quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O problema dos transportes explicado a professoras reformadas

Rosa despediu-se com o seu jeito de falar esbaforido: "Depois mando-te as fotografias por email".
Professora reformada de português, descobriu já depois dos 70 anos as vantagens da internet.
Entretanto utiliza o seu dinamismo num grupo de teatro e de vez em quando arrasta o marido em excursões culturais.
Desta vez foi a Guimarães e as fotografias são desse passeio.

Falo-vos de Rosa porque se me queixou de que a viagem no Intercidades não correu tão bem como esperado porque se atrasou muito, entre Coimbra e o Porto.
Segundo o revisor, foi por causa do regional.

Então eu expliquei que os senhores que mandam nestas coisas - não diretamente quem trabalha nos comboios, mas quem decide sobre as estratégias e as políticas de investimento - não costumam viajar de comboio, nem têm problemas quando vão ao Porto, porque ou vão pela auto-estrada com batedores em carros de 300 cavalos, ou vão no avião da TAP.

Pode parecer irrelevante, mas não deve ser.
Quem pede a uma secretária para tratar da viagem e tem tudo resolvido tem dificuldade em compreender o que sofrem os cidadãos e cidadãs comuns no dia a dia das suas viagens.
E o que sofrem é isso: atrasos por causa do regional.

Claro, a linha do norte é só uma e está saturada. O regional pára em Mogofores, Oiã e Silvades e o Intercidades não pode ultrapassar o regional porque é preciso dar passagem ao Alfa que tem mais pressa.
Por isso Rosa chegou atrasada a Guimarães, por causa do problema do modo de transporte e da incompatibilidade entre modos de transporte.

E não  lhe contei que o pessoal da manutenção tem de fazer intervenções durante a exploração diária, com risco da própria vida, porque de noite tambem circulam as mercadorias.

Isto é, quem manda e toma decisões acha que uma linha ferroviária aguenta tudo o que lhe querem pôr em cima (até nem aguenta, há normas que limitam o peso por eixo).
Não admira, não vão viajar nela, que viajar de comboio é para quem, parafraseando Margaret Tatcher, não teve exito na vida, e quem tiver de fazer manutenção que se arranje como puder, ou deixe para depois, que se houver um acidente imediatamente será ordenado um inquérito.

E pensar que os senhores que mandam e tomam decisões achavam que uma das razões para o novo aeroporto ficar na Ota era ter a linha do norte ao lado (coitados, disseram isto em público, sem terem vergonha nem consciencia da exibição de ignorancia)...

Mas Rosa gostou muito da visita a Guimarães, antecipando a capital da cultura.
E o regresso correu melhor, no suburbano Guimarães-Porto e mudança para o Alfa.
Disse Rosa que chegaram aos 256 km/h e o que o comboio tremia muito (ai a manutenção da via férrea...sabemos que é cara mas tem de ser feita especialmente para estas velocidades).
Eu disse-lhe que devia ter visto mal o painel informativo, devia ter sido antes 226 km/h.
E que isto das velocidade acima de 250 km/h já é mais TGV, embora os senhores que mandam e tomam decisões achem, do alto império aonde subiram sobre todas as técnicas, que podem andar a essas velocidades 4 vezes mais barato.

Na verdade, andar a 300 km/h consome e custa mais 21% do que andar a 250 km/h, e andar a 200 km/h custa menos 15% do que andar a 250 km/h.
Mas olhem que não, senhores que mandam e tomam decisões, olhem que as infra-estruturas e a sua manutenção para 250 km/h custam o mesmo que para 300 km/h, e a diferença no material circulante é pequena.

A Rosa já sabe isso, agora é a vossa vez.

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