do Marquês tenha lá uns bocados com 10%, o que é sempre viável mas bem podiam ser maiores as reservas dos gabinetes de engenharia quando elaboram os respectivos projectos…).

E devo pedir dispensa de compulsar os declives das ruas da Amadora que estão destinadas ao metro com pneus.

Mas metro ligeiro ferroviário, de superfície, com cruzamentos com vias rodoviárias, com a abundância que por cá se deseja (lembram-se do projecto abortado do metro ligeiro de superfície, com uma grande circular de Lisboa, de Algés à Falagueira, a Loures e a Sacavem? Com 24 cruzamentos rodoviários…) , a limitar a frequência e a velocidade comercial, tinha no meu tempo o nome de “eléctricos”, e circulam ainda em Lisboa, na Av.24 de Julho.

Os outros eléctricos, os velhinhos, vão circulando por exemplo na Calçada de S.Francisco, com 11% de declive e, lá em cima, com um bocadinho pequenino e curvo a 14%.

Não chega? Então se o declive da Amadora é tão exigente, podíamos experimentar comboiozinhos de cremalheira (basta arranjar uma representação de um consultor suisso), com capacidade para 22%, chega? E tentar as curvas de nível em lugar das pendentes, também não dará?

Voltando à economia energética, não me peçam números exactos e desconfiem se alguém lhes vendeu números exactos. Mas vamos admitir que, por cada kWh consumido pela entidade exploradora do metro com pneus ele transportará 5 pass.km, enquanto o metro com carris transportará 7 pass.km para idênticas taxas de ocupação e contabilizando os custos energéticos de escritórios e oficinas afectos à entidade exploradora (mais fácil fazer as contas ao contrário? Tudo bem, desde que reparem que o indicador é o inverso da eficiência: o metro com pneus gastará 0,2 kWh por cada passageiro.km transportado; e o metro com carris gastará 0,14 kWh)

Porém, a preocupação que referi atrás avolumou-se quando na apresentação foi dito: E depois, numa segunda fase, prolongaremos o metro com pneus até à estação Senhor Roubado do Metro e até Loures.

Horror, penso eu, são quilómetros a mais, para um diferencial energético de 0,06 kWh por cada pass.km.

Se a 1ªfase do metro com pneus for um sucesso, lá teremos, na 2ªfase, mais 4 km do Centro Comercial promotor até à estação do Senhor Roubado.

Se o gasóleo continuar a subir atrás do preço do petróleo (é, mercadorias de procura elevadíssima, de escassez a aumentar até à extinção, só podem subir, subir…) e o metro com pneus transportar 5.000 pass/h na hora de ponta e 50.000 passageiros em cada sentido por dia, vamos ter 400.000 pass.km por dia, só para a 2ªfase.

O que dará um diferencial metro com pneus-metro ferroviário de 0,06 x 400.000 = 24.000 kWh por dia.

Como o kWh também vai subindo, isso ao fim do ano dará à volta de 0,10 €/kWh x 24.000 kWh x 300 dias = 720.000 euros por ano.

Talvez se conseguisse arranjar um economista que aceitasse que este diferencial compensasse o investimento adicional para o metro ferroviário.

Ou que, pelo menos, fosse sensível à economia dos 7.200.000 kWh (quase 7% do que o Metro de Lisboa consome por ano nos tempos que correm), isto é, menos importação de combustíveis fósseis, menos toneladas de CO2 lá para cima…

Mas o que vale é que não há números exactos e o diferencial talvez não seja tão gritante, embora não possa subscrever a ideia do metro com pneus.

Estimativa, para efeitos de estudo de viabilidade, para a instalação de 7km do “mega-troleibus”: 12 a 18M€ (catenaria+mat.circulante+semaforização rodoviária)."

A senhora muito inspirada

Ainda a propósito da nova temporada do S.Carlos, vão-se sabendo alguns pormenores das pequenas histórias do nosso meio cultural.

É curioso como a senhora ministra da cultura tem muito boa cotação no meio musical. Tem algum mérito nisso porque é uma excelente pianista. E se eu tomo a liberdade de discordar dos seus métodos, é porque contrariam os princípios do trabalho em grupo definidos no “Sabedoria ds multidões”, e porque utilizou abusivamente a minha condição de assinante do S.Carlos para justificar a demissão do anterior diretor. Deveria ter usado argumentos dela, não que o público do S.Carlos não gostava das produções do anterior diretor.

Mas a verdade é que a maioria dos comentadores e das pesoas ligadas à cultura têm vindo a dizer mal do anterior diretor e a manifestar muita compreensão pela nova temporada. Vão até ao ponto de dizer que as 3 produções que estavam programadas pelo anterior diretor não estavam bem preparadas (?!?!?) e não tinha programado convenientemente as duas temporadas contratuais que ainda lhe faltavam (?!?!?).

Isto é, temos muita gente do meio cultural unida em torno da sua ministra, apesar as suas decisões polémicas e muito pessoais.

Que o mesmo é dizer, com as pessoas a depender do seu apoio à política oficial do ministério, é muito difícil que o setor cultural em Portugal se desenvolva, pelo menos até o valor-objetivo de 1% do orçamento de estado.

E também não augura nada de bom o comentário em entrevista de Martin Andre, novo diretor artístico do S.Carlos (preterido há 18 anos na direção da orquestra do S.Carlos em favor do maestro Alvaro Cassuto, que, contrariamente a Martin Andre, defende a especialização da orquestra em ópera) : “A ministra deve ser uma senhora muito inspirada” .

Também não é prometedor o novo diretor vangloriar-se na entrevista dos seus métodos: “mandei instalar um relógio e uma câmara de TV no palco dos ensaios e um monitor no meu gabinete para controlar as chegadas em atraso aos ensaios”

Por outras palavras, o meio artístico da musica dita erudita também não difere muito dos outros meios em termos de verniz, nem em visões messiânicas e moralisadoras dos salvadores e das salvadoras de pátrias (que é o nome que costumamos atribuir nas nossas empresas aos detentores de soluções que não gostam de ouvir os outros).

É pena.

Tendo já tantos músicos jovens de qualidade em Portugal, é pena ver estas nuvens no horizonte. Mas pode ser que eu esteja enganado , que a senhora ministra tenha razão.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Análise e prevenção de riscos de catástrofes

Tive mais uma surpresa agradável quando li no DN a notícia de que um eurodeputado português tinha coordenado um relatório – resolução do parlamento europeu propondo financiamentos de medidas de prevenção de catástrofes naturais, corretoras de situações indutoras de risco, nomeadamente:

- ordenamento florestal
- prevenção de fogos
- proteção da orla costeira
- recuperação de bacias hidrográficas
- proteção de zonas urbanas inundáveis
- monitorização de grandes infra-estruturas
- manutenção da atividade agrícola em zonas afetadas pela desertificação

A própria resolução reconhece que a política agrícola comum contribuiu para a quebra da produção agrícola e para o abandono rural e desertificação.
A solução  que se impõe agora é  a prevenção.

Para mim foi surpresa agradável ver que o parlamento europeu se preocupa com a analise de riscos e  a sua mitigação.
Eu que sou olhado com um ar de tolerância impaciente quando falo na conveniência de proteger os acessos do metropolitano e as grelhas de ventilação do túnel à beira do Tejo contra as entradas de água. Ou quando apelo à divulgação pela proteção civil das análises de riscos de inundações e de maremotos em Lisboa (o fecho da Golada, para além de uma medida de desenvolvimento dos portos de mar, é uma das medidas mitigadoras do risco de maremotos em Lisboa).
Faço votos para que as propostas apresentadas no parlamento europeu tenham seguimento.
Afinal há aspetos positivos na adesão à união europeia e possibilidade de intervenção na resolução de problemas dos outros e nossos.
E este mecanismo é muito interessante e  util para o nosso país: não tendo sido possível definir a estratégia de ataque aos incêndios em Portugal, o cidadão eurodeputado português bateu-se para tratar no parlamento europeu todos os casos de prevenção de catástrofes de modo a poderem ser aplicados em qualquer país.
Aplausos.
Entretanto, convido-os a ver as notícias sobre o assunto:







quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Noticiário do dia 22 de setembro de 2010

Do noticiário da RTP2 da noite do dia 22 de Setembro de 2010 cito de cor:

1 - Ministra do trabalho e da solidariedade social da república portuguesa: o nível do desemprego não vai baixar tão cedo
2 - Cidadão romeno, cigano, na sua terra na Roménia, depois de expulso de França: se aderimos à união europeia queremos que os nossos filhos tenham uma vida decente

O comentário seguinte é de um espetador do noticiário:
- 1 e 2 mostram claramente que a união europeia, apesar das suas manifestações de pureza de princípios, não tem como prioridade o cumprimento da Declaração Universal dos Direitos do Homem. Se é impossível ,ou insustentável como agora se diz, atribuir essa prioridade, pareceria importante explicar porquê. Igualmente seria interessante demonstrar a aplicabilidade ou não da lei de Philips (o custo de vida baixa com o crescimento do desemprego; para controlar o custo de vida, favorecer o aumento do desemprego) à situação atual, e quais as responsabilidades na política da globalização na atual situação de desemprego crescente. Para os cidadãos, de posse de mais informação, fazerem as suas opções de voto, desejavelmente extensível, o voto, à escolha dos governadores do banco central europeu.
Por outras palavras: a preocupação dos políticos e dos economistas  devia ser arranjar empregos concretos para os cidadãos e cidadãs como o cidadão romeno do noticiário, em vez de estar à espera que as empresas privadas criem empregos. Como dizia o major Melo Antunes, há espaço para o setor público e para o setor privado, mas se um não cria emprego, tem de ser o outro a criar. Mesmo que o custo de vida suba um bocadinho (não é o que querem os senhores economistas, reduzir salários?). Dinheiro para investir vai havendo, pelo menos nos "off-shores" há.

Worldwide quality living survey

Leio já não sei onde que na Câmara Municipal de Lisboa ficaram radiantes com a classificação de Lisboa no índice do Worldwide quality living survey, 45º em 216.

Entram na avaliação fatores como estabilidade política, criminalidade, cumprimento da lei, acesso a serviços, etc (ver em:

http://www.mercer.com/press-releases/quality-of-living-report-2010#Ranking_Eco_Cities   ).

A empresa que vende estes serviços , como “ observador” ou "observatório", produz avaliações discutíveis e subjetivas, mas acaba por tratar dados que permitem algumas conclusões, donde deveriam sair recomendações.

Acontece que a empresa não faz só a observação e a avaliação da qualidade de vida, mas também faz a classificação das cidades pela qualidade ecológica (eco-city ranking).

Fatores avaliados na qualidade ecológica: disponibilidade de água, reciclagem de lixos, tratamento de esgotos,poluição, congestão de tráfego.

E, infelizmente, neste capítulo, Lisboa não aparece na lista das primeiras 50 cidades, como se pode ver pela lista de fatores.

É pena.

Podiamos ver o assunto em debate alargado, não obstante todas as consultas que a CML vai fazendo.

É verdade que não há muito dinheiro para resolver isto, mas estudar a solução para quando vier a retoma podia fazer-se, embora não pareça ser a opção a seguir.

É pena.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

A Wal-Mart e os seus projetos inovadores

É muito perigoso o tempo vir dar razão aos simples, aos ignorantes e insignificantes que durante anos não quiseram acreditar no que diziam e faziam os senhores economistas-políticos e empresários de muito sucesso.

Perigoso porque ficam tentados a acharem que têm razão.

Quando ninguém tem de ter razão, o que é preciso é que cada problema seja abordado com a metodologia que o permita resolver e que essa metodologia seja participada.

Coisa com que os senhores economistas-políticos e empresários de sucesso não concordam.

Ou pelo menos não concordavam até aqui.

Até parece que os gestores estratégicos da Wal-Mart leram este humilde blogue sobre o teorema de Fermat-Weber e sobre a otimização energética da localização dos supermercados, ou andaram a ler os tratados matemáticos sobre  facilities location.

Ver em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/08/o-problema-de-fermat-weber-da.html

e em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/01/economicomio-xxxvi-economia-dos.html

O facto é, independentemente da minha imodéstia incontida ou talvez não,  que a Wal-Mart, o gigante do concentracionismo dos pontos de venda, a grande Sonae dos USA, está a estudar uma estratégia inovadora (inovadora só para eles, claro), projetando “deslocar-se para pequenas lojas de conveniência perto de si”.

Sinceramente espero que esta estratégia, decorrente da insustentabilidade de concentrar as vendas ao publico em grandes superfícies e obrigando as pessoas a fazerem múltiplos percursos de automóvel, em lugar de disseminar pelas povoações pequenas lojas abastecidas por meios de transporte mais eficientes (ai, esta dos meios de transporte está-me a fazer lembrar o fecho das escolas e dos centros de saúde...), venha a ser entendida pela SONAE e pela Jerónimo Martins. Espero que a experiencia do fecho do centro comercial da SONAE em Madrid seja proveitosa e que não invistam com este modelo de grandes concentrações no Brasil e em Angola.

Pode ser que o processo histórico (utilizo o termo, não no sentido marxista, para não chocar ouvidos mais sensíveis, mas apenas no sentido das relações económicas, da dimensão de mercado e da sustentabilidade energética) , nestes países, ou nas pensadas regiões destes países, esteja mais atrás, no tempo, dando ainda oportunidade para que floresça antes de deverem infletir para pequenas lojas, como a Wal-Mart.

Pode ser, embora a nova estratégia não tenha como motivação a melhoria do bem-estar e da realização profissional participativa do seu pessoal, nem a vontade de resolver problemas sociais (aqui em Portugal dizia-se que por cada novo posto de trabalho numa grande superfície comercial se perdiam 2,5 postos no comércio tradicional, gritando logo de seguida os economistas fazedores de opinião que isso era porque as pequenas lojas não eram competitivas; parece agora que não , que não era por isso) nem o desejo de poupar combustível aos seus clientes, mas apenas o de contrariar a tendência negativa das suas vendas (se não chocássemos os tais ouvidos sensíveis poderíamos dizer que a exploração dos clientes tem limite , que será o ponto em que a redução do seu poder de compra implica a diminuição do consumo e logo, do lucro da empresa; um pouco como a lógica das cochonilas e dos limoeiros parasitados: a taxa de consumo parasitário não pode ultrapassar a capacidade de regeneração do limoeiro).

Mais informação em :
http://articles.moneycentral.msn.com/Investing/top-stocks/default.aspx?feat=1806160>1=33002

e em:
http://www.fastcompany.com/magazine/77/walmart.html

As transações financeiras



Fiquei estupefacto.
Será que o senhor presidente Sarkozy leu este humilde blogue e resolveu apresentar na ONU a solução inovadora e imediata de taxar as transações financeiras?

Ou alguém lhe terá reportado a manifestação do dia 25 de Abril de 2010 na avenida da Liberdade (da Liberdade, não da Liberté) em que um grupo de manifestantes pedia isso mesmo.
Ver em:
Vale dizer que de 25 de Abril até hoje já tinha tido tempo para inovar, mas vale mais tarde do que nunca, e fica muito bem aos sábios e aos grandes decisores aprenderem com os ignorantes e os insignificantes.

A humildade move montanhas, contrariamente aos escandalizados economistas que nos governaram durante anos e agora só falam em congelar e reduzir salários (à boa maneira à portuguesa-classe dirigente)

Quem diria que as vozes de um blogue tão discreto chegavam ao Eliseu e á ONU.

Veja-se, com a devida vénia, um extrato da notícia do “le Point”:

«Le président français a appelé à adopter sans délai une taxe universelle sur les transactions financières pour financer les "objectifs du millénaire", fixés en 2000 à une échéance de quinze ans, dont le but est notamment de réduire la pauvreté dans le monde…
“Les financements innovants, la taxation des transactions financières, nous pouvons le décider ici. Pourquoi attendre ? La finance s'est mondialisée, au nom de quoi nous ne demanderions pas à la finance de participer à la stabilisation du monde en prélevant sur chaque échange financier une taxe ?" a lancé Nicolas Sarkozy au premier jour du sommet”.»

Notícia completa em:

http://www.lepoint.fr/economie/onu-nicolas-sarkozy-veut-taxer-les-transactions-financieres-20-09-2010-1238850_28.php

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Help Bing Give to Schools

É extremamente curioso. No país mais rico do mundo, um gigante da informática, a Microsoft através do seu motor de busca Bing, apela a contribuições de 3 dolares para apoiar as pequenas escolas locais e a luta contra a iliteracia.

É isso, estamos a precisar de subscrições públicas.
Aprendamos com os paises ricos.

Mais informação em :

http://www.discoverbing.com/education/searchwithpurpose/?fbid=H3v17Kt3nvk&wom=false

O São Carlos em 2010-2011

A fotografia com a senhora ministra vinha no Oje de dia 16 de Setembro de 2010 e mostra-a, sorridente, ouvindo a soprano Ana Franco que cantava uma ária de Gianni Schicchi,  oh mio babino caro (oh meu papá querido).
O título anuncia 10 óperas para  a temporada 2010-2011.

Como se sabe, a senhora ministra demitiu o anterior diretor artístico do S.Carlos com o argumento de que a sua programação não era o que o publico do S.Carlos desejava.
Na altura, como espetador, protestei porque achei a sua programação com interesse e achei tambem que os diretores artisticos não se despedem como os treinadores de futebol, até porque neste caso o senhor parece ter levado uma indemnização superior a 150.000 euros e as programações de ópera têm de fazer-se com mais de 2 anos de antecedência.

Eis porque não pode agora aceitar-se o argumento de que a temporada foi o que se pôde arranjar com o tempo disponível e com os cortes típicos dum país em que o orçamento da cultura não é comparável com 1% do orçamento, apesar de já representar quase 3% do PIB.
Isto é, sendo a senhora ministra uma boa pianista, como se pode comprovar com os discos que ela já gravou, como teria sido bom ter-se limitado a ser pianista., para bem dos melómanos.

Sobre os cortes, também há a dizer que se estranha muito não haver apoiantes particulares e mais mecenas empresariais e  para complementar o esforço do ministério da Cultura. Assim como assim, esquecida a adesão popular nos espetáculos do Coliseu, ir à ópera poderia ser uma associação mutualista.
E além disso, depois daquele estudo que a senhora ministra encomendou ao senhor economista Mateus e que demonstrou que a cultura é um domínio gerador de mais valias (venda de espetáculos a televisões estrangeiras, receitas publicitárias em transmissões televisivas, promoção da venda de bilhetes junto de turistas) , custa a aceitar que a temporada seja pobre (sem menosprezo pelo trabalho dos participantes nos espetáculos; é que 10 óperas é pouco, nas condições em que vão ser apresentadas).

Quanto à temporada, são de facto 10 óperas, mas convirá esclarecer o seguinte, para que não se oiça só dizer mal do anterior diretor e do seu trabalho, como convem à propaganda da senhora ministra:
- duas das óperas são apresentadas em versão concerto (Dona Branca  de Alfredo Keil e Cavaleria Rusticanna de Mascagni, sendo que esta ultima vai ser apresentada isoladamente, apesar de ter pouco mais de uma hora de duração, pelo que seria expetável ser apresentada com outra no mesmo espetáculo)
- três das óperas já tinham sido contratadas pelo diretor anterior (Dona Branca, Katia Kabanova de Janachek e Banksters)
- Paint me é uma ópera de câmara de Luis Tinoco (sobre os contos de Canterbury) e é uma produção da Culturgest
- Blue Monday é uma ópera sinfónica de jazz de Gershwin que dura menos de 30 minutos (é apresentada no mesmo espetáculo com Gianni Schicchi de Puccini)
- Banksters  de Nuno Corte-Real (ou o banqueiro gangster, sobre Jacob e o Anjo de José Régio) tem uma duração de 1 hora, pelo que seria expetavel no mesmo espetáculo ser apresentada outra ópera
- a ópera para crianças Hansel e Gretel de Humperdinck será apresentada no teatro Camões, embora seja uma produção do Teatro de S.Carlos
- Restantes óperas:  O chapeu de palha de Florença de Nino Rota, e Carmen de Bizet
- Número de óperas que fazem parte da assinatura: 6
- aplaude-se a participação de cantores portugueses, mas faltam co-produções com outros teatros de ópera europeus (evidentemente que não havia tempo para as combinar)
- aplaude-se a contratação do maestro Martin Andre para diretor artístico, mas receia-se que a sua presença não seja a tempo inteiro, assim como se tivesse sido pedido emprestado
- lamenta-se que o diretor geral da Opart tenha declarado que há problemas graves, mas que só os discutirá na intimidade do seu gabinete e do gabinete da senhora ministra; é que viola o art.48º da Constituição (direito à informação de assunto de interesse público).

Mas que haverá de fazer-se? se estamos no país da maravilhosa imperfeição, como diz Eduardo Lourenço.
No entanto, considerando que   se estava à espera de pior, e a atenção dada nesta temporada aos cantores e musicos portugueses, é de aplaudir.
Mas não nos esqueçamos que, como dizia um senhor que não será um expoente da cultura mas que falou sabiamente, "assim não ganhamos o jogo". Isto é, quando tivermos o TGV, vai-se  à ópera em Madrid e volta-se logo a seguir, coisa que os nossos concidadãos de Barcelona não precisarão de fazer. Será a otimização dos custos através da centralização , do ponto de vista dos gestores de Lisboa, e a afirmação da soberania do ponto de vista dos gestores de Barcelona.

Mais informações em:
http://www.saocarlos.pt/gca/?id=958
e  em:
fanaticosdaopera.blogspot.com

sugerindo, para quem tem crianças, a Hansel e Gretel (sobre um conto de Grimm), cantada em português, no Teatro Camões, no Parque Expo. Pode ser que a maioria das crianças não goste, mas se uma só  delas gostar, terá valido a pena.

Mohammed Arkoun

Com a devida vénia ao DN, que noticiou o falecimento de Mohammed Arkoun, intelectual argelino.

Era um adversário do conceito do conflito de culturas. Ou melhor, do preconceito a que se adere quando nos ficamos pelo conhecimento primário, sem querer investigar as causas e as circunstancias.

Frases de Arkoun com que o DN marcou a notícia:

- “os intelectuais podem, dando destaque à história comum, à interação de culturas e tradições, contribuir para uma Pax Universalis, uma cultura de universalidade, em vez de conflitos artificiais de culturas”;

- “o pensamento islâmico tem de se emancipar das suas molduras dogmáticas, teológicas e legalistas”.



Para mim este é um tema muito caro, não por no meu ADN, tal como no ADN de quase todos os portugueses, haver mais de 10% de contribuição de populações do norte de África islamizadas, mas por ter tido a felicidade de ter aprendido isso em reuniões com colegas de Teerão e Istambul.

Nos países de cultura islâmica também há caminhos de ferro e metropolitanos, com os mesmos problemas de exploração, de manutenção, de segurança.

Recordo as palavras de um colega francês: “Nós técnicos, promovemos muito melhor do que os políticos a aproximação entre os povos”.

Davida e Daspu


Com a devida vénia ao DN, que trazia na revista de domingo uma reportagem sobre Gabriela Leite, prostituta reformada, socióloga, fundadora da organização Davida, para defesa dos direitos das trabalhadoras e trabalhadores do sexo, candidata a senadora por S.Paulo nas próximas eleições no Brasil, fundadora da fabricante e loja de moda Daspu.
Não tem por objetivo o proibicionismo nem a mudança de vida de quem não quer mudar de vida, mas sim a proteção dos direitos e a defesa contra o tráfego e a dependência de drogas.
Estamos assim longe da visão limitada das organizações que em Portugal se ocupam do tema.
Mais um domínio em que podíamos aprender com o Brasil.
Mais informações em :


domingo, 19 de setembro de 2010

Psicorium II - Um elétrico chamado desejo

Com a devida vénia ao DN, conto uma das histórias da recente estreia no teatro D.Maria II do elétrico chamado desejo de Tennessee Williams.
Compareceram vários ministros.
O que é estranho num país em que a cultura vale menos de 1% no orçamento.
Mas compareceram, e um deles era o senhor ministro da Defesa.
O DN enriqueceu a reportagem entrevistando no fim da peça alguns dos ministros.
E quando chegou a vez do senhor ministro da Defesa ele disse que a peça tinha sido muito boa.
Que alívio.
Pode Tennessee Williams estar descansado.
Havia dúvidas mas ficaram esclarecidas.
A peça é mesmo muito boa.
O senhor ministro achou qe sim.
Lembrando Brecht, pode o trigo continuar a crescer porque o ministro da Agricultura fez o despacho esperado que sim, que autorizava que continuasse a crescer.
Até porque o senhor ministro da Defesa é uma pessoa culta, como se pode ver quando fala no Parlamento.
E de versatilidade dificilmente ultrapassável porque já ocupou várias pastas em vários governos.
O elétrico chamado desejo é mesmo uma peça muito boa.
Falando a sério, a peça foi escrita aplicando a psicologia e a psiquiatria a estudar os comportamentos e os condicionamentos das pessoas.
Tem razão o senhor ministro, e se falo nisto é porque gostaria de ver também aplicadas nas nossas empresas e na nossa gestão da coisa pública os mesmo conhecimentos da psicologia e psiquiatria.
Para compreendermos como se tomam as decisões e elas são impostas às pessoas, na peça de todos os nossos desejos.
Frustrados, como diz a psicologia, com personagens que não desempenham os papeis da participação na coisa pública.

Nota - Evidentemente que o senhor ministro não quis dizer a redundancia de que Tennessee Williams tinha escrito uma peça muito boa. Quereria referir-se à realização ou produção da peça e que tinha sido conseguido um bom espetáculo. Terá sido uma expressão enquadrável no contexto. Mas não consegui evitar lembrar-me do ministro da Agricultura de Brecht, nem de que era mesmo importante passarmos a estudar as questões das empresas e da coisa pública com intervenção da psicologia e da psiquiatria.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O FMI acha

Com a devida vénia ao Oje de 14 de Setembro de 2010, transcrevo a declaração do senhor diretor do FMI: “o mercado laboral está numa situação catastrófica”.

Há anos que o paradigma da economia, política como se dizia quando eu era novo, é a definição do lucro como objetivo supremo das empresas através do exercício musculado da competitividade das organizações (diretiva da selva transposta para o ordenamento jurídico: empresa que não tem lucros não merece viver e deve fechar).

Os decisores economistas que há anos se submetem a estas leis cometeram um pequeno erro. É que tinham obrigação de saber que essas linhas de orientação conduziriam à tal situação catastrófica do mercado laboral. A lei de Philips já é antiga e eles sabiam que a única maneira de conter os preços seria aumentar o desemprego para diminuir a pressão da procura.

Mas não querem reconhecer que o tipo de organização económica e o tipo de leis que enquadram a atividade económica têm de mudar. O lucro e o crescimento não podem ser deixados à rédea solta. Se não há mercados ideais, como já se viu, os mercados reais não podem ser deixados a funcionar segundo leis ideais.

Porquê?

Porque segundo a OIT há 210 milhões de desempregados registados no planeta.

E segundo o senhor diretor isso aconteceu em muitos países porque “as exportações caíram ou foram arrastadas pelo colapso do setor da construção”.

E mais acrescenta, a propósito de uma taxa de desemprego juvenil em Espanha de 40% : “se não se adotarem as medidas adequadas para fazer frente a esta tragédia, o custo social e económico será tremendo, porque será uma geração perdida” .

E finalmente: “quando alguém perde o seu trabalho, o mais provável é que tenha problemas de saúde ou morra jovem”.

Mas então, não quiseram que acreditássemos que o crescimento da longevidade fundamentava o aumento da idade da reforma? E afinal as pessoas conhecidas do senhor diretor do FMI andam a morrer mais cedo?

E não diz quais são as medidas adequadas – no caso português serão as 25 medidas que eu me comprometi a divulgar mas que ainda não tive oportunidade de inserir no blogue?

Tudo isto é profundamente deprimente.

Todos erram nas suas funções, mas saber que o que os decisores dizem agora, já eles sabiam há muitos anos e não alteraram os comportamentos nem a estrutura da propriedade dos meios de produção, só pode contribuir para a descredibilização desses decisores. Faz lembrar a frase de Sarkozy: "Não era este o capitalismo que queriamos"

Atrani e a conjetura do cantoneiro

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Nunca tinha ouvido falar de Atrani, uma pequena povoação a menos de um quilómetro de Amalfi, a sul de Nápoles.

No dia 9 de Setembro de 2010 sofreu uma enxurrada que matou uma pessoa e arrastou os automóveis . Ver http://www.youtube.com/watch?v=Z7Kb7sq12mo

Tratou-se de um fenómeno do mesmo tipo do que se passou na Madeira. Excesso de pluviosidade e consequente encharcamento, “liquefação” e deslizamento dos solos, formação de barragens devido à acumulação de vegetação, pedras ou detritos nas partes altas das linhas de água, seguindo-se o efeito de rebentamento da barragem. Ocupação das linhas de água e seu soterramento com vias de comunicação e edifícios. Subdimensionamento dos canais de escoamento para os valores da pluviosidade.

Este tipo de fenómenos tem tendência a repetir-se e admira como não aconteceu nas povoações vizinhas. Atrani está espartilhada entre cumeadas que acabam no mar e toda a ocupação dos solos parece ter sido feita com pouca intervenção da engenharia preventiva, desde o tapamento e redução das secções de escoamento das linhas de água aos obstáculos ao longo das encostas (estradas, vegetação não contida, casas). Ver a imagem do Google Earth .

Também no sul de Itália, na Calábria, em Maierato, tinha ocorrido um deslizamento de terras em Fevereiro de 2010. Ver:
http://rockglacier.blogspot.com/2010/02/landslide-in-calabria.html

Em Abril de 2010, no norte de Itália, na linha de caminho de ferro que serve Bolzano, num vale no sopé dos Alpes do Alto Adige, um deslizamento de terras com origem na rotura de uma rede de irrigação e consequente encharcamento dos solos, provocou o descarrilamento d e um comboio com vítimas mortais. Ver:
http://news.bbc.co.uk/2/hi/europe/8615002.stm

No Japão há registos de deslizamentos de terras já há vários anos. Neste país estudou-se profundamente a geologia da liquefação dos solos, de grande aplicação na construção de túneis em solos aluvionares ou argilosos (um solo com areia resiste melhor à liquefação) e na construção anti-sísmica. No caso do acidente neste vídeo, verifica-se que o coberto vegetal, de árvores, não é suficiente para evitar o deslizamento. Ver:
http://www.youtube.com/watch?v=23NZTzpw6cY

Em Portugal tivemos, em Janeiro de 2010, o deslizamento de terras sobre a CREL, em Carenque e, em Maio, na encosta da Graça, junto do miradouro da Senhora da Graça.

Verificou-se ainda, recentemente, na Tailândia, um deslizamento de terras com destruição de uma estrada. Neste país a UNESCO desenvolveu desde há vários anos estudos no campo para prevenção dos deslizamentos de terras, com definição do nível de alarme sempre que a pluviosidade diária ultrapassa 100 mm. Ver:
http://www.unescobkk.org/index.php?id=6147

Vou juntar a esta série de catástrofes mais ou menos naturais, mais ou menos consequência de alterações climáticas com aumento de ocorrências de pluviosidade muito elevada concentrada num período de tempo curto, mais ou menos potenciada pela ocupação descuidada dos solos, o acidente com a explosão de uma conduta de gás que provocou a morte de várias pessoas nos arredores de S.Francisco, junto do aeroporto.

O meu objetivo, para além de chamar a atenção para a importância do estudo dos solos e do seu relacionamento com a pluviosidade ou com outra presença de água na construção de vias férreas, rodovias, túneis ou viadutos é o de colocar uma conjetura.

Não disponho de nenhum estudo que a possa fundamentar, mas é uma conjetura que poderá também contribuir para o que parece um agravamento da ocorrência deste tipo de fenómenos.

Para formular a conjetura recordo uma figura que desapareceu há muito das estradas portuguesas: o cantoneiro. A espaços via-se, ao lado da estrada, a casa do cantoneiro, com a indicação, em azulejos azuis, da quilometragem e de que era propriedade da junta autónoma das estradas.

Não recordo desses tempos, passados há mais de 50 anos, nenhuma vegetação a obstruir uma placa de sinalização ou de indicação à beira da estrada. Não me recordo de ver marcos ou guardas de proteção nas curvas aguardando reparação.

De repente ou talvez não, desapareceram os cantoneiros.

Agora existem os contratos de manutenção, defendidos por senhores finos que os assinam.

Não é a falta dos cantoneiros nas estradas de Portugal que provoca fenómenos de deslizamento de terras, não é essa a conjetura.

Mas será a cultura que se instalou que o indicador de que os dirigentes se devem orgulhar é o da redução dos recursos humanos. Que, graças às novas tecnologias, as empresas não precisam de ter tantos funcionários.

Não foi o cantoneiro que faltou às estradas de Portugal que foi capaz de detetar na Madeira e em Atrani que a secção de escoamento das ribeiras enterradas era insuficiente para uma precipitação superior a 100 mm/dia, porque também aí não havia ninguém para fazer esse trabalho. Nem para detetar fissuras anteriores nas estradas das encostas, ou que os leitos das ribeiras estavam obstruídos com pedras e restos de vegetação, prontos a formarem uma barragem. Ou para explicar aos engenheiros ou arquitetos da câmara municipal que aqueles edifícios e aquelas estradas não podiam ser construídos assim.

Cinicamente a conjetura perguntará: será que os prejuízos das enxurradas recorrentes não dariam para suportar o pagamento dos salários de técnicos que ajudassem a prevenir as consequências e a detetar os riscos de enxurradas?
Mesmo que fosse em “outsourcing”, porque já se vê que as janelas de oportunidades devem ser muito bem aproveitadas.
E é aqui que entra a conduta de gás que rebentou na Califórnia. Segundo informações do MSNBC, as condutas eram já antigas, não tinham sido revistas e adaptadas à pressão do  gás natural escolhida, e havia dias que se notava o cheiro de fugas de gás (o gás é inodoro mas o transportador deve misturar um componente para dar cheiro).
Numa palavra, grandes economias com quadros de pessoal (e portanto um bom indicador para mostrar em powerpoints) e bons contratos de outsourcing com empresas de manutenção que não submeteram a conduta aos testes de estanquidade que deviam, foram as estratégias dos donos e dos operadores daquela conduta (como se sabe, a BP também não era a responsável pela perfuração da Deepwater Horizon. Tinha contratado o aluguer da torre e as equipas de perfuração).